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Crime de embriaguez ao volante: tipo penal, tipicidade, classificação e consequências da nova redação

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25/03/2014 às 12:22

Resumo:


  • O artigo 306 do Código de Trânsito Brasileiro, alterado pela Lei 12.760/2012, define o crime de conduzir veículo com capacidade psicomotora alterada em razão da influência de álcool ou outras substâncias psicoativas.

  • A nova redação do artigo exige a comprovação de alteração da capacidade psicomotora para a tipificação do crime, não bastando apenas a constatação da concentração de álcool no sangue ou no ar alveolar.

  • A interpretação mais adequada ao Estado Democrático de Direito é a que considera o artigo 306 como um crime de perigo abstrato de periculosidade real, exigindo a efetiva alteração da capacidade psicomotora e a geração de um risco-base para os bens jurídicos protegidos.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

4 CLASSIFICAÇÃO 

A corrente doutrinária, que começa a ser seguida por alguns Tribunais pátrios, mais condizente com os princípios penais da legalidade e da ofensividade classifica o crime de embriaguez ao volante como delito abstrato de perigosidade real. De acordo com esta posição, embora seja um crime de perigo abstrato, dispensando, assim, a comprovação de efetivo perigo, faz-se necessário que a conduta do agente, no caso concreto, tenha sido, ao menos, perigosa, excluindo-se a tipicidade daquela que sequer ofertou risco ao bem jurídico tutelado.

Dessa forma, mesmo que se admita que o parágrafo primeiro faça parte do tipo penal do artigo 306 e que a sua mera aferição já comprova as elementares normativas do caput, eventual conduta que apresente esta tipicidade formal não será verdadeiramente típica caso nenhum risco ofereça ao bem jurídico protegido pela descrição legal.

4.1 Os Bens Jurídicos Tutelados pelo Artigo 306 do CTB 

A missão do Direito Penal é proteger os valores fundamentais para a subsistência do corpo social, tais como a vida, a saúde, a liberdade, a propriedade etc., que são os denominados bens jurídicos. Assim, seleciona e incrimina os comportamentos mais graves, capazes de colocar em risco aquilo que é tutelado.

De acordo com Capez (2010), segundo o princípio da ofensividade, não há crime quando a conduta não tiver oferecido ao menos um perigo de lesão ao bem jurídico tutelado. Seja esse risco abstrato ou concreto, o importante é que não se deve punir uma agressão em sua fase ainda embrionária. A função principal da ofensividade é a de “limitar a pretensão punitiva estatal, de maneira que não pode haver proibição penal sem um conteúdo ofensivo a bens jurídicos” (p. 43).

Para entender a atuação do princípio da ofensividade no tipo penal do artigo 306 e de que forma contribui para a sua classificação, é necessário entender qual o bem jurídico efetivamente tutelado pela descrição legal.

Muitos magistrados, na tarefa de analisar sobre qual bem jurídico recai a proteção do legislador, entendem que o artigo 306 do CTB contempla um bem jurídico coletivo representado pela incolumidade pública no aspecto da segurança viária ou segurança no trânsito.

Bem e Gomes (2013), no entanto, entendem que os verdadeiros bens jurídicos protegidos são a vida, a integridade física e o patrimônio. Segundo os autores, o bem jurídico deve estar fundamentado em base realista e não espiritual, pois a sua proteção não deve servir de substrato para a expansão da pena, mas, ao contrário, deve limitar o poder punitivo estatal. Sendo assim, não se pode falar em algo real em se tratando de incolumidade pública ou segurança viária. E essa posição foi sustenta pelo Supremo Tribunal Federal:

Habeas corpus. Penal. Delito de embriaguez ao volante. Art. 306 do Código de Trânsito Brasileiro. Alegação de inconstitucionalidade do referido tipo penal por tratar-se de crime de perigo abstrato. Improcedência. Ordem denegada. [...] Na espécie, a proibição da conduta pela qual o paciente foi condenado objetiva, especialmente, combater e prevenir a ocorrência de delitos de trânsito que possam colocar em risco a incolumidade física ou até mesmo a vida dos indivíduos da coletividade ou provocar danos patrimoniais [...] (STF, Habeas Corpus 109.269/MG, 2ª T., rel. Min, Ricardo Lewandowski, j. 27-9-2011).

Admitir que o bem jurídico tutelado pelo artigo 306 é a segurança viária ou a incolumidade pública é transformar um crime de perigo em crime de dano, pois qualquer ação de risco no trânsito configuraria uma lesão à segurança do tráfego. Antecipa-se, assim, a própria lesão ao verdadeiro objeto de proteção.

4.2 Crimes de Perigo

Diversamente dos crimes de dano, nos quais se exige uma efetiva lesão ao bem jurídico protegido para sua consumação, os crimes de perigo apenas necessitam da possibilidade de dano, ou seja, a exposição do bem jurídico tutelado a um risco de lesão. A partir disto, é possível extrair a primeira lição: o crime previsto no artigo 306 do CTB é crime de perigo, uma vez que não exige a ocorrência do evento danoso sobre os bens jurídicos que protege (vida, integridade física e patrimônio), bastando a verificação do risco.

Capez (2010, p. 286-287) assim subdivide o crime de perigo:

[...] a) crime de perigo concreto, quando a realização do tipo exige a existência de uma situação de efetivo perigo; b) crime de perigo abstrato, no qual a situação de perigo é presumida, como no caso da quadrilha ou bando, em que se pune o agente mesmo que não tenha chegado a cometer nenhum crime; c) crime de perigo individual, que é o que atinge uma pessoa ou um número determinado de pessoas, como os dos arts. 130 a 137 do CP; d) crime de perigo comum ou coletivo, que é aquele que só se consuma se o perigo atingir um número indeterminado de pessoas, por exemplo, incêndio (art. 250), explosão (art. 251) etc.; e) crime de perigo atual, que é o que está acontecendo; f) crime de perigo iminente, isto é, que está prestes a acontecer; g) crime de perigo futuro ou mediato, que é o que pode advir da conduta, por exemplo, porte de arma de fogo, quadrilha ou bando etc.

É possível, assim, inferir que o crime do artigo 306 do CTB é de perigo abstrato, uma vez que o risco é presumível, baseado na prática da descrição legal, elaborada a partir da experiência do legislador. É importante ter em mente que os bens jurídicos tutelados pelo dispositivo são a vida, a incolumidade física e o patrimônio e que o perigo deve ser dirigido diretamente para esses bens, e não para a segurança viária ou a incolumidade pública.

4.3 Perigo Abstrato de Perigosidade Real: embriaguez ao volante

Enquanto crime de perigo abstrato, com risco dirigido à vida, à integridade física e ao patrimônio, Bem e Gomes (2013) vislumbram diversas tendências para conferir legitimação ao delito em análise.

Segundo os autores, na prática, há quem entenda a infração penal como um delito de perigo abstrato por se tratar de um delito formal. Essa corrente distingue crime formal de perigo, que é o crime de perigo abstrato, do crime material de perigo, que é o crime de perigo concreto. Os autores entendem que quem segue essa classificação apenas acompanha a vontade legislativa de punir por pura desobediência à norma de cuidado, sem considerar as circunstâncias do caso concreto, o que afronta as exigências de um Direito penal próprio de um Estado democrático de Direito.

A segunda tendência reside na classificação como crime de perigo abstrato de perigosidade concreta. Assim, as ações que geram um perigo provável aos bens jurídicos, em uma análise prévia, podem ser punidas quando os objetos protegidos entram no raio de ação da conduta ilícita, e o perigo decorreria unicamente de dirigir alcoolizado.

A terceira corrente enxerga o crime de perigo abstrato em comento como delito de perigo geral, pressupondo um comportamento geralmente perigoso segundo um juízo de probabilidade estatística. Refere-se a condutas de massa em setores de risco, nos quais é exigida a padronização de comportamentos para evitar infrações.

Por último, Bem e Gomes (2013) concebem a tendência mais moderna, qual seja, o crime de perigo abstrato com perigosidade real, nos quais se exige um resultado de risco para um concreto objeto de proteção, ou seja, para a vida, a integridade física e o patrimônio. Assim, algum bem jurídico deve entrar no raio de ação da real periculosidade da conduta, não sendo necessário haver vítima concreta, mas indeterminada.

O objetivo é excluir as ações que se amoldam à descrição legal quando, pelas circunstâncias como foram perpetradas, não resultarem perigosas para o bem jurídico. Neste sentido, encara-se o crime do artigo 306 do CTB não como delito de perigo abstrato puro, no qual a presunção é absoluta, mas como delito de perigo abstrato de perigosidade real, onde a presunção é relativa, admitindo prova em contrário, sendo necessário para a condenação que seja demonstrado que pelo menos um dos bens jurídicos tutelados (vida, integridade física, patrimônio) foi ameaçado, o que condiz com o princípio da ofensividade ao excluir condutas sem qualquer condão de agredir qualquer bem jurídico.

Cabette (2013) critica a classificação do crime de embriaguez ao volante como delito de perigo abstrato de perigosidade real, segundo a transcrição abaixo:

Indo direito ao ponto, pode-se afirmar com toda segurança que o neologismo “crime de perigo abstrato de perigosidade real” não passa de uma alteração do nome daquilo que é conhecido desde antanho como “crimes de perigo comum” em oposição aos “crimes de perigo individual”. Acontece que as classificações de “crime de perigo concreto e crime de perigo abstrato” por um lado; e “crime de perigo comum e crime de perigo individual” por outro, nada têm a ver entre si, de modo que podem existir crimes de perigo comum abstrato ou concreto. Já quanto aos crimes de perigo individual, geralmente estão ligados a perigo concreto não porque sejam uma mesma categoria, mas porque ao ser a conduta dirigida necessariamente a pessoa determinada, normalmente será exigida a criação de um perigo concreto. Enfim, essas denominações de perigo (comum/individual) (concreto/abstrato) não se confundem, já que cada uma delas se refere a um aspecto que em nada influencia naquele versado pela outra. São dicotomias independentes.

Assevera, ainda, o autor que essa nova categoria de crime nada mais é do que um palavreado vazio, falácia, que designa o crime de perigo comum, chamado, por meio de outro nome, para solucionar a questão do perigo abstrato versus perigo concreto, que nada lhe diz respeito.

Para Bem e Gomes (2013), porém, a categoria dogmática que se encaixa com perfeição ao novo tipo penal do artigo 306 é a do perigo abstrato de perigosidade real. Rompe-se, assim, a velha dicotomia entre o perigo abstrato e o concreto, nascendo um tercius. Assim, só haverá crime se houver a superação de um risco-base, retratado na conduta anormal. De acordo com os autores, é justamente a perigosidade da conduta anormal, previamente considerada, que levou o legislador a criminalizá-la.

Desse modo, não é suficiente provar a mera ingestão da substância para a consumação do delito (perigo abstrato), bem como não é preciso demonstrar que houve efetivo risco para bens ou pessoas certos e determinados (perigo concreto). Isso porque a nova redação do artigo 306 exige a comprovação da alteração da capacidade psicomotora com reflexo na condução anormal do motorista para que haja crime, não havendo presunção absoluta do perigo, cabendo prova em contrário. Também não é necessário que o risco seja comprovado efetivamente, como seria caso crime de perigo concreto fosse, razão pela qual faz parte dos crimes de perigo abstrato.

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É permitido asseverar, então, que cabe à acusação, para possibilitar a condenação do agente, além de demonstrar a ocorrência de todas as elementares do caput do artigo 306, em especial os elementos normativos “em razão da influência” e “capacidade psicomotora alterada”, através dos meios probatórios previstos nos seus parágrafos primeiro e segundo, deve comprovar que houve um risco-base gerado pela condução do agente, ou seja, que algum bem jurídico tutelado pela figura típica – vida, integridade física ou patrimônio – tenha entrado no raio de ação da real periculosidade da conduta, sem que seja necessário, no entanto, haver vítima concreta, mas sim indeterminada.

Sendo assim, ainda que presentes, verificadas e aferidas todas as elementares do tipo, corroboradas com instrumentos probatórios suficientes, se não for demonstrado que da conduta originou-se um perigo básico, o fato é atípico, tendo em vista que não houve a mínima ofensividade aos bens jurídicos protegidos.

Isso porque o que caracteriza fundamentalmente o injusto penal é a exigência (ao lado de um desvalor da ação) de um desvalor do resultado, conforme visto anteriormente. Para a intervenção penal, sempre será indispensável uma afetação ao bem jurídico, ou seja, um contato, mínimo que seja, entre a ação perigosa e o bem protegido. Mesmo presente a tipicidade formal e parte da tipicidade material (desvalor da ação), a tipicidade penal não é completa, pois falta o complemento daquela tipicidade material, isto é, o desvalor do resultado. Não se pode punir, portanto, condutas que gerem um resultado inócuo.


5 CONSEQUÊNCIAS JURÍDICAS 

O posicionamento defendido por Bem e Gomes começa a ser adotado pelos Tribunais brasileiros, dos quais o Egrégio Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul é exemplo:

[...] O réu é confesso. E a confissão é corroborada pelos depoimentos dos PM’s que atenderam a ocorrência e pelo resultado do teste do etilômetro, que indicou concentração de álcool muito superior ao limite legal: o triplo. A Lei 12.760/2012 alterou o disposto no artigo 306 do CTB. O tipo já não se realiza pelo simples fato de o condutor estar com uma determinada concentração de álcool no sangue e sim por ele ter a capacidade psicomotora alterada em razão da influência do álcool, seja ela qual for. A concentração que antes constituía elementar do tipo passou a ser apenas meio de prova dessa alteração. O resultado do exame constitui presunção relativa, em um sentido ou noutro. Houve descontinuidade típica, mas não abolitio criminis. Para os processos que ainda se encontrem em andamento, mormente as condenações impostas antes da vigência da alteração pendentes de recurso, como no caso dos autos, deve-se verificar se há evidência da alteração da capacidade psicomotora, sem o que não pode ser mantida a condenação. Caso em que há evidência nesse sentido. Condenação mantida. Penas aplicadas com parcimônia. Sentença confirmada. Recurso desprovido (TJRS, Apelação Crime nº 70052903184, Terceira Câmara Criminal, rel. Des. João Batista Marques Tovo, j. 27-6-2013).

A primeira consequência do posicionamento adotado reside na questão interpretativa da lei penal. A exegese de fatos e normas penais deve respeitar o princípio in dubio pro reo, corolário do princípio maior da presunção de inocência (faz-se aqui, também, uma interpretação conforme a Constituição). A uma, porque o princípio da inocência somente é superado com a comprovação de fatos e elementares típicas, jamais por presunções que prejudiquem o réu. A duas, pois, em caso de dúvida quanto à interpretação de uma normal penal, deve-se privilegiar aquela favorável ao agente.

Assim, diante da opção de admitir o crime de embriaguez ao volante como delito de perigo abstrato puro (presumido), no qual basta a mera ingestão para configurar a tipicidade, é substancialmente mais favorável ao agente a interpretação proposta por este trabalho, rezando ser necessária a comprovação de todas as elementares e a ocorrência de um risco-base para possibilitar a condenação, perante a insuficiência de critérios meramente quantitativos.

Outra possibilidade exegética para o crime de embriaguez ao volante é adotar a interpretação restritiva do tipo penal. Uma vez que o tipo penal do artigo 306 do CTB não traz palavras que permitam a ampliação do seu alcance e não é composto de uma descrição simplificada que permita declarar o seu sentido, é oportuno interpretá-lo restritivamente. Isso porque os elementos normativos inseridos pela nova redação (“em razão da influência” e “capacidade psicomotora alterada”) requerem a sua prova, aumentando os requisitos imprescindíveis para a incriminação do fato e reduzindo o alcance da norma, uma vez que um número inferior de condutas, em comparação com o critério quantitativo da redação anterior, será abarcado.

Um importante efeito da visão adotada por este estudo é a aplicação da regra da novatio legis in mellius, prevista no parágrafo único do artigo 2º do Código Penal Brasileiro (“a lei posterior, que de qualquer modo favorecer o agente, aplica-se aos fatos anteriores, ainda que decididos por sentença condenatória transitada em julgado”).

Assim, para fatos ocorridos antes do advento da Lei 12.760/2012, que resultaram em condenações baseadas simplesmente no critério quantitativo da dosagem alcoólica, a nova redação, mais benéfica ao agente, deve ser aplicada, ainda que operado o trânsito em julgado, se, à época do processo-crime, não ficou demonstrada a alteração da capacidade psicomotora em razão da influência de álcool ou substância psicoativa e/ou a ocorrência de risco-base para os bens jurídicos protegidos, resultando na absolvição do condenado.

Já é possível visualizar a aplicação retroativa da nova redação do artigo 306 pelos Tribunais Pátrios, adotando o entendimento de ser mais benéfica aos condenados ou acusados antes do advento da Lei 12.760/2012:

Apelação. Embriaguez ao volante. Alteração da capacidade psicomotora. Lei 12.760/12. Retroatividade. Com a alteração do artigo 306 da Lei 9503/97 pela Lei 12.760/12, foi inserida no tipo penal uma nova elementar normativa: a alteração da capacidade psicomotora. [...] Assim, a adequação típica da conduta, agora, depende não apenas da constatação da embriaguez (seis dg de álcool por litro de sangue), mas, também, da comprovação da alteração da capacidade psicomotora pelos meios de prova admitidos em direito. Aplicação retroativa da Lei 12760/12 ao caso concreto, pois mais benéfica ao réu. Ausência de provas de alteração da capacidade psicomotora, notadamente em razão do depoimento do policial responsável pela abordagem, que afirmou que o réu conduzia a motocicleta normalmente. Absolvição decretada (TJRS, 3ª Câmara Criminal, rel. Des. Nereu Giacomolli, j. 09-5-2013).

Para os fatos ocorridos após a edição da Lei 12.760/2012, deve o magistrado aplicar a nova redação do artigo 306 de acordo com a interpretação mais benéfica, refutando condenações com bases em critérios meramente quantitativos e absolvendo os acusados nos casos em que todas as elementares do tipo não forem demonstradas suficientemente. Exemplificando, os recentes julgados a seguir:

[...] Conforme se verifica, a denúncia não demonstrou a anormalidade realizada pela recorrente na condução do veículo, não se subsumindo na norma descrita no art. 306 da Lei 9503/97 como infração penal, mas sim como infração administrativa, prevista no artigo 165 da mesma Lei. Decisão que não merece reparo porque a denúncia foi oferecida sem a devida exposição do fato criminoso e ausente a justa causa para a deflagração da ação penal, já que a peça inaugural não descreveu o comportamento que caracterizaria a anormalidade na direção do veículo, indispensável para se falar em ofensa ao bem jurídico tutelado criminalmente. Estar "sob a influência", como era exigido pelo texto original do artigo 306-CTB, é condição essencial para a configuração do crime em análise. Deve-se, obrigatoriamente, considerar se o agente está "sob a influência de álcool ou substância de efeitos análogos, expondo a dano potencial a incolumidade de outrem", como era previsto anteriormente e que ainda deve imperar. RECURSO DESPROVIDO (TJRJ, Recurso em sentido estrito 0025765-11.2013.8.19.0002, 1ª Câmara Criminal, rel. Desa. Sandra Kayat Direito, j. 8-10-13).

Apelação Criminal. Embriaguez ao volante. Sentença de absolvição sumária. Recurso do Ministério Público. Diferentemente do texto anterior, a nova lei exige a prova da direção que coloque em risco o bem jurídico tutelado. Ônus que cabe a acusação. Precedentes desta Câmara. [...] Desprovimento do recurso (TJRJ, Apelação Criminal 0072636-98.2013.8.19.0067, 1ª Câmara Criminal, rel. Desa. Katya Monnerat, j. 26-9-13).

[...] para o reconhecimento do crime da lei de trânsito referido não basta que o motorista esteja embriagado, impondo-se a comprovação de que ele estava dirigindo sob a influência daquela substância, o que se manifesta numa direção anormal que coloca em risco concreto a segurança viária que é o bem jurídico protegido pela norma. Omissa a denúncia em relação a tal elementar, deve ser reconhecida a sua inépcia. Adoção da interpretação conforme a Constituição, não devendo a norma ser declarada inconstitucional "quando, entre interpretações plausíveis e alternativas, exista alguma que permita compatibilizá-la com a Constituição." No caso concreto, porém, a denúncia narrou e a prova carreada aos autos no curso da instrução confirmou que o acusado dirigia de forma perigosa, em zigue-zague, também ficando demonstrado que se encontrava embriagado na ocasião, o que é suficiente para tipificar o delito respectivo. Pena aplicada corretamente. Recurso desprovido (TJRJ, Apelação Criminal 0010320-72.2010.8.19.0061, 1ª Câmara Criminal, rel. Des. Marcus Basilio, j. 17-9-13).

Percebe-se, assim, que a nova interpretação do tipo penal do artigo 306 do Código de Trânsito Brasileiro e a classificação proposta (crime de perigo abstrato de perigosidade real), bem como os seus efeitos, como aplicação aos novos casos e retroatividade benéfica aos casos pretéritos, são tendências evidentes no seio jurisprudencial brasileiro.

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Sobre o autor
Thiago Meneses Rios

Advogado. Pós-graduado em Direito Constitucional pelo Centro de Ensino Unificado de Teresina. Graduado em Direito pelo Centro de Ensino Unificado de Teresina. Experiência anterior como Assessor de Juiz em Vara Criminal. Experiência como estagiário da Defensoria Pública Estadual do Piauí.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

RIOS, Thiago Meneses. Crime de embriaguez ao volante: tipo penal, tipicidade, classificação e consequências da nova redação. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 3919, 25 mar. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/27033. Acesso em: 22 dez. 2024.

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