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Jurisdição constitucional e a concretização dos direitos sociais previstos no art. 6º da Constituição Federal de 1988

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11/07/2013 às 08:10
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11.Moradia

O direito a moradia não estava previsto na redação original da CF. Foi acrescido ao rol dos direitos sociais pela Emenda Constitucional n.º 26/2000.

Sabe-se que o déficit habitacional é um dos maiores problemas ocorridos com o crescimento das cidades. O “êxodo rural e regional”, a explosão demográfica, a concentração de renda, as construções desordenadas e a falta de fiscalização do poder público são as principais causas do aludido deficit.

Atualmente, o Poder Executivo esforça-se em minorar tal problema, mediante a disponibilização de amplos recursos para o financiamento da casa própria, com prazos maiores, juros menores e redução dos entraves burocráticos. Porém, ainda é insuficiente.

O Poder Legislativo, por sua vez, contribuiu com a legislação do FGTS, que permite o seu saque para a compra da casa própria, a Lei 8.009/1990, que trata da impenhorabilidade do bem de família, visando proteger a moradia, dentre outras. Da mesma forma, a produção legislativa ainda é insuficiente.

Quanto ao Poder Judiciário, tivemos recentemente uma decisão que entrará para história como um dos maiores atentados aos direitos básicos, no que foi uma das grandes violações ao direito social à moradia: o caso Pinheirinho. Na favela Pinheirinho, localizada em São José dos Campos, São Paulo, milhares de famílias ocuparam irregularmente um terreno pertencente a massa falida de uma empresa pertencente ao especulador Naji Nahas. O Tribunal de Justiça referendou decisão de juiz de primeiro grau e determinou a reintegração de posse. Vê-se que o direito social à moradia sucumbiu perante o direito à propriedade.


12.Lazer

O direito ao lazer é, talvez, o mais abstrato dos direitos previstos no art. 6º da CF. Como assegurar o lazer à população? Se instado a se manifestar, como poderia o Judiciário assegurar ao indivíduo o direito ao lazer?

A dificuldade reside na circunstância que a efetividade de tal direito variará de pessoa para pessoa, pois temos diversas formas de nos divertir, de aproveitar nosso tempo livre. Enquanto alguns preferem ir para festas, outros frequentam igrejas. Enquanto uns ficam em casa lendo um livro ou assistindo algum filme, outros preferem ir para praças, praias e outros lugares públicos.

No entanto, o direito ao lazer deve possui um mínimo de eficácia, já que está previsto na Constituição. Assim, cabe ao Poder Público atuar no sentido de criar as melhores condições para que o lazer seja melhor aproveitado. Por isto, incumbe ao Poder Público construir praças, preservar áreas verdes, assegurar acesso pleno às praias, construir quadras poliesportivas, criar programas de recreação para crianças em comunidades carentes etc.

Nas palavras de Bulos:

O lazer também veio inscrito com um dos direitos sociais básicos. Trata-se de outra novidade, inexistente nas Cartas brasileiras pregressas. O direito de distrair-se, de usar o tempo reservado ao trabalho para o prazer do corpo e do espírito não vem, geralmente, expresso em ordenamentos constitucionais. Tanto é assim que não se tem notícia de sua presença no Direito Comparado. Ressalte-se, a propósito, que o direito ao lazer não se confunde com o direito ao descanso ou repouso, porque ele, diversamente dos últimos, não envolve a recuperação de forças exauridas no labor diário”. BULOS pág. 788

O direito ao lazer tem origem na regulação do direito do trabalho, ocorrida a partir do final do século XIX. Com a redução da jornada de trabalho, concessão de repouso semanal remunerado, férias e aposentadoria, os trabalhadores passaram a ter um tempo extra para tratar de seus assuntos pessoais, sendo que parte dele foi redirecionada ao lazer.

O lazer proporciona a socialização do indivíduo, que a passa a se relacionar mais e melhor com outras pessoas, além de, numa visão utilitarista, assumir vital importância para a saúde, pois grande parte das doenças oriundas com o estresse do trabalho e dos problemas cotidianos são eliminadas ou minoradas pelo descanso ou lazer.


13.Segurança

A Constituição Federal de 1988 concedeu à segurança a maior importância, colocando-a ao lado de outros direitos vitais, como a vida e a igualdade (art. 5, caput¸da CF), além de reconhecer o seu caráter de direito social.

José Afonso da Silva aduz que:

No art. 5º a segurança aparece, sobretudo, como garantia individual, como vimos antes. Aqui, segurança é definida como espécie de direito social. Portanto, há de se falar de outra forma de direito. Como direito social, a segurança é especialmente a obtenção de uma convivência social que permita o gozo de direitos e o exercício de atividades sem perturbação de outrem. Vale dizer, direito à segurança do artigo 6º,prende-se ao conceito de segurança pública. (SILVA, 2009, p. 187)

Segundo o caput do art. 144 da Constituição Federal, a segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio.


14.Previdência Social

O art. 201 da CF diz que a previdência social será organizada sob a forma de regime geral de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial.

A Previdência Social está amplamente normatizada tanto na CF como na legislação infraconstitucional, principalmente pelas Leis 8.212/91 e 8.213/91.

Outrossim, existe amplo acesso à jurisdição nesta seara, mormente após a criação e instalação de várias Varas Federais no interior do Brasil.

No Brasil existem dois sistemas de previdência: público e privado.

Segundo Tavares, “a previdência privada é um sistema complementar e facultativo de seguro, de natureza contratual”. (TAVARES, 2010, p. 25)

Quanto ao sistema público Tavares aduz que:

O sistema público, o que verdadeiramente pode ser intitulado de social, caracteriza-se por ser mantido por pessoa jurídica de direito público, tem natureza institucional, é de filiação compulsória e as contribuições têm natureza tributária; pode ser destinado aos servidores públicos e mantido pelos entes políticos da federação, ou aos trabalhadores da iniciativa privada e gerido por uma autarquia federal – INSS” MARCELO LEONARDO TAVARES pág. 26

Por último, conceitua a previdência no Regime Geral de Previdência Social: “como seguro público, coletivo, compulsório, mediante contribuição e que visa cobrir os seguintes riscos sociais: incapacidade, idade avançada, tempo de contribuição, encargos de família, morte e reclusão.” (TAVARES, 2010, p. 27)

Sarlet faz importantes observações, que aqui merecem transcrição literal:

Neste contexto, pacificou-se, por exemplo, o entendimento de que as normas contidas no art. 201, § 5º (vinculação do valor dos benefícios, no que concerne ao seu piso, ao salário mínimo) e § 6º (valor-base para a gratificação natalina dos pensionistas e aposentados) são diretamente aplicáveis e eficazes, vinculando todos os poderes estatais, independentemente de qualquer ato legislativo, posição esta acolhida já algum tempo pelo Supremo Tribunal Federal, que, além disso, sustentou que o art. 195, § 5º, da CF, de acordo com o qual nenhum benefício poderá ser criado, majorado ou estendido sem a correspondente fonte de custeio total, vincula tão somente o legislador, na constituindo óbice para a aplicação dos critérios já referidos e estabelecidos no art. 201, §§ 5º e 6º, de nossa Lei Fundamental.

(...)

Já no que diz com o art. 202 da CF, que assegura o direito à aposentadoria, nos termos da lei, constata-se que as normas nele contidas se destacam por sua alta densidade normativa, isto é, por sua completude intrínseca, já que, além de definir o objeto do direito (aposentadoria), fixam critério bem determinados para sua concessão, razão pela qual já se sustentou, na doutrina, a possibilidade de – independentemente de lei – reconhecer-se um direito subjetivo individual à aposentadora. Também no tocante a este aspecto, posicionou-se, no âmbito do controle concreto da constitucionalidade (RE nº 166.96-RS), o Supremo Tribunal Federal, entendendo que a norma contida no art. 202, inc. I, da CF, que regulamenta a aposentadoria por idade, constitui direito imediatamente aplicável. (SARLET, 2011, p. 316)


15.Proteção à maternidade e à infância

O direito social da proteção à maternidade e à infância está regulado de forma esparsa na Constituição Federal, como por exemplo: reconhecimento do direito à licença maternidade e paternidade aos trabalhadores rurais e urbanos (art. 7º, incs. XVII e XIX); assistência gratuita aos filhos e dependentes desde o nascimento até 5 (cinco) anos de idade em creches e pré-escolas (art. 7º, inc. XXV); o estabelecimento das condições necessárias para que as presidiárias possam permanecer com seus filhos durante o período de amamentação (art. 5º, inc. L) e principalmente nas disposições contidas no Capítulo VII (Da Família, da Criança, do Adolescente, do Jovem e do Idoso).

O mais importante é o art. 227 da CF que dispõe:

Art. 227 - É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, àalimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, àdignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária,além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação,exploração, violência, crueldade e opressão.

O aludido direito está regulado pela legislação infraconstitucional, principalmente através da CLT e o Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069/90).

Conforme nos notícia o site Consultor Jurídico, recentemente, a Justiça Federal estendeu a um servidor da Polícia Federal o direito de gozar da licença paternidade nos moldes da licença maternidade, depois que a solicitação foi negada na seara administrativa. O pedido foi feito porque a sua mulher morreu por complicações durante o parto do filho e o pai precisaria de mais tempo para cuidar do filho recém-nascido. (http://www.conjur.com.br/2012-fev-12/viuvo-pai-recem-nascido-direito-licenca-maternidade )

Trata-se decisão inédita e um excelente exemplo de como a jurisdição constitucional tem relevante papel na concretização dos direitos sociais, pois, tendo em vista a proteção da infância e os interesses imediatos dos filhos menores, reconheceu, mesmo sem previsão legal, o direito destes de ter a presença do pai. Em outras palavras, prevaleceu o direito social da proteção à infância e o princípio da dignidade humana sobre a letra fria da lei.


16.Assistência aos desamparados

Para Bulos:

A assistência aos desamparados é outro direito social que ainda não foi efetivado. No plano legislativo, é bem certo, ocorreram tentativas nesse sentido. A Emenda Constitucional n. 31/2000, por exemplo, buscando combater a miséria, a marginalidade, as desigualdades sociais e regionais, instituiu o Fundo de Combate e Erradicação da Pobreza, o qual, segundo a emenda, deve vigorar, no âmbito do Poder Executivo Federal, até 2010, para propiciar a todos os brasileiros acesso a níveis dignos de subsistência. Seus recursos devem direcionar-se às ações suplementares de nutrição, habitação, saúde, reforço da renda familiar, dentre outros programas de interesse social, voltados para a melhoria da qualidade de vida. (BULOS, 2010, p. 788)

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Uma das facetas da assistência aos desamparados é a assistência social, que possui previsão no art. 203 da CF, que “será prestada a quem dela necessitar, independentemente de contribuição à seguridade social”. No plano infraconstitucional, a assistência social é regulada pela Lei nº 8.742/92, denominada Lei Orgânica da Assistência Social – LOAS.

Segundo Tavares:

A assistência social é um plano de prestações sociais mínimas e gratuitas a cargo do Estado para prover pessoas necessitadas de condições dignas de vida. É um direito social fundamental e, para o Estado, um dever a ser realizado através de ações diversas que visem atender às necessidades básicas do indivíduo, em situações críticas da existência humana, tais como maternidade, infância, adolescência, velhice e para pessoas portadoras de limitações físicas.

As prestações de assistência social são destinadas aos indivíduos sem condições de prover o próprio sustento de forma permanente ou provisória, independentemente da exigência de contribuição para o sistema de seguridade social. (TAVARES, 2010, p. 17)


17.O PAPEL DO CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE NA EFETIVAÇÃO DOS DIREITOS SOCIAIS

Inicialmente, cabe ressaltar que não é o escopo do presente trabalho esmiuçar o controle de constitucionalidade e seus instrumentos, mas somente estabelecer seus principais pontos e como sua utilização pode reforçar a concretização dos direitos sociais.

Como já salientado acima, o controle de constitucionalidade pode ser exercido pelos juízes de primeiro grau e pelos tribunais. “No Brasil qualquer juiz de direito de primeira instância pode deixar de aplicar uma lei, se entendê-la inconstitucional”. (STRECK, 2002, p. 362)

O juiz exerce o controle de constitucionalidade de forma difusa, em questão preliminar de mérito do processo judicial. Em outras palavras, para haver continuidade na análise do processo deverá o juiz primeiramente encarar a arguição incidental de inconstitucionalidade. Há uma ampliação do acesso ao judiciário, pois não há necessidade de se levar a questão ao STF (ou Tribunal de Justiça, conforme o caso), órgão de cúpula do judiciário, para se analisar a constitucionalidade de determinada lei ou ato normativo.

Lênio Luiz Streck, de maneira enérgica, defende a utilização do controle difuso e faz uma diferenciação entre a análise realizada pelo juiz e a feita por Tribunais:

De pronto, é necessário deixar claro que qualquer ato judicial é ato de jurisdição constitucional. O juiz sempre faz jurisdição constitucional. É dever do magistrado examinar, antes de qualquer outra coisa, a compatibilidade do texto normativo infraconstitucional com a Constituição. Nesse sentido, há uma diferença entre o controle difuso exercido pelo juiz singular e o controle exercido pelos tribunais. Ao contrário dos tribunais, o juiz não declara a inconstitucionalidade do texto normativo; deixa de aplicá-lo. (STRECK, 2002, p. 362)

Entretanto, infelizmente, o controle difuso de constitucionalidade está esquecido em nossa prática forense. Os juízes negam-se a arguí-la de ofício e mesmo quando provocado pelas partes não enfrentam diretamente a questão, deixando ao Tribunal, em sede recursal, o enfrentamento do problema.

Resulta que o exercício do controle difuso é realizado mais assiduamente na Corte Suprema, que já detém o monopólio do controle concentrado de constitucionalidade.

Leis e atos normativos do Poder Público que negassem, dificultassem ou não regulassem satisfatoriamente os direitos sociais poderiam ser declarados inconstitucionais em sede de controle difuso por qualquer juiz, porém não é isso que se vê no cotidiano dos fóruns. São pouquíssimos os juízes que possuem a coragem de declarar uma lei inconstitucional. Preferem que a questão seja enfrentada primeiramente pelo STF ou Tribunais para, de posse do acórdão, escudado na decisão judicial, fundamentarem com maior segurança suas sentenças. Torna-se o juiz mero repetidor da jurisprudência dos tribunais, o que pode levar ao engessamento do judiciário e contribuir para a baixa normatividade da constituição.

A situação complica-se nos casos de omissão legislativa ou não adoção de políticas públicas pelo Poder Público.

Vaticina Anabelle Macedo Silva que:

na seara dos direitos fundamentais, a integração normativa jurisdicional presta-se ainda à reparação das omissões normativas lesivas a tais direitos. Frequentemente tais omissões legislativas conduzem à inefetividade das normas constitucionais, a menos que possa contar o cidadão com uma decisão jurisdicional integrativa do conteúdo normativo da Constituição, por exemplo, quando se definem, numa sentença, quantitativos mínimos de medicamentos essenciais à sobrevivência de doentes, a serem prestados pelo Estado, ou, ainda, quando estabelece a decisão judicial parâmetros mínimos para o atendimento terapêutico estatal de adolescente em situação de drogadição”. (SILVA, 2005, p. 93)

Posto isto, os juízes devem estar preparados para melhor analisar o problema, pois com a crescente conscientização da população na busca da concretização jurisdicional de seus direitos, com a instituição das defensorias públicas para a defesa dos pobres e o papel do Ministério Público na defesa dos direitos coletivos há uma tendência de crescimento dos conflitos jurisdicionais e de aumento no número de demandas.

No entanto, é no controle concentrado de constitucionalidade que a jurisdição constitucional assume uma posição mais proeminente e é onde temos uma maior possibilidade de efetivação dos direitos sociais, desde que os instrumentos postos a disposição da jurisdição constitucional sejam plenamente exercidos, algo que não está acontecendo atualmente. Vejamos as ações mais importantes segundo o escopo do nosso trabalho.

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Sobre o autor
Robson da Costa Oliveira

Analista Judiciário Federal do TRT da 5ª Região. Assistente de Juiz. Bacharel em Direito pela Universidade Regional do Cariri - URCA-CE. Especialista em Direito Público pela Universidade Anhanguera - Uniderp

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

OLIVEIRA, Robson Costa. Jurisdição constitucional e a concretização dos direitos sociais previstos no art. 6º da Constituição Federal de 1988. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3662, 11 jul. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/24919. Acesso em: 22 nov. 2024.

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