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O direito de voto como marco da penetração feminina na esfera pública e seus reflexos na retórica social de estruturação do poder

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16/08/2014 às 14:09
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3. CONCLUSÕES.

A análise retórica realizada permite o conhecimento mais aprofundado de parte da história do Brasil a qual configura marco inicial na quebra do padrão dualista “público/privado” de fixação das esferas de, respectivamente, exclusão e inserção da mulher, representando o início de uma ampliação nos horizontes da atuação social feminina e do preenchimento, pelas mulheres, de diversas instâncias de poder.

Ao fazerem-se presentes no diálogo social, as feministas criaram discursos que identificava a mulher como importante fator civilizatório, tendo no seio familiar seu principal espaço de intervenção social, mas não restringindo sua atuação apenas a essa esfera. Pelo contrário, à mulher foi concedida a possibilidade de expressar-se quanto às questões sociais relevante de sua época, interferindo nos destinos da coletividade. Foi esse o novo padrão de comunicação criado pelo movimento sufragista brasileiro, que representou o início da emancipação feminina, flexibilizando a linguagem de comando social baseada na ideologia do sexo dominante e dando novos contornos significativos ao papel social da mulher.

A importância desse momento da história nacional situa-se justamente no fato de ter sido ele a mola propulsora de muitas outras mudanças no discurso de gênero ocorridas no País e que refletem na atual concepção social do valor da mulher, a qual ocupa cada vez mais espaço no mercado de trabalho, em posições de liderança e nos diversos âmbitos do Poder (Legislativo, Executivo e Judiciário). Destaque-se, como exemplo dessa mudança de paradigma, a eleição de uma mulher para o cargo de chefia do Poder Executivo Federal.

Enfim, enquanto os espaços políticos tradicionais encontravam-se impermeabilizados para as mulheres, diante da produção de linguagens de comando baseadas na exclusão de gênero, elas foram organizando-se em formas alternativas de atuação, consolidando-se paulatinamente como sujeitos coletivos e políticos. Assim, foram capazes de, agindo estrategicamente sobre os discursos dominantes, conferir visibilidade para os problemas de gênero, sendo a descoberta do universo político, por meio das lutas pelo direito de voto, o ponto de mutação capaz de gerar esse processo de abertura lingüística de possibilidades para a atuação feminina.

Tal processo, saliente-se, continua em desenvolvimento nos dias atuais, não se considerando aqui que a luta feminina acabou com a vitória no debate sufragista, ou que a mulher ocupa plano de igualdade de oportunidades sociais com os homens. Ao revés, considera-se tal ponto na história apenas como um impulsionador de uma série de mudanças desenvolvidas até hoje e capazes de garantir à mulher o seu espaço atual na sociedade brasileira. Esse espaço ainda é pequeno se comparado com o ocupado pelos homens, mas é enorme quando relacionado a momentos históricos passados. Enfim, ainda há muito a ser feito no que diz respeito ao debate de gênero, mas o primeiro passo já foi há muito tempo dado, abrindo os caminhos para o surgimento da nova mulher brasileira.


4. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.

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VEIGA, Gláucio. História das idéias da Faculdade de Direito do Recife. vol. IV. Recife: Universitária, 1984.


Notas

[1] BALLWEG, O.. Retórica analítica e direito. In: Revista Brasileira de Filosofia, São Paulo, IBF, Vol XXXIX, fascículo 163, p. jul.-set., 1991, p. 175-184.

[2] ADEODATO, João M.. A Retórica Constitucional: sobre tolerância, direitos humanos e outros fundamentos éticos do direito positivo. São Paulo: Saraiva, 2009.

[3] HOLANDA, Sérgio B. et al.. História Geral da Civilização Brasileira: o Brasil monárquico. Tomo II. Vol. 3. São Paulo: Difusão Européia do Livro, 1967, p.298.

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[4] NASCIMENTO, Cecília Vieira do; OLIVEIRA, Bernardo J.. O Sexo Feminino em campanha pela emancipação da mulher. Cad. Pagu,  Campinas,  n. 29, Dec.  2007 .   Disponível em <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-83332007000200017&lng=en&nrm=iso>. Acesso em  14  Nov.  2009.  doi: 10.1590/S0104-83332007000200017, p.9.

[5] ARAUJO, Rita de Cássia Barbosa de. O voto de saias: a Constituinte de 1934 e a participação das mulheres na política. Estud. av.,  São Paulo,  v. 17,  n. 49, Dec.  2003 .   Disponível em <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-40142003000300009&lng=en&nrm=iso>.Acesso em  31 Out. 2009.  doi: 10.1590/S0103-40142003000300009, p. 8.

[6] VEIGA, Gláucio. A história das idéias da Faculdade de Direito do Recife: período Olinda. Vol. IV. Recife: Universidade Federal de Pernambuco, 1984, p. 117.

[7] ARAUJO, Rita de Cássia Barbosa de. O voto de saias: a Constituinte de 1934 e a participação das mulheres na política. Estud. av.,  São Paulo,  v. 17,  n. 49, Dec.  2003 .   Disponível em <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-40142003000300009&lng=en&nrm=iso>.Acesso em  31 Out. 2009.  doi: 10.1590/S0103-40142003000300009, p. 2.

[8] KOSHIBA, L.; PEREIRA, D. M. F.. História do Brasil. 7ª ed. ver. e ampl.. São Paulo: Atual, 1996, p. 238-240.

[9] ARAUJO, Rita de Cássia Barbosa de. O voto de saias: a Constituinte de 1934 e a participação das mulheres na política. Estud. av.,  São Paulo,  v. 17,  n. 49, Dec.  2003 .   Disponível em <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-40142003000300009&lng=en&nrm=iso>.Acesso em  31 Out. 2009.  doi: 10.1590/S0103-40142003000300009, p. 8.

[10] ALVES, B. M..Ideologia e Feminismo: a luta da mulher pelo voto no Brasil. Petrópolis: Vozes, 1980, p.96.

[11] ALVES, B. M..Ideologia e Feminismo: a luta da mulher pelo voto no Brasil. Petrópolis: Vozes, 1980, p.147.

[12] Idem. Ibidem, p 100.

[13] SEGATTO, J. A. (Coordenador). A Participação da mulher na sociedade brasileira. São Paulo, Departamento do Patrimônio Histórico da Prefeitura Municipal, 1987, p. 11-13.

[14] ALVES, B. M..Ideologia e Feminismo: a luta da mulher pelo voto no Brasil. Petrópolis: Vozes, 1980, p 116.

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Sobre a autora
Laila Iafah Goes Barreto

Advogada. Graduada em Direito pela Faculdade de Direito do Recife - UFPE. Mestranda vinculada ao Programa de Pós-Graduação em Direito da UFPE. Bolsista CAPES e, na graduação, bolsista da Fundação Baden Württemberg (durante o intercâmbio de 1 ano na Alemanha)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

BARRETO, Laila Iafah Goes. O direito de voto como marco da penetração feminina na esfera pública e seus reflexos na retórica social de estruturação do poder. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 4063, 16 ago. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/31008. Acesso em: 19 abr. 2024.

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