A adoção conjunta por casais homoparentais como meio de efetivação dos direitos da criança e adolescente

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06/10/2015 às 12:28
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5. Adoção homoafetiva e os tribunais estaduais

Para melhor nos posicionar nessa dinâmica, iremos analisar o posicionamento de dois tribunais, que historicamente mantém posicionamentos diversos, sendo que um costumeiramente apresenta posicionamento mais liberal e em consonância com a contemporaneidade, e o outro, por sua vez, mais conservador e tradicionalista.

Por se tratar de tema polêmico e atual, estudar-se-á o posicionamento do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais em contraposição aos julgados do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul.

5.1 Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais

Verifica-se que o tema em comento é pouco discutido neste tribunal, uma vez que em pesquisa realizada no sistema de buscas de jurisprudências, foram encontrados apenas dois acórdão relativos a ele.

O fato de haver poucos acórdãos relativos ao tema torna propício o seu estudo, uma vez, que com base em analise mais profunda do inteiro teor destes acórdãos, poderá extrair-se o “espírito da decisão”, verificando-se se o fundamento precípuo destas decisões é a proteção integral da criança e do adolescente, seu melhor interesse, ou apenas uma resposta aos anseios sociais por um tratamento igualitário dispensado aos casais homoafetivos.

Extrai-se em primeira analise do inteiro teor do acórdão proveniente do recurso de Apelação civil nº 1.0470.08.047254-6/00, que agora se passa em comento, que este tribunal pauta-se nos princípios do melhor interesse do adotado e visando o seu bem estar, para tomar sua decisão supera-se a discussão sobre a possibilidade ou não da união homoafetiva, conforme se verifica pelo voto do relator Des. Bitencourt Marcondes, 8ª câmara Cível, TJMG:

Desse modo, a vedação a discriminação, como fundamento de nossa República, desautoriza qualquer interpretação proibitiva de que o casal homoafetivo, que vive em união estável, adote uma criança. (TJMG, 2010)

E ainda segundo o douto Desembargador Bitencourt:

A questão, portanto, está superada, e não há óbice de que duas pessoas do mesmo sexo adotem uma criança, mas a união estável tem que estar configurada, pois, do contrário, estar-se-ia criando discriminação ao contrário, na medida em que para homem e mulher adotarem exige-se que constituam uma entidade familiar, seja pelo casamento ou em união estável. (TJMG, 2010)

Percebe-se, pois que para ele, não há que se discutir a questão do casal, e sim os interesses do adotado em consonância com a lei.

Verifica-se também, que de acordo com Bitencourt a questão relativa a aceitabilidade ou não da adoção conjunta por casais homoafetivos estará dependente apenas dos mesmos requisitos legais cabíveis à adoção conjunta por casais heterossexuais. Limitando sua dissertação acerca da cofiguração do casal (heterossexual ou homossexual) apenas a estes termos.

Observa-se que após uma breve explanação acerca da possibilidade de adoção conjunta por casais homoafetivos, sem dar muita ênfase a este tópico, passa o douto Desembargador a discorrer longamente, sobre as vantagens de se deferir a adoção pelo casal homoafetivo e sobre os prejuízos decorrentes de deliberação em contrário.

Verifica-se, pois que, segundo o entendimento da 8ª Câmara Cível do TJMG, que acompanhando o voto do Relator, demonstram que a adoção conjunta por casais homoafetivo é fonte garantidora da efetividade dos direitos da criança e do adolescente.

Para aquela Colenda Câmara, indeferir o pedido de adoção conjunta, pautando-se pela opção sexual dos adotantes, é passível de causar diversos prejuízos ao adota, tanto de ordem material, como o direito hereditário, o direito a alimentos, quanto de ordem prática, como a inclusão em convênios de saúde, educação de melhor qualidade, etc.

Não há dúvidas, portanto, de que, no caso dos autos, o melhor interesse da criança está atrelado à convivência com as autoras, que lhe proporcionam uma vida digna, motivo pelo qual o deferimento da adoção é medida que se impõe. Isso porque negar o pedido de adoção a uma das autoras retirará da menor o direito à proteção integral, já que, em seu assento de nascimento, apenas uma das companheiras figurará, o que sem dúvida, acarreta uma série de prejuízos de ordem material (direito de herança, alimentos, dentre outros). (TJMG, 2010)

Verifica-se que, seguindo uma linha diferenciada de raciocínio, encontra-se a 1ª Câmara Cível do TJMG, ao analisarmos o Acórdão proveniente da Apelação Cível 1.0480.08.119303-3/001 sob a relatoria do Desembargador Armando Freire, que manteve a sentença que deferiu pedido de adoção conjunta a um casal homoafetivo.

Observa-se, pois, que o Douto Desembargador Relator, neste ultimo caso, busca extinguir qualquer possibilidade de discussão acerca da existência de um novo modelo de família, formado por casais homoafetivos, colacionando em seu voto, diversos julgados e doutrinas que comprovam sua tese.

Nota-se também que foco do seu voto se volta exclusivamente à analise dos direitos dos casais homoafetivos, e aos possíveis danos psicológicos a que se expõe o adotado, pouco se atendo aos benefícios da adoção ao infante e aos princípios dela norteadores.

É de se salientar que a única observação pontualmente ligada aos direitos do infante, refere-se a sua saúde psicológica, pois, enfatiza o douto julgador sua decisão na existência de estudos psicológicos que comprovem a ausência de danos às crianças e adolescentes adotados conjuntamente por casais homoafetivos.

Extrai-se deste importante julgado que, conforme bem explicita o revisor Desembargador Alberto Vilas Boas, não há qualquer óbice à adoção conjunta por casais homoafetivos, conquanto nada tenha sido legislado, dada a morosidade do poder legislativo frente aos avanços sociais.

Incumbe ao Poder Judiciário, enquanto o Poder Legislativo não cumpre com a sua missão de disciplinar efetivamente essas relações jurídicas que vão se construindo no tempo, salvaguardar o melhor interesse da criança. (TJMG, 2010)

Em última analise, verifica-se com base nos acórdãos colhidos, observando-se os fundamentos neles prestados, que o Tribunal Mineiro, apesar de seu conservadorismo histórico, tem aceito a possibilidade da adoção conjunta por casais homoafetivos, porém, o discurso usado não é plenamente comum em suas Câmaras, pois, hora se decide objetivando de forma mais contundente os princípios da proteção integral e do melhor interesse da criança e do adolescente, hora se vislumbra de forma prioritária os aspectos relacionados aos direitos do adotante.

Neste plano, observa-se que neste tribunal em estudo a adoção conjunta por casais homoafetivas pode ser fonte garantidora dos direitos da criança e do adolescente, porém, não são observados tais princípios, integralmente, nos discursos proferidos pelas Câmaras Cíveis deste tribunal, uma vez que, hora tais princípios são abordados de forma profunda, hora de forma rasa.

5.2 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul é conhecido por suas decisões inéditas sobre temas polêmicos, como por exemplo, o pioneirismo no reconhecimento da união estável para casais homoafetivos.

Quanto ao tema em estudo, mantém este tribunal sua tradição, proferindo decisões favoráveis acerca dele, dentre elas a Apelação Civil nº 70033357054, cujo acórdão proferido sob a relatoria de José Conrado Kurtz de Souza e pela Sétima Câmara Cívil do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul.

Verifica-se neste acórdão, em especial pelo voto do relator, presente a ideia de priorização dos interesses do menor, como pode se extrair logo no primeiro parágrafo de seu voto.

Antes de tudo, no presente feito, tenho por importante considerar que a discussão que se deve travar não é a do direito de os autores adotarem o menino João Vitor, mas, sim, do direito da criança, diante de situação há muito consolidada do tempo, de ser adotado e poder fazer parte de um núcleo familiar saudável, protetor e afetuoso. (TJRS, 2010)

É de se observar que tal decisão foi proferida em momento anterior as decisões da nossa corte suprema que passou a reconhecer a união estável por casais homoafetivos e, talvez por essa razão, o douto Desembargador relator amparou seu julgamento unicamente nas previsões constantes dos dispositivos legais vigentes à época, o que é possível se verificar pela análise de trecho do seu voto, quando menciona decisão anterior.

Lembrei, na ocasião, que a União Estável, por força do artigo 1.726 do Código Civil, poderá converter-se em casamento, o que não é possível em se tratando de Parceria Civil, isto é, de relação estável existente entre duas pessoas do mesmo sexo. (TJRS, 2010)

Observa-se que neste momento, abandona o Douto Desembargador a possibilidade de se atender aos melhores interesses do adotado, deixando assim de priorizar a garantia de seus direitos, contradizendo o que ele mesmo menciona no início de seu voto.

Há de assegurar-se a toda e qualquer criança, diante do princípio da integral proteção previsto constitucionalmente, o direito de convivência em família e todos os desdobramentos dele decorrentes. (TJRS, 2010)

Verifica-se, que no caso concreto a impossibilidade de adoção conjunta pelo casal homoafetivo se deu, em tese, por impossibilidades processuais e não por entender os desembargadores pela impossibilidade de adoção conjunta por casais homoafetivos.

Estou acompanhando o eminente relator no caso concreto, já que, em tese, admito a possibilidade da adoção por casais homossexuais se satisfeitos todos os demais requisitos e, principalmente, se for da melhor conveniência para a criança.

No caso concreto, apenas CM ajuizou a ação de adoção e, apenas depois, CA veio aos autos pedir sua inclusão no pólo ativo, portanto concordo com o voto do eminente Relator, não pela impossibilidade jurídica do pedido, mas porque a demonstração é de que CM é quem efetivamente vem cuidando dos interesses e da guarda de JV (TJRS, 2010)

Porém é importante a análise do discurso aqui usado, uma vez que, dele pode se verificar que, mesmo dando provimento ao recuso em parte, e afastando a possibilidade de adoção conjunta, a analise tomada é favorável a adoção por conjunta por casais homoafetivos de uma forma ampla, apenas não contemplada nesta decisão por questões processuais.

É importante verificar, que por se tratar o caso concreto em comento de Embargos Infringentes que buscam verificar a possibilidade jurídica da habilitação à adoção por um casal homoafetivo, debruçaram-se os desembargadores em sua maioria sobre o estudo de tal possibilidade, não sendo considerados os direitos do adotado à uma proteção integral.

Porém extrai-se do voto do desembargador revisor Claudir Fidélis Faccenda, uma tímida introdução ao tema abordado:

Como a adoção deve levar em conta sempre o interesse maior da criança e, evidenciado que as requerentes possuem relacionamento estável, tudo indica que possuem a estrutura adequada para adoção.(TJRS, 2010)

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Noutro plano, em análise do acórdão proferido sede de Embargos Infringentes Nº 70034811810, sob a relatoria do Desembargador Sérgio Fernando de Vasconcellos Chaves, verifica-se o não reconhecimento da união Homoafetiva como entidade familiar, na contramão da maioria da doutrina.

E a sociedade evoluiu mais, até chegar à monogamia, forma hoje universalmente adotada no mundo moderno e, modo especial, no mundo ocidental. E sempre a estrutura de família focalizou o homem, a mulher e prole, sendo ela mesma resultado da regulamentação social do instinto de reprodução e, com ele, a perpetuação da espécie, ao lado da tendência gregária de todo o ser humano.

Essa forma de estruturação familiar não decorreu, portanto, de uma mera invenção ou convenção, nem surgiu do dia para a noite. As regras sociais relativamente à família foram, são e certamente continuarão sendo alvo de constante elaboração e burilamento, acompanhando o próprio desenvolvimento social, cultural e econômico de cada povo.

As regras jurídicas que disciplinam as relações de família, como tal estabelecidas no direito positivo, foram outrora meras normas de conduta social, isto é, normas pré-jurídicas. E a razão de ser desse regramento, cada vez mais minucioso e abrangente, foi decorrência necessária da importância social desse grupamento familiar. (TJRS, 2010)

Ressalta-se mais uma vez que, esta decisão precede ao julgamento da ADI 4277 E ADPF 132 que reconhece a possibilidade de união estável entre pessoas do mesmo sexo.

É de se ressaltar que o ponto importante na análise deste acórdão é o fato de os direitos da criança sequer são mencionados pelo douto desembargador, que se prende em um discurso histórico moral e religioso acerca da homossexualidade e da família, desprendendo-se por completo do objeto em análise.

Verifica-se que o caso em analise refere-se á possibilidade jurídica da habilitação à adoção por um casal formado por pessoas do mesmo sexo, o que de certa forma justifica o foco dos discursos.

Porém é de se observar, que independente do caso concreto o fim buscado pelo pleito jurídico é a adoção de uma criança conjuntamente por um casal homoafetivo, o que torna imprescindível a analise dos impactos desta adoção sobre o adotado.

Observa-se que somente ao final do acórdão, em voto proferido pelo douto desembargador revisor Claudir Fidélis Faccenda, é que se menciona ainda mais timidamente o principio do melhor interesse do menor.

Como a adoção deve levar em conta sempre o interesse maior da criança e, evidenciado que as requerentes possuem relacionamento estável, tudo indica que possuem a estrutura adequada para adoção. (TJRS, 2010)

Verifica-se, pois, que mesmo sendo favoráveis à adoção conjunta por casais formados por pessoas do mesmo sexo, contrariamente ao discurso adotado pelo tribunal mineiro, o foco adotado nestas decisões, pelo tribunal gaúcho é sob a ótica dos direitos dos casais e não os direitos do infante.


6. Adoção homoafetiva e os tribunais superiores

Nos Tribunais superiores esta discussão é ainda pouco considerada, não sendo constatado pelo sistema de buscas do STF nenhum julgado referenda a possibilidade ou impossibilidade de adoção conjunta por casais homoafetivos.

Observa-se porem, que através da resolução 175 do CNJ, aprovada em 14 de maio de 2013, passou-se a vedar aos cartórios a recusa à conversão da união estável entre casais homoafetivos em casamento, alem de garantir a estes casais o direito a habilitar-se ao casamento civil.

Art. 1º É vedada às autoridades competentes a recusa de habilitação, celebração de casamento civil ou de conversão de união estável em casamento entre pessoas de mesmo sexo.

A rt. 2º A recusa prevista no artigo 1º implicará a imediata comunicação ao respectivo juiz corregedor para as providências cabíveis.

Art. 3º Esta resolução entra em vigor na data de sua publicação. (CNJ, 2013)

Isto posto, verifica-se que o motivo que até então impossibilitava a adoção conjunta por casais homoafetivos, não mais existe, haja vista que um dos requisitos para a adoção conjunta, como já estudado, é que os adotantes sejam casados ou estejam em união estável comprovada (vide art.42, § 2º do Estatuto da Criança e do Adolescente)

É de se obsevar, que o conjunto de decisões, põe fim à discussão sobre a possibilidade jurídica da adoção conjunta por casais homoafetivos, sob a ótica do direito do adotante, porem, como mencionado nos capítulos anteriores, o escopo deste estudo é vislumbrar a garantia dos direitos do adotado quando desta adoção.

Nesse ínterim, extrai-se de decisão proferida pelo STJ em sede de Recurso Especial nº 889852 , sob a relatoria do Ministro Luiz Felipe Salomão que:

Nesse particular, é bem de ver que a lacuna não pode ser óbice à proteção, pelo Estado, dos direitos das crianças e adolescentes – direitos estes que, por sua vez, são assegurados expressamente em lei. O artigo 1º da Lei 12.010/09 prevê a “garantia do direito à convivência familiar a todas e crianças e adolescentes”, devendo o enfoque estar sempre voltado aos interesses do menor. (STJ, 2010)

Verifica-se que o posicionamento atual do STJ é direcionado pela busca pela garantia do melhor interesse do adotado, devendo ser levado em consideração todas nuances que permeiam o caso concreto, sempre levando em consideração e priorizando o adotado.

Por isso mesmo, a matéria relativa à possibilidade de adoção de menores por casais homossexuais vincula-se obrigatoriamente à necessidade de verificar qual é a melhor solução a ser dada para a proteção dos direitos das crianças, pois são questões indissociáveis entre si. (STJ, 2010)

Verifica-se ainda, que nesta mesma decisão, o discurso apresentado pelo STJ é o de ser favorável à adoção conjunta por casais homoafetivos tendo em vista a busca pela efetividade dos direitos da criança e do adolescente, em detrimento aos preconceitos e julgamentos meramente morais e religiosos até então apresentados, por aqueles de dela discordam.

O acórdão recorrido ressaltou ser “hora de abandonar os preconceitos e atitudes hipócritas desprovidas de base científica, adotando-se uma postura de firme defesa da absoluta prioridade que constitucionalmente é assegurada aos direitos das crianças e dos adolescentes". (STJ, 2010)

Este posicionamento, relativo ao fim dos preconceitos é também demonstrado por pesquisas realizadas pelo Instituto Brasileiro de Opinião e Estatística – IBOPE, realizada pelo sistema CONECTA, que realiza entrevistas pela rede mundial de computadores, demonstra que 57% dos entrevistados são favoráveis a adoção por homossexuais, o que demonstra certo anseio social por uma mudança de paradigma.

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Sobre o autor
Denis Dias

Dr. Denis Dias é advogado com ampla experiência em ações Cíveis, em especial ações de família, consumidor e Previdenciária. Formado em Direito pela Faculdade Estácio de Belo Horizonte em abril de 2014, atua desde então na defesa das causas dos menos favorecidos.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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