1 - Introdução
A Administração Pública, ao buscar cumprir com sua premissa comumente conhecida em atender aos anseios e necessidades da sociedade gerenciando interesses da coletividade, alicerçada em suas prerrogativas, está diretamente limitada a determinadas restrições as quais foram construídas e desenvolvidas ao longo do tempo pelo poder legislativo e pela doutrina, as quais algumas estão incorporadas no nosso ordenamento jurídico. Dentre as restrições estão presentes os princípios gerais da Administração Pública e outros princípios, como da razoabilidade e proporcionalidade, os quais abordaremos a seguir. Estes buscam harmonizar o ordenamento e extinguir lacunas, como qualquer outra ideia de princípios, os quais “são as proposições básicas, fundamentais, típicas que condicionam todas as estruturações subseqüentes” [1]. Ainda, estes princípios direcionam as ações dos aplicadores da lei e todos que estão direta ou indiretamente ligados à Administração Pública em qualquer ente federativo, isto é, aplicam-se à União, Estados Membros, Distrito Federal, Municípios, em todas as Agências Reguladoras, Sociedades de Economia Mista, Fundações Públicas, Autarquias, Agências Executivas, Empresas Públicas, compreendendo toda a universalidade de seus agentes públicos (lato senso) que desempenham função pública.
Tendo em conta os princípios gerais da Administração Pública, no caput do artigo 37 da Constituição Federal estão listados os princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e, por ultimo, eficiência, o qual foi acrescentado por emenda. Contudo, não podemos nos esgotar somente a estes, haja vista que outros diversos princípios não constam no texto normativo, tais como o princípio da supremacia do interesse público, princípio da finalidade e o princípio da razoabilidade, o qual trataremos neste artigo; além de outros que poderão ser elaborados pelo poder legislativo infraconstitucional, seja por leis orgânicas, ou por outra forma legal do poder constituinte derivado.
2 - O PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADE
O princípio da Legalidade é firmado como um princípio administrativo e, a cima disso, constitucional, previsto no artigo 37, como já foi mencionado, e no artigo 5°, II, o qual determina que “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer algo senão em virtude de lei”, o que acaba por ser um fundamento do Estado democrático de direito, o qual busca suprimir a ampla arbitrariedade do poder estatal. Da mesma forma, na esfera do direito administrativo, serve como limite ao propor que os agentes públicos, em toda sua desenvoltura na atividade da administração pública, poderão somente realizar o que está disposto em lei em sentido amplo, ou seja, desde lei ordinária até a constituição. Enquanto o cidadão tem o direito de realizar tudo aquilo que a lei não proíbe, a administração poderá realizar somente aquilo que está disposto e autorizado em lei, o que acaba por dar maior seguridade aos administrados uma vez que se o que foi executado estiver em desacordo com a lei será inválido, suscetível à apreciação do poder judiciário. Pela doutrina, “A administração pública não pode atuar contra legem ou praeter legem, só pode agir secundum legem” [2], isto é, a administração não poderá atuar nem na contramão, nem no sentido de complementar a lei, mas sempre segundo a lei.
Seguindo a ideia de instituir restrições à administração pública, imposta incialmente pelo princípio da legalidade no texto constitucional, o princípio da razoabilidade restringe a mesma discricionariedade administrativa, sendo um dos principais garantidores nesta tarefa, como Maria Sylvia Zanella di Pietro afirma em sua obra. Ainda, a mesma autora nos dá a definição de ato discricionário a fim de facilitar o nosso entendimento sobre a matéria:
“são os que a Administração pratica com certa margem de liberdade de avaliação ou decisão segundo critérios de conveniência e oportunidade formulados por ela mesma, ainda que adstrita à lei reguladora da expedição deles. A discricionariedade ocorre com maior frequência no motivo e no objeto do ato. O motivo são as razões de fato e de direito que resultaram na prática de um determinado ato, ou seja, o motivo antecede o ato” [3].
Com isso, a discricionariedade poderia ser usada de forma errônea, mesmo que despropositadamente, pelo agente público, o que poderia trazer sérias consequências na busca pela correta gerência dos interesses da sociedade.
Atualmente vige a Lei n° 9.784 de 29 de janeiro de 1999 que, como descrito no artigo 1°, dispõe sobre as normas do processo administrativo (compreendido como ato da administração pública), no âmbito da administração federal direta e indireta, visando a proteção dos administrados e ao melhor cumprimento dos fins da administração, estando de acordo com o que dispõe a legalidade na forma de princípio. Na mesma lei, em seu artigo 2°, apresenta que a “Administração Pública obedecerá, dentre outros, aos princípios da legalidade, finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica, interesse público e eficiência”. Juntos, estes princípios indicam que o poder público está obrigado à mostrar correspondência de seus atos com a ideia de coerência, racionalidade e sensatez, como bem afirma, de modo simples e objetivo, já tocando na matéria do princípio da proporcionalidade, Antonio José Calhau, ao dizer que tal princípio “consiste em agir com bom senso, prudência, moderação, tomar atitudes adequadas e coerentes, levando-se em conta a relação de proporcionalidade entre os meios empregados e a finalidade a ser alcançada, bem como as circunstâncias que envolvem a pratica do ato” [4], desta forma, mesmo quando o administrador tem certa liberdade de escolha em seu momento de ato discricionário, ele não poderá tomar uma decisão irracional e não razoável. Assim sendo, é lógico afirmar que o princípio da razoabilidade é uma decorrência direta do princípio da legalidade, considerando que buscam o mesmo propósito, ainda que o principio da razoabilidade faça maior relação com os atos normativos, juntamente à lei onde está descrito.
Ainda que a jurisprudencia e alguns doutrinadores tratem os dois de forma generalizada, confundir o princípio da proporcionalidade com a razoabilidade é de fato fácil, pois o desenvovimento de ambos sempre foi ligado. A construção do principio da proporcionalidade se deu na formação jurisprudencial do principio da razoabilidade, como descrito pela professora Maria Rosynete Oliveira Lima, ao dizer que:
"razoabilidade e proporcionalidade podem até ser magnitudes diversas, entretanto, cremos que o princípio da proporcionalidade carrega em si a noção de razoabilidade, em uma relação inextrincável, e que não pode ser dissolvida, justificando, assim, a intercambialidade dos termos proporcionalidade e razoabilidade no ordenamento brasileiro” [5].
Apesar disso, devemos entendê-lo como uma derivação do principio da razoabilidade, pois enquanto a ideia de razoável se limita ao sentido da ação e sua motivação, a propocionalidade deve ser observada na sua execução e nos meios e atos adotados, sempre buscando causar o menor prejuízo possível, embasando-se em seus próprios fatores, sendo eles a proporcionalidade, adequação e necessidade, como define Dirley da Cunha Júnior que assevera que "veda que a Administração Pública aja com excesso ou valendo-se de atos inúteis, desvantajosos, desarrazoados e desproporcionais” [6].
3 - CONCLUSÃO
Dada a discussão anterior, é visível o constante amadurecimento da construção doutrinária, apesar dos equívocos em sua aplicação e, além da questão puramente teórica, a presença no nosso ordenamento jurídico destes princípios, mesmo em leis infraconstitucionais como na lei 9.784/99, demonstram a preocupação e entusiasmo do legislador em fazer com que a Administração Pública execute da maneira mais correta o dever que lhe foi imposto, em manejar e gerir os anseios sociais, sem causar prejuízos de qualquer natureza ou pelo menos minimizando-os ao máximo, sempre à luz dos princípios da legalidade, razoabilidade e proporcionalidade.
4 - BIBLIOGRAFIA
[1] Cretella Junior , José. Revista de informação legislativa, V. 97.
[2] Slassinopolus, Michel. Estudos de Direito Administrativo. Coimbra. Atlântida, 1970.
[3] Di Pietro, Maria Silvia Zanella. Direito administrativo. São Paulo. Atlas, 2003.
[4] RESENDE, Antonio José Calhau. O princípio da Razoabilidade dos Atos do Poder Público. Revista do Legislativo. Abril, 2009.
[5] LIMA, Maria Rosynete Oliveira. Devido Processo Legal. Sérgio Antônio Fabris Editor, 1999, p. 287.
[6] CUNHA JÚNIOR, Dirley da. Curso de Direito Administrativo. 7ª ed. Podium, 2009, p. 50.