Resumo: Este trabalho realiza uma abordagem a respeito do atual sistema legal de acesso à informação, introduzido pela Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 e consolidado nas Leis nº 12.527 e 12.528 e respectivos decretos regulamentadores (Decretos nº 7.724 e nº 7.845, ambos de 2012), sob a perspectiva paradigmática do Estado Democrático de Direito, defendida pelo Professor da Faculdade de Direito da Universidade de Brasília, Menelick de Carvalho Netto, e da teoria discursiva da democracia, segundo o jusfilósofo Jürgen Habermas. Frente aos valores humanistas implicitamente contidos nos princípios e regras que formam a legislação vigente, procura-se demonstrar, por meio de uma amostra analítica dos principais dispositivos normativos, a ocorrência da superação histórica do período de exceção e ruptura com a cultura do segredo.
Palavras-chave: Acesso à informação. Paradigma Constitucional. Estado Democrático de Direito. Cultura do segredo. Superação.
1. INTRODUÇÃO
A resolução de delinear o trabalho com a temática do paradigma constitucional do Estado Democrático de Direito partiu da reflexão de sua aplicabilidade na leitura de leis que inauguraram um novo sistema jurídico de acesso à informação, quebrando com toda a limitação retrógrada da antiga legislação que dispunha sobre a matéria.
O exercício da função pública de Advogado da União em órgão de execução consultivo da Advocacia-Geral da União instigou a realização do trabalho, principalmente considerando a experiência de atuar perante a Consultoria Jurídica junto ao Ministério da Defesa, onde a discussão da matéria tem sido recorrente, tanto em assessoramento aos órgãos e autoridades consulentes, quanto em decorrência de embates judiciais, em defesa da União, que ainda têm (ou tinham) por referência um regime constritor de acesso a dados e informações – herança de um período em que, por motivos históricos bastante controversos, excepcionou-se a participação e legitimação popular.
Em vista dos objetivos e dos limites acadêmicos ora propostos, não cabe aqui tecer qualquer pronunciamento crítico a respeito do regime militar, mas apenas confluir a teoria da interpretação jurídica sob o ponto de vista de paradigmas constitucionais defendida por Menelick de Carvalho Netto e da ideia de democracia, segundo a teoria discursiva de Habermas, com a demonstração da superação, pela própria legislação infraconstitucional, de uma realidade de outrora, não mais condizente com a cultura do segredo e de segregação do cidadão no processo de elaboração e controle dos atos estatais.
A interpretação jurídica sob esse prisma de paradigmas torna um facilitador da conscientização da mudança de pré-compreensões e visões de mundo advinda do Estado Democrático de Direito, demonstrando a correção de curso pelos poderes executivo e legislativo federais com a edição de normas federais que garantem o direito de acesso à informação nos precisos termos ditados pela Constituição da República e Tratados Internacionais – direitos fundamentais que estruturam a própria democracia.
2. ADOÇÃO E APREENSÃO CONCEITUAL DE PARADIGMA
Consoante anunciado, adota-se como paradigma o conceito desenvolvido pelo Professor Menelick de Carvalho Netto, apreendido sob um duplo aspecto, a saber:
(...) Por um lado, possibilita explicar o desenvolvimento científico como um processo que se verifica mediante rupturas, através da tematização e explicitação de visões de aspectos centrais dos grandes esquemas gerais de pré-compreensões e visões de mundo, consubstanciados no pano de fundo naturalizado de silêncio assentado na gramática das práticas sociais, que a um só tempo tornam possível a linguagem, a comunicação, e limitam ou condicionam o nosso agir e a nossa percepção de nós mesmos e do mundo. Por outro lado, também padece de óbvias simplificações, que só são válidas na medida em que permitem que se apresente essas grades seletivas gerais pressupostas nas visões de mundo prevalentes e tendencialmente hegemônicas em determinadas sociedades por certos períodos de tempo e em contextos determinados. É claro que a história como tal é irrecuperável e incomensuravelmente mais rica do que os esquemas que aqui serão apresentados, bem como se reconhece as infinitas possibilidades de reconstrução e releitura dos eventos históricos. Assim, o nível de detalhamento e preciosismo na reconstrução desses paradigmas vincula-se diretamente aos objetivos da pesquisa que se pretende empreender.[1]
Essa mudança de visão da sociedade acaba por influenciar também o Direito quando da interpretação de suas regras e princípios, sobretudo a interpretação constitucional, eis que impregnada de conceitos abertos ou jurídicos indetermináveis, de modo que a leitura do texto e a valoração que lhe vai ser dada pelo intérprete interfere diretamente na aplicação da norma e solução de eventuais conflitos.
A referência e definição de público e privado no curso desse processo também nos revela tensões entre princípios e conceitos estruturantes, a exemplo da liberdade, da igualdade e da cidadania, que direcionam para o desempenho de papeis diferenciados do Estado e da sociedade, principalmente quando se caminha para o paradigma do Estado Democrático de Direito, onde a legitimação da ação estatal passa a ser o grande mote de construção e interpretação do direito.
Vê-se, assim, que os paradigmas afetam a interpretação ao imbuir cargas valorativas que servem de pano de fundo para a leitura e aplicação do texto normativo. Por mais técnico e legalista que o direito venha a ser, não há como ser plenamente isento de qualquer influência ou matemático a ponto de delinear um hipotético quadro de possíveis interpretações (KELSEN). A própria dinâmica da linguagem indicia a gramática das práticas sociais em permanente transformação.
Ante a quantidade de conceitos abertos (ou jurídicos indeterminados), a interpretação constitucional sofre indução direta dos paradigmas, “(...) ao pano-de-fundo compartilhado de silêncio, que sustenta a comunicação na linguagem, ao mundo-da-vida, que assegura a existência de uma Constituição compartilhada intersubjetivamente pela comunidade de cidadãos. Pano-de-fundo que contém os horizontes de sentido dessa determinada comunidade enraizados na gramática das práticas sociais, incorporando um repositório de sentidos decorrentes tanto da gramática das práticas assentadas nas tradições quanto de novas práticas emancipatórias e revolucionárias (MENELICK).
Segundo Bernardo Gonçalves Fernandes, absorvendo a teoria discursiva da democracia habermasiana:
“Temos que a Constituição deve ser compreendida como prefiguração de um sistema de direitos fundamentais que representam as condições procedimentais para a institucionalização da democracia, nos âmbitos e nas perspectivas específicas do processo legislativo, jurisdicional e administrativo, e que garante, ainda, espaços públicos informais de geração da vontade e das opiniões políticas. Nesse sentido, a democracia, como princípio jurídico-constitucional a ser densificado de acordo com a perspectiva específica de cada um desses processos, significa participação em igualdade de direitos e de oportunidades, daqueles que serão afetados pelas decisões, nos procedimentos deliberativos que as preparam”[2].
O fortalecimento da figura do cidadão no paradigma do Estado Democrático de Direito tem direcionado a afirmação constitucional dos direitos fundamentais de forma cada vez mais substancial e efetiva, não apenas como alvo de direitos, mas também como sujeito deles, de modo a influenciar – exercer a função informativa – na elaboração de normas infraconstitucionais.
Esse é o caso do novo sistema de acesso à informação que, superando uma legislação consonante com um passado histórico de pré-compreensões voltadas à segregação do público em relação ao privado, acaba por inserir o cidadão como ator e fator determinante, concedendo-lhe direitos e garantias que institucionalizam uma democracia participativa.
3. DEMONSTRAÇÕES TEXTUAIS DA RUPTURA DA CULTURA DO SEGREDO E ABERTURA DA CULTURA DA TRANSPARÊNCIA
Como herança conceptiva de um período de exceção democrática, até pouco tempo, ainda vigorava integramente a Lei nº 8.159/1991 e seu questionado Decreto nº 4.533/2002, que preservava critérios de classificação de documentos, em especial no que toca à indefinição do prazo de duração da classificação no grau de ultrassecreto, que amparava a guarnição hermética de informações e dados sob os auspícios do Estado.
Contudo, a União editou, por meio dos poderes constituídos (Executivo e Legislativo) e com a ampla participação popular, uma série de normas de afirmação do direito de acesso à informação, atendendo os anseios sociais e a própria efetivação dos direitos fundamentais inscritos na Constituição de 1988 e dos princípios que a regem, entre elas, a Lei nº 12.527/2011 e a Lei nº 12.528, ambas de 18 de novembro de 2011, publicadas nesta mesma data em edição extra do Diário Oficial da União.
Nesse contexto, sabe-se que, desde sua vigência (16.05.2012), a Lei nº 12.527 passou a regulamentar expressamente três dispositivos constitucionais, sendo eles (em destaque):
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
(...)
XXXIII - todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado;
Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)
(...)
§ 3º A lei disciplinará as formas de participação do usuário na administração pública direta e indireta, regulando especialmente: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)
(...)
II - o acesso dos usuários a registros administrativos e a informações sobre atos de governo, observado o disposto no art. 5º, X e XXXIII; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)
Art. 216. Constituem patrimônio cultural brasileiro os bens de natureza material e imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de referência à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira, nos quais se incluem:
(...)
§ 2º Cabem à administração pública, na forma da lei, a gestão da documentação governamental e as providências para franquear sua consulta a quantos dela necessitem.
A norma revogou parcialmente a Lei nº 8.159/1991, mortificando os antigos artigos 22 a 24, que dispunham sobre o acesso e o sigilo de documentos públicos. Em letras:
CAPÍTULO V
Do Acesso e do Sigilo dos Documentos Públicos
Art. 22 - É assegurado o direito de acesso pleno aos documentos públicos.(Revogado pela Lei nº 12.527, de 2011)
Art - 23. Decreto fixará as categorias de sigilo que deverão ser obedecidas pelos órgãos públicos na classificação dos documentos por eles produzidos. Regulamento(Revogado pela Lei nº 12.527, de 2011)
§ 1º - Os documentos cuja divulgação ponha em risco a segurança da sociedade e do Estado, bem como aqueles necessários ao resguardo da inviolabilidade da intimidade, da vida privada, da honra e da imagem das pessoas são originariamente sigilosos.(Revogado pela Lei nº 12.527, de 2011)
§ 2º - O acesso aos documentos sigilosos referentes à segurança da sociedade e do Estado será restrito por um prazo máximo de 30 (trinta) anos, a contar da data de sua produção, podendo esse prazo ser prorrogado, por uma única vez, por igual período.(Revogado pela Lei nº 12.527, de 2011)
§ 3º - O acesso aos documentos sigilosos referente à honra e à imagem das pessoas será restrito por um prazo máximo de 100 (cem) anos, a contar da sua data de produção.(Revogado pela Lei nº 12.527, de 2011)
Art. 24 - Poderá o Poder Judiciário, em qualquer instância, determinar a exibição reservada de qualquer documento sigiloso, sempre que indispensável à defesa de direito próprio ou esclarecimento de situação pessoal da parte.(Revogado pela Lei nº 12.527, de 2011)
Parágrafo único - Nenhuma norma de organização administrativa será interpretada de modo a, por qualquer forma, restringir o disposto neste artigo.(Revogado pela Lei nº 12.527, de 2011)
Desse modo, mudou-se, por inteiro, o paradigma antes consagrado na legislação ordinária anterior: afastou-se a cultura de segredo (redação do revogado § 1º do art. 23 da Lei nº 8.159/1991), para dar abertura à cultura de transparência, conforme disposto nos arts. 3º, I, e 8º da Lei nº 12.527/2011, que ora se reproduz:
Art. 3º. Os procedimentos previstos nesta Lei destinam-se a assegurar o direito fundamental de acesso à informação e devem ser executados em conformidade com os princípios básicos da administração pública e com as seguintes diretrizes:
I - observância da publicidade como preceito geral e do sigilo como exceção;
II - divulgação de informações de interesse público, independentemente de solicitações;
III - utilização de meios de comunicação viabilizados pela tecnologia da informação;
IV - fomento ao desenvolvimento da cultura de transparência na administração pública;
V - desenvolvimento do controle social da administração pública.
Art. 5º. É dever do Estado garantir o direito de acesso à informação, que será franqueada, mediante procedimentos objetivos e ágeis, de forma transparente, clara e em linguagem de fácil compreensão.
Art. 8º. É dever dos órgãos e entidades públicas promover, independentemente de requerimentos, a divulgação em local de fácil acesso, no âmbito de suas competências, de informações de interesse coletivo ou geral por eles produzidas ou custodiadas.
Nos termos da lei vigente, o acesso à informação é a regra, o sigilo passou a ser exceção, e apenas quando imprescindível à segurança da sociedade (à vida, segurança ou saúde da população) e do Estado (soberania nacional, relações internacionais, atividades de inteligência), ou seja, todas as informações produzidas ou custodiadas pelo poder público e não classificadas como sigilosas são públicas e, portanto, acessíveis a todos os cidadãos.
Com o inaugurado sistema de acesso à informação, prevalece o princípio da publicidade máxima, refletidas no dever do Estado de garantir o acesso à informação mediante procedimentos objetivos e ágeis, de forma transparente, clara e em linguagem de fácil compreensão, bem como no de promover a divulgação de forma pró-ativa (art. 8º), independente de solicitação (art. 3º, II), garantindo-se, ainda, que, mesmo nas situações em que não for autorizado o acesso integral à informação, por ser ela parcialmente sigilosa, seja assegurado acesso à parte não coberta por restrição, por meio de certidão, extrato ou cópia com ocultação da parte sob sigilo (art. 7º, § 2º[3]).
A norma trouxe, ainda, mudanças nos critérios de classificação de informação[4] quanto ao grau e prazos de sigilo, entre outras medidas, destacando-se as principais nos tópicos que se seguem:
Vedação de negativa de acesso à informação necessária à tutela judicial ou administrativa de direitos fundamentais e vedação de restrição de acesso a informações ou documentos que versem sobre condutas em que impliquem violação dos direitos humanos praticada por agentes públicos ou a mando de autoridade
Esse novo sistema não só afirma a posição adotada pela Constituição Cidadã, sobretudo em seus artigos 1º, III, e 4, II (fundamento e princípio que rege às relações internacionais da República Federativa do Brasil), como também torna explícita a garantia e proteção de direitos individuais e coletivos.
A norma vigente impede textualmente que seja negado acesso à informação necessária a tutela judicial e, inclusive, administrativa relativa a direitos humanos. Igualmente, veda que informações ou documentos que tratem sobre condutas que impliquem violação de direitos humanos decorrentes de condutas de agentes públicos ou a mando de autoridades sejam objeto de restrição de acesso. De tal sorte, blinda-se, por completo, a preceito maior da dignidade da pessoa humana.
Inclusive, não é demais lembrar que tal previsão da norma protege todo e qualquer cidadão de futuro retrocesso (proibição de retrocesso) ante o princípio da primazia da norma mais favorável a direitos humanos, devendo ser interpretada com a imediata e máxima eficácia que lhe é inerente.
Como bem destaca Portela[5]:
Essa é a regra do artigo 5º do Pacto dos Direitos Civis e Políticos, que determina que: “1. Nenhuma disposição do presente Pacto poderá ser interpretada no sentido de reconhecer a um Estado, grupo ou indivíduo qualquer direito de dedicar-se a quaisquer atividades ou de praticar quaisquer atos que tenham por objetivo destruir os direitos ou liberdades reconhecidos no presente Pacto ou impor-lhes limitações mais amplas do que aquelas nele previstas. 2. Não se admitirá qualquer restrição ou suspensão dos direitos humanos fundamentais reconhecidos ou vigentes em qualquer Estado-parte no presente Pacto em virtude de leis, convenções, regulamentos ou costumes, sob pretexto de que o presente Pacto não os reconheça em menor grau”.
Rol taxativo de situações passíveis de classificação quanto ao grau e prazo de sigilo: informações imprescindíveis à segurança da sociedade ou do Estado
A segunda modificação trazida pela Lei nº 12.527/2011 consiste na descrição de um rol taxativo de situações em que informações são passíveis de classificação; apenas naquelas cuja divulgação ou o acesso irrestrito são imprescindíveis à segurança da sociedade ou do Estado, listando-se as hipóteses objetivas de tais ocorrências. Transcreve-se para melhor visualização:
Seção II
Da Classificação da Informação quanto ao Grau e Prazos de Sigilo
Art. 23. São consideradas imprescindíveis à segurança da sociedade ou do Estado e, portanto, passíveis de classificação as informações cuja divulgação ou acesso irrestrito possam:
I - pôr em risco a defesa e a soberania nacionais ou a integridade do território nacional;
II - prejudicar ou pôr em risco a condução de negociações ou as relações internacionais do País, ou as que tenham sido fornecidas em caráter sigiloso por outros Estados e organismos internacionais;
III - pôr em risco a vida, a segurança ou a saúde da população;
IV - oferecer elevado risco à estabilidade financeira, econômica ou monetária do País;
V - prejudicar ou causar risco a planos ou operações estratégicos das Forças Armadas;
VI - prejudicar ou causar risco a projetos de pesquisa e desenvolvimento científico ou tecnológico, assim como a sistemas, bens, instalações ou áreas de interesse estratégico nacional;
VII - pôr em risco a segurança de instituições ou de altas autoridades nacionais ou estrangeiras e seus familiares; ou
VIII - comprometer atividades de inteligência, bem como de investigação ou fiscalização em andamento, relacionadas com a prevenção ou repressão de infrações.
Extinção do grau confidencial, prazos máximos menores de classificação (redução pela metade) e a possibilidade de apenas uma única renovação, por Comissão Mista de Reavaliação de Informações, por igual prazo, tão somente para aquelas informações classificadas como ultrassecretas
Quanto à classificação de grau de sigilo trazido pela Lei nº 12.527/2011, a alteração mais visível foi a extirpação do grau confidencial prevista no revogado Decreto nº 4.553/2002, que se encontrava, na hierarquia de restrição, entre o secreto e o confidencial, cujo prazo era de 20 (vinte anos), e que poderia ser atribuído por servidor civil ou militar, de acordo com a regulamentação específica de cada órgão ou entidade da Administração.
Com a nova classificação, apenas existem três graus de sigilo: a) ultrassecreto; b) secreto; e c) reservado, cujos prazos máximos sofreram considerável redução, caindo para a metade a contar de sua produção (§ 1º do art. 24), respectivamente, de 50 (cinquenta) para 25 (vinte e cinco) anos, de 30 (trinta) para 15 (quinze) anos e de 10 (dez) para 5 (cinco) anos.
Em atenção ao critério da menor restrição possível (maiores detalhes abaixo), igualmente previu-se a possibilidade de se estabelecer como termo final a ocorrência de determinado evento, com a condição de que este se efetive antes do prazo máximo de classificação correspondente.
Reproduzem-se os teores dos dispositivos legais mencionados:
Art. 24. A informação em poder dos órgãos e entidades públicas, observado o seu teor e em razão de sua imprescindibilidade à segurança da sociedade ou do Estado, poderá ser classificada como ultrassecreta, secreta ou reservada.
§ 1º. Os prazos máximos de restrição de acesso à informação, conforme a classificação prevista no caput, vigoram a partir da data de sua produção e são os seguintes:
I - ultrassecreta: 25 (vinte e cinco) anos;
II - secreta: 15 (quinze) anos; e
III - reservada: 5 (cinco) anos.
§ 2º As informações que puderem colocar em risco a segurança do Presidente e Vice-Presidente da República e respectivos cônjuges e filhos(as) serão classificadas como reservadas e ficarão sob sigilo até o término do mandato em exercício ou do último mandato, em caso de reeleição.
§ 3º Alternativamente aos prazos previstos no § 1º, poderá ser estabelecida como termo final de restrição de acesso a ocorrência de determinado evento, desde que este ocorra antes do transcurso do prazo máximo de classificação.
A cognominada Lei de Acesso à Informação (LAI), além de objetivar os critérios de classificação em rol taxativo quanto ao grau e prazo de sigilo, também eliminou, de uma vez por todas, a alegada indefinição dos prazos de restrição ao acesso de informações e documentos considerados ultrassecretos, vistos como infindáveis ante as ilimitadas renovações então previstas na redação original do multicitado Dec. 4.553.
Vale registrar que, antes mesmo do advento da LAI, no ano de 2004, uma pequena reforma no antigo decreto pelo o de nº 5.301 já havia retirado da antiga norma a dita possibilidade de renovação de prazo por período indefinido.
Conferem-se as redações do texto do Decreto nº 4.553/2002, confrontando-se a original e com aquela modificada pelo Decreto nº 5.301/2004:
Art. 6º A classificação no grau ultra-secreto é de competência das seguintes autoridades:(....)
§ 2º. Além das autoridades estabelecidas no caput, podem atribuir grau de sigilo:(Renumerado do parágrafo único pelo Decreto nº 5.301, de 2004)
I - secreto: as autoridades que exerçam funções de direção, comando, chefia ou assessoramento, de acordo com regulamentação específica de cada órgão ou entidade da Administração Pública Federal; e(Redação dada pelo Decreto nº 5.301, de 2004)
II - confidencial e reservado: os servidores civis e militares, de acordo com regulamentação específica de cada órgão ou entidade da Administração Pública Federal.(Redação dada pelo Decreto nº 5.301, de 2004)
Art. 7º Os prazos de duração da classificação a que se refere este Decreto vigoram a partir da data de produção do dado ou informação e são os seguintes:
I - ultra-secreto: máximo de cinqüenta anos;
II - secreto: máximo de trinta anos;
III - confidencial: máximo de vinte anos; e
IV - reservado: máximo de dez anos.
§ 1º O prazo de duração da classificação ultra-secreto poderá ser renovado indefinidamente, de acordo com o interesse da segurança da sociedade e do Estado.
§ 2º Também considerando o interesse da segurança da sociedade e do Estado, poderá a autoridade responsável pela classificação nos graus secreto, confidencial e reservado, ou autoridade hierarquicamente superior competente para dispor sobre o assunto, renovar o prazo de duração, uma única vez, por período nunca superior aos prescritos no caput.Art. 7º. Os prazos de duração da classificação a que se refere este Decreto vigoram a partir da data de produção do dado ou informação e são os seguintes: (Redação dada pelo Decreto nº 5.301, de 2004)
I - ultra-secreto: máximo de trinta anos; (Redação dada pelo Decreto nº 5.301, de 2004)
II - secreto: máximo de vinte anos;(Redação dada pelo Decreto nº 5.301, de 2004)
III - confidencial: máximo de dez anos; e (Redação dada pelo Decreto nº 5.301, de 2004)
IV - reservado: máximo de cinco anos. (Redação dada pelo Decreto nº 5.301, de 2004)
Parágrafo único. Os prazos de classificação poderão ser prorrogados uma vez, por igual período, pela autoridade responsável pela classificação ou autoridade hierarquicamente superior competente para dispor sobre a matéria. (Incluído pelo Decreto nº 5.301, de 2004)
Com a nova lei, enquanto o acesso ou divulgação puder ocasionar ameaça externa à soberania nacional, à integridade do território nacional ou grave risco às relações internacionais do país, a possibilidade de renovação limita-se tão somente às informações e documentos classificados como ultrassecretos e a ser realizada uma única vez, sempre por prazo determinado e observando lapso máximo de cinquenta anos para o prazo total da classificação (art. 35, §§ 1º, III, e 2º).
Para tanto, essa prorrogação não será mais viabilizada por simples ato singular da autoridade que tenha atribuído inicialmente o grau de classificação das informações ou de seu superior hierárquico, como antes era previsto. Pela legislação atual, a competência para a prorrogação é de órgão colegiado: a Comissão Mista de Reavaliação de Informações.
Retira-se, portanto, o domínio do poder de prolongamento da restrição das mãos da autoridade que a qualificou, medida esta que visa a prevenir eventuais abusos e prorrogações desnecessárias, possibilitando, de tal sorte, certa forma de controle.
Art. 35. (VETADO).
§ 1º. É instituída a Comissão Mista de Reavaliação de Informações, que decidirá, no âmbito da administração pública federal, sobre o tratamento e a classificação de informações sigilosas e terá competência para:
I - requisitar da autoridade que classificar informação como ultrassecreta e secreta esclarecimento ou conteúdo, parcial ou integral da informação;
II - rever a classificação de informações ultrassecretas ou secretas, de ofício ou mediante provocação de pessoa interessada, observado o disposto no art. 7º e demais dispositivos desta Lei; e
III - prorrogar o prazo de sigilo de informação classificada como ultrassecreta, sempre por prazo determinado, enquanto o seu acesso ou divulgação puder ocasionar ameaça externa à soberania nacional ou à integridade do território nacional ou grave risco às relações internacionais do País, observado o prazo previsto no § 1º do art. 24.
§ 2º. O prazo referido no inciso III é limitado a uma única renovação.
§ 3º. A revisão de ofício a que se refere o inciso II do § 1º deverá ocorrer, no máximo, a cada 4 (quatro) anos, após a reavaliação prevista no art. 39, quando se tratar de documentos ultrassecretos ou secretos.
§ 4º. A não deliberação sobre a revisão pela Comissão Mista de Reavaliação de Informações nos prazos previstos no § 3º implicará a desclassificação automática das informações.
§ 5º. Regulamento disporá sobre a composição, organização e funcionamento da Comissão Mista de Reavaliação de Informações, observado o mandato de 2 (dois) anos para seus integrantes e demais disposições desta Lei. (Regulamento)
Composição da Comissão Mista de Reavaliação de Informações, prazo de requerimento e quórum qualificado (maioria absoluta) para renovação do prazo das informações classificadas como ultrassecretas
Outro dado que chama a atenção é a composição da mencionada Comissão Mista, pois congrega os titulares de órgãos de alta relevância do Poder Executivo Federal, conforme se extrai da leitura do art. 46 do Decreto nº 7.724/2002:
DA COMISSÃO MISTA DE REAVALIAÇÃO DE INFORMAÇÕES CLASSIFICADAS
Art. 46. A Comissão Mista de Reavaliação de Informações, instituída nos termos do § 1o do art. 35 da Lei no 12.527, de 2011, será integrada pelos titulares dos seguintes órgãos:
I - Casa Civil da Presidência da República, que a presidirá;
II - Ministério da Justiça;
III - Ministério das Relações Exteriores;
IV - Ministério da Defesa;
V - Ministério da Fazenda;
VI - Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão;
VII - Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República;
VIII - Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República;
IX - Advocacia-Geral da União; e
X - Controladoria Geral da União.
Parágrafo único. Cada integrante indicará suplente a ser designado por ato do Presidente da Comissão.
Não bastasse a deliberação por um órgão colegiado, para a prorrogação no grau de ultrassecreto, a autoridade pública competente deverá encaminhar requerimento à Comissão Mista de Reavaliação de Informações em até um ano antes do vencimento do termo final de restrição de acesso. Soma-se a isso, o requisito de que a decisão pela prorrogação terá que ser provida por maioria absoluta da Comissão Mista.
Tais obstáculos, mais uma vez, retratam a teleologia do novo sistema normativo de prezar por medidas que privilegiem o critério da menor restrição possível ao acesso à informação.
A título de ilustração, segue a previsão contida no decreto regulamentador sobre a matéria (Decreto nº 7.724/2012):
Art. 49. Os requerimentos de prorrogação do prazo de classificação de informação no grau ultrassecreto, a que se refere o inciso IV do caput do art. 47, deverão ser encaminhados à Comissão Mista de Reavaliação de Informações em até um ano antes do vencimento do termo final de restrição de acesso.
Art. 52. As deliberações da Comissão Mista de Reavaliação de Informações serão tomadas:
I - por maioria absoluta, quando envolverem as competências previstas nos incisos I e IV do caput do art.47; e
II - por maioria simples dos votos, nos demais casos.
Parágrafo único. A Casa Civil da Presidência da República poderá exercer, além do voto ordinário, o voto de qualidade para desempate.
Conversão automática de acesso público da informação classificada após o transcurso do prazo ou consumado o evento que defina o seu termo final
Um padrão adotado pela LAI é a conversão automática de acesso público pela mera transcursão do prazo sigilo da informação classificada ou pela consumação do evento que lhe ponha termo.
Esta é, por exemplo, a previsão do §4º do art. 24 em alusão aos prazos previstos nos §§ 1º e 3º desse mesmo dispositivo:
Art. 24. A informação em poder dos órgãos e entidades públicas, observado o seu teor e em razão de sua imprescindibilidade à segurança da sociedade ou do Estado, poderá ser classificada como ultrassecreta, secreta ou reservada.
(...)
§ 4º. Transcorrido o prazo de classificação ou consumado o evento que defina o seu termo final, a informação tornar-se-á, automaticamente, de acesso público.
Interesse público da informação e critério menos restritivo possível como fatores determinantes para a classificação do grau de sigilo
Seguindo a tendência de tornar ainda mais objetiva (isenta de subjetivismo) a qualificação do grau de sigilo, a norma legal elegeu, em plena consonância com o preceito do art. 37 da Constituição da República e com os princípios que regem os procedimentos administrativos no âmbito federal (Lei nº 9.784/1999, art. 2º), o interesse público como fator determinante.
Ao que tudo indica, a intenção da lei é fazer que, no momento da pretensão de restringir o acesso à informação, a autoridade pública pondere sempre, em primeiro lugar, de forma preponderante, pelo interesse público, devendo este ser entendido como o interesse da coletividade (interesse público primário). Assim, essa carga axiológica acaba por repelir qualquer inclinação possível à pessoalidade.
De igual modo, foi erigido o critério da menor restrição possível ao acesso como elemento de determinação a ser utilizado para a classificação do grau de sigilo da informação. Nitidamente, o intuito também é de potencializar a regra geral refletida nos princípios constitucionais, desta vez a transparência e publicidade, em sua versão maximizada pela LAI (publicidade máxima), no tocante aos atos administrativos (CRFB, art. 37 e L. 9.784, art. 9º), somente devendo limitar o acesso àquilo que for estritamente necessário. Reafirma-se, destarte, a máxima o acesso é a regra e o sigilo é a exceção.
Confirmando os fatores determinantes acima elucidados, o § 5º do artigo 24 da Lei de Acesso à Informação aponta, ainda, como elementos a serem considerados quando da classificação, a gravidade do risco ou dano à segurança da sociedade e do Estado e o prazo máximo de restrição de acesso ou o evento que defina o seu termo final, conforme se vê:
Art. 24. A informação em poder dos órgãos e entidades públicas, observado o seu teor e em razão de sua imprescindibilidade à segurança da sociedade ou do Estado, poderá ser classificada como ultrassecreta, secreta ou reservada.
(...)
§ 5º. Para a classificação da informação em determinado grau de sigilo, deverá ser observado o interesse público da informação e utilizado o critério menos restritivo possível, considerados:
I - a gravidade do risco ou dano à segurança da sociedade e do Estado; e
II - o prazo máximo de restrição de acesso ou o evento que defina seu termo final.
Competência para a classificação de informações por autoridade pública de equivalência hierárquica ao grau de sigilo, necessidade de ratificação dos Ministros de Estado da Defesa e do Ministério das Relações Exteriores quando a classificação ultrassecreta for realizada, respectivamente, por Comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica e por Chefes de Missões Diplomáticas e Consulares permanentes no exterior e encaminhamento necessário da decisão pelas autoridades que classificar informação no grau de sigilo ultrassecreto à Comissão Mista de Reavaliação de Informações
No que concerne à competência para a classificação, a LAI reafirmou o cuidado e a razoabilidade empregada nas demais normas do sistema jurídico de acesso à informação por ela inaugurado. Centrou-se um ponto de equilíbrio entre as autoridades públicas as quais se atribuiu o exercício classificatório e os graus de sigilo ultrassecreto, secreto e reservado, por meio de uma escala de equivalência hierárquica.
Um escorço dessa equivalência já havia sido traçada na antiga legislação pelo comentado Decreto nº 5.301/2004, contudo, sem a exata correspondência ora vivenciada.
Reservou-se apenas ao Presidente, Vice-Presidente, Ministros de Estado e equiparados (com as mesmas prerrogativas), os Comandantes das Forças Armadas e aos Chefes de Missões Diplomáticas e Consulares o grau máximo de classificação – ultrassecreto.
A peculiaridade está em relação a estas últimas autoridades (Comandantes das Forças Forças Armadas e Chefes de Missões Diplomáticas e Consulares permanentes no exterior), pois, embora não tenham equiparação a Ministros de Estado, guardam importantes funções para o Estado, razão pela qual a norma legal encontrou o canal da ratificação para viabilizar a perfeição dos atos de classificação ultrassecretos por aquelas realizados.
Trata-se do conhecido modelo de ato administrativo composto, que, segundo a renomada administrativista Maria Sylvia Zanella Di Pietro[6], resulta da manifestação de dois ou mais órgãos ou autoridades, em que a vontade de um é instrumental em relação ao outro, que edita o ato principal, isso porque se limita à verificação da legitimidade do ato de conteúdo próprio (CARVALHO FILHO[7]).
Dessarte, embora inicialmente válidas, ficam pendente de ratificação dos correspondentes Ministros de Estado – Defesa e Relações Exteriores –, a se realizar no prazo de 30 (trinta) dias, as classificações ultrassecretas realizadas pelos Comandantes da marinha, Exército e Aeronáutica, assim como dos Chefes de Missões Diplomáticas e Consulares permanentes no exterior.
No que tange ao sigilo no grau de secreto a lei atribui a competência aqueles com competência para classificar como ultrassecreto, seguindo-se a máxima quem pode o mais, pode o menos, compatível com a teoria dos poderes implícitos admitida pela doutrina e jurisprudência. Além deles, também conferiu a atribuição aos titulares de autarquias, fundações ou empresas públicas e sociedades de economia mista.
Nessa mesma toada seguiu o parâmetro dos qualificados como reservados, permitindo-se aos competentes para as classificações ultrassecreta e secreta e aos que exerçam as funções de direção, comando ou chefia do Grupo-Direção e Assessoramento Superiores - DAS, nível DAS 101.5 ou superior, e seus equivalentes.
Em relação aos graus ultrassecreto e secreto, ocorreu interessante fato jurídico. Embora a lei inicialmente tenha previsto aparente possibilidade de delegação, o decreto regulamentador antecipou-se em corrigir eventual desvio interpretativo (§§ 1º e 2º), a fim de se preservar a equivalência hierárquica estabelecida nos incisos do artigo 27, vedando textualmente a delegação da competência de classificação nos graus de sigilo ultrassecreto ou secreto.
E, ainda, exclusivamente quanto aos ultrassecretos, a lei impôs o encaminhamento necessário da decisão pelas autoridades que classificar informação no grau de sigilo ultrassecreto à Comissão Mista de Reavaliação de Informações.
A razão dessa exigência encontra respaldo na própria ideologia de monitoramento e controle dos atos de restrição de acesso à informação, como a revisão de ofício de cabimento da própria Comissão Mista, consoante se demonstrará em tópico adiante.
Ante os detalhes circunstanciais acima expostos, a transcrição das normas contidas na lei e no decreto faz-se necessária para o devido cotejo dos dispositivos mencionados:
- Lei nº 12.527/2011 -
Art. 27. A classificação do sigilo de informações no âmbito da administração pública federal é de competência: (Regulamento)
I - no grau de ultrassecreto, das seguintes autoridades:
a) Presidente da República;
b) Vice-Presidente da República;
c) Ministros de Estado e autoridades com as mesmas prerrogativas;
d) Comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica; e
e) Chefes de Missões Diplomáticas e Consulares permanentes no exterior;
II - no grau de secreto, das autoridades referidas no inciso I, dos titulares de autarquias, fundações ou empresas públicas e sociedades de economia mista; e
III - no grau de reservado, das autoridades referidas nos incisos I e II e das que exerçam funções de direção, comando ou chefia, nível DAS 101.5, ou superior, do Grupo-Direção e Assessoramento Superiores, ou de hierarquia equivalente, de acordo com regulamentação específica de cada órgão ou entidade, observado o disposto nesta Lei.
§ 1º. A competência prevista nos incisos I e II, no que se refere à classificação como ultrassecreta e secreta, poderá ser delegada pela autoridade responsável a agente público, inclusive em missão no exterior, vedada a subdelegação.
§ 2º. A classificação de informação no grau de sigilo ultrassecreto pelas autoridades previstas nas alíneas “d” e “e” do inciso I deverá ser ratificada pelos respectivos Ministros de Estado, no prazo previsto em regulamento.
§ 3º. A autoridade ou outro agente público que classificar informação como ultrassecreta deverá encaminhar a decisão de que trata o art. 28 à Comissão Mista de Reavaliação de Informações, a que se refere o art. 35, no prazo previsto em regulamento.
- Decreto nº 7.724/2012 –
Art. 30. A classificação de informação é de competência:
I - no grau ultrassecreto, das seguintes autoridades:
a) Presidente da República;
b) Vice-Presidente da República;
c) Ministros de Estado e autoridades com as mesmas prerrogativas;
d) Comandantes da Marinha, do Exército, da Aeronáutica; e
e) Chefes de Missões Diplomáticas e Consulares permanentes no exterior;
II - no grau secreto, das autoridades referidas no inciso I do caput, dos titulares de autarquias, fundações, empresas públicas e sociedades de economia mista; e
III - no grau reservado, das autoridades referidas nos incisos I e II do caput e das que exerçam funções de direção, comando ou chefia do Grupo-Direção e Assessoramento Superiores - DAS, nível DAS 101.5 ou superior, e seus equivalentes.
§ 1º. É vedada a delegação da competência de classificação nos graus de sigilo ultrassecreto ou secreto.
§ 2º. O dirigente máximo do órgão ou entidade poderá delegar a competência para classificação no grau reservado a agente público que exerça função de direção, comando ou chefia.
§ 3º. É vedada a subdelegação da competência de que trata o § 2o.
§ 4º. Os agentes públicos referidos no § 2º deverão dar ciência do ato de classificação à autoridade delegante, no prazo de noventa dias.
§ 5º. A classificação de informação no grau ultrassecreto pelas autoridades previstas nas alíneas “d” e “e” do inciso I do caput deverá ser ratificada pelo Ministro de Estado, no prazo de trinta dias.
§ 6º. Enquanto não ratificada, a classificação de que trata o § 5º considera-se válida, para todos os efeitos legais.
Decisão fundamentada para a classificação de qualquer grau de sigilo
Em nome da segurança e estabilidade das relações jurídicas decorrentes e na trilha do princípio da motivação dos atos administrativos (art. 2º da Lei 9.784/1999), principalmente nos casos em que se neguem, limitem ou afetem direitos e interesses (L. 9.784, art. 50), a LAI requisitou que a classificação de informação em qualquer grau de sigilo fosse ser formalizada por de decisão fundamentada e contendo os elementos arrolados no artigo 28 que ora se reproduz:
Art. 28. A classificação de informação em qualquer grau de sigilo deverá ser formalizada em decisão que conterá, no mínimo, os seguintes elementos:
I - assunto sobre o qual versa a informação;
II - fundamento da classificação, observados os critérios estabelecidos no art. 24;
III - indicação do prazo de sigilo, contado em anos, meses ou dias, ou do evento que defina o seu termo final, conforme limites previstos no art. 24; e
IV - identificação da autoridade que a classificou.
Parágrafo único. A decisão referida no caput será mantida no mesmo grau de sigilo da informação classificada.
Revisão das classificações ultrassecretas e secretas mediante provocação ou de ofício período máximo a cada 4 anos (não deliberação implica em desclassificação automática das informações)
Além da anunciada atribuição de prorrogar os prazos de sigilo das informações classificadas como ultrassecretas, à Comissão Mista de Reavaliação de Informações incumbiu-se a tarefa de proceder à revisão desse grau de sigilo e das informações timbradas secretas quando provocada por pessoa interessada ou de ofício, num interstício máximo de 4 (quatro) anos em 4 (quatro) anos.
Mais uma vez, a lei reserva ao órgão colegiado de alto escalão governamental para mitigar os poderes e reexaminar classificações que se encontrem destoantes com os critérios objetivos por ela preestabelecidos ou que tenham perdido o sentido em razão da ocorrência de evento fixado como termo final para a restrição do acesso.
Afora as aludidas vantagens e garantias concernentes a uma decisão colegiada (v. itens 35 e 36 supra), a conferência de legitimidade à qualquer pessoa interessada na revisão das classificações mais restritas de acesso à informação é procedimento que oportuniza o desenvolvimento do controle social da administração pública (art. 3º, V, da Lei nº 12.527/2011).
Outrossim, a publicidade máxima e o critério da menor restrição ao acesso mais uma vez são aplicados ao se prevê que, na hipótese de revisão ex officio, ultrapassado o prazo de 4 (quatro) anos sem deliberação da Comissão Mista, implicar-se-á a desclassificação automática das informações então protegidas por sigilo.
Art. 35. (VETADO).
§ 1º. É instituída a Comissão Mista de Reavaliação de Informações, que decidirá, no âmbito da administração pública federal, sobre o tratamento e a classificação de informações sigilosas e terá competência para:
I - requisitar da autoridade que classificar informação como ultrassecreta e secreta esclarecimento ou conteúdo, parcial ou integral da informação;
II - rever a classificação de informações ultrassecretas ou secretas, de ofício ou mediante provocação de pessoa interessada, observado o disposto no art. 7º e demais dispositivos desta Lei; e
III - prorrogar o prazo de sigilo de informação classificada como ultrassecreta, sempre por prazo determinado, enquanto o seu acesso ou divulgação puder ocasionar ameaça externa à soberania nacional ou à integridade do território nacional ou grave risco às relações internacionais do País, observado o prazo previsto no § 1º do art. 24.
§ 2º. O prazo referido no inciso III é limitado a uma única renovação.
§ 3º. A revisão de ofício a que se refere o inciso II do § 1º deverá ocorrer, no máximo, a cada 4 (quatro) anos, após a reavaliação prevista no art. 39, quando se tratar de documentos ultrassecretos ou secretos.
§ 4º. A não deliberação sobre a revisão pela Comissão Mista de Reavaliação de Informações nos prazos previstos no § 3º implicará a desclassificação automática das informações.
§ 5º. Regulamento disporá sobre a composição, organização e funcionamento da Comissão Mista de Reavaliação de Informações, observado o mandato de 2 (dois) anos para seus integrantes e demais disposições desta Lei. (Regulamento)
Reavaliação obrigatória das informações classificadas como ultrassecretas e secretas no prazo máximo de 2 (anos) a contar da vigência da Lei nº 12.527/2011, sem excluir a possibilidade de realização, a qualquer tempo, pela Comissão Mista de Reaviação de Informações, observados os termos da lei, com a perda automática do sigilo, passando-se ao acesso público, se não operada a reavaliação obrigatória no prazo de 2 (anos)
A mesma desoneração da restrição ao acesso ocorre, caso não seja atendida pelos órgãos e entidades públicas a disposição transitória de reavaliação das informações classificadas como ultrassecretas e secretas.
A Lei de Acesso à Informação estabeleceu o prazo máximo de 2 (dois) anos para tal desiderato, contado do termo inicial de sua vigência, ou seja, 16.maio.2012, garantindo-se que eventual preservação ou reajuste da classificação deverá obedecer os prazos mais brandos e condições, incluindo-se aqui os requisitos e garantias procedimentais, nela previstos.
Art. 39. Os órgãos e entidades públicas deverão proceder à reavaliação das informações classificadas como ultrassecretas e secretas no prazo máximo de 2 (dois) anos, contado do termo inicial de vigência desta Lei.
§ 1º. A restrição de acesso a informações, em razão da reavaliação prevista no caput, deverá observar os prazos e condições previstos nesta Lei.
§ 2º. No âmbito da administração pública federal, a reavaliação prevista no caput poderá ser revista, a qualquer tempo, pela Comissão Mista de Reavaliação de Informações, observados os termos desta Lei.
§ 3º. Enquanto não transcorrido o prazo de reavaliação previsto no caput, será mantida a classificação da informação nos termos da legislação precedente.
§ 4º. As informações classificadas como secretas e ultrassecretas não reavaliadas no prazo previsto no caput serão consideradas, automaticamente, de acesso público.
Transparência ativa e Transparência passiva
O novo sistema de acesso à informação propiciado pela LAI preza por duas frentes de atuação para o alcance da publicidade de atos emanados do Estado, que, por questões didáticas foram categorizadas em: transparência ativa e transparência passiva.
A transparência ativa consiste no dever da Administração Pública (Estado) de divulgar informações à sociedade sponte propria (por iniciativa própria).
De outro lado, na transferência passiva, o Estado presta acesso à informação sob demanda em atendimento às solicitações da sociedade.
Nos termos da legislação, as informações de interesse coletivo ou geral por produzidas ou custodiadas pelos órgãos e entidades públicas devem ser divulgadas independentemente de requerimentos. Tais acessos devem ser disponibilizados em local de fácil acesso e por todos os meios e instrumentos legítimos, contendo no mínimo informações atinentes às competências e estrutura organizacional, endereços e telefones das unidades e horários de atendimento ao público, a quaisquer repasses financeiros ou transferências de recursos, às despesas, aos procedimentos licitatórios (editais e resultados) e contratos administrativos, aos dados gerais relativos a programas, ações, projetos e obras, além das perguntas mais frequentes feitas pela sociedade.
A divulgação em sítios oficiais da internet (rede mundial de computadores) é obrigatória e deve proporcionar o acesso à informação de forma objetiva, transparente, clara e em linguagem de fácil compreensão.
O objetivo principal desses preceitos é garantir captação fácil de informações e dados independente do grau de instrução do interessado, razão pela qual se deve utilizar vocabulário do dia-a-dia, como a usualmente empregada pelos meios de comunicação de massa e, se possível, em sintonia com a realidade cultural de cada região do país.
Não diferente, os procedimentos que viabilizem o acesso também devem buscar objetividade e celeridade sem que isso prejudique as balizas inerentes ao devido processo legal, consoante restará demonstrado à frente.
Característica marcante do procedimento é o acesso imediato à informação disponível, em consonância com o princípio constitucional da tempestividade[8], introduzido no corpo da Constituição da República pela Emenda Constitucional nº 45/2004, que também é aplicável no âmbito administrativo.
Vejam-se alguns dispositivos em evidência ao tema aqui tratado:
Art. 5º. É dever do Estado garantir o direito de acesso à informação, que será franqueada, mediante procedimentos objetivos e ágeis, de forma transparente, clara e em linguagem de fácil compreensão.
Art. 7º. O acesso à informação de que trata esta Lei compreende, entre outros, os direitos de obter:
I - orientação sobre os procedimentos para a consecução de acesso, bem como sobre o local onde poderá ser encontrada ou obtida a informação almejada;
II - informação contida em registros ou documentos, produzidos ou acumulados por seus órgãos ou entidades, recolhidos ou não a arquivos públicos;
III - informação produzida ou custodiada por pessoa física ou entidade privada decorrente de qualquer vínculo com seus órgãos ou entidades, mesmo que esse vínculo já tenha cessado;
IV - informação primária, íntegra, autêntica e atualizada;
V - informação sobre atividades exercidas pelos órgãos e entidades, inclusive as relativas à sua política, organização e serviços;
VI - informação pertinente à administração do patrimônio público, utilização de recursos públicos, licitação, contratos administrativos; e
VII - informação relativa:
a) à implementação, acompanhamento e resultados dos programas, projetos e ações dos órgãos e entidades públicas, bem como metas e indicadores propostos;
b) ao resultado de inspeções, auditorias, prestações e tomadas de contas realizadas pelos órgãos de controle interno e externo, incluindo prestações de contas relativas a exercícios anteriores.
Art. 8º. É dever dos órgãos e entidades públicas promover, independentemente de requerimentos, a divulgação em local de fácil acesso, no âmbito de suas competências, de informações de interesse coletivo ou geral por eles produzidas ou custodiadas.
§ 1º. Na divulgação das informações a que se refere o caput, deverão constar, no mínimo:
I - registro das competências e estrutura organizacional, endereços e telefones das respectivas unidades e horários de atendimento ao público;
II - registros de quaisquer repasses ou transferências de recursos financeiros;
III - registros das despesas;
IV - informações concernentes a procedimentos licitatórios, inclusive os respectivos editais e resultados, bem como a todos os contratos celebrados;
V - dados gerais para o acompanhamento de programas, ações, projetos e obras de órgãos e entidades; e
VI - respostas a perguntas mais frequentes da sociedade.
§ 2º. Para cumprimento do disposto no caput, os órgãos e entidades públicas deverão utilizar todos os meios e instrumentos legítimos de que dispuserem, sendo obrigatória a divulgação em sítios oficiais da rede mundial de computadores (internet).
Art. 11. O órgão ou entidade pública deverá autorizar ou conceder o acesso imediato à informação disponível.
Entre os mecanismos de transparência e acesso, tem-se a criação de serviço de informações ao cidadão (SIC) pelos órgãos e entidades públicas visando a atender e orientar o público, protocolizar documentos e requerimentos e prestar informações sobre a tramitação de documentos.
Em atenção à tendência de se obter uma legitimação e controle popular dos atos administrativos de interesse coletivo, a Lei 12.527/2011 ainda previu a realização de audiências e consultas públicas como incentivo e incidência direta de uma democracia social, que efetivamente participe na Administração Pública de um Estado Democrático de Direito (ou de direito democrático, conforme for), como o Brasil.
Art. 9º. O acesso a informações públicas será assegurado mediante:
I - criação de serviço de informações ao cidadão, nos órgãos e entidades do poder público, em local com condições apropriadas para:
a) atender e orientar o público quanto ao acesso a informações;
b) informar sobre a tramitação de documentos nas suas respectivas unidades;
c) protocolizar documentos e requerimentos de acesso a informações; e
II - realização de audiências ou consultas públicas, incentivo à participação popular ou a outras formas de divulgação.
Acesso à informação franqueado a qualquer pessoa
O acesso viabilizado pelo novo sistema é fraqueado a qualquer cidadão, ou seja, todas as informações produzidas ou custodiadas pelo poder público e não classificadas como sigilosas são públicas e, portanto, acessíveis a todos os cidadãos por quaisquer meios legítimos.
É necessário apenas que o interessado se identifique e especifique a informação que pretende obter, dispensando justificativa para o requerimento. Observa-se, ainda, que, no que repercute à identificação, não se pode requisitar condições que a inviabilizem.
De igual modo, para as informações de interesse público, a LAI proíbe ainda que os órgãos, entidades ou autoridades façam quaisquer exigências relativas aos motivos determinantes da solicitação.
Art. 10. Qualquer interessado poderá apresentar pedido de acesso a informações aos órgãos e entidades referidos no art. 1º desta Lei, por qualquer meio legítimo, devendo o pedido conter a identificação do requerente e a especificação da informação requerida.
§ 1º. Para o acesso a informações de interesse público, a identificação do requerente não pode conter exigências que inviabilizem a solicitação.
§ 2º. Os órgãos e entidades do poder público devem viabilizar alternativa de encaminhamento de pedidos de acesso por meio de seus sítios oficiais na internet.
§ 3º. São vedadas quaisquer exigências relativas aos motivos determinantes da solicitação de informações de interesse público.
Procedimento em atendimento ao princípio do devido processo legal, seus prazos e recursos
Conforme já anunciado, o procedimento administrativo previsto para o acesso à informação da Lei nº 12.527/2011 guarda correlação com os princípios do devido processo legal (substancial e formal), tempestividade, publicidade, celeridade, ampla defesa e recursos inerentes, atendendo-se aos preceitos da proporcionalidade e razoabilidade em relação a prazos, meios e cientificação de atos aos interessados, com oportunidade do contraditório.
A regra é que a informação seja prestada de imediato (prestação imediata). Todavia, quando esta não for possível, a lei estabelece o prazo de até 20 (vinte) dias para o órgão ou a entidade dar a devida resposta, passível de prorrogação por mais 10 (dez) dias, desde que se faça mediante justificativa expressa, cientificando o requerente.
Nesse prazo, cabe ao órgão ou entidade da Administração Pública proceder às condutas descritas nos incisos I a III do § 1º do art. 11, que se reproduz:
Art. 11. O órgão ou entidade pública deverá autorizar ou conceder o acesso imediato à informação disponível.
§ 1º. Não sendo possível conceder o acesso imediato, na forma disposta no caput, o órgão ou entidade que receber o pedido deverá, em prazo não superior a 20 (vinte) dias:
I - comunicar a data, local e modo para se realizar a consulta, efetuar a reprodução ou obter a certidão;
II - indicar as razões de fato ou de direito da recusa, total ou parcial, do acesso pretendido; ou
III - comunicar que não possui a informação, indicar, se for do seu conhecimento, o órgão ou a entidade que a detém, ou, ainda, remeter o requerimento a esse órgão ou entidade, cientificando o interessado da remessa de seu pedido de informação.
§ 2º. O prazo referido no § 1º poderá ser prorrogado por mais 10 (dez) dias, mediante justificativa expressa, da qual será cientificado o requerente.
(...)
Art. 14. É direito do requerente obter o inteiro teor de decisão de negativa de acesso, por certidão ou cópia.
Na hipótese específica do inciso II (negativa de acesso), assim como para a classificação em grau de sigilo, torna-se indispensável que a recusa seja justificada por escrito, atendendo-se às premissas de segurança e estabilidade e consonante ao princípio da motivação dos atos administrativos (art. 2º da Lei 9.784/1999) acima apontado, impondo-se a obrigatoriedade de a Administração informar ao requerente sobre a possibilidade de recurso, respectivos prazos e condições, além da autoridade responsável para julgá-lo.
Garante-se igualmente ao requerente o direito de obter a íntegra da decisão negativa de acesso por certidão ou cópia.
Em viés de garantir preceitos fundamentais (CRFB, art. 5º, LIV e LV[9]), a Lei confere ao requerente o direito recorrer das decisões que negam o acesso à informação ou não fornecem as razões da negativa do acesso no prazo de 10 (dez) dias da ciência. O recurso será dirigido à autoridade hierarquicamente superior àquela que exarou a decisão vergastada, tendo esta o prazo de 5 (cinco) dias para se manifestar.
Na hipótese de omissão de resposta ao pedido de acesso à informação, a legislação (art. 22 do Decreto nº 7.724/2002) disponibiliza ao requerente o instrumento da reclamação, em igual prazo de 10 (dez) dias, a começar somente a contar 30 (trinta) dias após da apresentação do pedido, à autoridade de monitoramento designada nos termos do art. 40 da LAI.
Confirmada a negativa por via do recurso hierárquico ou sendo infrutífera a aludida reclamação, caberá recurso à CGU – Controladoria-Geral da União, que terá o mesmo prazo de 5 (cinco) dias para se manifestar, com a possibilidade da CGU solicitar esclarecimentos ao órgão ou entidade.
Nos termos da lei, o recurso para Controladoria somente caberá nas hipóteses em que (art. 16) o acesso à informação não classificada como sigilosa for negado ou em caso de vícios formais, consistentes: i) na ausência de indicação da autoridade classificadora ou a hierarquicamente superior a ser dirigido o pedido de acesso ou desclassificação, bem como ii) não terem sido observados os procedimentos legais de classificação de informação sigilosa e iii) os prazos ou outros procedimentos legais estiverem sendo descumpridos.
Provido o recurso, a CGU fixará prazo para o cumprimento da decisão pelo órgão ou entidade. Caso contrário, ou seja, desprovido o recurso pela CGU, poder-se-á, ainda, interpor recurso à Comissão Mista de Reavaliação de Informações, no prazo uniforme de 10 (dez) dias.
No intuito de melhor visualizar o procedimento recursal, transcrevem-se os trechos da legislação pertinente:
- Lei nº 12.527/2011 -
Art. 15. No caso de indeferimento de acesso a informações ou às razões da negativa do acesso, poderá o interessado interpor recurso contra a decisão no prazo de 10 (dez) dias a contar da sua ciência.
Parágrafo único. O recurso será dirigido à autoridade hierarquicamente superior à que exarou a decisão impugnada, que deverá se manifestar no prazo de 5 (cinco) dias.
Art. 16. Negado o acesso a informação pelos órgãos ou entidades do Poder Executivo Federal, o requerente poderá recorrer à Controladoria-Geral da União, que deliberará no prazo de 5 (cinco) dias se:
I - o acesso à informação não classificada como sigilosa for negado;
II - a decisão de negativa de acesso à informação total ou parcialmente classificada como sigilosa não indicar a autoridade classificadora ou a hierarquicamente superior a quem possa ser dirigido pedido de acesso ou desclassificação;
III - os procedimentos de classificação de informação sigilosa estabelecidos nesta Lei não tiverem sido observados; e
IV - estiverem sendo descumpridos prazos ou outros procedimentos previstos nesta Lei.
§ 1º. O recurso previsto neste artigo somente poderá ser dirigido à Controladoria-Geral da União depois de submetido à apreciação de pelo menos uma autoridade hierarquicamente superior àquela que exarou a decisão impugnada, que deliberará no prazo de 5 (cinco) dias.
§ 2º. Verificada a procedência das razões do recurso, a Controladoria-Geral da União determinará ao órgão ou entidade que adote as providências necessárias para dar cumprimento ao disposto nesta Lei.
§ 3º. Negado o acesso à informação pela Controladoria-Geral da União, poderá ser interposto recurso à Comissão Mista de Reavaliação de Informações, a que se refere o art. 35.
Art. 17. No caso de indeferimento de pedido de desclassificação de informação protocolado em órgão da administração pública federal, poderá o requerente recorrer ao Ministro de Estado da área, sem prejuízo das competências da Comissão Mista de Reavaliação de Informações, previstas no art. 35, e do disposto no art. 16.
§ 1º. O recurso previsto neste artigo somente poderá ser dirigido às autoridades mencionadas depois de submetido à apreciação de pelo menos uma autoridade hierarquicamente superior à autoridade que exarou a decisão impugnada e, no caso das Forças Armadas, ao respectivo Comando.
§ 2º. Indeferido o recurso previsto no caput que tenha como objeto a desclassificação de informação secreta ou ultrassecreta, caberá recurso à Comissão Mista de Reavaliação de Informações prevista no art. 35.
- Decreto nº 7.724/2012 –
Art. 21. No caso de negativa de acesso à informação ou de não fornecimento das razões da negativa do acesso, poderá o requerente apresentar recurso no prazo de dez dias, contado da ciência da decisão, à autoridade hierarquicamente superior à que adotou a decisão, que deverá apreciá-lo no prazo de cinco dias, contado da sua apresentação.
Parágrafo único. Desprovido o recurso de que trata o caput, poderá o requerente apresentar recurso no prazo de dez dias, contado da ciência da decisão, à autoridade máxima do órgão ou entidade, que deverá se manifestar em cinco dias contados do recebimento do recurso.
Art. 22. No caso de omissão de resposta ao pedido de acesso à informação, o requerente poderá apresentar reclamação no prazo de dez dias à autoridade de monitoramento de que trata o art. 40 da Lei no 12.527, de 2011, que deverá se manifestar no prazo de cinco dias, contado do recebimento da reclamação.
§ 1º. O prazo para apresentar reclamação começará trinta dias após a apresentação do pedido.
§ 2º. A autoridade máxima do órgão ou entidade poderá designar outra autoridade que lhe seja diretamente subordinada como responsável pelo recebimento e apreciação da reclamação.
Art. 23. Desprovido o recurso de que trata o parágrafo único do art. 21 ou infrutífera a reclamação de que trata o art. 22, poderá o requerente apresentar recurso no prazo de dez dias, contado da ciência da decisão, à Controladoria-Geral da União, que deverá se manifestar no prazo de cinco dias, contado do recebimento do recurso.
§ 1º. A Controladoria-Geral da União poderá determinar que o órgão ou entidade preste esclarecimentos.
§ 2º. Provido o recurso, a Controladoria-Geral da União fixará prazo para o cumprimento da decisão pelo órgão ou entidade.
Art. 24. No caso de negativa de acesso à informação, ou às razões da negativa do acesso de que trata o caput do art. 21, desprovido o recurso pela Controladoria-Geral da União, o requerente poderá apresentar, no prazo de dez dias, contado da ciência da decisão, recurso à Comissão Mista de Reavaliação de Informações, observados os procedimentos previstos no Capítulo VI.
Percebe-se, assim, que o sistema jurídico de acesso à informação garante um amplo espectro de reexame e de controle das decisões administrativas, distribuindo em autoridades e órgãos diversos a tarefa de aferir e eventualmente corrigir a decisão negativa de acesso ou indeferimento de desclassificação.
Apenas para não ser omisso, interessante é destacar também a inteligência despendida aos prazos recursais. Em semelhança ao que é empregado no processo trabalhista, justificado pela capacidade postulatória do próprio do trabalhador e de sua hipossuficiência, como no caso do acesso à informação, lá judicial e aqui administrativo, adota-se uma uniformidade do prazo recursal, no caso da LAI, de 10 (dez) dias, evitando confusões por parte do cidadão interessado.
Sistema de controle, inclusive, social e responsabilização de agentes públicos civis e militares
Essa multiplicidade de recursos e diversidade de autoridades e órgãos – autoridade hierárquica superior, CGU e Comissão Mista de Reavaliação de Informações - revelam a deferência da legislação a um sistema de controle amplo e eficiente, que retira do círculo do órgão ou entidade que produz ou custodie informações o poder de reexame e revisão de eventuais sigilos ou negativa de acesso.
Afora o controle propiciado pela própria Administração Pública, nota-se forte papel da sociedade nessa tarefa, ante as inúmeras previsões de participação ativa do cidadão no acesso à informação e na fiscalização, monitoramento e gestão.
Prestigia-se, mais uma vez, o controle social, dando-se abertura à que a sociedade diretamente solicite informações e documentos de interesse pessoal e coletivo, além da classificação, reclassificação e desclassificação de sigilos. Trata-se de mecanismo de prevenção à corrupção e fortalecimento da cidadania.
Esse novo sistema jurídico prevê a responsabilização dos agentes civis e militares por condutas ilícitas, bem como a pessoas físicas e entidades privadas que, em virtude de vínculo de qualquer natureza com órgãos ou entidades, detiver informações e deixar de observar à legislação ou tenha acesso à informação sigilosa ou pessoal e a submeta a tratamento indevido.
Sem prejuízos de outras sanções cabíveis, a LAI comina penalidades específicas, destacam-se multas que variam de R$ 1.000,00 (mil reais) a R$ 600.000,00 (seiscentos mil reais), que demonstra o caráter preventivo (inibitório) e pedagógico destas, bem como impõe a responsabilidade por eventuais danos decorrentes aos órgãos e entidades, com ação regressiva contra os agentes que agirem com culpa ou dolo.
Art. 32. Constituem condutas ilícitas que ensejam responsabilidade do agente público ou militar:
I - recusar-se a fornecer informação requerida nos termos desta Lei, retardar deliberadamente o seu fornecimento ou fornecê-la intencionalmente de forma incorreta, incompleta ou imprecisa;
II - utilizar indevidamente, bem como subtrair, destruir, inutilizar, desfigurar, alterar ou ocultar, total ou parcialmente, informação que se encontre sob sua guarda ou a que tenha acesso ou conhecimento em razão do exercício das atribuições de cargo, emprego ou função pública;
III - agir com dolo ou má-fé na análise das solicitações de acesso à informação;
IV - divulgar ou permitir a divulgação ou acessar ou permitir acesso indevido à informação sigilosa ou informação pessoal;
V - impor sigilo à informação para obter proveito pessoal ou de terceiro, ou para fins de ocultação de ato ilegal cometido por si ou por outrem;
VI - ocultar da revisão de autoridade superior competente informação sigilosa para beneficiar a si ou a outrem, ou em prejuízo de terceiros; e
VII - destruir ou subtrair, por qualquer meio, documentos concernentes a possíveis violações de direitos humanos por parte de agentes do Estado.
§ 1º. Atendido o princípio do contraditório, da ampla defesa e do devido processo legal, as condutas descritas no caput serão consideradas:
I - para fins dos regulamentos disciplinares das Forças Armadas, transgressões militares médias ou graves, segundo os critérios neles estabelecidos, desde que não tipificadas em lei como crime ou contravenção penal; ou
II - para fins do disposto na Lei no 8.112, de 11 de dezembro de 1990, e suas alterações, infrações administrativas, que deverão ser apenadas, no mínimo, com suspensão, segundo os critérios nela estabelecidos.
§ 2º. Pelas condutas descritas no caput, poderá o militar ou agente público responder, também, por improbidade administrativa, conforme o disposto nas Leis nos 1.079, de 10 de abril de 1950, e 8.429, de 2 de junho de 1992.
Art. 33. A pessoa física ou entidade privada que detiver informações em virtude de vínculo de qualquer natureza com o poder público e deixar de observar o disposto nesta Lei estará sujeita às seguintes sanções:
I - advertência;
II - multa;
III - rescisão do vínculo com o poder público;
IV - suspensão temporária de participar em licitação e impedimento de contratar com a administração pública por prazo não superior a 2 (dois) anos; e
V - declaração de inidoneidade para licitar ou contratar com a administração pública, até que seja promovida a reabilitação perante a própria autoridade que aplicou a penalidade.
§ 1º. As sanções previstas nos incisos I, III e IV poderão ser aplicadas juntamente com a do inciso II, assegurado o direito de defesa do interessado, no respectivo processo, no prazo de 10 (dez) dias.
§ 2 º. A reabilitação referida no inciso V será autorizada somente quando o interessado efetivar o ressarcimento ao órgão ou entidade dos prejuízos resultantes e após decorrido o prazo da sanção aplicada com base no inciso IV.
§ 3 º. A aplicação da sanção prevista no inciso V é de competência exclusiva da autoridade máxima do órgão ou entidade pública, facultada a defesa do interessado, no respectivo processo, no prazo de 10 (dez) dias da abertura de vista.
Art. 34. Os órgãos e entidades públicas respondem diretamente pelos danos causados em decorrência da divulgação não autorizada ou utilização indevida de informações sigilosas ou informações pessoais, cabendo a apuração de responsabilidade funcional nos casos de dolo ou culpa, assegurado o respectivo direito de regresso.
Parágrafo único. O disposto neste artigo aplica-se à pessoa física ou entidade privada que, em virtude de vínculo de qualquer natureza com órgãos ou entidades, tenha acesso a informação sigilosa ou pessoal e a submeta a tratamento indevido.
LAI em consonância com diplomas internacionais
Por todos os prismas, a Lei nº 12.527/2011 e as demais normas consectárias reafirmam o acesso à informação como direito fundamental que é, dando o mesmo tratamento já efetuado por diplomas internacionais, a exemplo da Declaração Universal dos Direitos Humanos, da Convenção das Nações Unidas contra a corrupção, da Declaração Interamericana de princípios de liberdade de expressão e do Pacto Internacional dos direitos civis e políticos.
Declaração Universal dos Direitos Humanos (artigo 19):
“Todo ser humano tem direito à liberdade de opinião e expressão; este direito inclui a liberdade de, sem interferência, ter opiniões e de procurar, receber e transmitir informações e idéias por quaisquer meios e independentemente de fronteiras”.
Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção (artigos 10 e 13):
“Cada Estado-parte deverá (...) tomar as medidas necessárias para aumentar a transparência em sua administração pública (...) procedimentos ou regulamentos que permitam aos membros do público em geral obter (...) informações sobre a organização, funcionamento e processos decisórios de sua administração pública (...)”.
Declaração Interamericana de Princípios de Liberdade de Expressão (item 4):
“O acesso à informação mantida pelo Estado constitui um direito fundamental de todo indivíduo. Os Estados têm obrigações de garantir o pleno exercício desse direito”.
Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos (artigo 19):
“Toda pessoa terá direito à liberdade de expressão; esse direito incluirá a liberdade de procurar, receber e difundir informações e ideias de qualquer natureza (...)”.
Publicação pela Controladoria-Geral da União[10] com parceria com a UNESCO - United Nations Educational, Scientific and Cultural Organization (Organização das Nações Unidas para a educação, a ciência e a cultura) aponta que a LAI veio para incluir o Brasil ao grupo de mais de 90 (noventa) países que regulamentam o acesso à informação pública, tecendo interessante relato histórico a tal respeito. Transcreve-se:
“A primeira nação no mundo a desenvolver um marco legal sobre acesso foi a Suécia, em 1766. Já os Estados Unidos aprovaram sua Lei de Liberdade de Informação, conhecida como FOIA (Freedom of Information Act), em 1966, que recebeu , desde então, diferentes emendas visando a sua adequação à passagem do tempo. Na América Latina, a Colômbia foi pioneira ao estabelecer, em 1888, um Código que franqueou o acesso a documentos de Governo. Já a legislação do México, de 2002, é considerada uma referência, tendo previsto a instauração de sistemas rápidos de acesso, a serem supervisionados por órgão independente. Chile, Uruguai, entre outros, também aprovaram leis de acesso à informação”.
LEI 12.528/2011 (criação da Comissão da Verdade)
Não bastassem todos os direitos e as garantias assegurados pela Lei de Acesso à Informação, conjuntamente com esta foi editada a Lei 12.528/2011, de 18 de novembro de 2011, que criou a Comissão Nacional da Verdade no âmbito da Casa Civil da Presidência da República, com a finalidade específica de examinar e esclarecer as graves violações de direitos humanos praticadas no período fixado no art. 8º do ADCT – Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (18 de setembro de 1946 até 5 de outubro de 1988[11]), no intuito de efetivar o direito à memória e à verdade histórica e promover a reconciliação nacional.
Nesse ponto, constata-se o forte empenho da União, por meio da iniciativa institucional da Presidência da República, em viabilizar o acesso à informação e o direito fundamental à verdade, não havendo mais falar em restrição de acesso a dados e documentos relativos ao período abrangido pelo regime militar.
Isso se demonstra pelos objetivos propugnados por essa Comissão de esclarecer os fatos e as circunstâncias dos casos de graves violações de direitos humanos do período de exceção democrática (i), assim como de promover o esclarecimento circunstaciado dos casos de tortura, mortes, desaparecimentos forçados, ocultação de cadáveres e sua autoria – ainda que ocorridos no exterior (ii) e identificar e tornar públicos as estruturas, os locais, as instituições e as circunstâncias relacionadas à prática de tais violações a direitos humanos e suas eventuais ramificações nos diversos aparelhos estatais e na sociedade (art. 3º)[12].
Ademais, a lei dotou a Comissão Nacional da Verdade de prerrogativas como a de requisitar informações, dados e documentos de órgãos e entidades do poder público, ainda que classificado em qualquer grau de sigilo, além de convocar, para entrevistas ou testemunho, pessoas que possam guardar qualquer relação com os fatos e circunstâncias examinados, determinar a realização de perícias e diligências para a coleta ou recuperação de informações, documentos e dados e promover audiências públicas (art. 4º)[13]. Também se guarneceu à Comissão de recorrer às vias judiciais, pelo órgão de representação judicial competente – Advocacia-Geral da União (CRFB, art. 131) –, para requerer o acesso a elementos (informações, dados e documentos públicos e privados) necessários para o desempenho de suas atividades.
Pode-se chegar à conclusão, portanto, que a lei que criou a Comissão da Verdade reforça o intento estatal de implementação da cultura da transparência anunciado pela LAI, em especial quanto aos fatos e relatos históricos atribuídos ao período no qual predominou a condução governamental por autoridades militares. Tanto é assim que a Lei nº 12.528/2011 imprimiu textualmente o dever de todos os servidores públicos e dos militares de colaborar com a Comissão Nacional da Verdade e deu igual acesso a qualquer cidadão, que demonstre interesse em esclarecer situação de fato revelada ou declarada pela Comissão, de solicitar e prestar informações para fins de estabelecimento da verdade.