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A qualidade da educação fundamental da rede municipal de Ilhéus (BA) aferida a partir da infraestrutura de seus prédios escolares no período de 2010-2012.

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25/03/2015 às 07:41
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3 DA INFRAESTRUTURA COMO COMPONENTE DA QUALIDADE DA EDUCAÇÃO

3.1 Análise histórica da qualidade da educação sob os viés subjetivo, curricular e de infraestrutura

A qualidade da infraestrutura, incluindo os equipamentos e materiais didáticos adequados para apresentação e reforço de conteúdo das aulas afeta o rendimento escolar (ALBERNAZ; FERREIRA; FRANCO, 2001, p. 4) . Entretanto, existem poucos estudos sobre o peso da infraestrutura sobre o desempenho escolar, especialmente para verificar o peso de cada um de seus componentes, como tamanho de sala de aula e existência de laboratórios ou até para verificar a influência de situações aparentemente simples, como sala arejada e silenciosa e seu grau de impacto nas atividades do professor e do aluno (ALBERNAZ; FERREIRA; FRANCO, 2001, p. 19).

Não obstante, já se aponta para a falta de relação linear entre infraestrutura e aprendizado, ou seja, para além de determinado patamar, as melhorias na infraestrutura parecem não trazer impacto tão significativo (PARA MELHORAR A APRENDIZAGEM, [201?], n.p). Os investimentos em infraestrutura trazem mais resultados ao desempenho dos alunos quando modificam espaços precários do que quando esses investimentos ocorrem em escolas em que a oferta de espaço e equipamentos é satisfatória, tomando-se como referencial, aqui, os insumos listados na Resolução nº 08/2010 do Conselho Nacional de Educação (BRASIL, 2010c) ou a classificação de infraestrutura adequada, apontada no estudo “Uma escala para medir a infraestrutura escolar” (SOARES et al, 2013, p.90).

Em compensação, como o uso dos recursos humanos é intenso na área da educação, como espécie do gênero serviço social (BARROS, [201?], n.p), os estudos sobre o papel do professor são mais numerosos. A própria história da educação vem frequentemente relatada sob o foco subjetivo, centrada na figura do professor.

Tanto é assim que as teorias da educação tradicionais reportaram-se, durante muito tempo, à consideração do professor como centro dos interesses. Ao professor, como especialista, incumbia transmitir os conteúdos, enquanto aos alunos, exercerem o papel de receptores passivos do conhecimento. Nessa tendência pedagógica, questionava-se “como ensinar” (SAVIANI, 2008, p. 81), interessando os métodos de ensino. Foi preponderante até o final do século XIX.

Como comenta Júlio Moreira dos Santos Neto (2013, n.p):

Essa abordagem denota uma visão individualista do processo educativo e do caráter cumulativo do conhecimento. O ensino é caracterizado pelo verbalismo do professor e pela memorização do aluno. Sua didática pode ser resumida em “dar a lição” e “tomar a lição”, e a avaliação consiste fundamentalmente em verificar a exatidão da reprodução do conteúdo comunicado em aula.

Do início do século XX até pelo menos o início de sua segunda metade, ainda sob o enfoque subjetivo, a tendência pedagógica dominante foi a de preocupação com a aprendizagem do aluno. Perguntava-se como podia aprender, enfatizando-se as teorias da aprendizagem e não mais do ensino. O destaque passou a ser o aluno. Como esclarece Dermeval Saviani (2008, p. 82):

Pautando-se na centralidade do educando, concebem a escola como um espaço aberto à iniciativa dos alunos, que, interagindo entre si e com o professor, realizam a própria aprendizagem. O eixo do trabalho pedagógico desloca-se, portanto, da compreensão intelectual para a atividade prática, do aspecto lógico ao psicológico, dos conteúdos cognitivos aos métodos ou processos de aprendizagem, do professor para o aluno, do esforço ao interesse, da disciplina à espontaneidade, da quantidade para a qualidade.

Atualmente, a temática prossegue, com novas propostas sendo lançadas pela pedagogia, sobretudo nas últimas quatro décadas. Modifica-se, inclusive, o vocabulário relativo à aprendizagem. Ao invés do mestre ou professor, surge o coordenador, facilitador, mediador, com o fito de estimular “a construção conjunta de conhecimentos e o protagonismo dos jovens nessa tarefa” (SIBILIA, Paula, 2012, p. 117).

A Lei nº 9.394/96 (BRASIL, 1996) externa essa mudança, em seu artigo 32, ao enfatizar duplamente a importância da aprendizagem, in verbis:

Art. 32. O ensino fundamental obrigatório, com duração de 9 (nove) anos, gratuito na escola pública, iniciando-se aos 6 (seis) anos de idade, terá por objetivo a formação básica do cidadão, mediante: (Redação dada pela Lei nº 11.274, de 2006

I - o desenvolvimento da capacidade de aprender, tendo como meios básicos o pleno domínio da leitura, da escrita e do cálculo;

II - a compreensão do ambiente natural e social, do sistema político, da tecnologia, das artes e dos valores em que se fundamenta a sociedade;

III - o desenvolvimento da capacidade de aprendizagem, tendo em vista a aquisição de conhecimentos e habilidades e a formação de atitudes e valores;

IV - o fortalecimento dos vínculos de família, dos laços de solidariedade humana e de tolerância recíproca em que se assenta a vida social. (grifos não originais)

Dessa forma, verifica-se que o modo de ensinar ou de aprender sobressaiu-se em relação ao local do aprendizado e suas condições. O local (locus) oficial do aprendizado é elemento relegado a segundo plano, inclusive na legislação. Vale observar que a Lei nº 9.394/96 (BRASIL, 1996) nem menciona a palavra estrutura quando se refere à educação básica, fazendo-o somente em relação à educação superior, no caput do artigo 54, podendo tanto significar estrutura física e, neste caso, com o mesmo significado de infraestrutura empregado neste trabalho, como também estrutura organizacional humana, quando, então, não estaria relacionada aos objetivos propostos neste estudo.

Na leitura restante da Lei de Diretrizes e Bases da Educação (BRASIL, 1996), tem-se que forçar o espírito interpretativo para apontar que esse diploma legal se refere às condições estruturais dos estabelecimentos de ensino no artigo 67, inciso VI , quando menciona que a valorização dos profissionais da educação dá-se, também, pela oferta de condições de trabalho.

Por outro lado, se coloca como despesa de manutenção e de ensino a aquisição, manutenção, construção e conservação de instalações e equipamentos necessários ao ensino (artigo 70, incisos II e III), faz a menção sem qualquer aprofundamento. Em seu artigo 25, parágrafo único, a Lei nº 9.394/96 (BRASIL, 1996) poderia ter introduzido elementos subjetivos ou objetivos do tipo normativo que garantissem um referencial sobre espaços adequados de aprendizado; ao contrário, flexibilizou adaptações “às condições materiais do estabelecimento”, que podem ser, assim, satisfatórias ou não. Não sendo, procedem-se às adaptações quanto ao número de alunos, não desatendendo, desse modo, ao comando legal.

Pode-se igualmente mencionar que quando a história da educação é contada sob o prisma do conteúdo ministrado, nem assim é feito maior detalhamento sobre a infraestrutura dos estabelecimentos escolares. Por exemplo, quando são analisados os conteúdos transmitidos aos alunos pelos jesuítas, notadamente os da Companhia de Jesus, com ensino com característica conservadora, sem qualquer

menção às salas de aula, assim descreve a historiadora Maria Lúcia de Arruda Aranha (2006, p. 164):

“Centrada no nível secundário, a educação visava a formação humanística, privilegiando o estudo do latim, dos clássicos e da religião. Não faziam parte do currículo escolar as ciências físicas ou naturais, bem como a técnica ou as artes. (...) Era literária, abstrata- além de dogmática- , afastada dos interesses materiais, utilitários, e até estranha, por tentar trazer o espírito europeu urbano para um ambiente agreste e rural”.

Outra situação exemplificativa ocorre quando os conteúdos são tratados por prisma mais político ou ideológico, apresentados como mecanismos de exclusão de alunos oriundos de classes populares. Sob esse prisma, a serventia dos conteúdos, é indicada como forma de homogeneizar as práticas, violar ou ignorar a realidade sociocultural, tentando conformar o aluno a outra dada realidade, diversa de sua origem. Quando este não alcançasse a compreensão, ainda receberia a culpa do insucesso, por sua falta de cultura ou nível de socialização (SILVA, 2010, p. 2.880).

Ou o preocupante enfoque aportado por Paula Sibilia (2012), sobre a substituição do saber, que outrora exigia memorização e introspecção, pelo atual quantitativo de informação, que requer velocidade, domínio de tecnologias e opera por mecanismos de reduzida absorção, até mesmo de excesso de dispersão, para possibilitar a execução de multitarefas. O choque entre o ensino tradicional, marcado pela disciplina, esta reforçada por outras instituições, como Igreja, Exército, família e fábricas, batizadas por Michel Foucault (apud SIBILIA, 2012, p. 43) como “instituições de confinamento” bem assim pela crença na lei abstrata, e as subjetividades dos alunos contemporâneos, levam a questionar a escola enquanto sua atualidade. Comenta a autora que se a escola se instaurou sobre a égide da cultura letrada, atualmente padece diante do fascínio da sociedade aos “sedutores feitiços das imagens” (SIBILIA, 2012, p.63)

Encaixa-se nesta visão a colocação de Dermeval Saviani (2008, p. 158) , quando tece comparativos entre as influências pedagógicas e os livros escolares.

Quando predominava a teoria da pedagogia tradicional, os livros didáticos eram sisudos, constituídos por textos que explicitavam conceitos através de um discurso lógico, dirigindo-se ao intelecto dos alunos e solicitando a sua capacidade de memorização. Quando passa a predominar a influência da pedagogia nova, os livros didáticos tornam-se coloridos, cheios de ilustrações, com sugestões de atividades, de trabalho em grupo, multiplicando os estímulos à capacidade de iniciativa dos alunos. E, quando se dissemina a influência da pedagogia tecnicista, começam a surgir livros didáticos com testes de múltipla escolha ou na forma de instrução programada, em suma, os chamados livros descartáveis.

No mesmo sentido, Gilberto Luiz Alves (2007, p. 258), quando ressalta a utilização de obras clássicas do pensamento antigo, para o ensino na sociedade escravista, e do pensamento medieval, para o ensino na sociedade feudal.Para o autor, a obra clássica foi excluída do trabalho didático na era moderna, com a adoção do manual didático, como novo recurso didático, que se propunha a resumir o conhecimento de gerações anteriores.

Fica perceptível que as modificações relatadas pouca alusão fazem à infraestrutura das escolas. As teorias sobre ensino-aprendizagem e seus conteúdos, nos enfoques referidos, são tecidas independentemente da análise do local de sua realização.

Assim, embora sejam apontadas a influência da imagem e da velocidade da informação como situações que colocam em xeque a própria escola, que estaria com o mesmo perfil que tinha na Idade Moderna, por vezes a permanência nesse estágio não decorre de deliberação da escola, por querer ser mais ou menos tradicional. Decorre de deficiência material e financeira, pois muitas escolas não contam com laboratórios de informática, tampouco bibliotecas. É importante referir que apenas 14,9% das escolas brasileiras têm infraestrutura adequada, que inclua, entre outros itens, biblioteca, laboratório de informática e acesso à internet, enquanto tão somente 0,6% das escolas têm infraestrutura avançada, que implica a presença dos equipamentos do nível anterior, mais laboratório de ciências e dependências adequadas para atender a estudantes com necessidades básicas (SOARES et al, 2013, p.90).

Com isto, dificilmente o preparo dos alunos para a seleção e crítica de informações, transmitidas com velocidade não praticadas em outros períodos, aprendizagem que se mostraria significativa para a realização do objetivo previsto no artigo 2º da Lei nº 9.394/96 (BRASIL,1996), de preparação para o trabalho e cidadania, poderá ser efetivado a contento, por exigirem o manuseio de equipamentos de informática e de material de leitura e estudo inexistentes naquelas instituições.

Desse modo, embora a infraestrutura dos prédios escolares não seja muito relatada na literatura específica de pedagogia ou de história da educação, muito menos em doutrina jurídica, é certo que sempre esteve presente ao tempo dessas alterações históricas de sujeitos e de conteúdo , apesar de ocupar condição mais figurativa ou de segundo plano.

Exceções podem ser observadas nas referências às escolas de improviso, em prédios utilizados para aplicação do método Lancaster ou nas megaconstruções que acompanharam determinados gestores públicos, as quais serão tratadas no próximo tópico.

3.2 A evolução da infraestrutura escolar no tempo

Segundo historiadores, escolas de improviso eram aquelas que funcionavam em igrejas, salas de prefeituras e de lojas maçônicas ou na casa dos professores (ARANHA, 2006, p. 192). Não tinham as condições adequadas e foram providenciadas ante o aumento do corpo discente, a requerer sua colocação em algum espaço.

Tanto que no Editorial de A Província de S. Paulo, de 13 de janeiro de 1876, segundo Maria Lucia Hilsdorf (apud ARANHA, 2006, p. 232), constou o seguinte:

“Como o professor é pobre e escasso o ordenado, instala a escola numa saleta qualquer, contanto que seja barata e lhe não absorva o ordenado. A título de mobília procura dois ou três bancos de pau, uma cadeira para si, uma mesa ao menos possa encostar os cotovelos e tomar notas, um pote e uma caneca e aí temos armado o alcatifado palacete da instrução. Agrupam-se aí dentro 20, 30 ou 40 crianças, tendo por único horizonte as frestas sombrias de uma rótula e durante quatro ou cinco horas diárias martirizam os ouvidos e as cordas vocais da laringe em insólito berreiro, respirando ar viciado e poeira, arruinando a saúde, cansando a inteligência, matando a vontade de aprender, a natural curiosidade infantil e a paciência (...). O resultado é tornar-se a escola o mau sonho das crianças”.

Outro momento em que a característica das estruturas das escolas é ressaltada, na história da educação consultada, ocorre na apresentação do sistema mútuo ou monitoral, originário da Inglaterra, por aplicação de Bell e Lancaster, em suas respectivas escolas. A divisa de Lancaster (1778-1838) era “Um só mestre para mil alunos”. No ensino mútuo, “o professor não ensina todos os alunos, mas prepara apenas os melhores, que por sua vez atendem grupos de colegas” (ARANHA, 2006 p. 203).

O sistema reunia um grande número de alunos em um galpão, agrupando-os conforme o estágio de leitura, ortografia e aritmética. O método, na Inglaterra, pretendia ampliar a alfabetização em uma sociedade em pleno crescimento industrial. Para a implantação do método, portanto, o espaço físico disponível era fundamental, para possibilitar a “distribuição hierarquizada dos alunos sentados em bancos dispostos num salão único e bem amplo” (SAVIANI, 2008, p. 190).

Como explica Maria Lúcia de Arruda Aranha (2006, p. 203), a preparação às aulas do grande grupo era feita pelo professor com os alunos mais adiantados. Estes tinham entre dez ou doze anos de idade e estavam encarregados de atuar como monitores dos próprios colegas, repassando aos diversos grupos, concentrados no mesmo espaço físico, os conteúdos que tinham aprendido, mesmo que sem muita profundidade. Não havia necessidade de sequência conjunta das disciplinas, pois um aluno podia estar mais adiantado em uma ou em outra. À medida que cumprisse uma etapa, era transferido para o grupo de grau mais elevado e assim por diante.

Eram necessários rigorosa disciplina, organização e falar em voz baixa. O professor ficava do alto de um estrado ou sentado em uma cadeira alta(SAVIANI, 2008, p.190), acompanhando o trabalho dos monitores, com interferências eventuais. Em caso de indisciplina, usava um apito para chamar a atenção. Cartazes espalhados indicavam a sequência dos trabalhos, a ser cumprida por todos de um mesmo grupo, ao mesmo tempo, o que conferiu ao sistema a qualificação de mecânico, tornando-o alvo de críticas. “Era um sistema militar, que levava a agir mediante ordens e a submeter-se a condicionamentos”, como criticou a professora Maria Helena Camara Bastos (apud ARANHA, 2006, p. 203).

Por ser um método barato e que impunha disciplina rígida (ARANHA, 2006, p. 2003), foi replicado em outros países, como França e Estados Unidos. Encontrou acolhida entre intelectuais e políticos no Brasil, que divulgavam suas vantagens, dentre elas, a possibilidade de generalização da educação para um grande número de alunos. Sustentavam que outro método de ensino, mais individualizado, tornava a escola dispendiosa e pouco eficiente (FARIA FILHO; VIDAL, 2000, p. 20).

A “propaganda em torno da superioridade do método mútuo foi intensa” (FARIA FILHO, VIDAL, 2000, p. 22), culminando com sua adoção, no Brasil, durante o período monárquico, através da Lei do Império s/nº, de 1827 (BRASIL, 1827), até aproximadamente o ano de 1854, com prédios diferenciados conforme o sexo dos alunos, como demonstram os artigos abaixo transcritos:

Art. 4º As escolas serão do ensino mútuo nas capitais das províncias; e serão também nas cidades, vilas e lugares populosos delas, em que for possível estabelecerem-se.

Art. 5º Para as escolas do ensino mútuo se aplicarão os edifícios, que couberem com a suficiência nos lugares delas, arranjando-se com os utensílios necessários à custa da Fazenda Pública e os Professores que não tiverem a necessária instrução deste ensino, irão instruir-se em curto prazo e à custa dos seus ordenados nas escolas das capitais.

Art. 6º Os professores ensinarão a ler, escrever, as quatro operações de aritmética, prática de quebrados, decimais e proporções, as noções mais gerais de geometria prática, a gramática de língua nacional, e os princípios de moral cristã e da doutrina da religião católica e apostólica romana, proporcionados à compreensão dos meninos; preferindo para as leituras a Constituição do Império e a História do Brasil.

Art. 11. Haverão escolas de meninas nas cidades e vilas mais populosas, em que os Presidentes em Conselho, julgarem necessário este estabelecimento.

Art. 15. Estas escolas serão regidas pelos estatutos atuais se não se opuserem a presente lei; os castigos serão os praticados pelo método Lancaster.

A adoção do método mútuo possibilitou a discussão em torno do espaço para abrigar a escola pública primária. Afinal, não podia ser aplicado em qualquer espaço físico. Exigia dimensões que comportassem o quantitativo de alunos, bem assim permitissem a mobilidade dos monitores dentro da classe para atendimento dos demais alunos. Exigia construções físicas aptas às inovações pedagógicas, como cartazes e outras peças na parede, como lembram Faria Filho e Vidal (2000, p. 22). O sucesso do método seria possível, teoricamente, desde que o professor contasse com espaço e materiais adequados.

Todavia, a aplicação não foi exitosa no Brasil. O insucesso do método deveu-se a várias causas, inclusive relacionadas à própria infraestrutura escolar, como lista a professora Maria Lúcia de Arruda Aranha (2006, p. 223):

“a necessidade de salas bem amplas para abrigar grande número de alunos certamente não foi contemplada, porque os prédios usados, sempre de improviso, não eram apropriados. Faltava, ainda, material adequado, como bancos, quadros, fichas, sinetas, compêndios, etc.

No mesmo sentido apontam Faria Filho e Diana Vidal (2000, p. 23), esclarecendo que o propalado menor custo do método não se confirmou, na prática, notadamente em face do mobiliário e demais materiais exigidos para o controle da disciplina que deviam ser adquiridos. A situação foi agravada pelo afastamento do governo central da escola elementar e secundária, deixada a cargo das Províncias, apartir do Ato Adicional de 12 de março de 1840 (BRASIL, 1840), as quais não contavam com maiores recursos para a educação. Com isto, houve o declínio do método, por volta de 1840, com o retorno ao ensino individual.

Na segunda metade do século XIX, muitas foram as críticas sobre a precariedade das instalações de ensino oferecidas aos estudantes. Retoma-se a discussão sobre a adequação dos prédios que serviriam como escolas, inclusive sob o ponto de vista sanitário, para permitir o respeito aos “ditames higiênicos” do fim daquele século (ARANHA, 2006, p. 298; FARIA FILHO; VIDAL, 2000, p. 23).

Sucedeu ao método Lancaster, então, o método intuitivo, também conhecido como lições de coisas, porque pregava que o ensino devia partir de uma percepção sensível, oferecendo aos alunos dados para observação e percepção. Foi facilitado pela revolução industrial, que produziu novos materiais didáticos, os quais passaram a ser objeto de exposições universais. Entre os materiais que permitiam a ilustração das aulas, mencionam-se o quadro negro parietal (próprio para ser pendurado em parede), aritmômetros fracionários (máquinas de calcular) caixas com pedras, metais, gravuras, etc. (SAVIANI, 2008, p. 93/94). Para Gilberto Luiz Alves (2007, p. 257), o quadro-negro, surgido no início do século XIX, “respondeu à necessidade histórica de uma forma de ensino dirigida a um coletivo de estudantes”.

Os defensores do método intuitivo defendiam a construção de escolas, já que “não era mais possível ficar adaptando os espaços”, sob pena de não extrair do “arsenal inovador de materiais didático-pedagógicos” todos os reais benefícios para a instrução. Às suas vozes somavam-se os higienistas, que criticavam as péssimas condições das escolas, desde a falta de espaço até a falta de “materiais higienicamente concebidos”, apontando seus efeitos negativos sobre a saúde dos alunos (FARIA FILHO; VIDAL, 2000, p. 24).

Após a proclamação da República, começaram as construções dos “grupos escolares” (ARANHA, 2006, p. 224), próprios também para o desenvolvimento de um modelo de escolarização baseado na escola seriada. A seriação representava o esforço de implantação de ordem e disciplina, favorecia a introdução do método intuitivo e a disseminação da ideologia republicana (ARANHA, 2006, p. 298).

Em função da seriação do ensino, o tamanho das salas podia variar, com salas maiores destinadas às turmas iniciais do curso primário (FARIA FILHO;VIDAL, 2000, p. 25). No ensino secundário, a seriação foi introduzida pelo Decreto nº. 16.782 A, de 13 de Janeiro de 1925, pela Reforma João Luiz Alves, que previu a frequência obrigatória e a expansão dos estabelecimentos desse nível de ensino (MARCHAND, 2007, p. 85).

Os grupos escolares, além de comportarem a seriação, foram construídos em busca proposital de monumentalidade. Segundo Silvia Wolff (apud FARIA FILHO; VIDAL, 2000, p. 24), objetiva-se fossem percebidos e identificados como espaços de esfera governamental, que divulgassem a estabilidade e a nobreza das administrações.

A propósito, pertinente colacionar a descrição trazida por Faria Filho e Diana Vidal (2000, p. 25) sobre a formatação física dos grupos escolares:

Monumentais, os grupos escolares, na sua maioria, eram construídos a partir de plantas-tipo em função do número de alunos, em geral 4, 8 ou 10 classes, em um ou dois pavimentos, com nichos previstos para biblioteca escolar, museu escolar, sala de professores e administração. Edificados simetricamente em torno de um pátio central ofereciam espaços distintos para o ensino de meninas e de meninas. À visão formal da planta, às vezes,era acrescido um muro, afastando rigidamente e evitando a comunicação entre os dois lados da escola. Esses prédios tinham entradas laterais diferentes para os sexos. Apesar de padronizados em planta, os edifícios assumiam características diversas, sendo-lhes alteradas as fachadas.

Cabe destacar, por outro lado, com base em Diana Vidal e Faria Filho (2005, p. 60), que a atribuição do nível de ensino primário às Províncias, desde 1840 (BRASIL, 1840), favoreceu alterações locais e diferenciadas, sem linearidade histórica na construção de grupos escolares nos diversos estados brasileiros, fato que não permite uma análise global das mudanças.

Registra-se, contudo, que Fernando de Azevedo, como Diretor Geral da Instrução Pública do Distrito Federal, então Rio de Janeiro, iniciou a construção de prédios, adotando o estilo neocolonial na fachada, para despertar o sentido de brasilidade, ao retomar estilos arquitetônicos dos antepassados. Os prédios eram caros e representavam a elitização da educação (FARIA FILHO; VIDAL, 2000, p. 29).

Seguiram-se, então, por volta de 1936, a partir de Almeida Jr. em São Paulo, os prédios funcionais, com materiais da região, atendendo ao clima, usos e costumes locais. No Rio de Janeiro, igualmente nos anos 30, Anísio Teixeira trouxe propostas de escolas mais baratas, com adoção de escolas nucleares ou escolas-classes e escolas-parques. Introduziu as escolas do tipo “platoon” (pelotão), que implicava na mobilização dos alunos, em pelotões que se encaminhavam para as salas de aulas, estas fixas, conforme disciplinas a serem cursadas em horários pré-definidos.

Nas primeiras décadas do século XX, a história da educação no Brasil aponta a continuidade das construções de grandes escolas, em termos de espaço físico, com o propósito de atestar o interesse do governo pelo ensino público, como justifica Aranha (2006,p. 298).

Em 1950, na cidade de Salvador (BA), Anísio Teixeira retoma sua proposta de construção da Escola-parque e Escola-classe, o que exigiu estrutura física apropriada. O Centro Popular de Educação Carneiro Ribeiro, mais conhecido como Escola-parque, foi idealizado para o atendimento de quatro mil alunos de forma integral, divididos entre cinco prédios, quatro destinados a serem Escola-classe para ensino do currículo escolar, e o último (Escola-parque), para as práticas de educação física, atividades sociais e artísticas, cursos profissionalizantes e envolvimento com a comunidade, como explica Maria Lúcia de Arruda Aranha (2006, p. 333). Três escolas-classe entraram em funcionamento.

Outra fase de megaconstruções ocorreu no governo de Leonel Brizola a frente do Estado do Rio de Janeiro (1983-1987 e 1991-1994), consubstanciada nos Centros Integrados de Educação Pública (Ciep). O projeto arquitetônico dos prédios coube a Oscar Niemayer. Foram construídos com blocos pré-fabricados e tinham capacidade de abrigar mil crianças, em horário integral, de dois turnos. A infraestrutura dos Centros Integrados consistia em bibliotecas, quadras de esporte, refeitório, vestiário, gabinete médico e odontológico.

O primeiro Centro Integrado de Educação Pública (Ciep) foi inaugurado em 1985, provocando aplausos e críticas. A indicação positiva fazia-se em torno da exemplaridade de cada Centro, que deveria funcionar como parâmetro para as demais escolas, bem assim como polo de irradiação de um projeto pedagógico e até como escola de aperfeiçoamento dos professores da rede pública (CAVALIERE, COELHO, 2003, p. 151). As críticas foram tecidas em função das intenções eleitoreiras, já que Darcy Ribeiro, Secretário de Educação daquele governo estadual, almejava o governo do Estado nas eleições de 1986.

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Outros Centros Integrados de Educação Pública (Cieps) foram construídos no segundo mandato de Leonel Brizola no Rio de Janeiro, no período de 1991-1994, quando cumpriu a promessa de construção de quinhentas unidades, efetuada na campanha eleitoral, segundo Lígia Martha Coelho, professora de pós-graduação da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (Unirio) (CHAGAS, 2011).

Porém, algumas unidades foram construídas em cidades de reduzida densidade demográfica e não lograram aprovação local, transformando-se em espaço ocioso. Em outros locais, os Centros Integrados de Educação Pública (Cieps) foram estigmatizados, ao serem associados a internatos, adolescentes infratores e escolas para pobres, visão agravada pela associação com escola “fraca”, por permitir a aprovação automática dos alunos (CAVALIERE; COELHO, 2003, p. 152-153)

Como resume Maria Lúcia de Arruda Aranha (2006, p. 323):

Os prédios, em que pese a notoriedade do arquiteto, tiveram a construção encarecida devido às exigências de adaptá-los aos terrenos. A pressa em concretizar o projeto antes das eleições de 1986 – nas quais Darcy Ribeiro era candidato a governador – trouxe problemas posteriores, como afundamentos, vazamentos, rachaduras e mau isolamento acústico. Embora devessem atender às necessidades das áreas carentes, muitas vezes os prédios eram construídos à margem de rodovias ou em cruzamento que facilitassem sua visibilidade.

Tal assertiva encontrou rebate, inclusive do próprio arquiteto. O uso de blocos pré-fabricados foram idealizados para aliar baixo custo e rápida execução, em média de quatro meses, constituindo uma economia de 30% (trinta por cento) em relação as construções comuns (QUANTO... 2013).

Em Porto Alegre, entre os anos de 1986 a 1989, e no Estado do Rio Grande do Sul, entre os anos de 1991-1994, outros noventa e quatro centros foram erguidos durante a gestão de Alceu Collares, respectivamente, como Prefeito e Governador (COLLARES, 2013). Todavia, o projeto também não teve continuidade. Em 2011, segundo informação da Secretaria de Educação daquele estado, apenas dezesseis unidades prosseguiam com horário integral, proposta maior dos Centros (CHAGAS, 2011). Já no Rio de Janeiro, havia duzentos e noventa e seis (296) Centros em funcionamento, sob a responsabilidade do Estado, mas apenas setenta e seis em regime integral (WERNECK; STURM, 2012).

O governo de Marta Suplicy, como prefeita de São Paulo durante os anos de 2001-2004, também demonstrou atração por projetos arquitetônicos de grande porte, desta feita para abrigar os Centros Educacionais Unificados (CEUs) em diversos bairros da periferia. Pretendia diferenciá-los dos Centros Integrados de Educação Pública do Rio de Janeiro pela sua continuidade, a ser gerada pelo cuidado que receberia da comunidade, inclusive mediante a eleição do dirigente escolar de cada unidade, independente da alternância de governo. Foi prevista a construção de vinte e uma (21) escolas dessa concepção (CEUs...2002).

Os Centros Educacionais Unificados inspiraram-se nas propostas dos Centros Integrados de Educação Pública (Cieps) e Centros Integrados de Apoio à Criança (Caics), bem assim da escola-parque de Anísio Teixeira. Não se limitavam aos tradicionais equipamentos educacionais, pois além da creche e escolas de educação fundamental, contavam com teatro, cinema, piscinas, biblioteca, telecentro, que compunham o bloco cultural, quadras e ginásios esportivos, pátio, jardins e playground, como espaços de convivência. Sua inovação foi permitir o aproveitamento desses equipamentos por pessoas da comunidade. Visava-se ao fortalecimento da escola pública articulado com o desenvolvimento da comunidade (CANGUSSU, 2010).

No governo de Fernando Collor de Mello, advieram os Centros de Atenção Integral à Criança e ao Adolescente (Ciacs). Foram construções padronizadas, feitas pelo Governo Federal, em terreno providenciado pelo município. Destinavam-se à educação integral do aluno, tendo perfil mais assistencialista do que educacional, para fins de execução do Projeto Minha Gente. A intenção do governo era criar cinco mil escolas, compostas por creches, pré-escolas e ensino primário em tempo ampliado pelo território brasileiro. Com a saída de Fernando Collor de Mello da Presidência da República, em 1993, e a assunção de Itamar Franco, passaram a denominar-se Centros Integrados de Apoio à Criança (Caics) (COUTINHO, 2013,p.6 ; SANTOS; ARRUDA, 2013, p.6).

As críticas feitas a essas megaconstruções ocorrem pela sua onerosidade, por não atenderem a totalidade dos alunos (ARANHA, 2006, p. 323) e pela falta de continuidade do projeto, com mudanças de governo. Como aponta Luiz Antonio Cunha (1996, p. 64), há uma “administração zigue-zague”. A cada quatro anos ou até mais rápido, quando não permanecem no cargo até o final do mandato do governador ou do prefeito, cada secretário de educação altera o tipo de arquitetura escolar e as prioridades na área educacional.

Esse comportamento evidencia descontinuidade das políticas, desarticulação da gestão federativa e falta de planejamento nacional e integrado, indicado na Resolução nº 4/2010 do Conselho Nacional de Educação (BRASIL,2010a), em seu artigo 7º, caput, deixando distante a pretensão de projeto de educação nacional, para ceder a “influências de políticas acidentais” (O PAIZ, apud VIDAL, FARIA FILHO, 2005, p. 28) . Acarreta efeitos negativos, por gerar apatia e indiferença da escolas na recepção das políticas cíclicas do Ministério da Educação ou de instâncias de poder educacionais da esfera municipal e estadual, por saberem que a duração da proposta estará vinculada à duração do governo, bastando a assunção de novo administrador para desestruturar tudo o que foi erguido na gestão anterior (ESQUINSANI, 2009, p. 83).

Indispensável referir que a infraestrutura dos prédios escolares pode reproduzir mecanismos de diferenciação e exclusão social, justificando seu estudo com mais profundidade. Além disto, como coloca Maria Lúcia de Arruda Aranha (2006, p. 347), a escola para todos, universal, gratuita, democrática e de qualidade,deve ser instituída, “sem sucumbir à tentação da monumentalidade”. Não é o grande prédio que importa, mas “a rede escolar suprida com bibliotecas, obras de referência, instalações adequadas, condições reais de reuniões educacionais e pedagógicas.”

Por outro lado, ainda que os Centros Integrados de Educação Pública (Cieps), Centros Integrados de Apoio à Criança (Caics) e Centros Educacionais Unificados (CEUs) possam ter sido construções majestosas, marcam momento histórico de preocupação com a visibilidade dos prédios escolares e sua funcionalidade. São iniciativas que volta e meia são reproduzidas em outras gestões, com outros nomes (MELO, 2013, n.p ; DILMA...,2013, n.p)

Excepcionada por essas fases emblemáticas, no restante, porém, a infraestrutura da escola pública é apontada como deficitária ao longo da história da educação. No governo militar, no período de 1964-1985, quando ocorreu a expansão quantitativa da rede, esteve desacompanhada de investimentos em outros elementos relevantes para a qualidade da educação, posto que indispensáveis para a aprendizagem. Ao ponto da escola pública da época ser apontada, por Marisa Bittar e Mariluce Bittar (2012, p.163, 164), como escola das camadas populares. Como sustentam as autoras,a expansão física das escolas foi uma característica dos 21 anos de ditadura. Mas que escola era essa? Sem dúvida, a das crianças das camadas populares; a escola em que funcionava o turno intermediário, com pouco mais de três horas de permanência na sala de aula, mal aparelhada, mal mobiliada, sem biblioteca, precariamente construída, aquela em que os professores recebiam salários cada vez mais incompatíveis com a sua jornada de trabalho e com a sua titulação.

Esse descuido histórico com os prédios escolares, envolvendo limpeza, acessibilidade, estrutura, segurança e conforto, entre outros itens que deveriam ser colocados à disposição daqueles, é relatado por Marcelo Lima de Oliveira e Hugo Costa Pessoa (2013, p. 626), que apontam que essa má qualidade decorre “da ineficiência de gestão, de desvio de recursos e do elevado índice de corrupção verificado na aplicação dos recursos destinados à educação.”

É certo que o Plano Trienal de Educação de 1963-1965 (BRASIL, 1963), previu a construção, em três anos, de escolas integradas (uma para cada grupo de duzentas crianças não escolarizadas ou escolarizadas com deficiência), e grupos escolares (um para cada grupo de 400 a 900 crianças) cada qual com salas de aula equipadas, além de Centros de Educação em tempo integral, reunindo escolas-classe e escolas-parque. Previu, igualmente, a entrega de recursos financeiros para as redes estaduais para a conservação dos prédios escolares, mediante convênios, aquisição de material didático e de consumo e reequipamento das 51.674 salas de aulas previstas para o então ensino primário. Em relação ao ensino médio, previu a construção de ginásios e a expansão da rede de colégios. Todavia, sobreveio o regime militar, em 1964, modificando a implementação dessas ações, inclusive com revisão do plano (MARTINS, 2013, p. 512).

Em 1968, com o Programa Estratégico de Desenvolvimento na Área da Educação, volta-se a mencionar a ampliação da rede escolar, por construção ou reforma (BRASIL, 1968). Com o I Plano Setorial de Educação e Cultura (BRASIL, 1973), foi prevista a construção de escolas polivalentes e estabelecimentos de ensino técnico, com apontamentos à inadequação das construções escolares e inexistência de especificações educacionais para elas e para os equipamentos escolares, do nível primário, insuficiência da rede escolar de ensino médio, em equipamentos e instalações, absorvendo somente 20% (vinte por cento) da faixa etária; estruturas deficientes para a obtenção de maior rentabilidade ao ensino superior e falta de instalação e equipamentos para o ensino e a pesquisa.

O projeto do Plano Nacional de Educação para 2011-2020 (BRASIL, 2012), em discussão no Senado Federal, remete a padrões mínimos de funcionamento de escolas, com garantia de existência nas escolas de água tratada, saneamento, energia, acesso à internet, biblioteca, espaço para a prática desportiva, laboratórios, acesso a bens culturais e arte (MARTINS, 2013, p. 534). O Parecer nº 7/2010 do Conselho Nacional de Educação (BRASIL, 2010, p. 21) fala, inclusive, de infraestrutura tecnológica, como apoio às atividades escolares, assim compreendido o acesso ao rádio, televisão e internet aberta, além da referida biblioteca.

Assim, calham as palavras de Nina Beatriz Ranieri (2000, p. 77), para quem “planos educacionais não têm faltado no Brasil e nem por isso as metas propostas foram alcançadas”. De qualquer sorte, a sua inclusão na Constituição Federal, se asseguradas as condições de exequibilidade, poderá imprimir-lhe um novo padrão de efetividade, complementa.

Importante referir, do mesmo modo, que os padrões mínimos nacionais de infraestrutura para a educação infantil e para o ensino fundamental deveriam ter sido elaborados no prazo de um ano, a partir do anterior Plano Nacional de Educação (PNE), que esteve vigente entre 2001-2010. Esse prazo encerrou-se em 2002, conforme dispôs o Anexo da Lei nº 10.172/2001 (BRASIL, 2001) , ao tratar dos objetivos e metas para esses níveis de ensino. Consta do texto legal o seguinte:

1.3 Objetivos e Metas

2. Elaborar, no prazo de um ano, padrões mínimos de infra-estrutura para o funcionamento adequado das instituições de educação infantil (creches e pré-escolas) públicas e privadas, que, respeitando as diversidades regionais, assegurem o atendimento das características das distintas faixas etárias e das necessidades do processo educativo quanto a:

2.3 Objetivos e Metas (...)

4. Elaborar, no prazo de um ano, padrões mínimos nacionais de infra-estrutura para o ensino fundamental, compatíveis com o tamanho dos estabelecimentos e com as realidades regionais, incluindo: (...)

5. A partir do segundo ano da vigência deste plano, somente autorizar a construção e funcionamento de escolas que atendam aos requisitos de infra-estrutura definidos. (grifos não originais)

Para a educação infantil, os parâmetros infraestruturais mínimos foram publicados em 2005, concedendo-se o prazo para funcionamento ou construção sem sua observância de cinco anos, após o qual deveriam estar implantados (BRASIL, 2006a). Já o padrão mínimo de infraestrutura para a educação fundamental, conforme previsão do anterior Plano Nacional de Educação (BRASIL, 2001), deveria pronunciar-se sobre os seguintes itens: a) espaço, iluminação, insolação, ventilação, água potável, rede elétrica, segurança e temperatura ambiente; b) instalações sanitárias e para higiene; c) espaços para esporte, recreação, biblioteca e serviço de merenda escolar; adaptação dos edifícios escolares para o atendimento dos alunos portadores de necessidades especiais. Advieram orientações quanto ao ambiente físico relacionado com o programa federal denominado Fundo de Desenvolvimento da Escola (FUNDESCOLA), restrito, portanto, às escolas públicas de ensino fundamental do Norte, Nordeste e Centro-Oeste (MORAES, 2002, p.6; OLIVEIRA; FONSECA; TOSCHI, 2005, p. 128).

Bom recordar que o Plano Nacional foi previsto, pelo constituinte originário, com duração plurianual. Por força da Emenda Constitucional nº 59/2009 (BRASIL, 2009), a duração foi estendida de quatro para dez anos. Contudo, mesmo com duração assim ampliada, o plano decenal perdeu sua vigência e a elaboração dos padrões mínimos não foi totalmente concretizada, tampouco foi finalizada a redação do novo plano para o decêndio subsequente, que já se esgota.

Sendo o objetivo do Plano a melhoria da qualidade de ensino em todos os níveis, conforme previsto no artigo 214, inciso III, da Constituição Federal (BRASIL, 1988), perdeu-se, na última década, a oportunidade de arrolar componentes concretos e aferíveis da qualidade da educação, que facilitariam a exigibilidade desse padrão em juízo. No ritmo de tramitação atual para a aprovação do novo plano, corre-se o risco de repetir o vácuo normativo. Nestas circunstâncias, pouco resolve ter o título de único país do Mercado Comum do Sul (Mercosul) que conta com a previsão de Plano Nacional de Educação em sua Carta Magna (BABINSKI, 2010, p. 36).

3.3 A melhoria da infraestrutura escolar como condição para acesso e permanência

Apresentando a questão sob outro prisma, assevera-se a insuficiência da garantia do direito à educação, por si só, posto que “o brilho e a positividade ficam mais no discurso dos intelectuais e nas proclamações dos textos legais, do que nas realizações práticas”, propriamente (CASTANHO, 2007, p. 43). Como sustenta Rogério Silva (p. 2795), apesar de robusto o suporte legislativo, a efetividade do direito à educação demanda políticas públicas estatais, em parceria com iniciativas coerentes da sociedade civil. No mesmo sentido Sousa (2010,p. 30), para quem a efetividade do direito à educação depende da adoção de ações paralelas que “permitam à sociedade as condições de chegar até a escola e manter-se nela, bem como a asseguração de sua qualidade pelo Estado.”

Uma destas ações é a melhoria da infraestrutura da rede escolar, já que tanto o acesso como a permanência na escola passam pela revisão da estrutura física de tais estabelecimentos. Assegurar o acesso na educação básica depende da expansão da rede física de ensino e da instituição da obrigatoriedade de matrícula. Já a permanência implica, além do controle da frequência, mudanças qualitativas no interior da própria escola (PEREIRA; TEIXEIRA, 2013, p. 3).

No primeiro aspecto, em tempos de propagada universalização do acesso, verifica-se que atender a contingentes de alunos com direito ao acesso à escola, requer reflexões sobre a construção de prédios escolares, que atendam tanto a padrões mínimos de qualidade, como também ao princípio da eficiência na Administração Pública, conjugado com economicidade.

Sabe-se da existência de inúmeras salas de aulas denominadas “isoladas”, também denominadas escolas unidocentes ou multisseriadas no Parecer nº 23/2007, do Conselho Nacional de Educação, por sua Câmara de Educação Básica (BRASIL, 2007, p. 4), espalhadas pelo território nacional, normalmente pertencentes aos sistemas estaduais e municipais de educação (BARBOSA, 2013). Embora situadas em outras regiões, não estão distantes da descrição dada por Maria Elisabeth Blanck Miguel (2007, p. 33) a respeito das classes multisseriadas do Paraná, antes de 1996, que ora se transcreve:

(…) a maioria das escolas oferecia o ensino multisseriado : consistindo de várias turmas em uma única sala de aula com uma professora, as séries eram divididas por fileiras de alunos de acordo com o grau de aprendizagem e o quadro negro era dividido em partes; essas escolas situavam-se em localidades distantes da sede do município.

O arquétipo de salas isoladas deveria implicar a presença mínima de professor e merendeira, por vezes de auxiliar de serviços gerais, o que ocasionaria possível impacto na folha de pagamento. Nesses moldes, não haveria economicidade.

Mas não é isto que normalmente ocorre. Estudos e relatos indicam o trabalho único do professor cumulando funções, inclusive administrativas (FAGUNDES; MARTINI, 2003, p. 114), sem que isso represente aumento salarial. No máximo, há gratificação por exercício de atividade em classe multisseriada, sem recompensa pecuniária, no entanto, pelas demais funções, como já proferiu o Tribunal Superior do Trabalho em um de seus julgados (BRASIL, 2009), até mesmo porque vedada essa acumulação, nos termos do artigo 37, inciso XVI, da Constituição Federal (BRASIL, 1988). Como coloca Maria Marta Lopes Flores (2013), “a escola rural isolada economiza o dinheiro público em vários momentos: primeiro, economiza na dupla exploração do professor, que além de mal remunerado é professor, faxineiro, diretor, coordenador, cozinheiro e secretário”.

Contudo, há outras despesas a serem consideradas, como casa de apoio para o profissional, as dificuldades deste de afastamento da classe, o que normalmente acarreta a dispensa dos alunos das aulas, pela falta de substituto (FLORES, 2013), o custo da distribuição e do transporte da alimentação escolar até as salas isoladas, bem como de pintura, consertos e manutenção dos prédios, dispersos geograficamente.

A propósito, estudos demonstram que os custos de implantação e de manutenção são equivalentes. A distinção reside que os primeiros ocorrem apenas uma vez, com a construção da escola ou sala isolada. Já a manutenção é custo que deve ser programado e atualizado anualmente. Assim sendo, se manter uma escola pode ser tão dispendioso quanto construí-la (GOMES, 2009), melhor que essa despesa seja efetuada em estabelecimentos condignos.

Dessa forma, as salas isoladas atendem ao requisito de proximidade com a residência do aluno, previsto no artigo 53, inciso V, da Lei nº 8.069/90 (BRASIL, 1990), mas podem não atender ao critério de economicidade. Por esta razão, a viabilidade econômica das salas isoladas não pode ser aferida com consideração exclusiva sobre o quantitativo de servidores empregados.

Além disso, é certo que a infraestrutura de uma ou mais salas não equivale a todos os espaços educativos que um prédio adequadamente projetado poderia conter, como biblioteca, quadra de esporte, entre outros. De mesma forma, a concentração de alunos em prédios maiores poderá significar, também, a presença do diretor e de todo corpo funcional em um só estabelecimento, afetando a própria qualidade pedagógica.

Isto nem sempre ocorre quando há múltiplas e distantes salas, por vezes sem número significativo de alunos, as quais são colocadas sob a responsabilidade de um dirigente escolar sediado em outro espaço escolar e que as visita apenas ocasionalmente. Como registra Denise Guilherme da Silva (2013), as distâncias a serem percorridas por quem deveria “acompanhar, controlar e orientar sua prática” podem condenar o professor ao isolamento.

Em face dessas e de tantas outras dificuldades, inclusive a precariedade física das salas, foi implantado o processo conhecido como nucleação ou nuclearização (MIGUEL, 2007 p. 33). Consiste na criação de escolas-núcleo na própria zona rural, a partir da “aglutinação das tradicionais escolas multisseriadas num mesmo espaço, sob forma de núcleo, onde cada série passa a ser atendida por um professor, dando origem às escolas nucleadas” (FAGUNDES; MARTINI, 2003, p.100).

O agrupamento de várias escolas, “antes isoladas nas propriedades rurais, em um núcleo central”, permite, teoricamente, “fornecer recursos humanos e materiais mais adequados ao ensino-aprendizagem” (SALES, 2013). O Parecer nº 23/2007 da Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação (BRASIL, 2007, p. 4/5), aponta a nucleação como fechamento ou desativação de escolas unidocentes (multisseriadas), seguido pelo transporte dos alunos para escolas maiores, melhor estruturadas e abrangendo ciclo ou ciclos completos, funcionando como núcleo administrativo e pedagógico.

O modelo de nucleação não é novo, tampouco nacional, eis que foi adotado pelo Brasil durante o regime militar, por acordos entre o Ministério da Educação brasileiro com a agência norte-americana United States Agency for International Development (Usaid), que liberava recursos através de empréstimos-projeto, para utilização em áreas específicas, como educação. O primeiro Estado a implantá-lo foi o Paraná, em 1976, seguido de Minas Gerais, em 1983, Goiás, em 1988, e São Paulo, em 1989 (SALES, 2013).

Não obstante as anunciadas vantagens, o fechamento de salas de aula conduz a um previsível “desgaste com a comunidade e lideranças locais, confronto que prefeitos e secretários de educação procuram evitar” (BARBOSA, 2013). É ocasionado pelo sentimento de perda cultural e do ponto de referência, já que a escola funciona como elo de ligação e de confraternização, inclusive em datas comemorativas (FAGUNDES; MARTINI, 2003). É o que se destaca do relato feito por Sales (2013), a partir da experiência local em Patos de Minas (MG):

a escola é entendida como “carro chefe” da comunidade, que é ligada a ela por laços culturais e afetivos. Retirar da comunidade o espaço que proporcionou educação formal para várias gerações por tantos anos, causou indignação em muitas famílias.

O Parecer nº 23/2007 da Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação (BRASIL, 2007) apresenta outros argumentos, aos quais, dada sua importância, passa-se a transcrever:

* as escolas do meio rural, mesmo pequenas, ainda são a única presença do poder público nas comunidades que atendem;

* a presença da escola na comunidade é forte elemento na preservação de valores que mantêm as populações rurais vinculadas aos seus modos de vida e convivência;

* a escola é importante instrumento de mobilização para o diálogo com a realidade e, na medida em que oferece educação – entendida em seu sentido mais amplo – pode aglutinar as ações necessárias ao desenvolvimento rural integrado, trabalhando por um projeto de ser humano vinculado a um projeto de sociedade mais justa e equilibrada;

* o direito à educação somente estará garantido se articulado ao direito à terra, à água, ao saneamento, ao alimento, à permanência no campo, ao trabalho, às diferentes formas de reprodução social da vida, à cultura, aos valores, às identidades e às diversidades das populações do campo;

* a educação, ao desenvolver o complexo processo de formação humana, encontra nas práticas sociais o principal ambiente dos seus aprendizados; ela é mantenedora das raízes e tradições culturais da comunidade; é o lugar das reuniões comunitárias, do encontro dos sujeitos e espaço de socialização pelas festas e comemorações que estimula; muitas pequenas escolas rurais foram construídas com a participação das famílias e da comunidade do seu entorno; e

* a manutenção das escolas no campo, com qualidade, sempre que possível e desejável, é condição para se assegurar a educação como direito de todos e, evidentemente, dever do Estado.

Por fim, já que a comunidade deixará de contar com uma escola próxima, que satisfazia ao critério espacial indicado pela Lei nº 8.069/90 (BRASIL, 1990), haverá, igualmente, de se analisar a incidência ou não de proibição ao retrocesso social. Tal princípio “tem por escopo a vedação da supressão ou da redução de direitos fundamentais sociais, em níveis já alcançados e garantidos aos brasileiros” (FILETI, 2009), impedindo a desconstituição de conquistas já alcançadas. Nesse sentido já sinalizou o Supremo Tribunal Federal (BRASIL, 2011), como verifica-se do excerto a seguir coletado:

(…) A PROIBIÇÃO DO RETROCESSO SOCIAL COMO OBSTÁCULO CONSTITUCIONAL À FRUSTRAÇÃO E AO INADIMPLEMENTO, PELO PODER PÚBLICO, DE DIREITOS PRESTACIONAIS. - O princípio da proibição do retrocesso impede, em tema de direitos fundamentais de caráter social, que sejam desconstituídas as conquistas já alcançadas pelo cidadão ou pela formação social em que ele vive. - A cláusula que veda o retrocesso em matéria de direitos a prestações positivas do Estado (como o direito à educação, o direito à saúde ou o direito à segurança pública, v.g.) traduz, no processo de efetivação desses direitos fundamentais individuais ou coletivos, obstáculo a que os níveis de concretização de tais prerrogativas, uma vez atingidos, venham a ser ulteriormente reduzidos ou suprimidos pelo Estado. Doutrina. Em consequência desse princípio, o Estado, após haver reconhecido os direitos prestacionais, assume o dever não só de torná-los efetivos, mas, também, se obriga, sob pena de transgressão ao texto constitucional, a preservá-los, abstendo-se de frustrar - mediante supressão total ou parcial - os direitos sociais já concretizados. (...)

ARE 639337 AgR, Relator(a): Min. CELSO DE MELLO, Segunda Turma, julgado em 23/08/2011, DJe-177 DIVULG 14-09-2011 PUBLIC 15-09-2011 EMENT VOL-02587-01 PP-00125.

Todavia, o Superior Tribunal de Justiça pronunciou-se em situação concreta, apresentada em Recurso Especial em que o Ministro Humberto Martim atuou como Relator. Nesse julgado, deliberou-se o seguinte:

DIREITOS DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE – ENSINOS FUNDAMENTAL E MÉDIO – INEXISTÊNCIA DE OBRIGATORIEDADE AO MENOR EXIGIR DIREITO SUBJETIVO DE ACESSO AO ENSINO PÚBLICO E GRATUITO PRÓXIMO À ESCOLA – POSSIBILIDADE DE MATRÍCULA EM ESCOLA PÚBLICA EM LOCALIDADE DIVERSA DA SUA RESIDÊNCIA PARA ASSEGURAR O BOM DESENVOLVIMENTO FÍSICO E PSICOLÓGICO DO MENOR E SUA MANUTENÇÃO NA ESCOLA – INEXISTÊNCIA DE CONFRONTO ENTRE INTERESSE PRIVADO E INTERESSE PÚBLICO.

1. O Estado do Paraná não pode alegar violação do direito de acesso ao ensino público e gratuito próximo à residência do estudante, estabelecido no inciso V do art. 53 da Lei n. 8.069/90 (ECA), pois violação do direito não poder ser veiculada pela pessoa que tem o dever de implementa-lo; somente poderá ser alegada, caso queira, por seu titular ou pelo Ministério somente poderá ser alegada, caso queira, por seu titular ou pelo Ministério Público.

2. O direito de acesso a ensino próximo à residência do estudante cede quando confrontado com o direito ao bom desenvolvimento físico e psicológico do menor e a sua manutenção na escola, conforme disposto no caput e no inciso I do art. 53 do ECA.

3. Não se há falar em prevalência, neste caso, do interesse privado sobre o interesse público, uma vez que os direitos estabelecidos no Estatuto da Criança e do Adolescente são exemplos clássicos da doutrina para combater a distinção entre direito público e direito privado. De certo, existem interesses privados que são transfixados pelo interesse público, o que justifica, inclusive, a atuação do Ministério Público como parte ou como fiscal da lei.

Recurso especial improvido. (grifos não originais)

(REsp 1178854/PR, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 09/03/2010, DJe 18/03/2010)

Assim, se houver uma escola-núcleo, com melhores recursos materiais e humanos, que permita aprimorar a qualidade do ensino e da aprendizagem, a determinação legal de proximidade da escola da residência do aluno pode ser relativizada, com base no inciso I do próprio artigo 53 da Lei nº 8.069/90 (BRASIL,1990), que coloca no mesmo patamar tanto o direito de escola próxima ao lugar de morada do aluno como a igualdade de condições de acesso e permanência na escola.

Todavia, mesmo em nome do princípio da economicidade, não pode ser defendido o processo de nucleação extracampo, enquanto mero transporte dos alunos da zona rural para a zona urbana, não recomendado pelo artigo 3º da Resolução nº 2/2008, da Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação (BRASIL, 2008) para a Educação Infantil e os anos iniciais do Ensino Fundamental.

Ao contrário do sentido da nucleação como concentração em polos rurais com melhorias, o mero transporte dos campesinos para a zona urbana pode estimular o êxodo rural, ao deixar de incentivar a permanência do aluno no campo, ou ainda de considerar os valores culturais, artísticos e históricos próprios do contexto social da criança e do adolescente, apresentando uma aparente superioridade da vida urbana sobre a rural, o que feriria o artigo 58 da Lei nº 8.069/90 (BRASIL, 1990). É o que explica Maria Elisabeth Blanck Miguel (2007, p. 33:

(…) houve um transplante do modelo de escola urbana para a zona rural, evidenciado pelo fechamento de muitas das escolas, pela implantação do processo de nuclearização delas, centralizando-as na sede do município, e pelo deslocamento dos alunos para a área mais central da cidade. A história das escolas rurais passou a ser a história das escolas urbanas.

Isto contraria ao próprio sentido da nucleação, que foi pensada para o deslocamento dos alunos para um ponto escolar determinado na própria zona rural, eleito a partir de critérios objetivos, incluindo densidade demográfica, distâncias e tempo de deslocamento, condições de estradas e vias, localização e possibilidades de trabalho pedagógico de qualidade (BRASIL, 2007, p. 11).

Contraria, de igual forma, ao artigo 28 da Lei nº 9.394/96 (BRASIL, 1996), que trata da educação do campo, ao ponto de Carlos da Fonseca Brandão (2010, p. 83/84) afirmar que o ensino rural nos dias de hoje tornou-se residual, diante da preferência de muitos Estados e Municípios pela utilização das verbas da Educação para montagem ou ampliação de sua frota de veículos destinados ao transporte escolar, fazendo com que as crianças do meio rural sejam transportadas para escolas urbanas. Eis o dispositivo legal mencionado:

Art. 28. Na oferta de educação básica para a população rural, os sistemas de ensino promoverão as adaptações necessárias à sua adequação às peculiaridades da vida rural e de cada região, especialmente:

I - conteúdos curriculares e metodologias apropriadas às reais necessidades e interesses dos alunos da zona rural;

II - organização escolar própria, incluindo adequação do calendário escolar às fases do ciclo agrícola e às condições climáticas;

III - adequação à natureza do trabalho na zona rural.

Para a oferta da educação do campo, deveriam ser providenciadas a construção ou ampliação e reformas de determinado espaço físico escolar, situado na zona rural, dotando-o dos materiais e livros didáticos, equipamentos, laboratórios, biblioteca e áreas de lazer e desporto, enfim, da infraestrutura adequada (BRASIL, 2007, p.11), equiparável à infraestrutura escolar existente na cidade.

Nesse polo seriam concentrados os trabalhadores em educação, com investimentos em sua formação pedagógica, inicial e continuada, com assistência permanente por serviços de supervisão (BRASIL, 2007, p. 6) , ao invés de serem enviados para salas isoladas espalhadas, com estrutura precária e deficientemente equipadas. A nucleação das escolas rurais seria uma alternativa financeiramente viável aos cofres públicos, pela economia de recursos humanos e infraestruturais, a traduzir-se em possível economia de gastos (SALES, 2013).

O deslocamento dos alunos intracampo para essa escola rural seria feito, quando possível, a pé, em menores distâncias e pelo transporte escolar financiado, dentre outras fontes, com os recursos do Programa Nacional do Transporte Escolar (PNATE), para os alunos que residissem um pouco mais afastados da escola, a mais de dois quilômetros, como já se pronunciou o Tribunal de Justiça de São Paulo (SÃO PAULO, 2006), ou entre quinhentos metros a um mil quilômetros do ponto de ônibus, como já se manifestou o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (RIO GRANDE DO SUL, 2008). Com isto, haveria também ampliação do acesso, pois os alunos dos lugares mais distantes passariam a ir para escola, servindo-se do transporte escolar oferecido pelo Poder Público (MIGUEL, 2007, p. 33).

Pertinente observar que não há impedimento legal à realização de consórcios intermunicipais para compartilhamento da mesma estrutura física e transporte (BRASIL, 2007, p. 8) , inclusive por mais de um sistema de ensino, o que também concretizaria o regime de colaboração entre Estado e Município, previsto nos artigos 8º e 10, inciso II, da Lei nº 9.394/96 (BRASIL, 1996).

Não é só a ampliação de acesso que está relacionada a melhorias da infraestrutura. O mesmo ocorre com a permanência do aluno na escola e, em muito maior grau, para fins de concretização do incentivo ao ensino integral. Nesta modalidade de ensino, há ampliação da carga horária de permanência do aluno dentro da instituição escolar. A permanência requerida pelo ensino de qualidade também é a do professor, que deve se sentir atraído à carreira, evitando-se seu abandono em face das condições de trabalho negativas, como quando enfrenta salas de aula superlotadas e falta de insumos pedagógicos mínimos (CARA, 2013).

Por isto, importante transcrever os comentários de Joselaine Aparecida Campos e Soeli Teresinha Hoppe (2011, p. 13890),

Mais tempo na escola tem sido apontado como uma das alternativas possíveis para superação de muitos desafios em relação à evasão e repetência, decorrentes do cotidiano escolar. O tempo integral remete-se a uma dimensão qualitativa, relacionada à concepção da formação social do sujeito e saberes da vida em sociedade, assim a educação integral reside num encontro dialógico de tempo e qualidade, ou, ainda, qualidade com tempo.

(...)A discussão do tempo integral decorre do fato de ampliar a jornada escolar com propostas interessantes e variáveis preocupando-se, também com espaço adequado que propicie condições de aprendizagem, pensando nessa relação tempo-espaço como oportunidade a mais para o aluno de forma prazerosa. (grifos não originais)

Assim sendo, é preciso ajustar as condições físicas dos prédios à nova concepção de escola e à garantia constitucional de padrão de qualidade, para que tenham atratividade intrínseca (VELOSO et al, 2009, p. XVIII) e absorvam, ao menos parcialmente, as expectativas dos alunos (SCANTIMBURGO, 2013, p. 3) e dos professores, sem descurar dos aspectos práticos, como existência de chuveiros para as crianças tomarem banho antes de voltarem à sala de aula (MUNHOZ, 2013).

Tanto que Marcelo Côrtes Neri (2009, p. 42), procurando desvendar as razões que levam o adolescente a sair da escola, após estudos nos questionários da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) 2006, realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), agregou as motivações de evasão escolar da seguinte forma :a) 10,9%, pela dificuldade de acesso à escola; b) 27,1%, pela necessidade de trabalho e geração de renda; c) 40,3%, por falta intrínseca de interesse e d) 21,7%, por outros motivos. Tal resultado indica que “a falta de atratividade da escola aos olhos dos adolescentes (...) continua sendo a razão de evasão mais citada”, conclui o autor. No mesmo sentido é o posicionamento de Paulo Nathanael Pereira de Souza (2013, n.p), quando comenta o desinteresse dos alunos do ensino básico como causa da evasão e da reprovação, segundo eles próprios revelam em pesquisas.

Destarte, a infraestrutura desponta como componente da qualidade de educação. Impõe-se a melhoria daquela, a qual, como insumo, compreende recursos materiais à disposição dos alunos, dentre os quais biblioteca, laboratórios de informática e salas de multimídias, entre outros equipamentos, bem assim aspectos exteriores de serviços públicos.

Ainda que as características das escolas, isoladamente, possam ter efeito modesto no desempenho dos alunos (SOARES, 2013, p. 579), diminutas são as expectativas de aprendizagem satisfatória em escolas com ausência de condições materiais mínimas ao processo educacional. Nestas incluem-se escolas sem água potável, banheiro, esgoto, energia elétrica, sobretudo na zona rural; classes multisseriadas, número insuficiente de professores e/ou com formação adequada, elevados índices de absenteísmo docente e descontinuidade de políticas públicas (MORAES, 2013, p. 652). A falta de equipamentos e materiais pedagógicos e a estrutura física precária da escola reforça a desigualdade da educação, tanto para com a ministrada na rede privada, como entre sistemas de ensino.

Entretanto, nem sempre essa diferença é captada pelos pais, como demonstrou a Pesquisa Nacional de Qualidade em Educação, realizada pelo Ministério da Educação e Cultura em 2005, quando os pais ouvidos inclinaram-se a afirmar similaridade em qualidade da educação oferecida pelo Estado e pelas Prefeituras e indicar que a educação local, experimentada por eles, era superior a de outros locais no país ou de que não haveria diferenças consideráveis (CABRAL, 2008, p. 137). Isso pode explicar a resignação ou aceitação do padrão escolar que tem sido oferecido.

As instalações físicas das escolas afetam as condições de trabalho docente e discente, o “bem-estar dos alunos no dia a dia” (DINIZ; FONTAVINE; KLEIN, 2013, p. 567), com implicações nas faltas ao trabalho e adoecimento, por parte dos professores, e de evasão escolar e aprendizagem, por parte dos alunos, compondo a qualidade social do ambiente escolar. As instalações fazem parte do ambiente escolar, definido como “meio físico do estabelecimento de ensino, suas condições estruturais e sanitárias, bem como pelas relações sociais travadas entre alunos, professores e funcionários da escola” (DINIZ; FONTAVINE; KLEIN, 2013, p. 567).

Cabem ao Poder Público iniciativas para equiparar as condições materiais de funcionamento das escolas, tendo em vista o princípio constitucional do padrão de qualidade. Devem incluir “itens sobre espaço físico, equipamentos e materiais de apoio pedagógico, multimídia para o ensino e adequação da infraestrutura às características das crianças e jovens do ensino especial”, como recomendam Eva Pereira Waisros e Zuleide Araújo Teixeira (2013, p. 15) .

3.4 Dignidade humana, mínimo existencial e valor simbólico da infraestrutura escolar

Circula a teoria jurídica do “mínimo existencial”, apontando-o como os requisitos mínimos a que a pessoa humana tem direito. Estão diretamente ligados à dignidade humana, consistindo em condições materiais da existência, dos quais nem mesmo prisioneiros, doentes mentais e indigentes podem ser privados (VICTOR, 2011, p. 99)

Para Krell (apud VICTOR, 2011, p. 98), a teoria do mínimo existencial tem como função dotar o indivíduo de um direito subjetivo oponível ao Poder Público, em casos de flagrante diminuição da prestação dos serviços sociais básicos que garantem a sua existência digna

Transportando-se tal teoria para a educação, pode-se sustentar que, em termos de construções escolares, igualmente há um padrão mínimo a ser implementado, sob pena de ferir-se a dignidade do estudante e do profissional da educação que convivem naquele espaço físico. Isto há de ser bem sopesado, já que a diferença de padrões, por exemplo, entre uma escola rural e uma escola da sede de determinado Município, pode refletir indireta prática discriminatória.

Não significa igualar as construções, posto que condições climáticas, de relevo e até mesmo a finalidade de prestar-se a escola em zona rural ou zona urbana podem impor diferentes projetos arquitetônicos. Trata-se de dotar os estabelecimentos com os mesmos recursos de infraestrutura, incluindo energia elétrica, esgotamento sanitário, recursos didáticos, laboratórios, bibliotecas, quadras de esportes e outros equipamentos, com as adaptações necessárias à topografia, condições climáticas e atividades curriculares específicas.

Cabe advertir que a Convenção da United Nation Educational, Scientific and Cultural Organization (Organização para a Educação, a Ciência e a Cultura das Nações Unidas- Unesco) aponta como discriminação as iniciativas que privem qualquer pessoa ou grupo do acesso aos tipos e graus de ensino, limite a educação de qualquer pessoa ou grupo de pessoas a determinado nível inferior ou imponha condições incompatíveis com a dignidade do homem (SILVA, 2010, p. 2797).

A existência de escolas com estruturas físicas precárias e desprovidas de equipamentos e materiais pedagógicos para o desenvolvimento do ensino reforça a desigualdade da educação. Como colocam Oliveira e Pessoa (2013, p. 626) “Existe um descuido notório com acessibilidade, limpeza, estrutura, segurança, conforto, dentre outros itens que deveriam ser colocados à disposição dos discentes e docentes nos prédios escolares.” Impõe-se, destarte, ao Poder Público a adoção de iniciativas com o propósito de equiparar as condições materiais de funcionamento das escolas, inclusive para não incidir em prática discriminatória.

Outra razão para implementar melhorias estruturais é o já mencionado princípio constitucional de garantia de padrão de qualidade (PEREIRA; TEIXEIRA, p. 15). Não basta um eficiente sistema de avaliação sem a implementação de medidas corretivas que permitam elevar a qualidade do ensino. Entre as políticas a serem observadas estão a melhoria das instalações físicas das escolas brasileiras (OLIVEIRA, PESSOA, 2013, p. 625/626).

Ricardo Chaves de Rezende Martins (2013, p. 534) também aponta a necessidade de padrões mínimos de funcionamento das escolas, como previsto no novo plano nacional de educação, ainda em tramitação (BRASIL, 2012). Os padrões devem observar a etapa e a modalidade da educação básica a que se destinam.

É interessante o comentário feito por Ester Buffa (2007, p. 158), quando ressalta que, apesar do crescimento do estudo da arquitetura dos prédios escolares, o edifício escolar em si é que é mantido como objeto de estudo, podendo incluir questões como sustentabilidade, sem preocupação maior com os projetos pedagógicos ou com as concepções educativas. Tanto que se for perguntado a um arquiteto como deve ser uma escola, ele vai se preocupar com a funcionalidade e os materiais utilizados. Já um médico, ao ser questionado, preocupar-se-á com os aspectos sanitários. Por fim, se questionado a um professor como deve ser a escola, apontará que as salas devem ser de maior dimensão.

Isto indica que a concepção de escola como espaço simbólico pode não estar sendo muito compartilhada e até compreendida por esses profissionais. É preciso que seja trabalhada de forma integrada, enfocando a “relação entre a proposta pedagógica e a organização do espaço escolar” (BUFFA, 2007, p. 157).

Da mesma forma, há conveniência de elaboração da planta por equipe multidisciplinar, com arquitetos e educadores compartilhando experiências (PAES, 2008, p. 25), bem assim de projetos integrados, desde a fase da programação (PAES, 2008, p.27), para que não aconteça , por exemplo, da rede elétrica não ser compatível ou não suportar o número de aparelhos de condicionadores de ar ou mesmo computadores instalados.

A construção de escolas deve importar também aos urbanistas, pois não é recomendável sua construção em locais próximos a fontes poluentes sonoras, por exemplo. Tanto que se na época de Brizola e da construção dos Centros Integrados de Educação Pública (Cieps) importava a visibilidade dos prédios, motivo para serem construídos à beira de rodovias, atualmente, o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação Básica tem restrições em financiar a construção de escolas em locais de trânsito intenso, inclusive por proximidade de mercados, templos, posto telefônico, posto de correio e aeroportos (BRASIL, 2011, p. 33).

E para aqueles que pregam a possibilidade de dar aulas sob árvores (não como propósito em si, mas por inexistência de outro espaço), Cesário Motta Júnior (apud BUFFA, 2007, p. 157), médico e Secretário dos Negócios do Interior do Estado de São Paulo, deixou, desde 1895, a resposta: “sem bons prédios é impossível fazer boas escolas”. A complementação dada por Ester Buffa (2007, p. 157) é de extrema relevância, razão pela qual passa a ser transcrita:

Ele [Cesarário Motta Júnior] não disse que seria impossível ensinar. Sabemos que é possível ensinar em qualquer lugar, até mesmo em chão batido, sem cobertura e sem móveis. Mas uma escola é muito mais que isso e o edifício escolar, sabemos todos, pode facilitar ou dificultar a aprendizagem, a convivência, o desenvolvimento dos alunos. Em suma, os espaços educam. Ninguém confunde conseguir comunicar-se (o que pode ser feito de várias formas, até com gestos) com o conhecimento de uma língua) .(grifos não originais)

Assim, é evidente o caráter simbólico da escola. O estado de suas construções demonstra a preocupação do Poder Público e até mesmo da sociedade para com a educação. “A escola tem as feições que sociedade lhe imprime”, sentencia Ester Buffa (2007, p. 157).

O espaço sempre teve seu peso simbólico e muitas vezes caracterizou-se como ofensa à igualdade, com a reserva de lugares para negros, em transportes públicos, ou exclusivo para mulheres, em cultos religiosos ( DIDIER JR.; ZANETTI JR., 2009, p. 347). A própria escola já teve, como visto, entradas separadas conforme o sexo, se meninas ou meninos, revelando um valor da sociedade naquele momento (BUFFA, 2007, p. 159).

Como explicam Vidal e Farias Filho (2005, p. 42), “tanto o espaço quanto o tempo escolar ensinam, permitindo a interiorização de comportamentos e de representações sociais”. Não são dimensões neutras do ensino.

Quando o ensino era centrado no professor, o espaço era organizado de forma diversa do que quando passou a ser centralizado no aluno. No primeiro caso, as carteiras eram enfileiradas e fixas ao solo, voltadas para o quadro negro, pendurado na parede. Com a mudança de concepção de ensino, centrado no aluno, houve modificações, com carteiras móveis, para rodas de alunos e trabalhos em equipe, possibilitando diferentes arranjos.

Com a chegada do mundo digital, muitas escolas não estão preparadas sequer com número suficiente de tomadas, merecendo a crítica de Ester Buffa (2007, p. 159) de que “a concepção moderna de ensino sem o correspondente provimento da escola dos recursos humanos e materiais (espaços, inclusive) necessários é um triste arremedo.” Para Gilberto Luiz Alves (2007, p. 259-261), igualmente, com o advento das novas tecnologias, a forma de organização do trabalho didático, que implica um espaço físico com características peculiares como condição necessária à sua realização, tornou-se anacrônica, aferrada ainda ao século XVII.

Por vezes ocorre, normalmente na iniciativa particular, uma tentativa de reciclagem da instituição tradicional, como menciona Sibília (2012, p. 141-142)maquiando-a com disfarces tecnológicos e midiáticos para seduzir o alunato - e seus pais- , fingindo haver entrado em sintonia com os tempos atuais, embora o que acontece entre as paredes da sala de aula continue a ser mais ou menos o mesmo de sempre.

Sem deixar de comentar, também, o tamanho do próprio mobiliário escolar, que nem sempre observa a proporção do aluno. A inadequação do assento, levando à má acomodação, pode influir negativamente na atenção dos alunos aos conteúdos ministrados (BUFFA, 2007, p. 159).

Em relação à construção de escolas, não é diferente. Houve a transformação ao longo do tempo, de escolas de improviso a escolas-monumentos, com repetições de ciclos, tal como a Rússia voltou a ser invadida, duas vezes, na História, como fator decisivo de Guerras Mundiais.

Os Centros Integrados de Educação Pública (Cieps) e os Centros de Atenção Integral à Criança e ao Adolescente (Caics) operavam com plantas padronizadas. Atualmente, o Ministério da Educação (BRASIL, 2011) volta a adotar construções padronizadas, com alcance de plantas-tipo para os municípios. O Município pode optar por construir de acordo com planta por ele mesmo elaborada, desde que aprovada pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação Básica (FNDE). Mas diante de um custo a menos, podendo utilizar projeto pronto, assinado por profissional com responsabilidade técnica, a tendência é a de dispersão do mesmo padrão de escola, sobretudo de creches e de prédios voltados para a educação infantil, com a mesma fachada e concepção construtiva, nos mais diversos recantos do país.

Por sinal, a discussão sobre o espaço adequado para a pré-escola também é recente e necessária, diante de equipamentos próprios, como playground, trocador de fraldas, escala do mobiliário (BUFFA, 2007, p. 162). Como apontam os Parâmetros Básicos de Infraestrutura para Educação Infantil (BRASIL, 2006a, p.8) , “o espaço lúdico infantil deve ser dinâmico, vivo, 'brincável', explorável, transformável e acessível para todos”.

Com a existência de recursos públicos, não há razões para que a construção de prédios escolares não seja viabilizada, salvo má gestão, incluindo incompetência técnica no gerenciamento e apresentação de projetos ao Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação Básica, e corrupção. É preciso avaliar porque a sociedade se contentou em construir espaços cada vez mais precários, escolas cada vez mais pobres, como coloca Ester Buffa (2007, p. 157), quando já houve época de espaços escolares belíssimos, construídos para atender a educação das gerações futuras. Será que persistem o favoritismo e as alianças políticas denunciadas por Fernando de Azevedo, aos idos de 1927-1930, que estimulam a locação de imóveis de determinadas famílias, “proprietárias das casas alugadas à instrução do município”? (VIDAL, FARIA FILHO, 2005, p. 35).

Das monumentais escolas normais e grupos escolares do início da República, com uso de materiais importados (BUFFA, 2007, p. 161), pensados para o ensino seriado, passando pelas escolas em estilo neoclássico de Azevedo, com preocupação estética, “promovendo o gosto pelo belo e pelo artístico”, com retomada dos valores arquitetônicos coloniais para auxiliar na constituição “de um sentido de brasilidade” (VIDAL; FARIA FILHO, 2005, p. 62), inovam-se negativamente com os contêineres, utilizados no Rio Grande do Sul (FRIO..., 2011) e as escolas de lata em São Paulo (ALUNOS..., 2013).

Por outro lado, mesmo quando mantida a construção tradicional, a escola pode ter se tornado massificada e assistencialista, com preocupação maior quanto à segurança das pessoas frente a inimigos externos, revelada por grades, muros altos e por vezes por câmaras de vigilância, como versão renovada e mais elegante do velho panóptico (SIBILIA, 2012, p. 162). Perigos internos, decorrentes de desabamento e incêndio não parecem preocupar os gestores, com poucas exceções, refletidos na ausência de equipamentos de combate a incêndio e treinamento para situações de pânico, verificável em muitas escolas.

A readoção de plantas-tipo pelo Governo Federal nas últimas décadas, que traz como vantagens a redução de prazos, consumo de recursos e custos (PAES, 2008, p. 30), não é garantia de preservação da construção e de sua funcionalidade, idealizada pelo profissional que a projetou. A fiscalização não é permanente e é comum encerrar-se com a entrega da obra. Como coloca Ester Buffa (2007, p. 157)

Mesmo quando é construído, mais ou menos de acordo com o projeto, quase sempre acontecem descaracterizações posteriores, reformas verdadeiros “puxadinhos”. Quando as escolas passaram a oferecer refeições aos alunos, foi preciso construir cozinhas, refeitórios que, quase sempre, se apropriaram de espaços destinados a atividades de ensino ou de recreação. A violência urbana também impôs sérias limitações ao espaço escolar: muros altos, grades nas janelas e em aparelhos como televisão, cercas elétricas etc. Somando-se a isso, as inúmeras “pichações”, edifícios outrora bonitos se tornaram um espetáculo deprimente.

Apesar disso, de modo geral, a escola logrou ter um espaço específico e uma plataforma que a sustenta e justifica, desde a Modernidade (SIBÍLIA, 2012, p. 29). A repartição dos alunos entre as salas e a distribuição do tempo escolar em calendário próprio, inclusive quanto ao tempo da hora-aula, indicam a concepção de aquisição paulatina e sucessiva de um conhecimento acumulado. “Não se deve subestimar a importância desse treinamento corporal, tão metódico, a portas fechadas”, alerta Paula Sibilia (2012, p. 28), no que é complementada por Diana Gonçalves Vidal e Luciano Mendes de Faria Filho (2005, p. 70):

Se a representação da escola como um espaço específico e um tempo determinado conseguiu ser hegemônica na sociedade, de tal sorte que não se questiona a necessidade de construção de prédios, nem da permanência na criança no interior da escola; os significados desse espaço e desse tempo escolares ainda são objeto de luta.

Para a arquiteta Rosângela Fulche de Souza Paes (2008, p. 25), “A nova escola deve ser um espaço aglutinador e interativo e sua arquitetura deve permitir flexibilidade para absorver mudanças físicas e transformações” Confirma o valor simbólico da edificação, asseverando que o tratamento que recebe de seus usuários reflete não só a estrutura social do entorno, mas também o significado simbólico da escola para aqueles, apontando que a baixa qualidade físico- espacial pode levar a atos de depredação e vandalismo.

Menciona estudo efetuado pela Colaborative for High Performance Schools (CHPS), organização sem fins lucrativos fundada no Estado da Califórnia (EUA) com a integração de órgãos ligados à produção e fornecimento de energia, que objetivam atingir melhor desempenho nas escolas, nos seguintes termos:

O CHPS (2006, v.1) qualifica uma escola de alto desempenho como aquela que emprega as melhores estratégias de projeto e tecnologias de construção da atualidade, de forma que: ofereça ambientes saudáveis e confortáveis; conserve energia, recursos e água; funcione como uma ferramenta de ensino; ofereça espaços e serviços à comunidade; assegure fáceis operação e manutenção; crie uma atmosfera educacional segura e protegida.

Para Paes (2008, p. 31-47), uma escola de alto desempenho deve ter qualidade ambiental, que define como “conjunto de condições físicas capazes de proporcionar conforto, bem-estar e salubridade aos seus usuários”. Implica conforto térmico, visual e acústico, tanto para ruídos externos, como para internos, ressaltando a importância de projeção de bibliotecas e salas de aula em locais mais distantes das fontes geradoras de maiores ruídos, como cantinas e quadras de esportes. Destaca a importância do controle da umidade e da qualidade do ar do interior, inclusive sobre o viés de saúde pública, posto que menor troca de ar leva a concentração de poluentes químicos e biológicos. Ressalta a importância da organização espacial escolar, onde a setorização está relacionada ao conforto acústico, sem prejuízo da oferta de espaços de convivência, recreação e até mesmo de isolamento e concentração, bem assim de áreas verdes. Por fim, menciona os aspectos de acesso à escola através de meios de transportes, pavimentação, iluminação, ciclovias, etc. Quanto aos parâmetros técnico-construtivos, menciona a importância do uso eficiente de recursos, passando pela racionalização do consumo de energia e água e a gestão de resíduos. Os materiais utilizados na construção devem ser escolhidos em função do “desempenho, custo, disponibilidade e estética”, aliados a quesitos ambientais, como durabilidade, possibilidade de reutilização e reciclagem.

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Sobre a autora
Karina Gomes Cherubini

Promotora de Justiça do Estado da Bahia. Especialista em Ciências Criminais pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. Especialista em Gestão Pública pela Faculdade de Ilhéus. Especialista em Direito Educacional pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CHERUBINI, Karina Gomes. A qualidade da educação fundamental da rede municipal de Ilhéus (BA) aferida a partir da infraestrutura de seus prédios escolares no período de 2010-2012.. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 20, n. 4284, 25 mar. 2015. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/35215. Acesso em: 22 dez. 2024.

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