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A bengala a serviço do interesse político

18/05/2015 às 09:52
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Casuisticamente elevada a idade de aposentação, a presidente ver-se-á impedida de mais ministros nomear para os tribunais superiores até o fim do mandato – pela perspectiva de que os que, atingidos os 70 anos, só venham a se aposentar aos 75.

A PEC 457/2005, conhecida como PEC da Bengala, enfim, foi aprovada. Por ela, a idade para aposentadoria obrigatória no serviço público passou de 70 para 75 anos, com efeitos imediatos para tribunais superiores. Para os outros, dependerá de lei complementar.

Questão polêmica! Há argumentos favoráveis e desfavoráveis à mudança, todos respeitáveis. Tratando-se a magistratura duma carreira, justo àqueles que a integrem a intenção de chegar a seu posto máximo, tanto quanto natural, àqueles que nele já estão, queiram mais permanecer – pois a atividade faz parte de sua vida.

O argumento desfavorável reside, essencialmente, no engessamento da carreira, de forma a tornar cada vez mais difícil o acesso de magistrados mais jovens. E tem sua razão de ser! Se, com os 70 anos, o sistema já estava congestionado, agora, ficará muito mais, com inequívoco desestímulo dos que se encontrem na base da pirâmide.

O favorável, na percepção de que à pessoa de mais de 70 anos, desde que saudável, não falta capacidade de trabalho a justificar permanência por mais algum tempo – intuitivo que a experiência haurida com os anos, em regra, mais os habilitará à contribuição proveitosa.

Posiciono-me dentre os primeiros, não vendo motivo à elevação de idade – no que secundado pelas associações de magistrados, de todos os segmentos da Justiça. E há indicativos de que o Direito Comparado tende a fixar entre 65 e 70 anos a idade da aposentadoria compulsória, mesmo em países com expectativa de vida muito mais elevada que a nossa – por exemplo, Alemanha, Áustria, Bélgica, Rússia e Hungria.

Sob este viés, o debate sempre se revelou interessante e qualificado, permeado por aspectos jurídicos, econômicos e sociais importantes. Não, porém, no contexto em que a mudança legislativa se deu – casuística e de todo lamentável!

Lembremo-nos de que se estava em sede de Proposta de Emenda à Constituição (PEC), a tramitar no Congresso Nacional há mais de dez anos. Nesse período, sem grande interesse dos políticos e distante da pauta da Câmara e das luzes da mídia. Então, o que a fez ressuscitar?

O cenário político atual, revelador de queda de braço entre a presidente da República e aquela casa de leis. De fato, pelo sistema vigente, aquela indica e nomeia os ministros dos Tribunais Superiores, notadamente do Supremo Tribunal Federal (STF). Com isso, casuisticamente elevada a idade de aposentação, a presidente ver-se-á impedida de mais ministros nomear até o fim do mandato – pela perspectiva de que os que, atingidos os 70 anos, só venham a se aposentar aos 75.

Era a ‘bengala’, o apoio de que se precisava para manobra política pontual e que tão visceralmente haverá de mexer com a vida funcional, principalmente, dos magistrados brasileiros. Nesse cenário, perde relevo toda e qualquer argumentação jurídica, por mais sólida o seja. A questão de Direito sucumbiu a aspecto de conveniência político/partidária, exclusivamente!

O que haveria de ser bem pensado, repensado, positivamente refletido, acabou na vala comum dos particularismos do Parlamento, sob pressões circunstanciais em nada condizentes ao cerne da questão sob exame.

Causa espécie aquele indisfarçável casuísmo, na medida em que a regra nova só terá aplicação imediata para os tribunais superiores. Assim, evidenciados dos reais destinatários da norma, com vista ao objetivo maior de obstar novas indicações e nomeações presidenciais. Incidência prática do princípio de que ‘os fins justificam os meios’.

Ficam as indagações: a situação justificaria alteração na Constituição Federal, a toque de caixa, com o só objetivo de beneficiar o reduzido grupo dos ministros de tribunais superiores? Adequado sejam os rumos do país definidos com base na só conveniência política, de disputa de poder, ao largo de discussões efetivamente qualificadas?

Como sabido, modificação constitucional há de expressar comando abstrato e geral, sem que se preste a interesses outros – inconfessáveis, quão perceptíveis. O Brasil merece mais! Tem precisão de parlamentares qualificados, que se não guiem por aspectos menores, apequenados a seus próprios olhos e aos da Nação.

Por que, então, não se enfrentar a questão como se deve, em alto nível? Por exemplo, modificando-se o próprio sistema de indicação e nomeação de ministros de tribunais superiores e sufragando-se da real independência do Poder Judiciário? Qual a razão de a este não se franquear, como devido, a indicação de seus próprios juízes? Mas isto não interessa ao Legislativo e ao Executivo, cuja visão retrógrada, em nada progressista, continua a jugular um Poder ao qual, na prática, se nega o poder devido, por pura conveniência política.

É preciso crescer, amadurecer, fazer-se digno da representação popular. Colocar a política a serviço do real interesse público, esta a meta! Políticos, acordem, abram os olhos ao clamor que vem do povo, origem, meio e fim de todas as coisas. Viva a bengala da lucidez, salve o propósito de bem servir!

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Sobre o autor
Edison Vicentini Barroso

Desembargador em São Paulo. Mestre em Direito Processual Civil pela PUC/SP. Magistrado

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

BARROSO, Edison Vicentini. A bengala a serviço do interesse político. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 20, n. 4338, 18 mai. 2015. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/39128. Acesso em: 2 nov. 2024.

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