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A condição jurídica do trabalho cooperado

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06/11/2013 às 12:45
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Na missão de coibir a constituição de pseudocooperativas, a nova lei enfatizou princípios diferenciadores das verdadeiras cooperativas em face daquelas simuladas e fixou regras de fiscalização e de penalização em casos de locação de mão de obra subordinada.

Resumo: O presente trabalho cuida da condição jurídica do trabalho cooperado, à luz do artigo 90 da Lei nº 5.764/71 e do parágrafo único acrescentado ao artigo 442 da CLT, por meio da Lei nº 8.949/94, o qual estabelece a presunção relativa de inexistência de vínculo empregatício entre as cooperativas e seus cooperados e, igualmente, entre estes e as empresas tomadoras de serviços das sociedades cooperativas. Busca-se examinar a terceirização através da contratação de sociedades cooperativas de trabalho e, ainda, a possibilidade de reconhecimento de vínculo de emprego junto ao tomador de serviços ou à cooperativa, conforme o caso. Através da revisão e pesquisa bibliográfica acerca do tema, com a análise de trabalhos publicados, legislação, doutrina e jurisprudência, constatou-se que tal terceirização se dará de forma lícita se o tomador de serviços proceder pela contratação, nos limites da Súmula 331, III, do TST, de uma autêntica cooperativa, isto é, que atenda aos princípios, características e valores cooperativistas, que tornam essa sociedade peculiar frente às demais. De forma concomitante, não podem estar presentes os pressupostos da relação de emprego. Por outro lado, caso ocorra a terceirização mediante a contratação de cooperativa intermediadora de mão de obra subordinada (“fraudocooperativa”), será reconhecido o vínculo de emprego entre o tomador de serviços e os cooperados (Súmula 331, I, TST). Se a própria cooperativa exercer a subordinação jurídica (“gatoperativa”) resultar-se-á no reconhecimento de vínculo empregatício entre ela e seus cooperados, com a responsabilidade subsidiária do tomador de serviços (Súmula 331, IV, do TST). A constituição formal de uma cooperativa não é capaz de afastar direitos trabalhistas se estiverem presentes os elementos fático-jurídicos da relação de emprego, caso em que se decretará a nulidade do ato, conforme artigo 9º da CLT e com base no princípio da primazia da realidade. A Lei nº 12.690/2012, que regula as cooperativas de trabalho, contempla em seus dispositivos, ferramentas de fiscalização e reprimenda, visando-se coibir a criação das “pseudocooperativas” e a utilização dessas sociedades como intermediadoras de mão de obra subordinada.

Palavras-chave: Cooperativas. Tomador de serviços. Terceirização. Presunção relativa. Relação de emprego.


1 INTRODUÇÃO

A Constituição Federal de 1988 não só garante a liberdade de associação e de criação de sociedades cooperativas (art. 5º, XVII e XVIII), como também determina que a legislação infraconstitucional apoie e estimule o cooperativismo, consoante § 2º do artigo 174.

Esse tratamento privilegiado das cooperativas, pode ser visualizado nitidamente no parágrafo único, do artigo 442, da Consolidação das Leis do Trabalho, inserido através da Lei nº 8.949, de 9 de dezembro de 1994, haja vista que o dispositivo prevê a presunção de ausência de relação de emprego entre a cooperativa e seus cooperados e, outrossim, estre estes e os tomadores de serviços da sociedade.

A presente pesquisa se aprofunda no estudo da condição jurídica do trabalho cooperado, com enfoque na terceirização por meio da contratação de cooperativas de trabalho, avaliando-se a possibilidade de afastamento da presunção supracitada e consequente reconhecimento do vínculo de emprego entre cooperados e tomador de serviços ou entre cooperativa e cooperados, a depender do caso. Ademais, analisar-se-ão as diretrizes que devem ser seguidas para que tal terceirização possa ser considerada lícita.

Nota-se, deste modo, a importância da matéria, que é atual, especialmente pela aprovação da recente Lei nº 12.690, de 12 de julho de 2012, que regula as cooperativas de trabalho.

Discorrendo sobre o objeto do trabalho, são dadas noções conceituais sobre as cooperativas, abordando-se as suas principais características e princípios fundamentais. Também é tratada a divisão dos ramos do cooperativismo, de acordo com a atividade econômica exercida pela sociedade.

Por conseguinte, há um breve estudo da relação de emprego e dos pressupostos exigidos para sua caraterização. A pesquisa também cuida da conceituação da terceirização, apontando os casos em que ela é admitida.

Em seguida, há uma incursão analítica na alteração promovida na Consolidação das Leis do Trabalho com a inclusão do parágrafo único em seu artigo 442, confrontando-a com as normas e princípios cooperativistas, bem como com o princípio da primazia da realidade e elementos caracterizadores da relação de emprego, permitindo-se apurar e fazer uma conclusão acerca das hipóteses lícitas e ilícitas de terceirização através da contratação de sociedades cooperativas.

O método amplamente observado na confecção do trabalho foi a pesquisa bibliográfica, consistente no aprofundamento do conteúdo bibliográfico existente relativo ao tema da pesquisa científica, com contribuições advindas de diversos autores sobre o assunto.

Vale destacar que no decorrer da pesquisa bibliográfica, fez-se também o uso de uma metodologia eclética ou de complementaridade, nos moldes abaixo explanados:

a) a dogmática jurídica, método específico da ciência do Direito, com sustentáculo na legislação, doutrina e jurisprudência;

b) o processo comparativo, aplicado sempre que necessária a comparação ou confrontação de institutos, formas e normas desses direitos e respectiva eficácia;

c) o analítico – sintético, empregado quando as circunstâncias indicaram a viabilidade de um estudo analítico dos textos normativos e jurisprudenciais (análise), para subsequente aplicação a fatos e atos concretos;

d) o indutivo-dedutivo, sendo o indutivo conceituado como o modo ou processo de raciocínio a partir do qual se extrai de fatos particulares uma conclusão genérica, e o dedutivo entendido como o raciocínio que partindo da conclusão geral chega-se à particular, isto é, do princípio para as consequências, da causa para os­ efeitos.


2 PRINCIPAIS CARACTERÍSTICAS DAS COOPERATIVAS

Apesar de registros sobre a existência de cooperativas anteriores a Robert Owen (1771-1858), sua proposta intelectual de cooperativismo foi um marco primordial para o desenvolvimento desse movimento. Considera João Paulo Koslovski (2001, p. 20), que foi com Robert Owen que “o sentido de cooperação toma um rumo mais consciente. Robert Owen é considerado o pai da moderna concepção de cooperação, e o pai da cooperação na Inglaterra”.

E assim, foi em 1844, com a criação da cooperativa “Sociedade dos Probos Pioneiros de Rochdale” (Rochdale Society of Equitable Pioneers), localizada na cidade industrial de Rochdale, que fica nos arredores de Manchester, Inglaterra, que o cooperativismo em sua concepção moderna começou a se arraigar e a se propagar, sob a perspectiva de se atenuar as condições de opressão do operariado, em meio a Revolução Industrial.

Sem se adentrar em suas especificidades históricas, esta cooperativa formada por 28 tecelões com o objetivo de fornecimento de bens de consumo, foi a responsável por difundir a essência do cooperativismo tal como conhecemos hoje, com seus princípios e valores, além de estabelecer suas principais características.

Conforme os dados históricos apontados por Renato Lopes Becho (2002, p. 18), a primeira sociedade cooperativa brasileira foi a “Sociedade Cooperativa Econômica dos Funcionários Públicos de Ouro Preto, cujos estatutos são datados de 27.10.1889. A mais antiga cooperativa em funcionamento ininterrupto é a centenária caixa rural Raiffeisen de Nova Petrópolis, no Rio Grande do Sul, de 1902”.

Desde a criação da primeira sociedade cooperativa no Brasil até os dias atuais, constata-se um crescimento extraordinário e promissor do setor, com números expressivos de cooperados e com uma representativa participação na economia nacional.

O reconhecimento brasileiro acerca da importância do cooperativismo pode ser visualizado na legislação pátria, inclusive a nível constitucional, diante dos incentivos e proteção à criação e desenvolvimento das cooperativas.

Com efeito, a liberdade de associação é um direito fundamental garantido pela Constituição Federal de 1988, e está prevista no artigo 5º, incisos XVII a XXI. Com diz seu texto, essa liberdade de associação é plena para fins lícitos, vedada a de caráter paramilitar.

Estabelece o inciso XVIII do artigo retro, que “a criação de associações e, na forma da lei, a de cooperativas independem de autorização, sendo vedada a interferência estatal em seu funcionamento”.

O eminente jurista José Afonso da Silva (2012, p. 269) subdivide a liberdade de associação em quatro direitos:

[...] o de criar associação (e cooperativas na forma da lei), que não depende de autorização; o de aderir a qualquer associação, pois ninguém poderá ser obrigado a associar-se; o de desligar-se da associação, porque ninguém poderá ser compelido a permanecer associado; e o de dissolver espontaneamente a associação, já que não se pode compelir a associação a existir. A cláusula “na forma da lei”, constante do inc. XVIII do art. 5º, só se refere à criação das cooperativas, não à autorização para essa criação. Quer isso dizer, repita-se, que tanto a criação de associação como de cooperativa independe de autorização.

Portanto, o cooperativismo encontra fundamento de validade constitucional. Além disso, o artigo 174 e seus parágrafos 2º, 3º e 4º, também da Constituição Federal de 1988, demonstram o desiderato do legislador em fomentar o cooperativismo, notadamente ao preconizar que a lei não só apoiará, mas também estimulará o cooperativismo[1].

Quanto à esfera de legislação infraconstitucional, o principal diploma legal que rege as sociedades cooperativas, é a Lei nº 5.764 de 16 de dezembro de 1971, que define a Política Nacional de Cooperativismo e institui o regime jurídico das sociedades cooperativas.

Além da Lei nº 5.764/71, existem leis esparsas que tratam de matérias específicas do cooperativismo, como a Lei Complementar nº 130/2009, que é responsável por dispor sobre o regramento das cooperativas de crédito e sobre o Sistema Nacional de Crédito Cooperativo.

A recém-aprovada Lei nº 12.690, de 19 de julho de 2012, rege as cooperativas de trabalho.

Resguardado o disposto nas leis especiais, dentre as quais se destacam as supracitadas, as sociedades cooperativas também estão disciplinadas nos artigos 1093 a 1096 do Código Civil.

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Para se compreender o regime jurídico das cooperativas, é imprescindível uma análise do seu principal diploma legal, qual seja, a Lei nº 5.764/71.

O artigo 3º da Lei nº 5.764/71 preceitua que “celebram contrato de sociedade cooperativa as pessoas que reciprocamente se obrigam a contribuir com bens ou serviços para o exercício de uma atividade econômica, de proveito comum, sem objetivo de lucro”.

Maria Helena Diniz (2012, p. 785) conceitua a sociedade cooperativa como:

[...] uma associação sob forma de sociedade simples, com número aberto de membros, que tem por escopo estimular a poupança, a aquisição de bens e a economia de seus sócios, mediante atividade econômica comum. É uma modalidade especial de sociedade simples (CC, art. 982, parágrafo único, in fine) [...]. É uma forma de organização de atividade econômica, tendo por finalidade a produção agrícola ou industrial, ou a circulação de bens ou de serviços, voltada ao atendimento de seus sócios. Como ensina Rachel Sztajn, há uma busca de “benefício econômico direto para os sócios, resultante da redução de custo de serviços prestados pela cooperativa”. Pode ser constituída até mesmo sem capital e apenas com serviços, não tendo objetivo de lucro.

Flávio Augusto Dumont Prado (2004, p. 80), traz interessante conceito sobre cooperativa, nos seguintes termos: “cooperativa é a sociedade de pessoas, de cunho econômico e social, sem fins lucrativos, criada e mantida rigidamente de acordo com os princípios que lhe são próprios, para prestar serviços aos sócios”.

O exercício de atividade econômica que tenha proveito comum é elemento que exterioriza a razão de ser de qualquer sociedade de pessoas constituída de forma lícita, isto é, a afinidade entre os sócios ou o affectio societatis, que se revela na finalidade do indivíduo de contribuir como sócio ou de sujeitar-se ao regime societário, seja colaborando com bens ou serviços ou cooperando ativamente para a consecução da finalidade traçada pela sociedade, ou seja, de seu objeto social.

Ao tratar da classificação da cooperativa como uma sociedade de pessoas, Wilson Alves Polonio (2001, p. 34/35), destaca que a “sociedade cooperativa pode ser tomada como uma sociedade genuinamente de pessoas, e nem precisaria de lei para classificá-la como tal, uma vez que tem como fundamento a solidariedade, a igualdade e a comunhão de interesses dos associados”.

Sob a ótica cooperativista, o objeto social deverá servir como liame entre os cooperados e as atividades da cooperativa, demonstrando-se a afinidade associativa. Nesse sentido, Paulo Gonçalves Lins Vieira e Priscila I. Grecco Oliveira (2009, p. 96) explicam que:

As “cooperativas” que se propõem a desenvolver todas e quaisquer atividades, disponibilizando pessoas e não os serviços definidos em seu objeto social ao mercado, são conhecidas como “cooperativas de mão-de-obra” ou “cooperativas multiprofissionais”, ou, ainda, “pseudocooperativas”.

Dentre as características que diferenciam as cooperativas das demais sociedades, também está a de que as sociedades cooperativas serão sempre consideradas sociedades simples, independentemente de seu objeto, conforme expressa disposição legal do artigo 982, parágrafo único, do Código Civil.

Ao tratar das atividades econômicas civis e em atenção a este aspecto legal das cooperativas, leciona Fábio Ulhoa Coelho (2013, p. 40) que:

As cooperativas, normalmente, dedicam-se às mesmas atividades dos empresários e costumam atender aos requisitos legais de caracterização destes (profissionalismo, atividade econômica organizada e produção ou circulação de bens ou serviços), mas, por expressa disposição do legislador, que data de 1971, não se submetem ao regime jurídico-empresarial. Quer dizer, não estão sujeitas à falência e não podem requerer a recuperação judicial. Sua disciplina legal específica encontra-se na Lei n. 5.764/71 e nos arts. 1.093 a 1.096 do CC, e seu estudo cabe ao Direito Civil.

A sociedade cooperativa, como pessoa jurídica, não objetiva lucros para si, pelo contrário, tem por fim a prestação de serviços aos seus sócios e a promoção do crescimento econômico e social dos mesmos. É o magistério de Walmor Franke (1973):

O fim da cooperativa é a prestação de serviços ao associado, para a melhoria de seu status econômico. A melhoria econômica do associado resulta do aumento de seus ingressos ou da redução de suas despesas, mediante a obtenção, através da cooperativa, de créditos ou meios de produção, de ocasiões de elaboração e venda de produtos, e a consecução de poupanças.

O escólio de Amador Paes de Almeida (1984, p. 385) corrobora o raciocínio:

Destinam-se elas a prestar serviços e vantagens, tendo, em regra, como seus únicos fregueses, os seus sócios. É para eles e por eles que ela se constitui e opera. Todos os sócios cooperam com seu capital, no mínimo para que possa se alcançar o seu objetivo. São cooperadores e cooperados ao mesmo tempo.

A adesão às cooperativas é livre, contudo pode haver a recusa de novos sócios por impossibilidade técnica de prestação de serviços aos associados.

Em decorrência da liberdade de aderir ou de desligar-se da cooperativa, o capital social, que é representado por quotas-partes, é variável. Daí extrai-se, ainda, que há a participação econômica do cooperado no empreendimento, que para o seu ingresso na sociedade deve subscrever o número de quotas-partes exigido pelo Estatuto Social e, em seguida, realizar a integralização.

De acordo com o inciso IV, do artigo 4º, da Lei nº 5.764/71, é vedada a cessão de quotas-partes do capital a terceiros, estranhos a sociedade, sendo permitida a transferência entre os sócios.

O inciso V do mesmo artigo cuida do princípio da singularidade do voto, ou seja, independentemente do capital ou da participação do sócio na atividade econômica, terá ele direito a só um voto nas Assembleias Gerais, o que demonstra a valorização do cooperado em detrimento do capital.

Cumpre ressalvar que, afora a essa regra pertinente às cooperativas de primeiro grau, as cooperativas de grau superior (centrais, federações e confederações de cooperativas), com exceção das que exerçam atividade de crédito, podem optar por critério de votação proporcional ao número de associados que elas tenham.

Observa-se que o direito ao voto nas Assembleias Gerais, órgão máximo da cooperativa, expressa que as decisões da sociedade estão sujeitas ao controle democrático exercido pelos cooperados.

Ainda em relação ao artigo 4º, o seu inciso VII prevê o “retorno das sobras líquidas do exercício, proporcionalmente às operações realizadas pelo associado, salvo a deliberação da assembleia geral”, direito este que deriva do princípio da participação econômica dos sócios.

Destarte, os cooperados contribuem para o custeio da sociedade na medida das operações que realizam e dos serviços por eles utilizados, constituindo-se os ingressos, e, em contrapartida, havendo a aprovação pela Assembleia Geral Ordinária, recebem da cooperativa o retorno das sobras líquidas do exercício, ou seja, depois de deduzidos dispêndios e as parcelas correspondentes aos fundos obrigatórios previstos pela lei (Fundo de Reserva – FR e Fundo de Assistência Técnica Educacional e Social – Fates).

Em vista de todas essas peculiaridades, conclui-se que o cooperado tem a característica da dupla qualidade: nas operações, ele age como cliente dos serviços prestados pela cooperativa, enquanto que nas decisões participa como proprietário.

Essas características básicas funcionam como elementos que identificam uma sociedade como cooperativa, à luz de seus princípios e de sua natureza jurídica, diferenciando-a das demais sociedades. Ademais, esses aspectos peculiares servem como norte para averiguar se a sociedade é mesmo cooperativa ou se apenas utilizou-se fraudulentamente desta roupagem com o intuito de obter benefícios ilícitos.

2.1 Ramos do cooperativismo

Para Walmor Franke (1973), as cooperativas definem um fim, que necessariamente deve se identificar com o de seus cooperados, sendo que o objeto é o ramo da atividade. O ramo do empreendimento cooperativo é a forma pela qual a sociedade busca atingir o fim que motivou a sua criação.

A doutrina clássica considera que as cooperativas podem ser classificadas em três espécies distintas: as de recebimento, fornecimento e produção, consoante explica Paulo César Andrade Siqueira (2004, p. 50/51):

Entendemos, adotando a doutrina clássica, que as principais espécies de cooperativas são as de recebimento, fornecimento e produção. Todas as espécies de cooperativas estão consideradas nestes três segmentos, que justificam as únicas diferenças da cooperação, seja para receber o patrimônio, serviços e bens dos cooperados; seja para fornecer patrimônio bens ou serviços; seja para coordenar a produção dentro da própria cooperativa, pelos sócios que trabalhariam na sede ou unidades, sob coordenação e para os fins da cooperativa. [...] As cooperativas de recebimento recebem valores para administrar (como as cooperativas de crédito), serviços para contratar (como as cooperativas de trabalho), bens para comercializar (como as cooperativas de beneficiamento ou compra e venda). As cooperativas de fornecimento adquirem bens de interesse dos cooperados, para seu consumo (como as cooperativas de consumo). As cooperativas de produção congregam os cooperados em locais da cooperativa, para produzirem bens ou prestarem serviços, sempre no local da cooperativa, utilizando-se insumos da própria cooperativa, e submetendo-se a rateio mensal ou periódico, do resultado de seus negócios, de acordo com a contabilidade das cooperativas.

O fato é que, ainda que se possa considerar que todas as cooperativas se ajustam às aludidas três espécies de cooperativas (recebimento, fornecimento e produção) reconhecidas pela doutrina clássica, o que se vê na prática é uma divisão em diversos ramos, de acordo com a atividade econômica para a qual a cooperativa foi constituída.

A Organização das Cooperativas Brasileiras – OCB é uma entidade representativa das sociedades cooperativas filiadas e desempenha a função de promover, integrar e defender os interesses das mesmas. Conforme rege o seu estatuto social, incumbe à OCB integrar e classificar as cooperativas por ramos do cooperativismo[2]. A entidade assim fundamenta essa classificação:

No Brasil existem cooperativas em 13 setores da economia. Todas representadas pela Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB) nacionalmente e pelas organizações estaduais (Oces) nas unidades da federação. Para melhor cumprir sua função de entidade representativa do cooperativismo brasileiro, a OCB estabeleceu os ramos do cooperativismo baseados nas diferentes áreas em que o movimento atua. As atuais denominações dos ramos foram aprovadas pelo Conselho Diretor da OCB, em 4 de maio de 1993. A divisão também facilita a organização vertical das cooperativas em confederações, federações e centrais.

Esses ramos reconhecidos e definidos pela OCB são: agropecuário, consumo, crédito, educacional, habitacional, infraestrutura, mineral, produção, saúde, trabalho, transporte, turismo e lazer, especial.

O ramo do trabalho, em síntese é composto pelas cooperativas voltadas à prestação de serviços especializados ao mercado, desde que estejam previstos em sua atividade econômica, e que são responsáveis por viabilizar e otimizar o trabalho de seus cooperados.

A Lei nº 12.690, de 19 de julho de 2012 é a norma que disciplina a organização e o funcionamento das cooperativas de trabalho e institui o Programa Nacional de Fomento às Cooperativas de Trabalho – PRONACOOP.

Tem-se como definição legal de cooperativa de trabalho, a teor do que dispõe o artigo 2º da citada lei, “a sociedade constituída por trabalhadores para o exercício de suas atividades laborativas em proveito comum, autonomia e autogestão para obterem melhor qualificação, renda, situação socioeconômica e condições gerais de trabalho”.

Cumpre consignar, todavia, que tal lei exclui de seu âmbito de regulamentação: as cooperativas de assistência à saúde, na forma da legislação de saúde suplementar; as cooperativas que atuam no setor de transporte regulamentado pelo poder público e que detenham, por si ou por seus sócios, a qualquer título, os meios de trabalho; as cooperativas de profissionais liberais cujos sócios exerçam as atividades em seus próprios estabelecimentos e as cooperativas de médicos cujos honorários sejam pagos por procedimentos.

No que não colidirem com a Lei nº 12.690/12, também são aplicáveis às cooperativas de trabalho as disposições da Lei nº 5.764/71 e do Código Civil.

Conforme previsto no artigo 4º da Lei nº 12.690/12, a cooperativa de trabalho pode ser classificada como: a) de produção, quando os cooperados contribuem com trabalho para a produção em comum de bens e, por sua vez, a cooperativa detém, a qualquer título, os meios de produção; e b) de serviço, quando criada por seus cooperados visando a prestação de serviços especializados a terceiros, sem que haja relação de emprego.

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Sobre o autor
Rafael Dias Martins

Advogado e Assessor Jurídico da Cooperativa de Cafeicultores e Agropecuaristas - COCAPEC e da Cooperativa de Crédito Rural COCAPEC - SICOOB CREDICOCAPEC. Especialista em Direito e Processo do Trabalho pela Universidade Anhanguera-Uniderp. Graduado em Direito pela Faculdade de Direito de Franca.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MARTINS, Rafael Dias. A condição jurídica do trabalho cooperado. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3780, 6 nov. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/25756. Acesso em: 28 mar. 2024.

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