Capa da publicação Cumprimento de pena após condenação em segundo grau
Artigo Destaque dos editores

Da possibilidade de cumprimento de pena após condenação em segundo grau

Exibindo página 2 de 4
Leia nesta página:

3 DA SENTENÇA E DA COISA JULGADA

 3.1 INTROITO DE JUSTIFICAÇÃO

Diante do tema tratado pelo presente trabalho, e considerando a subsidiariedade do processo civil em face do processo penal, afigura-se indispensável tratar da Teoria dos Capítulos de Sentença, mormente em razão dos aspectos práticos que ela revela para a adequada compreensão do assunto, qual seja, a possibilidade de cumprimento de pena antes do trânsito em julgado da sentença penal condenatória, conforme buscar-se-á demonstrar no decorrer do mesmo.

No âmbito do processo civil, sobre as repercussões práticas propiciadas pela teoria dos capítulos de sentença, veja-se as lições de Didier Jr. Et. Al. (2015, pág. 355):

A percepção de que o dispositivo de uma decisão judicial pode ser dividido em capítulos é de extrema utilidade; isso repercute nos mais variados temas do direito processual, tal como na atribuição do custo financeiro do processo, na teoria dos recursos, na liquidação e efetivação das decisões que certificam direito a uma prestação na própria teoria da decisão judicial

Para atingir o desiderato proposto para o capítulo, por questões metodológicas, dividimos a análise em três pontos básicos. O primeiro, voltado a tecer linhas gerais sobre a teoria supramencionada. No segundo, por sua vez, será procedido um confronto entre a mesma em face dos recursos, tanto cíveis, quanto penais, para, por fim, estabelecer considerações finais, à título de conclusão parcial, em relação aos assuntos abordados no capítulo.

Aliás, vale salientar, o tema foi tratado, ainda que de passagem, no julgamento do HC 126.292/SP, de Relatoria do falecido Ministro Teori Zawascki, julgado em 17 de fevereiro de 2016. Tanto é que colhe-se, do voto do Ministro Luiz Fux (2016, pág. 58-59) o seguinte excerto: “Coisa julgada significa a imutabilidade da decisão ou a indiscutibilidade de alguns capítulos da decisão”.

Justificado, contextualizado e explicitadas as razões metodológicas pertinentes ao presente capítulo, passar-se-á ao primeiro ponto.

3.2 DOS ELEMENTOS E CAPÍTULOS DE SENTENÇA

 Antes de tratar da Teoria dos capítulos de sentença, propriamente dita, cumpre trazer algumas contextualizações sobre a topografia de seu estudo. Dentro do que a doutrina chama de teoria da decisão judicial, conforme os ensinamentos de Didier Jr. Et. Al (2015, págs. 311-312), é necessário compreender os elementos essenciais de uma sentença (entenda-se decisão). Consoante o art. 489, caput, incisos I, II e III do CPC/15, são elementos essenciais da sentença: a) Relatório; b) Fundamentação; e, c) Dispositivo.

No processo penal, por sua vez, a lógica é bastante similar, inobstante algumas pequenas diferenças. Eis o teor do Art. 381, do Código de Processo Penal, (Decreto-Lei n° 3.689, de 3 de outubro de 1941):

Art. 381 - A sentença conterá:

I - os nomes das partes ou, quando não possível, as indicações necessárias para identificá-las;

II - a exposição sucinta da acusação e da defesa;

III - a indicação dos motivos de fato e de direito em que se fundar a decisão;

IV - a indicação dos artigos de lei aplicados;

V - o dispositivo;

Vl - a data e a assinatura do juiz.

Em linhas gerais, os incisos I e II, do Art. 381 do CPP correspondem ao relatório; os incisos II e IV à fundamentação, e o V ao dispositivo. Tal conclusão pode ser depreendida do confronto entre os mencionados dispositivos, quai sejam, o Art. 489, caput, I, II, III do CPC (BRASIL, 2015) cumulado com o art. 381, I, II, III, IV, V, VI do CPP (BRASIL, 1941).

Dessa forma, perceptível a similitude existente entre as matérias tratadas, constatação essa que ganhará relevo mais adiante. Feitas essas observações, cumpre retornar à topografia do estudo da teoria dos capítulos de sentença. Segundo Didier Jr. Et. Al. (2015), a mesma é estudada quando da abordagem do dispositivo como elemento da decisão. 

Seguindo a mesma linha de sistematização, pode-se citar Jorge Neto (2015). À vista disso, será aqui mantida. Vale destacar, nesse passo, que tomando em consideração que não se tem o objetivo de esgotar a temática, não serão tecidas minudentes observações sobre os demais elementos, mas observar-se-á, entretanto, o que for necessário.

Assim, e com base no Art. 489, I do CPC, o relatório é o elemento da sentença aonde serão registrados “os nomes das partes, a identificação do caso, com a suma do pedido e da contestação, e o registro das principais ocorrências havidas no andamento do processo” (BRASIL, 2015).

Dito de outra forma, é uma síntese dos principais aspectos que circundam o processo. Interessante fixar, nesse passo, as lições de Didier Jr. Et. Al. (2015, p. 313):

Em um sistema que valoriza o precedente judicial, como o brasileiro, o relatório possui um papel relevantíssimo na identificação da causa e, com isso, dos fatos relevantes (material facts), sem os quais não é possível a aplicação do precedente judicial. Não se pode aplicar ou deixar de aplicar de aplicar um precedente, sem saber se os fatos da causa a ser decidida se assemelham ou se distinguem dos fatos da causa que gerou o precedente. Daí a importância do relatório, onde deve estar a correta e minuciosa exposição da causa.

A fundamentação, por sua vez, é o ponto da decisão no qual serão analisadas as questões de fato e de direito que circundam o caso concreto, consoante o preceitua o Art. 489, II do CPC. Em outras palavras, é o elemento da decisão onde o juiz fixará as premissas de sua decisão. Nessa linha de raciocínio, e destacando a importância da mesma, veja-se as lições de Didier Jr. Et. Al. (2015, pág. 314):

A garantia da motivação das decisões judiciais possui natureza de direito fundamental do jurisdicionado. A própria Constituição Federal, em seu art. 93, IX, estabelece que toda decisão judicial deve ser motivada e, fugindo um pouco à sua linha, prescreve norma sancionadora, cominando pena de nulidade para as decisões judiciais desmotivadas. Ainda, porém, que não houvesse disposição constitucional expressa nesse sentido, o dever de motivar não deixaria de corresponder a um direito fundamental do jurisdicionado, eis que é consectário da garantia do devido processo legal e manifestação do Estado de Direito. A regra da motivação compõe o conteúdo mínimo do devido processo legal.

Ainda cumpre destacar, como se verá mais adiante, que dos fundamentos decisórios é donde se extraí as razões fundamentais necessárias para aplicação dos precedentes. Constam dela, por exemplo, os fundamentos determinantes de uma decisão que, na sistemática do controle de constitucionalidade brasileiro, assumem força vinculante perante os demais órgãos, não só do judiciário, mas perante toda a sociedade, posto que parâmetro de observância obrigatória. Nesse sentido, vide os ensinamento de Didier Jr. Et. Al. (2015).

Nesse passo, cumpre destacar que a fundamentação decisória possui funções: uma endoprocessual e outra exoprocessual. Nas palavras de Didier Jr. Et. Al. (2015, pág. 315), a função endoprocessual:

[...] permite que as partes, conhecendo as razões que formaram o convencimento do magistrado, possam saber se foi feita uma análise apurada da causa, a fim de controlar a decisão por meio dos recursos cabíveis, bem como para que os juízes de hierarquia superior tenham subsídios para reformar ou manter essa decisão.

A função exoprocessual, por sua vez, nas palavras dos autores acima mencionados (2015.pág. 315):

[...] viabiliza o controle da decisão do magistrado pela via difusa da democracia participativa, exercida pelo povo em cujo o nome a sentença é pronunciada. Não se pode esquecer que o magistrado exerce parcela do poder que lhe é atribuído (o poder jurisdicional), mas que pertence, por força do parágrafo único do art. 1° da Constituição Federal, ao povo.

Por outro lado, dispositivo é o elemento da decisão onde serão resolvidas, pelo juiz, as questões principais que as partes lhe submeterem, consoante o disposto no Art. 489, III do CPC. Após sustentar que se trata de elemento nuclear da decisão, eis as lições de Didier Jr. Et. Al. (2015, págs. 349-350), que aduzem que o “Dispositivo é a parte da decisão em que o órgão jurisdicional estabelece um preceito normativo, concluindo a análise acerca de um (ou mais de um) pedido que lhe fora dirigido”.

Jorge Neto (2015, pág 238), por sua vez, afirma que “é a parte final da sentença. Nele o julgador proclama o resultado do julgamento e dá o comando normativo que deverá ser cumprido pelas partes”. Pode-se dizer, nesse gancho, que é nele, assim, onde serão resolvidas as questões principais e controvertidas postas à apreciação jurisdicional. Vale transcrever, por razões didáticas, as lições de Marinoni et. Al. (2015, pág. 415) que aduzem que:

O dispositivo é o local em que o juiz afirma se acolhe ou não o pedido do autor e, em caso de acolhimento, o que deve ser feito para que o direito material seja efetivamente realizado. Assim, por exemplo, o juiz pode, na parte dispositiva da sentença, ao acolher o pedido formulado, condenar o réu a pagar certa soma em dinheiro ou ordenar o réu a fazer ou a não fazer ou mesmo determinar a entrega de determinada coisa. Como a parte dispositiva é aquela que dá resposta ao pedido do autor, ela também é chamada de conclusão da sentença da sentença. O dispositivo é o comando que rege a vida das partes e exprime como essas devem se comportar diante do acaso concreto.

Com essas observações iniciais, é mister, doravante, tratar da relação deste com a teoria dos capítulos de sentença, esta sistematizada, no Brasil, por Dinamarco (2006), em obra especialmente destinada ao tema, qual seja, “Capítulos de Sentença”. Impera dizer, dessa forma, que é necessário entender, desde logo, do que se trata um capítulo de sentença. Segundo Jorge Neto (2015, pág. 238):

Os capítulos de sentença nada mais são que a projeção das questões jurídicas discutidas no processo. As questões jurídicas [...] são os pontos de divergência entre as partes; já os capítulos de sentença são os compartimentos do pronunciamento judicial que resolvem essas questões.

À vista dessa conceituação, pode-se dizer que os mesmos são as partes da decisão judicial onde foram resolvidas questões postas ao juízo. Vale dizer, para cada questão resolvida, um capítulo de sentença. É justamente em razão disso que Didier Jr. Et. Al. (2015, pág. 353) afirmam se tratar de uma “unidade decisória autônoma contida na parte dispositiva de uma decisão judicial”.

É justamente nesse peculiar aspecto que o assunto interessa ao trabalho. Ora, no processo penal também são resolvidas questões processuais e de mérito. É possível, vale dizer, aplicar a lógica dessa teoria para o processo penal. Imagine-se, por exemplo, um caso onde se discuta, dentre outros pontos, a condenação /absolvição de uma pessoa.

Assine a nossa newsletter! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos

Evidente que resolvida a questão, pela condenação, verbi gratia, será necessária a imposição e a correlata quantificação da pena. Nesse caso, também haverá a constituição de um capítulo de sentença, onde se resolverá, por certo, o assunto. E assim, pela lógica posta, irão se formando “unidades decisórias” para cada ponto resolvido.

Dessa forma, impende dizer, à decisão penal, e essa é uma premissa importante do trabalho, também cumpre observar essas possibilidades, conforme será melhor articulado ao final do capítulo, depois de analisar os principais aspectos da disciplina recursal diante da teoria dos capítulos de sentença, mormente no que tange aos efeitos recursais, tema este que está, conforme será demonstrado, intimamente ligado à problemática principal do trabalho.

3.3 DA COISA JULGADA

Consoante o Art. 502 do Código de Processo Civil, Lei 13.105, de 15 de março de 2015, “Denomina-se coisa julgada material a autoridade que torna imutável e indiscutível a decisão de mérito não mais sujeita a recurso”. Sobre o assunto, comentando o artigo retromencionado, eis as valiosas lições de Didier, et all (2015, 513), segundo os quais:

Primeiramente, considera a coisa julgada uma "autoridade". "Autoridade" é uma situação jurídica: a força que qualifica uma decisão como obrigatória e definitiva. Como situação jurídica, a coisa julgada é um efeito jurídico - efeito que decorre de determinado fato jurídico, após a incidência da norma jurídica. Na segunda parte, o art. 502 do CPC preceitua os dois corolários dessa autoridade: a decisão torna-se indiscutível e imutável.

Dessa forma, como se pode depreender, a decisão de mérito que não mais possa ser desafiada, mediante recurso, estará acobertada pela coisa julgada, sendo passível, assim, de execução definitiva (MARINONI, 2015).

À vista disso, e considerando que é indispensável algumas notas sobre as espécies de coisa julgada, passaremos, doravante, a tratar, dentro do possível, destas. Em sintonia com os objetivos do trabalho, entretanto, serão expostas apenas no que for imprescindível para propiciar uma melhor compreensão da matéria. Dessa forma, inciar-se-á por algumas considerações sobre coisa julgada material e formal. Sobre o assunto, eis as lições de Didier, et all (2015, pág. 517) aduzindo que:

Coisa julgada formal é uma categoria doutrinária. Para a parte majoritária da doutrina, coisa julgada formal se refere à indiscutibilidade e à imutabilidade de uma decisão no âmbito do processo em que proferida. É uma estabilidade endoprocessual da decisão e, por isso, distingue-se da coisa julgada propriamente dita (chamada de coisa julgada material), que se projeta para fora do processo em que produzida.

Segundo o mencionado autor, a coisa julgada formal seria uma espécie de preclusão, em razão da qual não se pode mais discutir a matéria no âmbito do mesmo processo (2015). Em outras palavras, ao se reconhecer uma decisão como formalmente preclusa significa dizer que ela não mais será objeto de apreciação no âmbito do mesmo procedimento, visto que matéria formalmente preclusa.

A coisa julgada material, por sua vez, irradia seus efeitos para fora do processo em que foi proferida (MARINONI, 2015). Com o seu reconhecimento, apenas nas hipóteses de relativização da coisa julgada ela poderá ser modificada.

Tais, entretanto, não serão aqui expostas em razão de fugir aos objetivos do trabalho. Dessa forma, cumpre tecer considerações sobre a coisa julgada vista do âmbito do resultado do processo, pois tal classificação é de suma importância para a lógica aplicada ao processo penal.

Antes, porém, cumpre destacar que os ensinamentos até aqui esposados valem tanto para o processo civil como para o processo penal. Tecida essa consideração, impede algumas considerações iniciais.

Na seara do processo penal, é bom que se diga, a formação da coisa julgada varia conforme o resultado do processo. A depender dele, pode haver coisa julgada material ou formal (TÁVORA, 2013). Não cabe, aqui, trazer as hipóteses exaustivamente, mas apenas no que for necessário. Sobre o assunto, eis as lições de Oliveira (2015, pág. 670), aduzindo que:

Há, com efeito, decisões judiciais que, quando passadas em julgado, impedem a rediscussão da matéria unicamente em relação ao contexto em que foi proferida e especificamente no processo em cujo curso foi prolatada. Fala-se, então, em coisa julgada formal. Por exemplo: a decisão que rejeita a denúncia por ausência de pressupostos processuais ou de qualquer das condições exigidas na lei para o exercício da ação penal (incluindo as condições de procedibilidade), nos termos do art. 395, CPP. Referida decisão impediria, naquele processo, a reabertura da discussão daquele caso penal, fazendo coisa julgada formal, pois.

À vista disso, conforme se pode depreender, é possível que em outro processo ela venha a ser rediscutida, visto que a decisão fez coisa julgada apenas formalmente. A decisão condenatória, por outro lado, é passível de relativização diante das hipóteses do Art. 621 do Código de Processo Penal (BRASIL, 1941).

Tecidas essas considerações, cumpre, a diante, tratar da coisa julgada em razão de sua extensão. Sob essa perspectiva, ela poderá ser total ou parcial, a depender do quantum tenha sido impugnado nos cabíveis recursos.

Para melhor explicar, imagine que em uma ação (seja cível ou penal), se discuta duas matérias (X e Y). Ao recorrer da condenação, por exemplo, o réu não impugnou a matéria Y. Diante disso, a matéria passa a não ser mais discutível dentro do mesmo procedimento quanto em outros. Dessa forma, forma-se coisa julgada tanto formal como material, visto que, passada em julgado, não será mais passível de rediscussão, excetuada as hipóteses de relativização.

3.4 DOS RECURSOS EM FACE DA TEORIA DOS CAPÍTULOS DE SENTENÇA

Tratar-se-á, aqui, dos recursos em face da teoria dos capítulos de sentença, mormente no que atine aos seus efeitos. Em razão da similitude da matéria, não será procedida diferenciação entre recursos cíveis e criminais, posto que ambos, quanto aos efeitos, podem ser tratados simultaneamente.

Ademais, por questões metodológicas, será adotada uma lógica diferenciada de tratamento, pois sustenta-se, aqui, que o efeito suspensivo do recurso somente pode se dar na extensão impugnada pelo mesmo. Em outras palavras, é possível que haver matéria com trânsito em julgado já no primeiro grau de jurisdição, a depender do quantum foi impugnado no recurso.

Cumpre, assim, trazer o conceito de recurso. Nesse particular, são válidas as lições de Didier e Cunha (2016, pág. 87) segundo os quais: “recurso é o meio ou instrumento destinado a provocar o reexame da decisão judicial, no mesmo processo em que proferida, com a finalidade de obter-lhe a invalidação, a reforma, o esclarecimento ou a integração”.

À vista disso, e já caminhando para o tema a ser abordado, cumpre registrar que dois são efeitos mais conhecidos em matéria recursal. São eles o efeito suspensivo e o efeito devolutivo.

Não se desconhece, por óbvio, da existência de outros, mas aqui, considerada a finalidade do trabalho, a analisa sofrerá recorte, de forma que ficará restrita, vale salientar, aos dois já citados acima e àquele que José Carlos Barbosa Moreira (2009) chama de impeditivo ao transito em julgado.

Mais uma vez, ressalte-se, que a ordem de abordagem se dará de modo particularizado, tomado os escopos do trabalho.

Passa-se, então, ao denominado efeito devolutivo. Sem adentrar na divergência atinente a ser, ou não, próprio de todos os recursos, o efeito devolutivo pode ser definido como a consequente devolução de uma determinada matéria, cuja extensão será definida no recurso, para que volte a ser apreciada, em toda a sua profundidade, pelo poder judiciário (CUNHA e DIDIER, 2016).

Sobre o primeiro aspecto, a extensão do recurso, convêm arrolar as lições de Didier Jr e CUNHA. (2016, págs. 142-143) segundo os quais:

A extensão do efeito devolutivo significa delimitar o que se submete, por força do recurso, ao julgamento do órgão ad quem. A extensão do efeito devolutivo determina-se pela extensão da impugnação: tantum devolutum quantum appellatum. O recurso não devolve ao tribunal o conhecimento de matéria estranha ao âmbito do julgamento (decisão) a quo. Só é devolvido o conhecimento da matéria impugnada (art. 1.013, caput, CPC). Sobre o tema, convém ressaltar que as normas que cuidam da apelação funcionam como regra geral. A extensão do efeito devolutivo determina o objeto litigioso, a questão principal do procedimento recursal.

Nesse mesmo sentido, impende dizer, são as lições de Eugênio Pacelli de Oliveira (2014). Dessa forma, vale salientar, a matéria impugnada no recurso é que irá delimitar o conhecimento que será realizado pelo órgão recursal ad quem.

Quanto à profundidade, por outro lado, não sofrerá as limitações decorrentes da escolha dos fundamentos recursais, posto que, saliente-se, ligada aos subsídios que serão tomados como base para julgar o recurso. (OLIVEIRA, 2014)

Assim, impõe-se o registro, o órgão ad quem não ficará limitado aos fundamentos utilizados como suporte para a interposição do recurso, podendo transcender a eles, desde que oportunizada, por imposição do princípio do contraditório, a manifestação prévia daqueles a quem os prejudica.

Nesse particular, por oportuno, é proveitosa a juntada das lições do professor acima citado (2014, pág. 949), para quem:

No campo do processo penal, o exame em profundidade inclui até mesmo a repetição de provas já realizadas e mesmo a possibilidade de novo interrogatório do réu (art. 616, CPP, aplicável não só às apelações). A devolução da matéria somente encontraria limites quanto à sua extensão, e não em relação à profundidade.

Dessa forma, quanto à extensão, pode-se assentar que a temática está umbilicalmente ligada, embora não se confundindo, com a teoria dos capítulos de sentença. Isso porque, conforme se pode depreender, são os capítulos da decisão que serão objeto da impugnação recursal delineando os limites de devolução da matéria.

Explicando com outras palavras: se capítulo de sentença é “unidade da decisão” onde se resolve uma questão posta à apreciação jurisdicional, e o recorrente escolhe a matéria sobre a qual recai a sua irresignação, conclui-se, então, que poderá se dá apenas em um, alguns, ou todos os pontos da decisão. Dessa forma, é nítida a possibilidade de fracionamento da mesma, de forma a poder falar, inclusive, em parcelas incontroversas da “sentença”.

Sobre estas, mister o registro, não recairia o efeito suspensivo dos recursos, posto que, e aqui está o âmago da ressalva metodológica acima feita, se dará apenas em face da extensão da matéria impugnada.

A mesma linha de raciocínio se aplicaria, vale dizer, ao efeito impeditivo do trânsito em jugado, posto que, in casu, ter-se-ia, conforme restou demonstrado, um fracionamento da matéria decisória de forma a possibilitar o trânsito parcial de matérias.

Nesse sentido, inclusive, foram as considerações do Ministro Luiz Fux (2016, pág. 58-59) no julgamento do HC 126.292/SP, de Relatoria do falecido Ministro Teori Zawascki, julgado em 17 de fevereiro de 2016.

Tome-se, como base, o exemplo acima aventado, ná página 26 (recurso especial discutindo quantificação de pena). A extensão do recurso, nessa situação, não discutirá mais o juízo de condenação. E é justamente aqui que entra a possibilidade do cumprimento de pena, ainda que pendente o recurso.

Poderia se dizer, aqui, que estar-se-ia desrespeitando a presunção de inocência, em razão da abertura dessa possibilidade. Entretanto, cumpre dizer, não há mais presunção de inocência, pois, neste aspecto, a matéria é formalmente preclusa. Não se discutirá mais no processo, a menos que surjam novas provas, e em revisão criminal, a inocência do réu (Art. 621, III, do CPP).

Assuntos relacionados
Sobre o autor
Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

GOMES, Decio Nathanael Nogueira. Da possibilidade de cumprimento de pena após condenação em segundo grau. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 22, n. 5259, 24 nov. 2017. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/62121. Acesso em: 25 abr. 2024.

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Publique seus artigos