Capa da publicação Presunção de inocência e o HC de Lula no STF
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Princípio da presunção de inocência - decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal e o caso Lula

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4 DA DECISÃO PROFERIDA NO HABEAS CORPUS Nº 126.292

4.1 Caso que deu ensejo ao Habeas Corpus nº 126.292

Inicialmente, insta salientar que, quando o assunto em comento é o Habeas Corpus nº 126.292, muitos (apoiadores ou não da nova decisão), ao debaterem o tema sequer imaginam de qual seja o caso que ensejou a decisão.

Adianta-se que referida situação trata-se de momento em que o Supremo Tribunal Federal, revestindo-se de um Ativismo Judicial sem precedentes, julgou de forma contrária à Constituição, mudando entendimento pacificado há anos.

Tal acontecimento deu-se em momento em que o Brasil passa por devasta crise política e judicial, razão pela qual, o novo posicionamento é acolhido e apoiado por diversas pessoas, com conhecimento técnico, ou não, que enxergam na decisão o fim da impunidade para aqueles que cometem crimes políticos, os chamados crimes de colarinho branco – pelo qual pessoas de grande importância na sociedade incorrem em delitos, através de “fraudes e outras tramoias [...] para desviar dinheiro” (RODRIGUES, 2017).

Todavia, como se verá a seguir, o crime que deu ensejo ao novo posicionamento do Tribunal, nem mesmo se compara à referida modalidade de crimes citada, como supõe os defensores da decisão.

Tudo teve início em 29 de março de 2011, na cidade de Itapecerica da Serra/SP, onde dois jovens (M.R.D. e A.S.L.)[8] foram denunciados pelo Ministério Público pelo cometimento do crime de roubo qualificado. Ambos foram presos preventivamente, porém tiveram as prisões revogadas ao longo do processo, chegando ao julgamento livres.

A sentença datada de 28 de junho de 2013 condenou ambos os agentes: A.S.L. com pena de 6 anos e 8 meses, e M.R.D. com pena de 5 anos e 4 meses. O primeiro teve sua prisão decretada. Entretanto, permitiu o juiz, não enxergando periculosidade em M.R.D., que este recorresse em liberdade. O Ministério Público contentou-se com a decisão e não interpôs recurso. Ambos os agentes apelaram ao Tribunal de Justiça de São Paulo.

Neste ponto já resta evidente que M.R.D. não é “do colarinho branco”, mas ao contrário: jovem pobre, filho de empregada doméstica da casa de uma advogada que agiu em sua defesa. Vale esclarecer que a execução provisória não é para culpabilizar quem comete crimes de colarinho branco, poderia de fato ser, mas os números[9] mostram que a maioria esmagadora de pessoas atingidas com a nova decisão, é de pessoas como M.R.D.

Um ano e três dias depois, os autos chegam ao Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, situação em que a apelação de ambos é julgada – e negada, A.S.L. que já estava preso, manteve-se.

Todavia, a estranheza se encontra no fato de que, ainda que transitada em julgado a condenação para o Ministério Público e havendo apenas apelação de M.R.D., o mesmo além de não ter seu recurso provido, teve a prisão decretada sem nenhuma fundamentação, “de ofício”, inclusive em regime fechado, ainda que com a pena inferior a oito anos. Lênio L. Streck (2016) diz que o agente “foi buscar lã e saiu tosquiado”.

As advogadas de ambos, em 19 de dezembro de 2014, impetraram Habeas Corpus ao Superior Tribunal de Justiça, que indeferiu a liminar, alegando jurisprudência defensiva.

Autos ao Ministério Público Federal, que sabiamente, deu parecer favorável à concessão do Habeas Corpus.

Com o referido indeferimento da liminar, as advogadas impetram novo Habeas Corpus, agora ao Supremo Tribunal Federal. Ao analisar o caso em 05 de fevereiro de 2015, o Ministro Teori Zavascki deferiu a liminar, concedendo a ordem. Para tanto, reconheceu que a sentença já havia permitido que o paciente recorresse em liberdade, havendo recurso apenas deste. Mencionou ainda, que o Tribunal de Justiça de São Paulo não apresentou qualquer fundamento ao impor a prisão preventiva, consoante prevê o artigo 312 do Código de Processo Penal, estando a decisão em desacordo com Jurisprudência do Supremo.

Desta feita, teria acabado o caso para M.R.D., que poderia aguardar o julgamento de seus recursos em liberdade, vez que reconhecidas todas as situações anteriormente narradas.

Contudo, sabendo que este caso é o próprio Habeas Corpus 126.292 é de se concluir que, infelizmente, para o paciente, o caso não acaba aqui.

4.2 A decisão propriamente dita

O Habeas Corpus foi levado ao Plenário do Supremo Tribunal Federal em 17 de fevereiro de 2016 para se discutir a liminar deferida pelo Ministro  Teori Zavascki.

Ocorre que em tal situação, o próprio Ministro, muda decisão e se pronuncia em sentido contrário, votando com a maioria (sete votos a quatro). Ou seja, M.R.D. volta à prisão – o mesmo que teve o direito de recorrer em liberdade; não tendo interposição de recurso por parte do Ministério Público; sendo preso “de ofício” pelo Tribunal de Justiça de São Paulo; a quem o Ministro reconheceu todas as circunstâncias fáticas e controversas do processo.

Ao decidir pela revogação da liminar, o relator do caso (Min. Teori Zavaski), afirmou que a presunção de inocência se arrasta apenas até o momento em que a decisão proferida em sentença é confirmada em segundo grau de Jurisdição. Todavia, após referido momento, não há mais que se falar em presunção de inocência, isto porque, segundo o Ministro, os recursos cabíveis em instâncias extraordinárias não discutem mais fatos e provas, apenas matéria de direito. E segue o Ministro (BRASIL, 2016):

Ressalvada a estreita via da revisão criminal, é, portanto, no âmbito das instâncias ordinárias que se exaure a possibilidade de exame de fatos e provas e, sob esse aspecto, a própria fixação da responsabilidade criminal do acusado. É dizer: os recursos de natureza extraordinária não configuram desdobramentos do duplo grau de jurisdição, porquanto não são recursos de ampla devolutividade, já que não se prestam ao debate da matéria fático-probatória. [...]

Desse modo, resta evidente que o relator votou pelo indeferimento da liminar, ao passo que foi seguido pelos Ministros Edson Fachin, Luís Roberto Barroso, Luiz Fux, Dias Toffoli, Cármen Lúcia e Gilmar Mendes. De outro modo, concluíram pela concessão do Habeas Corpus, abrindo e votando com a divergência a Ministra Rosa Weber e os Ministros Marco Aurélio, Celso de Mello e Ricardo Lewandowski (BRASIL, 2016).

De pronto, já se observa que nem mesmo o relator atentou-se para o previsto no artigo 283 do Código de Processo Penal, não enfrentando o mesmo, a fim de alegar sua constitucionalidade ou não. Lênio L. Streck (2016) bem define a controvérsia da decisão nos seguintes moldes:

Sigo, para indagar: O que fez, afinal, o STF? Além de dar um giro de 180 graus na sua jurisprudência, acabou por sufragar uma prisão decretada fora de qualquer legalidade, circunstância reconhecida pelo MPF e pelo próprio ministro Teori. Ou seja: o ministro Teori concede a liminar com o fundamento de que, além de poder superar a Súmula 691, o TJ-SP não havia fundamentado a prisão em segundo grau. Pois agora ele, juntamente com mais seis ministros, revogam a liminar, só que não fundamentam a necessidade do caso concreto.

Ao analisar o caso, o Supremo deveria ter feito um overruling acerca do entendimento anterior. Um overruling se dá quando um Tribunal entende que deve mudar sua jurisprudência. Para tanto, deve demonstrar o porquê do novo entendimento. Ou seja, além de explicar as fundadas razões que os levaram a tomar tal decisão, devem informar sob qual conjectura o fazem. Em linhas gerais, overruling quer dizer que, o caso que dá ensejo ao novo entendimento deve ser um caso passível de provocar tal reviravolta (STRECK, 2016).

O que se observa atualmente no Supremo Tribunal, é que se tem agido de forma a simpatizar com a Teoria da Katchanga Real.

Explica-se: em linhas gerais, define tal Teoria, que aquele que dá as cartas, é quem dita as regras, vez que sabe tudo, e têm todas as saídas. Contudo, sempre há um “não dito”, que é tirado da manga sempre que lhe convém (STRECK, 2012).

De fato, o que mais torna “esdrúxula” a decisão, é que no momento da deliberação do Habeas Corpus, M.R.D. tornou-se um conceito, uma tese, desaparecendo como protagonista do caso. Toda a argumentação levantada em decisão monocrática do relator quando da concessão da liminar, desaparecera. Veja-se que de um recurso interposto apenas pela defesa, fora modificada jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, em um caso extremamente simples – e ao mesmo tempo complexo – e repleto de erros não sanados. Decisão esta, que atingirá diretamente todos aqueles com condenação em Segundo Grau, ainda que pendente de recurso.

Em 17 de maio de 2016, foram opostos embargos de declaração. Situação em que se afirmou que a decisão apresenta significativa alteração jurisprudencial, vez que os precedentes judiciais possuem “dever de estabilidade”, para que se evite mudanças repentinas capazes de atentar contra a segurança jurídica. Ao fim alegou omissão por parte do Supremo, vez que não abordou de forma clara a vigência do artigo 283 do Código de Processo Penal. Os embargos foram rejeitados em 02 de setembro de 2016, sob o fundamento de que não houve qualquer vício na decisão (BRASIL, 2016).

A decisão transitou em julgado, em 14 de fevereiro de 2017, nos mesmos moldes da resolução adotada em fevereiro.

Destarte, desde fevereiro de 2016 está liberada a execução provisória da pena antes do momento previsto na Constituição Federal e no Código de Processo Penal, e suspensa a presunção de inocência.

4.3 Ações Declaratórias de Constitucionalidade (ADCs) 43 e 44

Com a decisão proferida pelo Supremo, e o descontentamento de diversos movimentos, o PEN (Partido Ecológico Nacional) e o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), ingressaram com duas Ações Declaratórias de Constitucionalidade (que receberam respectivamente, os números 43 e 44), com pedido liminar, visando o reconhecimento da constitucionalidade da nova redação do artigo 283, caput,[10] do Código de Processo Penal (incluída pela Lei nº 12.403 de 2011).

Em suma, alega o PEN que o dispositivo legal é a única interpretação cabível ao princípio da presunção de inocência, em complemento com a norma prevista no art. 5º, inciso LVII, da Constituição Federal. Menciona o partido que a decisão não é compatível com a norma do Código de Processo Penal, desse modo, para que a pena pudesse ser cumprida já a partir da condenação em Segunda Instância, o Supremo Tribunal Federal deveria ter declarado a inconstitucionalidade do mesmo.

Pedia em caráter cautelar, para que não sobreviessem novas execuções neste sentido, bem como, que fossem suspensas aquelas que já estivessem em curso. Requeria também, que até o julgamento da ADC 43, fossem libertados todos que estivessem em cárcere devido à nova decisão.

Requeria ainda o partido de forma subsidiária – no caso de não acolhimento do primeiro pedido:

Subsidiariamente, caso o primeiro pedido seja indeferido, requer que seja dada interpretação conforme a Constituição ao artigo 283 do CPP para determinar, até o julgamento final da ação, a aplicação das medidas alternativas à prisão previstas no artigo 319 do CPP em substituição ao encarceramento provisório decorrente da condenação em segunda instância.

Ainda subsidiariamente, o partido pede que, se os pedidos cautelares anteriores não forem acolhidos, seja realizada interpretação conforme a Constituição do artigo 637 do CPP, restringindo, enquanto não for julgado o mérito desta ação, a não produção do efeito suspensivo aos recursos extraordinários, e condicionando a aplicação da pena à análise da causa criminal pelo STJ quando houver a interposição do recurso especial (BRASIL, 2016).

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A OAB, por sua vez, argumenta que a redação dada pela Lei que introduziu o artigo 283 do Código de Processo Penal buscou justamente, conciliar o processo penal às normas constitucionais. Alega ainda, que o tema tem gerado grande debate e causado controvérsia jurisprudencial, o que, conforme a entidade, ameaça a segurança jurídica. Salienta que, mesmo que a decisão exarada pelo Plenário não tenha efeito vinculante, Tribunais do país todo passaram a adotar igual posicionamento, emitindo decisões que ignoram o disposto no artigo 283 (BRASIL, 2016).

Em 01 de setembro de 2016, o julgamento das ADCs teve início, sendo suspenso logo após o voto do relator, Ministro Marco Aurélio, que deferiu a liminar afirmando ser constitucional a redação do artigo 283, com a finalidade de que fossem suspensas todas as execuções provisórias após condenação em Segunda Instância. Em seu voto, ao citar o artigo 5º, inciso LVII da Constituição, o Ministro reforçou que a redação do artigo é literal, não restando espaços para quaisquer dúvidas sobre a real intenção do legislador (BRASIL, 2016).

No dia seguinte, o Ministro Edson Fachin abriu a divergência, com o escopo de indeferir a liminar. Para tanto, declarou a constitucionalidade do artigo 283, afirmando que este deve ser interpretado conforme a Constituição, afirmando que “é coerente com a Constituição o principiar de execução criminal quando houver condenação confirmada em segundo grau, salvo atribuição expressa de efeito suspensivo ao recurso cabível” (BRASIL, 2016).

O próximo a votar, Ministro Luís Roberto Barroso, seguiu a divergência, votando pelo indeferimento das cautelares, bem como, dos pedidos subsidiários.

De mesmo modo, o Ministro Teori Zavaski optou por seguir a divergência, afirmando que quando o cumprimento de pena dá-se somente após a análise de recursos em instâncias extraordinárias, o processo penal não alcança sua última finalidade, qual seja a de pacificação social.

Acompanhando o relator, a Ministra Rosa Weber ponderou que o artigo 283 é espelho do artigo 5º, inciso LVII. Afirmou, ainda, que a interpretação dá-se pela semântica das palavras, razão pela qual, não se deve afrontar a clareza do texto.

De maneira oposta, declarou o Ministro Luiz Fux, ao seguir a divergência, que na verdade, é o inciso LXI do artigo 5º da Constituição[11] que condiciona o cumprimento de pena em Segundo Grau, e se a vontade do legislador fosse a de condicionar a execução de pena somente após o trânsito em julgado, o teria feito em tal inciso.

Apresentou decisão diferente à exarada no Habeas Corpus 126.292, o Ministro Dias Toffoli, que tinha votado pela execução da pena após condenação em Segunda Instância, acompanhou, em parte o relator. Defendeu o Ministro que o cumprimento antecipado só pode se dar após o julgamento de Recurso Especial pelo Superior Tribunal de Justiça (excluindo a possibilidade quando se tratar de Recurso Extraordinário no Supremo Tribunal Federal). Afirmou por fim, que o critério, é uma forma de impossibilitar o uso exacerbado de recursos e ao, mesmo tempo, a maculação à presunção de inocência.

Ricardo Lewandowski acompanhou o relator, mas de forma integral. Afirmou que o problema não está só no desrespeito à presunção de inocência, mas também, na necessidade de motivar a execução de pena antecipada, vez que não há a correta fundamentação, sendo que, para o Ministro “os tribunais simplesmente confirmam, batem o carimbo na decisão de primeiro grau” (BRASIL, 2016).

Seguiu a divergência o Ministro Gilmar Mendes.

De outro modo, o Ministro Celso de Mello, ao acompanhar o relator afirmou que a presunção de inocência deve prevalecer até o trânsito em julgado, vez que é consequência de longo processo. Ao fim, o Ministro apresentou realce sob o fato de que não pode a inefetividade do sistema processual penal, servir de respaldo para a inobservância de princípio constitucional, sendo a solução mais coerente, a reforma de tal sistema, mas respeitando os direitos fundamentais, principalmente, aqueles fundados do princípio da liberdade.

A última a votar, Ministra Cármen Lúcia, seguiu a divergência confirmando seu entendimento pela execução antecipada da pena, afirmando que o disposto no texto constitucional não descarta a possibilidade de cumprimento da decisão antes do trânsito em julgado.

Desse modo, por seis votos a cinco, manteve-se decisão exarada quando da análise do Habeas Corpus nº 126.292.

4.4 Possíveis situações que possam gerar controvérsias com a referida decisão

Em estudo realizado, André Ribeiro da Silva (2016) apresenta alguns problemas quando do cumprimento de pena em momento anterior ao trânsito em julgado da sentença penal condenatória.

Ademais, estudando-se o caso, verificam-se outros problemas que surgirão com o cumprimento da pena após a decisão de segunda instância, sem o trânsito em julgado do processo.

4.4.1 Do não reconhecimento do privilégio no crime de tráfico de drogas em 1ª e 2ª Instâncias

Considere um caso, onde determinado sujeito foi condenado pelo crime de tráfico de drogas – crime hediondo –, sem que lhe fosse reconhecido o privilégio (artigo 33, §4º da Lei nº 11.343/06[12]) em 1ª e 2ª Instâncias. Imagine-se que o mesmo é condenado a cinco anos de prisão, e inicie o cumprimento de pena em regime fechado. Todavia, em momento posterior, o privilégio é reconhecido em Instância extraordinária, podendo a pena ser reduzida de um sexto a dois terços, situação em que pode ficar inferior a dois anos, podendo ser cumprida em regime aberto. O que fazer com o tempo que o sujeito ficou encarcerado devido á execução antecipada?

4.4.2 Progressão do regime no cumprimento de pena

Considere que certo réu fora condenado a pena de doze anos, com decisão mantida em Segunda Instância havendo, portanto, o cumprimento antecipado da pena. Em recurso à Instância extraordinária, a pena do réu é reduzia a sete anos. Neste caso, há nítido prejuízo na progressão do regime, considerando que com a nova pena, o regime inicial a ser adotado, seria o semiaberto.

4.4.3 Momento para requerer a revisão criminal

O artigo 621 do Código de Processo Penal[13] garante a revisão criminal para processos findos, em três situações: quando a sentença foi baseada em provas ou documentos falsos; quando a sentença contraria Lei ou provas do processo; ou quando surjam novas provas de inocência do réu. O entendimento até então, é de que caberia a revisão somente após o trânsito em julgado da sentença penal condenatória. Todavia, com a nova decisão, quando se poderia ingressar com o pedido de revisão criminal? Após decisão de segundo grau ou somente após o trânsito em julgado do processo?

4.4.4 Princípio da Insignificância no crime de Descaminho

É sabido que o Superior Tribunal de Justiça e o Supremo Tribunal Federal adotam entendimentos divergentes quanto ao valor limite á ser aplicado o Princípio da Insignificância no crime de Descaminho[14]. Para o STJ, aplica-se o referido princípio quando a sonegação for até no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais). Já para o Supremo o princípio pode ser aplicado, quando o valor iludido não alcance R$ 20.000,00 (vinte mil reais).

Dito isto, imagine a seguinte situação: o agente é condenado pelo crime de descaminho por ter sonegado R$ 15.000,00 (quinze mil reais) em impostos. Tanto o juízo de Primeiro Grau, quanto o Tribunal, seguem entendimento do Superior Tribunal de Justiça, ou seja, o réu é condenado e pode dar início ao cumprimento antecipado da pena.

Todavia, imagine que esse mesmo réu, interpõe recurso junto ao Supremo Tribunal Federal, situação em que o Supremo aplicará o Princípio da Insignificância. Terá o réu cumprido pena por crime que sequer existiu.

4.4.5 Indenização decorrente do crime

Não são raros casos em que a sentença penal condenatória condena a parte vencida em obrigação a ser cumprida na esfera cível. Veja-se que o inciso IV do artigo 387 do Código de Processo Penal (BRASIL, 1941) incumbe ao juiz, que ao proferir sentença deverá fixar “valor mínimo para reparação dos danos causados pela infração, considerando os prejuízos sofridos pelo ofendido”.

Para tanto, é fixado no artigo 63[15] do mesmo diploma legal que o momento oportuno para tal, é aquele que sucede o trânsito em julgado da sentença penal condenatória.

Entretanto, considerando que a sentença condene o réu á pagar determinado valor, e que a decisão é mantida em sede recursal. Com o novo entendimento, ainda que pendente a análise de Recurso Especial ou Extraordinário, poderá a vítima ingressar com a execução da sentença penal condenatória no cível para cobrar os valores fixados na sentença?

E se a decisão é reformada pelo Superior Tribunal de Justiça ou pelo Supremo Tribunal Federal, como proceder em face do valor já pago? Caberia uma ação de repetição de indébito?

São todas questões que se levantam com o entendimento atual do Supremo Tribunal Federal, que padecem de respostas concretas, causando a insegurança jurídica que vivemos hoje.

Ademais, não somente estas questões apontadas acima, mas também questões diversas como o caso principal de absolvição pelas Cortes Superiores em sede de recurso.

 Insta salientar, que em seu voto, o Min. Luís Roberto Barroso defende a prisão antes do trânsito em julgado, afirmando que entre janeiro de 2009 e abril de 2016, a quantidade de recursos impetrados às Instâncias Extraordinárias alcançaram números insignificantes.

Apontou o Ministro que no período mencionado, foram providos menos de 3% dos recursos pelo Supremo, tanto a favor do réu, quanto a favor do Ministério Público. Aponta ainda, que se considerados apenas os recursos providos em favor do réu, o índice alcançado é de 1,1% (CANÁRIO, 2016).

Todavia, como explanado anteriormente, os números no que toca, exclusivamente, aos Habeas Corpus concedidos atinge percentual consideravelmente superior.

Outrossim, mesmo que não atingisse, pois ainda que haja apenas 1,1% de recursos providos, há pessoas (de verdade, e não apenas números) que serão gravemente atingidas pelo novo entendimento. Não há que se falar em Justiça, quando essas mesmas pessoas viram apenas estatísticas nas mãos de nossos Juristas.

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Sobre os autores
Alessandro Dorigon

Mestre em direito pela UNIPAR. Especialista em direito e processo penal pela UEL. Especialista em docência e gestão do ensino superior pela UNIPAR. Especialista em direito militar pela Escola Mineira de Direito. Graduado em direito pela UNIPAR. Professor de direito e processo penal na UNIPAR. Advogado criminalista.

Karine Aparecida Dias de Almeida

Discente do curso de direito da Unipar - Campus de Paranavaí.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

DORIGON, Alessandro ; ALMEIDA, Karine Aparecida Dias. Princípio da presunção de inocência - decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal e o caso Lula. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 23, n. 5382, 27 mar. 2018. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/65023. Acesso em: 28 mar. 2024.

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