Artigo Destaque dos editores

A estigmatização do réu diante da sociedade

Exibindo página 2 de 2
12/04/2014 às 07:31
Leia nesta página:

5- O ostracismo social

5.1 Origem - valores do social e a honra da sociedade

O Ostracismo surgiu em Atenas, na última década do século VI a.C período em que foi criada a Democracia. Deriva do grego ostrako, que significa caco. Para entender melhor o seu surgimento vale lembrar que os atenienses usavam pedaços de cerâmica, onde escreviam nomes de seis mil cidadãos nas ostrakas para ser legitimada a exclusão. Por um período de 10 dias, o nome do homem mais indicado nas cerâmicas, ficava em segredo para votação, se desejava ou não que a pessoa fosse ostracizada.

Com isso, os homens ganharam o direito de exercer cargos públicos, fato que contribuiu muito para o desenvolvimento da cidade – Estado. Para Durkheim este é um meio de socialização que o homem teve para se alcançar a posição de líder, pois caso o homem não tivesse se tornado um sociável ele seria apenas um animal selvagem. No entanto, devido ao grande crescimento deste na política, a população resolveu criar uma maneira de punir aqueles políticos que usavam o poder da cidade para se beneficiar. A partir daí foi denominado um instrumento chamado de ostracismo que, embora antidemocrático, foi criado com objetivo de banir da cidade de Atenas os indivíduos que eram considerados perigosos, como os tiranos, para o bem comum e para o bem democrático. Tal fato tinha o objetivo também de afastar os baderneiros de Atenas, por um período de 10 anos e assim evitar a guerra na cidade.

Dessa forma, sabe-se que o início da democracia foi marcado por muitos conflitos, onde os partidos políticos eram formados por líderes cada vez mais fortes, os derrotados (os tiranos na Ática) eram expulsos, que o mais forte oprimia o mais fraco. Percebe-se que nesse mecanismo jurídico há um excesso de repressão, porque na verdade, o fato de ser condenado ao exílio, não dava nenhuma chance de se defender, o que configurava um sistema antidemocrático e colocava em risco os princípios democráticos, ou seja, impedia o indivíduo de manifestar suas ideias.


6- A reincidência do réu por causa do preconceito

A reincidência significa voltar a pratica novos crimes pelo qual já foi condenado, e como se sabe é traves da reincidência que verifica as deficiências de qualquer sistema jurídico social, é a parti dele que se verifica o porquê as pessoas entram nas instituições prisionais, se é em virtude de carências, como moradia digna, da deficiência na escolaridade, ausência de qualificação profissional ou de caráter e personalidade, e verificar o porquê de voltarem ao sistema independente do tempo que estiveram nestas instituições.

É notório que alem desses problemas sociais que são acarretados pela falta de políticas publicas, temos a folha de antecedentes que é o histórico do réu ou do condenado e um dos principais motivos da discriminação, afastamento e aumento de pena se for reincidente.

‘’a partir do conceito de antecedentes, é possível concluir que o instituto tem por características a amplitude, a negatividade, a subjetividade, a relatividade, a antijuridicidade e a perpetuidade. ’’ [25]

Em virtude da negativação das antecedentes condenado a sociedade começa a estigmatiza-lo, fazendo com que o condenado não arrume trabalho, pelos maus olhares, mostrando que os antecedentes se tornem como uma ‘’marca de Caim’’, obrigando muitas das vezes a reincidir.

Às vezes nem há antecedentes desfavoráveis, mas o fato de esta sendo processado criminalmente já é motivos para a sua estigmatização, já é motivos suficientes para acabar com a imagem do réu dificultando a sua defesa, causando-lhe uma condenação que ira repercutir até a sociedade esquecer-se do fato que lhe foi imputado.

Mas porque a sociedade afasta o réu ou o condenado de seu meio? Como se sabe o sistema carcerário atualmente esta falido, não tendo capacidade nenhuma para ressocializar, reinserir o apenado novamente na sociedade, e isso é um fato notório. A sociedade afasta o condenado pelo medo de que ele volte a praticar crimes, assim explica H. Becker, “a posse de um traço desviante pode ter um valor simbólico generalizado, de modo que as pessoas dão por certo que seu portador possui outros traços indesejáveis presumivelmente associados a ele.” [26]

E a partir dessa rotulação o condenado que tenta se regenera se vê em um caminho cujos obstáculos serão muito difíceis para se manter  economicamente, pois devido sua ficha o mercado de trabalho será reduzido para este, sendo mais fácil cometer outros crimes para se manter.

‘’ Ao se tratar alguém como desviante em geral, segundo o diagnóstico popular que descreve sua maneira de ser, e não particularmente desviante em relação a determinado fato, põe-se em movimento diversos mecanismos que agem sobre a pessoa de forma a moldá-la segundo a imagem que os outros têm dela, produzindo um desvio crescente. Isso ocorre porque, após ser identificada como desviante, ela passa a ser isolada dos grupos mais convencionais, inclusive dos quais fazia parte, e acaba por encontrar dificuldades em se conformar a outras regras que não tem a intenção de infringir, tornando-se forçosamente desviante também em relação a essas últimas, em um impulso desesperado de sobrevivência. ‘’ [27]

Então pode-se perceber que aquele que comete um crime pode estar fadado a cometer outro, não porque ele quer e sim porque precisa para sobreviver. Esse é um dos principais motivos da reincidência, pois o condenado que quer se manter regenerado, precisa ser superior à sociedade em que vive, pois o que vemos é o homem se corrompendo a cada dia para satisfazer seu interesse, são pequenos delitos como suborno, abuso das autoridades policiais e outras infrações, que tem uma grande relevância na sociedade, ainda mais naquele que quer muda o modo de vida.

Dessa forma a pratica de desonestidade que se torna cada vez mais habitual em muitos negócios, o instituto da ressocialização acaba se fragilizando, talvez a regeneração do infrator fosse mais fácil se a sociedade em geral contivesse menos pessoas do tipo criminoso ou quase criminoso.


Conclusão

A pesquisa apresentou algumas concepções teóricas que afirmaram categoricamente a importância de se ressocializar o indivíduo para reintegrar-se à sociedade esperando-se com isto o menor número possível de detentos nos presídios.

Para entender a ressocialização, necessário dizer que a socialização surgiu como forma de integração, com o objetivo de que todos os indivíduos respeitassem o contrato social da época, o que ao longo dos tempos foi ficando mais complexos, tendo em vista que nem todos cumpriam tal pacto. E, assim foi gerando cada vez mais, a violência e a criminalidade. Quanto a ressocialização esta se refere a uma fase de reestruturação da personalidade e das atitudes dos indivíduos, podendo ser boas ou maléficas. Logo, pode-se observar que a personalidade, assim como os valores e a aparência das pessoas não são fixos, ou melhor, dizendo, eles variam de acordo com as relações e às experiências vividas ao longo da vida. Ao que se sabe é a partir das relações e experiências passadas pelo indivíduo, estando este condicionado pelos hábitos, é que se reflete em práticas individuais e coletivas.

Neste sentido, a ressocialização contribui para a reflexão quanto às mudanças necessárias no contexto social e quanto às concepções de alguém que já está exercendo seu cargo no mercado de trabalho, além do que possui dados importantes para os responsáveis que lidam com detentos nos presídios, casas de recuperação e desejam desenvolver o assunto para sanar essas dificuldades que vem enfrentando no dia-a-dia de sua profissão.

Espera-se que a pesquisa, assim como seus resultados sirvam de ponto de partida para pessoas que desejam aperfeiçoar aspectos que envolvem o papel do homem na sociedade. É de grande relevância e atual, assunto este que vem sendo discutindo no campo de estudos do direito, sobretudo o da criminologia que considera o delito como sendo um problema social e comunitário.

Pela pesquisa realizada pode-se compreender que a partir das coisas que acontecem com o homem, ou seja, a maneira como ele age, pensa e sente exteriormente, percebe-se que somos vítimas daquilo que vem do exterior, o que de certa forma nos obriga a cumprir determinada cultura, regra e leis. Tudo isto ao contrário, foge das regras, caracterizando então, a estigmatização do indivíduo pela sociedade. É o que diz Durkheim 

... Se um indivíduo experimentar opor-se a uma dessas manifestações coercitivas, os sentimentos que nega (por exemplo, o repúdio do público por um homem de terno rosa) voltar-se-ão contra ele. Em outras palavras, somos vítimas daquilo que vem do exterior...[28]

Baseado na pesquisa realizada pensa-se que a reinserção do detento na sociedade, é para que o preso seja humanizado, sua personalidade seja transformada juntamente com a assimilação dos valores morais necessários para torná-lo apto a viver junto a outras pessoas. Sabe-se que a prisão não está cumprindo sua função de reeducar o indivíduo para atuar na sociedade, como também já não é um dado inédito, basta conferir o quanto o sistema prisional está falido, pois há um grande índice de reincidência, hoje no país, conforme relata os diversos meios de comunicações existentes em nosso meio.

Nesse sentido é que se observou que essa dificuldade de ressocialização surge logo no momento em que estes indivíduos voltam para a sociedade, pois se percebe o perigo ou desconfiança que estes causam à população. Para entender tal questão pensa-se em um meio eficaz que pode resolver a situação. É a de utilizar as políticas públicas como um incentivo, principal de financiar programas que possam transformar essas pessoas em pessoas melhores.

Pois há uma falta de políticas públicas, sem contar o descaso no que diz respeito às normas já existentes e que fazem com que a ressocialização do indivíduo na sociedade tende a ficar cada vez mais longe de ser concluída. O ideal seria fazer uma reavaliação do que já existe no papel e que pode ser aproveitado e dar sentido prático às propostas que existem em relação a essa ressocialização ou recuperação e as que já estão sendo discutidas.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BECKER, Howard - outsiders estudos de sociologia do desvio, Ed . Zahar, Rio de Janeiro, 2008.

BARATTA, Alessandro (1999) - Criminologia Crítica e critica do direito penal - Introdução à Sociologia do direito Penal, 3ª Ed. Rio de Janeiro: Editora Revan  - Instituto Carioca de Criminologia;

BOMERY, Helena/MEDEIROS, Bianca Freire, - Tempos Modernos, Tempos Modernos: São Paulo. Editora Brasil, 2010

DURKHEIM, Emile (1985) - As Regras do Método Sociológico;

DURKHEIM, Emile, O suicídio (1897), 2ªEd.Coimbra, 2008.

GRECCO, Rogério: Curso de Direito Penal - Parte Geral - Vol. I - 13ª Ed. 2011, Ed. Impetus: Rio de Janeiro.

NUCCI, Souza Guilherme de - Manual de Direito Penal - Parte Geral - Parte Especial - 5ª Ed.2009: Ed. Revista dos Tribunais: São Paulo;

Assine a nossa newsletter! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos

PRATES, Flávio cruz. TAVARES, Neusa Felipim. ‘’A influencia da mídia nas decisões do conselho de sentença’’

DA CUNHA, JAQUELINE FALEIROS. "OS ANTECEDENTES EA REINCIDÊNCIA CRIMINAL NO ORDENAMENTO JURÍDICO."


NOTAS

[1] Becker, Howard - outsiders estudos de sociologia do desvio, Ed. Zahar, Rio de Janeiro, 2008.

[2] BITENCOURT Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte geral, v. 1. 11. ed. São Paulo: Saraiva, 2007, p.80.

[3] BITENCOURT Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte geral, v. 1. 11. ed. São Paulo: Saraiva, 2007, p.80.

[4] http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l7210.htm

[5] M ARCÃO, Renato. Curso de Execução Penal. 2 ed. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 1.

[6] MIRABETE, Júlio Fabbrini. Execução Penal. 10 ed. São Paulo: Atlas, 2002, p.24.

[7] MIRABETE, Júlio Fabbrini. Execução Penal. 10 ed. São Paulo: Atlas, 2002, p.84.

[8] DURKHEIM, Emile (1985) - As Regras do Método Sociológico.

[9] Becker, Howard - outsiders estudos de sociologia do desvio, Ed. Zahar, Rio de Janeiro, 2008.

[10] _____________- outsiders estudos de sociologia do desvio, Ed. Zahar, Rio de Janeiro, 2008, p 15.

[11] BARATTA, Alessandro (1999) - Criminologia Crítica e critica do direito penal - Introdução à Sociologia do direito Penal, 3ª Ed. Rio de Janeiro: Editora Revan - Instituto Carioca de Criminologia.

[12] A Teoria do Labelling surge após a 2ª Guerra Mundial, os Estados Unidos são catapultados à condição de grande potência mundial, estando em pleno desenvolvimento o Estado do Bem-Estar Social, o que acaba por mascarar as fissuras internas vividas na sociedade americana. A década de 60 é marcada no plano externo pela divisão mundial entre blocos: capitalista versus socialista, delimitando o cenário da chamada Guerra Fria. Já no plano interno, os norte-americanos se deparam com a luta das minorias negras por igualdade, a luta pelo fim da discriminação sexual, o engajamento dos movimentos estudantis na reivindicação pelos direitos civis. (SHECAIRA, 2004, p.371-374)

[13] ANDRADE, 2003, p.39.

[14] Becker, Howard - outsiders estudos de sociologia do desvio, Ed. Zahar, Rio de Janeiro, 2008, p.22.

[15] BARATTA, Alessandro (1999) - Criminologia Crítica e critica do direito penal - Introdução à Sociologia do direito Penal, 3ª Ed. Rio de Janeiro: Editora Revan - Instituto Carioca de Criminologia, p 11.

[16] BARATTA, Alessandro (1999) -Criminologia Crítica e critica do direito penal - Introdução à Sociologia do direito Penal, 3ª Ed. Rio de Janeiro: Editora Revan - Instituto Carioca de Criminologia, p.15.

[17] Becker, Howard - outsiders estudos de sociologia do desvio, Ed. Zahar, Rio de Janeiro, 2008, p.22.

[18] NUCCI, Guilherme de Souza. Crimes contra a dignidade sexual- comentários à Lei 12.015, de 7 de agosto de 2009, p.37.

[19] ‘’A teoria por eles construída demonstra a dependência causal da delinquência  secundaria, ou seja, das formas de reincidência que configuram uma verdadeira e própria carreira criminosa, dos efeitos que sobre a identidade social do individuo exerce a primeira condenação; ‘’ (BARATTA, Alessandro (1999) - Criminologia Crítica e critica do direito penal - Introdução à Sociologia do direito Penal, 3ª Ed. Rio de Janeiro: Editora Revan - Instituto Carioca de Criminologia, p 179)

[20] D.Peteres( 1973), p.157.

[21] BARATTA, Alessandro (1999) - Criminologia Crítica e critica do direito penal - Introdução à Sociologia do direito Penal, 3ª Ed. Rio de Janeiro: Editora Revan - Instituto Carioca de Criminologia, p 178.

[22] BARATTA, Alessandro (1999) - Criminologia Crítica e critica do direito penal - Introdução à Sociologia do direito Penal, 3ª Ed. Rio de Janeiro: Editora Revan - Instituto Carioca de Criminologia, p 178.

[23] Por unanimidade, o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) declarou nesta quinta-feira (4) que é constitucional a aplicação do instituto da reincidência como agravante da pena em processos criminais (artigo 61, inciso I, do Código Penal). A questão foi julgada no Recurso Extraordinário (RE 453000) interposto contra acórdão (decisão colegiada) do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ-RS) que manteve a pena de quatro anos e seis meses imposta a um condenado pelo crime de extorsão e entendeu como válida a incidência da agravante da reincidência, na fixação da pena. (informativo STF Quinta-feira, 04 de abril de 2013)

[24] PRATES, Flávio cruz. TAVARES, Neusa Felipim. ‘’A influencia da mídia nas decisões do conselho de sentença’’. P.34

[25] BISSOLI FILHO, Francisco. Estigmas da criminalização: dos antecedentes à reincidência criminal, p.64.

[26] Becker, Howard - outsiders estudos de sociologia do desvio, Ed. Zahar, Rio de Janeiro, 2008, p.43.

[27] Sérgio Enrique Ochoa Guimarães, Cárcere, estigma e reincidência: o mito da ressocialização - Revista Jus Navigandi - Doutrina e Peças, 2013

[28] DURKHEIM, Emile (1985) - As Regras do Método Sociológico

Assuntos relacionados
Sobre os autores
Felippe Souza

Estudante de Direito pelo Instituto de Educação Superior de Brasília – IESB <br>Formado em teoria geral do direito público pelo Instituto Brasiliense de Direito Público - IDP.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SOUZA, Felippe ; DALVA , Gercina Dalva. A estigmatização do réu diante da sociedade. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 3937, 12 abr. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/27268. Acesso em: 26 abr. 2024.

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Publique seus artigos