Os limites do poder normativo das agências reguladoras e a proporcionalidade

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28/01/2016 às 15:33
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O controle das atividades e serviços decorrentes da Administração não só se faz pelo principio da legalidade. Com a introdução dos princípios da Administração (art.37, “caput”) acabou-se ampliando o controle que se apega não só a lei mas ao direito.

1.0 Princípios da proporcionalidade nos atos administrativos das agências reguladoras

       

             A atividade administrativa tem seus limites, regras e mecanismos de controle estampados dentro das normas da Constituição, infraconstitucionais ou até por atos secundários, tendo também suas antinomias e lacunas resolvidas pelo direito.

            O Direito aqui compreende o ordenamento jurídico e seus ideais. Não foi sem sentido a colocação pelo legislador infraconstitucional na Lei Federal de processo administrativo a nomenclatura “direito” quando estabeleceu no artigo 2º, parágrafo único, I, que: “Nos processos administrativos serão observados, entre outros, os critérios de:  I – atuação conforme a lei e o Direito”.

            A capacidade de confeccionar lei pelo Poder Legislativo que representa os cidadãos nunca conseguirá exaurir e positivar todos os comportamentos e dúvidas advindas das relações entre as pessoas, o Estado e os indivíduos. Isso é tarefa impossível. Entretanto, esse tipo de lacuna lógica poderá ser resolvida com a atuação do direito e, especialmente com os princípios que ele abarca, positivados ou não.         

            Existem princípios que mesmo não tendo expressa previsão legal, já funcionam para buscar soluções e regrar comportamentos ou até mesmo dar aos cidadãos mais uma chance de revisão das suas condutas que contrariaram a lei e os bons costumes. Um dos exemplos de princípios não positivados é o duplo grau de jurisdição que não possui expressamente sua menção em normas jurídica, nasce do sistema[1], o que não exclui do controle a sua importância.

            Por outro lado, existem princípios que não possuíam menção em norma jurídica, mas depois foram abarcados pela legislação infraconstitucional e até pelo Poder decorrente Constitucional, como ocorreu com o princípio da razoabilidade na Constituição Paulista.

            Dentre a atuação do direito por meio da interpretação da melhor solução e mais salutar, concentram-se os estudos na análise do princípio da proporcionalidade e sua distinção com o princípio da razoabilidade. A Administração ou até o Poder Judiciário devem avocá-los no exercício do controle quando ocorre a expedição de atos pelas Agências Reguladoras que, apesar de serem condizentes com a lei, ultrapassam a boa noção do Direito, combatidos pela proporcionalidade. Portanto, os princípios auxiliam no controle amplo da Administração.

            Apesar de terem semelhanças, o princípio da razoabilidade é distinto do princípio da proporcionalidade. Existe uma tendência de denominá-los sinonímias, como é entendido na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal[2].

            Ademais, à luz da teoria de Robert Alexy, não pode ser considerada a proporcionalidade como princípio, pois não tem como produzir efeitos em variadas medidas, já que é aplicado de forma constante, sem variações, o que o exclui do âmbito dos princípios.[3] É denominado também por parte da doutrina como “regra da proporcionalidade”[4]. Virgílio Afonso da Silva destaca as diferenças históricas da regra da proporcionalidade com a razoabilidade[5]:

[...] A não identidade entre os dois conceitos fica ainda mais clara quando se acompanha o debate acerca da adoção do Human Rights Act de 1998 na Inglaterra. Somente a partir daí passou a haver um real interesse da doutrina jurídica inglesa na aplicação da regra da proporcionalidade, antes praticamente desconhecida na Inglaterra. Atualmente, discute-se qual o papel que a regra da proporcionalidade deverá desempenhar ao lado do princípio da irrazoabilidade ou, até mesmo, se aquela deverá substituir este. Se ambos fossem sinônimos, essa discussão seria impossível[6].

        

             Por outro lado, não há expressa consagração da regra da proporcionalidade na Constituição Federal vigente[7]. No controle das leis restritivas de direitos fundamentais, surgiu por desenvolvimento jurisprudencial do Tribunal Constitucional Alemão e não é uma simples pauta que, vagamente, sugere que os atos estatais devem ser razoáveis, nem uma simples análise da relação meio-fim[8].

            Na forma desenvolvida pela jurisprudência constitucional alemã, tem ela uma estrutura racionalmente definida, com subelementos independentes (adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito) que são aplicados em uma ordem pré-definida, e que conferem à regra da proporcionalidade a individualidade que a diferencia, claramente, da mera exigência de razoabilidade, posição que iremos adotar com algumas sugestões. Portanto, os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade em nada se confundem.

            Assim, a proporcionalidade deve ser enxergada como um instrumento que auxilia no controle, ampliando-o, ao retirar do ordenamento atos normativos em desconformidade com os seus subelementos da adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito.

            Mas, antes de adentrar na explicação de cada um destes elementos, é salutar explorar a premissa colocada por Carlos Bernal Pulido[9] ao escrever sobre proporcionalidade. Dentre os grandes ensinamentos, destaca-se o raciocínio sobre os direitos fundamentais e sua restrição, colocando que a importância da intervenção no direito fundamental deve estar justificada pela importância da realização do fim perseguido pela intervenção legislativa:

 

O primeiro aspecto da análise da idoneidade das intervenções legislativas nos direitos fundamentais consiste em verificar se o fim que o parlamento pretende favorecer, pode ser considerado legitimo do ponto de vista constitucional. Este primeiro elemento é um pressuposto do segundo. Unicamente se tem estabelecido de antemão que a finalidade perseguida na intervenção legislativa e se tem constatado que esta finalidade não resulta ilegítima da perspectiva da Constituição, pode processar se a medida adotada pelo legislador resulta idônea para contribuir na sua realização. (tradução nossa).

 

            Essa definição significa que as vantagens obtidas mediante a intervenção legislativa[10] no direito fundamental devem compensar os sacrifícios que esta implica para seus titulares e para a sociedade em geral. Trata-se de uma comparação entre a importância da intervenção no direito fundamental e a importância da realização do fim legislativo, com o objetivo de fundamentar uma relação de precedência entre aquele direito e este fim. Deve, portanto, existir uma compensação entre a intervenção ao direito fundamental realizada pela intervenção legislativa com as benesses que a coletividade terá.

            Veja que esse raciocínio tem grande importância quando se está diante da função normativa das Agências Reguladoras à luz do serviço público adequado. Assim, os atos normativos expedidos pelas agências reguladoras ou lei que determine alguma intervenção a cargo destas, ao limitar um direito fundamental, devem conceder mais benesses do que a própria restrição posta a este direito fundamental. O não atendimento deste raciocínio acaba gerando uma expulsão deste ato com base no controle judicial ou administrativo ampliado à luz dos princípios e regras constitucionais.

            Quando há uma intervenção legislativa (e até ampliando um pouco esse horizonte à luz da lei, colocando os atos expedidos com base na função normativa das agências reguladoras), se houver alguma restrição que não justifique a importância da intervenção no direito fundamental (serviços públicos essenciais: transporte, água, luz e demais à luz da Constituição[11] vigente) devem ser declarados desproporcionais e retirados do ordenamento jurídico, sob o prisma da regra da proporcionalidade.

            Nesta visão somente cabe a intervenção (atos expedidos pelas Agências Reguladoras) ao direito fundamental quando existir alguma benesse à coletividade e, consequentemente, atender ao interesse público. Caso contrário, esses atos podem ser declarados inválidos ou até inconstitucionais[12].

            Assim, o controle representado pela expedição de atos excessivos ou pela omissão na atividade de regulação e de fiscalização do serviço público essencial (transporte, saúde, água e outros) pelas agências reguladoras que implique restringir direito fundamental do usuário do serviço público sem o correspondente meio adequado, deve ser repelido no âmbito da União com base no princípio da tutela pelo Ministério ao qual a Agência Reguladora estiver vinculada. Deverá ocorrer um controle mais amplo baseado em regras e princípios. Do contrário, pela falta de racionalidade da Administração, operar-se-á no âmbito do Poder Judiciário.

            Exemplo clássico é norma proibindo remédio ou a omissão da não concessão de registro que autorize a sua venda pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) nos casos de tratamento de câncer de uma pessoa que se não obtiver sucesso na concessão do remédio poderá falecer. Esse ato, na visão esposada, contraria a regra da proporcionalidade pelo excesso (norma proibindo) e pela insuficiência (omissão ou ação insuficiente) do ato de autorização que limitou o direito fundamental à saúde ou à vida sem demonstrar suficientemente mais benefícios com o resultado desta restrição e, com mais razão, negando a própria função normativa da agência[13]. Portanto, essa norma deve ser excluída do ordenamento, pois seus fundamentos não trazem benesses à coletividade.

            Portanto, determinados atos expedidos pelas Agências Reguladoras devem ser analisados antes de serem confeccionados, verificando se há potencialidade de restrição a algum direito fundamental, seja pela insuficiência ou pelo excesso de proibição. Havendo, não podem tornarem válidos.

            O princípio da proporcionalidade na visão de Carlos Bernal Pulido possui três elementos-subprincípios. O princípio da proporcionalidade está composto pelos subprincípios da: (I) idoneidade-adequação; (II) necessidade e (III) proporcionalidade stricto sensu. A aplicação se dá de maneira sucessiva e escalonada, da seguinte forma: o intérprete pesquisa se a norma que intervém no direito fundamental é idônea; se não é, deve ser declarada inconstitucional; caso passe por esse primeiro crivo, deve ser submetida aos subprincípios da necessidade e da proporcionalidade[14].

            Já na visão de Virgílio Afonso da Silva[15], a subdivisão da regra da proporcionalidade em três sub-regras, adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito, conquanto praticamente ignorada pelo Supremo Tribunal Federal, é bem salientada pela doutrina. O autor ressalta que é preciso ter em mente que a análise da adequação precede a da necessidade, que, por sua vez, precede a da proporcionalidade em sentido estrito.

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            Nem sempre é preciso analisar se as três sub-regras atendem aos pressupostos. Se uma já não atender, encerra-se a análise, e declara-se a inconstitucionalidade da regra posta (relação subsidiária). Ressalta o autor que há três tendências diversas quanto ao número de sub-regras da proporcionalidade. A clássica (adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito), a restrita (adequação, necessidade) e a ampliada, que costuma identificar um elemento adicional, que precede a análise da adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito: a análise da legitimidade dos fins que a medida questionada pretende atingir.

            Portanto, independentemente das classificações, é pacífico que o princípio ou a regra da proporcionalidade é um vetor de extrema importância no controle da atividade da Administração, uma vez que acaba ampliando-o, à luz da verificação da mera legalidade, analisando abusos que acabam por vez afetando a prestação de um serviço adequado. Essa análise sempre será feita sobre três elementos; adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito, os quais serão vistos adiante.  

 

2          Subprincípio (regra) da adequação

           

Esse subprincípio exige que toda intervenção nos direitos fundamentais seja adequada para contribuir para a obtenção de um fim constitucionalmente legítimo. Impõe-se que tenha um fim constitucionalmente legítimo e seja idônea para favorecer sua obtenção.

            A aplicação do subprincípio da adequação consiste em uma análise acerca da capacidade que tem o meio escolhido pelo Legislativo para fomentar sua finalidade; é uma análise da relação entre o meio legislativo e seu fim na qual este meio persegue facilitar a obtenção do fim e o fim, por sua vez, oferece uma fundamentação ao meio. Ou seja, “uma medida adotada por uma intervenção legislativa em um direito fundamental não é idônea quando não contribui de nenhum modo para obtenção do seu fim imediato”. (tradução nossa)[16] .

            Portanto, para haver adequação, o que importa é a conformidade com o objetivo (Zielkkonformitat) e a prestabilidade para atingir o fim (Zwecktaugglickkeit) da medida[17].

            A análise da legitimidade do fim legislativo tem sido designada por juízo de razoabilidade. O objeto desse juízo de razoabilidade consiste em constatar que a norma sub examine não constitui uma decisão arbitrária, porque está fundamentada em alguma razão legítima. Entre nós, o conceito clássico de adequação decorre do meio empregado. Se com sua utilização o evento pretendido pode ser alcançado, o meio é adequado.

            Para Virgílio Afonso da Silva, o conceito de adequação não é o mais correto, pois deriva de uma má tradução. Ao invés de alcançar, a tradução correta seria fomentar. E promover não é a mesma coisa que fomentar. Adequado, então, não é somente o meio utilizado para alcançar um objetivo, mas também o meio utilizado para fomentar, promover a realização de um objetivo, ainda que o objetivo não seja completamente realizado. Por esse prisma, uma medida somente pode ser considerada inadequada se sua utilização não contribuir em nada para fomentar a realização do objetivo pretendido[18].

            Com relação ao controle das medidas advindas da Administração Pública, ponto principal do trabalho, uma vez que os atos normativos das agências reguladoras são atos advindos da Administração, não se discute tanto sobre a finalidade e os meios – objetivos desejados, – mas sobre a adequação das medidas (atos normativos) expedidas pautadas no ordenamento. Isto é, se faz uma análise de adequação se estas medidas cumprem seus propósitos nas normas jurídicas. Essas lições são bem colocadas por Willis Santiago Guerra Filho:

Neste quadro, vale destacar, com relação ao controle de medida proveniente da Admnistração Pública, que por tratar de uma função estatal a ser exercida em obediência à norma preexistente, não há tanto a se discutir sobre finalidade eobjetivos “desejados”; mas, sim, acima de tudo, sobre a adequação daquelas medidas a tais propósitos, previsto normativamente. Caso elas impliquem em limitação de direitos fundamentais, deve-se verificar antes de mais nada se o ato administrativo não deixou de corresponder ao sentido da norma que deveria realizar concretamente[19].

           

            Assim, os atos normativos administrativos expedidos pela Administração devem ser adequados no sentido de verificação ao cumprimento fiel correspondente a sua criação legal, diferentemente das normas abstratas nas quais há ampla possibilidade de meios desejados alcançados pela prognose. Saliente-se ainda que, à luz do verbo fomentar, seria também o meio utilizado para fomentar a realização de um objetivo.

            Com efeito, os atos normativos das agências reguladoras devem possuir fundamento legal nas suas próprias finalidades normatizadas que ensejaram os motivos da sua criação. Por isso, quando temos uma situação em que o serviço que está sob guarda da própria agência (saúde) acaba sendo prejudicado por seus próprios atos (venda de remédio ou negativa de expedição de autorização de venda), negando o seu fim, esse ato será inadequado.

            Considerando essa última premissa, conclui-se que as atividades fins da agência reguladora, a título de exemplo, de transporte, não podem ser contrariadas por ato normativo expedido por ela própria que contraria este fim. Por exemplo: um ato normativo que determina no serviço público de transporte a colocação de equipamento novo em determinadas regiões para atender a acessibilidade dos anões (atualidade), justamente para dar cumprimento ao conceito de prestação de serviço adequado, poderá ser considerado inadequado caso seja provado que essa situação não detenha base normativa. Portanto, o meio não foi apto para alcançar o resultado pretendido.

            Portanto, toda vez que um ato normativo determina uma obrigação de fazer ou não fazer pautados em meios a fim de que possa alcançar determinado resultado pretendido e, esse não se sucedeu, poderá à luz da proporcionalidade no seu subelemento adequação ou idoneidade ser considerado abusivo (proibição de excesso) ou ineficiente (proibição de ineficiência), portanto, desproporcional, via regra ou princípio, dependendo da posição adotada.

 

3          Subprincípio (regra) da necessidade

            Segundo a doutrina consagrada, um ato advindo do Poder Público que limite algum direito fundamental somente pode se manter quando não existir outra forma ou método menos intensivo, em menor medida, ao direito fundamental atingido. Estamos diante do subprincípio da necessidade.

            Sua outra designação na doutrina é a exigibilidade, que constuma ser associada à busca do meios mais suaves (milderes Mittel)  dentre os vários possíveis, para atingir o fim buscado, no que se reconhece haver grande margem de ação (Handlungsspielraum) e no campo para realização  (Gestaltungsbereich) ao legislador e na Administração Pública.[20]

            A diferença entre o exame da necessidade e o da adequação é clara: o exame da necessidade é um exame imprescindivelmente comparativo, enquanto o da adequação é um exame absoluto[21].

            Quando aplicamos a necessidade temos como cerne a aplicação de meios menos onerosos e mais sensíveis que possam auxiliar o fim desejado, consequentemente protege-se mais o direito fundamental. Quando estamos diante da expediação de ato normativos advindos da competência das agências reguladoras, nada mais prudente no momento da sua expedição, do que observar meios mais condizentes voltados à efetivação da prestação do serviço adequado (meio de fomentar), diga-se de passagem, serviço público social integrante dos direitos fundamentais do cidadão.

            Nesse quadro, usando ainda como exemplo o serviço de transporte coletivo urbano, a necessidade de atingir as metas de qualidade exigidas no artigo 10 e parágrafos da Lei Nacional de Mobilidade Urbana é normatizada via uma nova resolução da ANTT: a exigência dos concessionários à realização de melhoras na infraestrutura municipal (acessibilidade aos anões em determinadas regiões, por exemplo. Para atender metas de qualidade, coloca como meio para atingir esse objetivo, a fim de equilibrar as equações financeiras do contrato administrativo, a necessidade de aumento de tarifas públicas.

            Sob essa análise do ato normativo expedido, há possibilidade de a Agência Reguladora de transportes exigir melhoras na infraestrutura colocando como forma de subvenção o aumento das tarifas públicas dos usuários, conforme norma legal[22]. Daí, indaga-se: esse meio normatizado é o correto à luz do subprincípio da necessidade/exigibilidade para se socorrerem os concessionários?

            Obviamente que não. A lei possibilita outros meios alternativos que favorecem o serviço adequado, como receitas alternativas, subsídios cruzados e remuneração direta pela Administração. Todas essas são medidas mais sensíveis que acabam evitando o aumento das tarifas públicas, medida mais drástica ao usuário do serviço público.

            Portanto, diante dessa análise, o ato expedido pela Agência de Transporte (ANTT) estaria violando a proporcionalidade, não porque o meio é inadequado ou inidôneo (há normatização legal), mas porque não foi o mais eficiente e necessário adotado pela Agência na expedição do seu ato normativo, portanto, será invalidado.

            Assim, deve o intérprete pautar-se na busca de meios alternativos menos onerosos à medida proposta. Havendo a omissão desta análise, deve o controle ampliado à luz dos princípios ganhar efetividade, especialmente no âmbito do Poder Judiciário, ou, pelo Estado com base no princípio da tutela excluindo-se os atos normativos desproporcionais expedidos pelas Agências Reguladoras, porque são excessivos e ocasionam prejuízos aos direitos fundamentais dos seus usuários.

 

4          Subprincípio (regra) da proporcionalidade em sentido estrito

            Quando há a adequação, e se necessário, os atos normativos expedidos que restrinjam direitos fundamentais devem ser averiguados quanto ao último subelemento quanto à proporcionalidade destes atos. Esse subprincípio define-se pelo sopesamento entre a intensidade da restrição ao direito fundamental atingido e a importância da realização do direito fundamental que com ele colide e fundamenta a adoção da medida restritiva.

            A proporcionalidade em sentido estrito importa na correspondência (Angemessenheit) entre o meio e o fim, o que requer o exame de como se estabeleceu a relação entre um e outro, com o sopesamento (Abwagung) de sua recíproca apropriação, colocando, de um lado o interesse no bem-estar da comunidade, e de outro, as garantias dos indivíduos que a integram, a fim de evitar o beneficiário no bem demasiado de um em detrimento de outro[23].

            Para que uma medida seja considerada desproporcional em sentido estrito, basta que os motivos que fundamentam a adoção da medida não tenham peso suficiente para justificar a restrição ao direito fundamental atingido. É possível, por exemplo, que essa restrição seja pequena, bem distante de implicar a não realização de algum direito ou de atingir o seu núcleo essencial. Se a importância da realização do direito fundamental, no qual a limitação se baseia, não for suficiente para justificá-la, será ela desproporcional.

            No mesmo exemplo utilizado tanto na análise da sub-regra adequação quanto da sub-regra necessidade sobre o ato expedido pela ANTT visando modernizar o serviço de estrutura na busca de dar atendimento à lei de acessibilidade para anões, caso o meio fosse necessário, ao invés de ser utilizado o aumento de tarifa, houve a proposta de algo menos oneroso ao usuário, pela adoção de receitas alternativas. Tivemos, assim, uma análise que ultrapassou a adequação e a necessidade.

            Constata-se que essa correspondência entre o meio e o fim sopesado não detém peso suficiente para justificar a limitação ao direito fundamental[24] (princípio da isonomia, artigo 5º da Constituição Federal de 1988). Foram verificados pouquíssimos casos de anões na região onde ocorreu a obra de infraestrutura. Veja que o peso da obrigatoridade da acessibilidade do transporte coletivo para anões acabou sendo considerada restritiva, já que beneficiou uma classe de pessoas, ocorrendo a infringência ao princípio da isonomia, na medida em que a norma enunciada é materialmente inviável[25], ocasionando-se desproporcional no seu terceiro elemento, proporcionalidade em sentido estrito.  

            No caso das Agências Reguladoras, quaisquer atos expedidos que atinjam o núcleo essencial devem ser reconhecidos na atividade de controle como desproporcional tanto na esfera Administrativa (princípio da tutela) quanto na revisão do ato pelo Poder Judiciário.

            O mais eficiente seria a criação de um órgão administrativo para realizar esse controle interno previamente com fundamento em lei como pressuposto de validade da expedição deste ato, atividade vinculada cuja inobservância geraria nulidade absoluta do ato normativo expedido. Não pode ser deixada exclusivamente essa atividade de controle aos Ministérios sem um mecanismo que vincule a expedição de atos a uma análise mais aprofundada com base em estudos que comprovem o impacto destas medidas.

            As Agências Reguladoras não regulam simples serviços, mas tão somente serviços públicos na maioria das vezes essenciais que carregam consigo direitos fundamentais. Mesmo com a autonomia dos seus dirigentes, por si só, esse gestor não tem como controlar todos os atos expedidos pela Agência Reguladora que dirige. Deve haver a criação de um órgão de controle de qualidade que verifique à luz do princípio da proporcionalidade a medida mais equilibrada e saudável a ser tomada.

            Portanto, essa análise poderia ser feita com a criação de um órgão que incluísse a participação de universidades por meio de seu corpo técnico que realizasse estudos a fim de comprovar medidas menos prejudiciais aos usuários dos serviços públicos.

 

5.             Controle relativo à aplicação da proporcionalidade

            A função normativa fundamentada pela expedição de atos na regulação dos serviços públicos deve se pautar em lei. Seu fundamento deve estar baseado na eficiência e gerar benefícios aos usuários dos serviços públicos. Consequentemente devem existir como pressuposto de validade estudos técnicos que provam essa benesse aos usuários.  

            Caso esses atos expedidos contrariem alguns princípios ou se forem legais, mas desproporcionais, fundados em erro, devem ser retirados do ordenamento jurídico sob a análise da adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito, elementos do princípio da proporcionalidade.

            Essa análise normalmente é realizada pelo Poder Judiciário, podendo em alguns casos ser verificada com base no princípio da tutela pela União por meio dos seus Ministérios, eis que a Administração deve se pautar pelo dever de manter apenas atos que não contrariam a lei e o direito (análise da proporcionalidade).

            Não pode uma Agência Reguladora expedir atos que carregam consigo estudos técnicos que inviabilizam a utilização do serviço sob a ótica de um serviço adequado, colocando restrições exageradas; ressalta-se que serviço adequado se encontra positivado pela Lei Tradicional de concessões de serviços públicos.[26]       

            O serviço adequado abarca desde as situações econômicas – modicidade tarifária afeta aos usuários – como também aquelas ligadas à eficiência, segurança, atualidade, generalidade, cortesia na sua prestação. Ou seja, existe um controle rígido colocado pela lei, devendo existir qualidade nos serviços prestados pelas concessionárias, atendendo aos atos expedidos pelas agências reguladoras, desde que estejam de acordo com a lei e o direito.

            Isso porque as Agências Reguladoras não podem criar regras excessivas para dar atendimento na busca de um serviço adequado. Se ocorrida essa situação, esvaziará de legitimidade seus atos normativos retirando deles os necessários parâmetros legais e proporcionais (direito adotado como pressuposto na aferição real de um serviço adequado).

            Quando isso acontece, ao invés de padronizar comportamentos e situações na busca da melhor qualidade de um serviço público e adequado, acarretará, devido ao excesso técnico, uma barreira para que as concessionárias cumpram determinadas resoluções normativas (atos expedidos pelas Agências Reguladoras).

            Essa análise, tanto sob o aspecto da legalidade quanto da proporcionalidade, ocorre no Poder Judiciário, com base na realização de um controle de resultado, validando ou julgando-o ilegal sob o prisma do princípio da proporcionalidade, retirando do ordenamento decisões impostas sob o manto dos atos normativos das Agências Reguladoras que, ao invés de beneficiar os usuários do serviço público, os prejudicam, uma vez que os descaracterizam como serviço adequado.

            Uma decisão judicial que demonstra essa situação ocorreu no Estado do Rio de Janeiro suspendendo o aumento excessivo de 41,7% autorizado pela ANATEL para reajustar as tarifas telefônicas, sob pena de multa de 01 milhão de reais[27]. Essa decisão se deu em decorrência do exagero no aumento, analisado sob o princípio da proporcionalidade.

            Outras apreciações técnicas transformadas em atos normativos podem também ocasionar transtornos aos usuários dos serviços públicos. Um exemplo corrente são os bloqueios dos sinais de celulares existentes em determinados prédios públicos pertencentes à atividade de segurança pública, como delegacias, Batalhões da Polícia Militar ou presídios.

            Quando ocorrem esses bloqueios de celulares com base em apreciações técnicas que depois se transformam em atos normativos, há prejuízo às pessoas que transitam nestes lugares, ficando sem sinal para o uso, transformando-o, também em serviço inadequado, já que haverá abruptamente a sua interrupção.

            Assim, atos normativos expedidos pelas agências reguladoras sempre passarão por um controle tanto pelo ente controlador-Estado (tutela), como também, e normalmente é o que ocorre, pelo Poder Judiciário (controle externo de resultados), inclusive, analisando o mérito administrativo quando há desvios de finalidade e falta de paridade com base no princípio da proporcionalidade que concede ao Poder Judiciário a ampliação do controle da discricionariedade destes atos.

 

6 Conclusão

 

            Diante o esposado, conclui-se que os atos normativos expedidos pelas Agências Reguladoras na busca do serviço adequado quando restringe direitos fundamentais, devem ter uma finalidade mais benéfica do que a própria restrição. A benesse ao direito fundamental deve ser maior do que a sua restrição.

            O controle sobre estes atos é feito em três fases; adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito, havendo a incompatibilidade de um elemento a análise se interrompe e o ato normativo deve ser retirado do ordenamento. Veja que a verificação não só fica afeta a legalidade formal, mais ao direito sendo como parâmetro o controle com base em regras e princípios.

            Por isso, o controle no decorrer destes anos com a constitucionalização dos princípios Administrativos (art.37 “caput”) ampliou-se o controle, em razão da  normatização de princípios e regras, considerados novos mecanismos na busca da qualidade nos serviços públicos- serviço adequado, em especial aqueles afetos às Agências Reguladoras.

 

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Sobre o autor
Jacob Paschoal

É Procurador do Município de Guarulhos lotado na Secretaria de Transportes e Mobilidade Urbana. Foi Chefe na Procuradoria de Licitações e Contratos deste Município de 2013-2016.Ex- Oficial titular de Registro Civil no Estado de São Paulo (2007-2009). Especialista em Direito Eleitoral e Processual Eleitoral pela Escola Judiciária Eleitoral Paulista do Tribunal Regional Eleitoral -SP. Pós graduando em Gestão Pública com ênfase em Cidades pela Fundação Getúlio Vargas- FVG. Mestre em Direito do Estado pela PUC-SP. Mestrando em Cidades Inteligentes- UNINOVE. Coordenador Jurídico do Fórum Paulista de Secretários e dirigentes de mobilidade Urbana do Estado de SP.(2020-2021). Advogado e Consultor

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Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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