Capa da publicação MP 927 e covid-19: aspectos trabalhistas
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Principais aspectos jurídicos empresariais acerca da Medida Provisória n. 927, de 22 de março de 2020.

Enfrentamento do estado de calamidade pública decorrente da covid-19

Leia nesta página:

Fique por dentro das novas normas trabalhistas que foram adotadas durante a vigência do estado de calamidade pública.

Sabe-se que foi promulgada a Medida Provisória nº 927, que discorre sobre possíveis medidas trabalhistas em meio ao estado de calamidade em que se encontra nosso país e o mundo. A Medida com 39 (trinta e nove) artigos visa à manutenção das relações de emprego diante do cenário atual, sem que haja demissões em massa.

Em seu capítulo primeiro, a Medida se autodeclara força maior, ou seja, o Governo autoriza que entidades públicas e privadas tomem medidas excepcionais, segundo disposto no Art. 501 da CLT, in verbis:

Art. 501 - Entende-se como força maior todo acontecimento inevitável, em relação à vontade do empregador, e para a realização do qual este não concorreu, direta ou indiretamente.

§ 1º - A imprevidência do empregador exclui a razão de força maior.

§ 2º - À ocorrência do motivo de força maior que não afetar substâncialmente, nem for suscetível de afetar, em tais condições, a situação econômica e financeira da empresa não se aplicam as restrições desta Lei referentes ao disposto neste Capítulo.

A Medida Provisória, em seu Art. 2º, autoriza a celebração de acordo individual com o empregado, a fim de manter a relação de emprego. Esse acordo terá primazia diante das demais normais legais, negociais e instrumentos normativos, ou seja, Convenções Coletivas, Acordos Coletivos e Consolidação das Leis do Trabalho, com limites estabelecidos em nossa Constituição Federal.

Em seu Art. 3º é tratado acerca das hipóteses de medidas que poderão ser adotadas pelos empregadores para a melhor condução da empresa no estado de calamidade, são elas:

I - o teletrabalho;

II - a antecipação de férias individuais;

III - a concessão de férias coletivas;

IV - o aproveitamento e a antecipação de feriados;

V - o banco de horas;

VI - a suspensão de exigências administrativas em segurança e saúde no trabalho;

VII - o direcionamento do trabalhador para qualificação; e

VIII - o diferimento do recolhimento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço - FGTS.

DO TELETRABALHO

A primeira opção apresentada seria a possibilidade de alteração para teletrabalho, sem que precise de registro prévio da alteração de contrato individual de trabalho, além de dispensar a existência ou não de Acordos ou Convenções Coletivas da categoria que prevejam essa possibilidade.

Importante frisar que o teletrabalho é recomendado para o pessoal administrativo da empresa. Além disso, é possível o controle da jornada por meio de um gerente ou coordenador, também à distância ou uso do ponto online, que hoje em dia é uma opção bastante utilizada por empresas que já utilizam do regime de teletrabalho.

Para alteração do regime presencial para o regime de teletrabalho, a Medida Provisória estabelece um limite mínimo de 48 (quarenta e oito) horas de antecedência para a notificação do empregado da mudança, podendo ser por escrito ou por meio eletrônico. Também, é autorizado a modalidade de teletrabalho para estagiários e aprendizes.

DA ANTECIPAÇÃO DE FÉRIAS INDIVIDUAIS

Fica assegurado a possibilidade de antecipação das férias do empregado, recomendada principalmente para os funcionários operacionais, que não têm possibilidade de fazer o regime de teletrabalho, podendo ser concedida mesmo para aqueles que ainda não tenham direito ao período aquisitivo. Os trabalhadores que estão enquadrados no grupo de risco, sendo idosos ou portadores de doenças crônicas, além dos empregados já diagnosticados com a doença COVID-19, têm preferência na concessão de férias individuais sobre os demais empregados.

A Medida Provisória determina um período mínimo de 48 (quarenta e oito) horas para a informação do empregado sobre a concessão de férias, podendo ser por escrito ou por meio eletrônico, ou seja, por e-mail ou por meio de aplicativos, como WhatsApp. Se faz importante destacar que o recebimento do aviso deve ser devidamente documentado, no caso de uso do WhatsApp, é recomendado arquivar o “print” do aviso e recebimento, para efeitos de comprovação.

Com relação ao pagamento das férias, ele não precisa ser antecipado, podendo ser pago até o 5º (quinto) dia útil do mês posterior à concessão das férias, portanto, no prazo do salário. Já o adicional de 1/3 (um terço) de férias poderá ser pago até a gratificação natalina.

Os profissionais da área da saúde ou aqueles que prestam serviços essenciais, que se encontram em férias ou licenças não remuneradas, poderão ter as mesmas suspensas, devendo retornar ao trabalho por convocação escrita ou por meio eletrônico, preferencialmente, com antecedência de 48 (quarenta e oito) horas.

DA CONCESSÃO DE FÉRIAS COLETIVAS

Existe também a possibilidade de concessão de férias coletivas aos empregados, devendo seguir o mesmo prazo de 48 (quarenta e oito) horas de antecedência para que seja avisado aos empregados, não necessitando de homologação sindical. As empresas de terceirização podem aplicar aos empregados terceirizados relacionados aos clientes que pediram a suspensão dos serviços. Na dúvida, recomenda-se a aplicação das férias individuais, em razão de possíveis discussões sobre a validade das férias coletivas.

DO APROVEITAMENTO E DA ANTECIPAÇÃO DE FERIADOS

Poderá ser antecipado os feriados não religiosos federais, estaduais, distritais e municipais, devendo ser notificados por escrito ou por meio eletrônico aos empregados que serão abarcados nessa antecipação, com um prazo mínimo de 48 (quarenta e oito) horas, portanto, deverão ser compensados com trabalho em data futura. Também é possível descontar do saldo eventual do banco de horas. Existe a possibilidade de feriados religiosos serem aproveitados, desde que haja concordância do empregado e que seja assegurado em acordo individual escrito.

DO BANCO DE HORAS

Sendo paralisadas as atividades da empresa, o regime de banco de horas poderá ser implementado pela mesma, tornando-se necessário a documentação do controle, de forma a aproveitar o trabalho no prazo de até 18 (dezoito) meses. A compensação poderá ser feita com até 2 (duas) horas, não podendo exceder 10 (dez) horas diárias. O empregador poderá determinar a compensação por banco de horas, mesmo sem previsão em Convenção Coletiva de Trabalho. Recomenda-se adotar o “termo de acordo de compensação e banco de horas” ou essa previsão de banco de horas no contrato de trabalho.

DA SUSPENSÃO DE EXIGÊNCIAS ADMINISTRATIVAS EM SEGURANÇA E SAÚDE NO TRABALHO

O conjunto de atividades administrativas de contratações, exames ocupacionais, clínicos e complementares, estão suspensos, devendo ser feitos após a cessação do Estado de Calamidade, em um prazo de até 60 (sessenta) dias. Permanece válido tão somente o exame demissional, podendo ser dispensado, caso já realizado outro exame ocupacional há menos de 180 (cento e oitenta) dias.

Caso exista a possibilidade de que a prorrogação do exame seja arriscada para a saúde do empregado, o médico deverá indicar a necessidade de realização do exame para a empresa.

Ficam suspensos também a necessidade de realização de treinamentos periódicos e eventuais dos empregados atuais, devendo ser realizados no prazo de até 90 (noventa) dias, após a cessação do Estado de Calamidade. A empresa pode optar pela realização dos cursos em modalidade à distância.

DO DIRECIONAMENTO DO TRABALHADOR PARA QUALIFICAÇÃO

O Art. 18, que versava sobre a possibilidade de suspensão por 4 (quatro) meses do contrato de trabalho, sem o recebimento de salário, para participação em cursos de qualificação, foi duramente criticada, sendo revogado pela Medida Provisória 928/2020.

DO DIFERIMENTO DO RECOLHIMENTO DO FUNDO DE GARANTIA DO TEMPO DE SERVIÇO

O recolhimento do FGTS nos meses de março, abril e maio de 2020, ficam suspensos, sendo que esses valores deverão ser pagos, sem juros e sem atualização monetária, em até 06 (seis) parcelas, a partir de julho de 2020, com vencimento no 7ª (sétimo) dia de cada mês. Para utilizar-se desse benefício é necessário comunicado/declaração à Secretaria da Receita Federal e ao Conselho Curador do FGTS, até 20/06/2020, sob pena de perda do benefício (juros e multa). Nos casos de rescisão do contrato de trabalho a empresa deverá efetuar o seu recolhimento quando da rescisão. Também foi criada a Circular n° 893, de 24/3/2020 referente a esse tópico, a fim de esclarecer mais sobre o assunto.

Casos as parcelas sejam inadimplidas, sofrem os encargos devidos além de estarem sujeitos a multa, e também de predispor o bloqueio do certificado de regularidade do FGTS. Ademais, fica suspenso o prazo prescricional dos débitos decorrentes ao FGTS, pelo prazo de 120 (cento e vinte) dias, contados da entrada em vigor da Medida Provisória. Outrossim, fica o certificado do FGTS expedido antes da MP prorrogado por 90 (noventa) dias.

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OUTRAS DISPOSIÇÕES EM MATÉRIA TRABALHISTA

Em estabelecimentos de saúde, sendo feito acordo coletivo individual com o empregado, fica permitido mesmo que para jornadas de 12 (doze) horas de trabalho por 36 (trinta e seis) horas de descanso e atividades insalubres, a prorrogação de jornada de trabalho e a adoção de escalas suplementares entre a décima terceira e a vigésima quarta hora do intervalo interjornada, ficando garantido o descanso semanal remunerado.

Os empregados em estabelecimentos de saúde que possuírem sobrecarga de trabalho, com horas suplementares, poderão compensar em 18 (dezoito) meses, através do banco de horas.

Ficam suspensos também, os prazos processuais para apresentação de defesa e recursos administrativos, oriundos de violações trabalhistas e notificações de débitos de FGTS, pelo prazo de 180 (cento e oitenta) dias, contados da data de entrada em vigor da Medida Provisória.

Caso os Acordos ou Convenções Coletivas da categoria estejam vencidos ou venham a vencer, a empresa poderá adotar a que vencer (ou já estiver vencida) dentro de 180 dias, por mais 90 dias.

Os Auditores Fiscais do Trabalho do Ministério da Economia deverão atuar orientando os envolvidos nas relações de trabalho, durante um período de 180 (cento e oitenta) dias, devendo agir quando contatarem as seguintes irregularidades, in verbis:

Art. 31 (...)

I - falta de registro de empregado, a partir de denúncias;

II - situações de grave e iminente risco, somente para as irregularidades imediatamente relacionadas à configuração da situação;

III - ocorrência de acidente de trabalho fatal apurado por meio de procedimento fiscal de análise de acidente, somente para as irregularidades imediatamente relacionadas às causas do acidente; e

IV - trabalho em condições análogas às de escravo ou trabalho infantil.

DA ANTECIPAÇÃO DO PAGAMENTO DO ABONO ANUAL EM 2020

O abono anual pago aos beneficiários da previdência que tenham recebido auxílio-doença, auxílio-acidente ou aposentadoria, pensão por morte ou auxílio-reclusão, terão as parcelas pagas da seguinte maneira, segundo Art. 34, inciso I e II:

I - a primeira parcela corresponderá a cinquenta por cento do valor do benefício devido no mês de abril e será paga juntamente com os benefícios dessa competência; e

II - a segunda parcela corresponderá à diferença entre o valor total do abono anual e o valor da parcela antecipada e será paga juntamente com os benefício da competência maio.


DISPOSIÇÕES FINAIS

Por fim, serão validadas as ações dos empregados consoantes às normas pertinentes na Medida Provisória nº 927, tomadas no período de 30 (trinta) dias anteriores à vigente MP. E terá validade de 180 (cento e oitenta) dias a Certidão Negativa de Débitos referente aos tributos federais e à dívida ativa da União.

Cabe destacar que, cessando o estado de calamidade, voltam as reger as demais normas trabalhistas do ordenamento jurídico brasileiro, sendo válidas as ações praticadas com base nessa Medida Provisória por se tratar de providências emergenciais para manutenção das relações de trabalho.

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Sobre os autores
Eliza Hartung

Advogada do núcleo jurídico trabalhista da Galvani Advogados Associados, inscrita na OAB/SC nº 56.832. Tem experiência profissional, com ênfase no direito digital, compliance e direito do trabalho. Graduada em Direito pela Universidade do Vale do Itajaí. Palestrante e procuradora de empresas.

Raphael Galvani

Sócio Sênior da Galvani Advogados Associados, advogado militante, inscrito na OAB/SC sob o nº 19.540, com mais de 17 anos de experiência nas áreas do Direito Empresarial, Tributário, Cível, Administrativo e Trabalhista. Contabilista. Graduado em Direito pela Universidade do Vale do Itajaí. Pós-graduado especialista em Controle Público pela Universidade Federal de Santa Catarina - UFSC. Especialista em direito tributário e contabilidade tributária pela PUC/SC. Pós graduado em direito processual pela UNAMA. Pós graduado em Compliance e Gestão de Riscos pela Uniderp. Pós graduado em Direito do Trabalho e Previdenciário pela Uniderp. Palestrante e procurador de empresas. Atualizado em 2020.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

HARTUNG, Eliza ; GALVANI, Raphael. Principais aspectos jurídicos empresariais acerca da Medida Provisória n. 927, de 22 de março de 2020.: Enfrentamento do estado de calamidade pública decorrente da covid-19. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 25, n. 6146, 29 abr. 2020. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/80759. Acesso em: 21 nov. 2024.

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