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Regime disciplinar diferenciado: dissecando a constitucionalidade da execução de pena do inimigo

Regime disciplinar diferenciado: dissecando a constitucionalidade da execução de pena do inimigo

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A segregação extrema fomenta alguns aspectos maléficos da pena privativa de liberdade, mas garante a gênese do Estado democrático de direito, que é a segurança da sociedade em um Estado de emergências impostas pelo crime organizado.

Resumo: O presente estudo visa identificar se o regime disciplinar diferenciado (RDD) representa o Direito Penal do inimigo. Analisando os efeitos do confinamento extremo apreciaremos a legalidade, constitucionalidade e efetividade do RDD. Admitindo a existência do grave criminoso e sua potencialidade lesiva cogitaremos a possibilidade de utilização do princípio da proporcionalidade como justificativa para segregação diferenciada do inimigo.

Palavras-chave: Regime Disciplinar Diferenciado. Direito Penal do inimigo. Princípio da proporcionalidade. Constitucionalidade do RDD


INTRODUÇÃO

A República Federativa do Brasil constitui-se em um Estado Democrático de direito destinado a assegurar o exercício das garantias sociais e individuais. O fundamento de nossa Carta Magna assenta-se na cidadania e no respeito incondicional à dignidade da pessoa humana.

Todo homem, apesar de livre, está sujeito, entretanto, à pena de prisão. Aos presos são assegurados todos os direitos compatíveis com a perda da liberdade, sendo intangível a sua integridade física e moral.

O presente trabalho se ergue com a análise da origem e as razões do nascimento de um Regime Disciplinar Diferenciado de cumprimento de pena no Brasil. No que consiste? Teria o Regime Disciplinar Diferenciado (RDD) inspiração filosófica no direito internacional ou seria uma criação indígena? Qual a sua natureza jurídica?

Ao tempo em que se aborda os efeitos do confinamento diferenciado deflagramos reflexões buscando identificar se o RDD representaria ou não a execução de pena do inimigo.

Uma pergunta desponta interesse nuclear: a compatibilidade do RDD com a política de execução de pena brasileira.

Para que a resposta ecloda com a lucidez necessária teremos que identificar a congruência da segregação diferenciada imposta pelo RDD com a ordem constitucional, especificamente, no que atine à suposta crueldade da medida e possível violação da dignidade da pessoa humana

Para superar o dogmatismo rasteiro, achamos conveniente partir de uma breve reflexão histórica. A posteriori, efetivaremos a análise do funcionamento do RDD com a abordagem de dados empíricos fornecidos pelo Departamento Penitenciário Nacional/Ministério da Justiça e o Centro de Readaptação Penitenciária "Dr. José Ismael Pedrosa" de Presidente Bernardes no Estado de São Paulo, Brasil.

Estaria a proteção de nossas vidas sujeita à aplicação de uma execução de pena diferenciada? A busca da segurança pública legitimaria a mitigação de garantias constitucionais e direitos individuais? Existem direitos constitucionais absolutos? O recrudescimento da pena privativa de liberdade se justificaria dentro da ótica da proporcionalidade dos bens a serem protegidos?

Estas perguntas colocam o direito penal entre a cruz e a espada, incurso em aflições nefastas. A legislação que elege o inimigo implica no rompimento com o direito penal do cidadão? Se a resposta for positiva, exsurge um Estado autocrata1. Em sendo negativa, nos restará a tarefa de delimitar a pungência deste direito penal de exceção (direito penal do inimigo), frente ao Estado democrático de Direito.

Na procura da verdadeira gênese do Estado democrático de direito, investigaremos se a ordem constitucional brasileira comporta, no seu âmago, a existência de uma legislação penal que elege seu inimigo?


1- REGIME DISCIPLINAR DIFERENCIADO: Surgimento e razões da implantação

Nos idos de fevereiro de 2001 uma megarrebelião toma conta de 29 unidades prisionais da Capital Paulista, Região Metropolitana e Interior. O movimento fora tido como a maior rebelião do pais, mobilizou cerca de 28 mil presos.

A ação foi orquestrada pela facção criminosa Primeiro Comando da Capital (PCC) que protestava contra a transferência de alguns de seus lideres.

Em 04 de maio de 2001, o Governo do Estado de São Paulo instituiu um regime disciplinar diferenciado para cumprimento de pena, como medida de rigor imposta aos líderes de organizações criminosas (Resolução SAP 026/01). O regime teve significativo sucesso de contenção.

No Rio de Janeiro, no ano de 2002 o presídio de segurança máxima Bangu I foi palco de uma briga entre as facções rivais. O confronto acabou com a morte de importantes traficantes, como Ernaldo Pinto de Medeiros (o Uê). Revoltosos, criminosos extra muros, sob as ordens dos reclusos, iniciaram verdadeiro ataque contra a sociedade. Pessoas foram queimadas vivas em ônibus públicos. Mais de 800 mil passageiros ficaram sem transporte. Parte do comércio da segunda maior capital do mundo fechou as portas. Policiais eram mortos à luz do dia, unidades policiais e do corpo de bombeiro eram atacadas.

A Secretaria de Administração Penitenciária do Estado do Rio de Janeiro, em pronto resposta, institui, também, regime disciplinar especial de cumprimento de pena, visando a “neutralização” dos presos subversivos e comandantes de facções criminosas.

A instalação do sistema disciplinar diferenciado visava afastar líderes violentos, retirando-lhes o poder de manobra sobre os demais reeducandos anulando qualquer influência no mundo “intra” para o “extra” muros das penitenciárias. Isolar os presos que lideravam facções parecia a solução mais natural e plausível, de modo a interromper a cadeia de comando e desarticular o movimento subversor.

Ainda no final da década de 90 escutas telefônicas autorizadas pelo judiciário identificaram que, assaltos, homicídios, execuções, sequestros, extorsões dentre outros delitos eram comandados e organizados de dentro de presídios estaduais. A sensação de insegurança foi generalizada, a prisão era medida ineficaz para fazer cessar a atividade criminosa de alguns indivíduos2.

O Governo Federal, no afã de ofertar respostas e soluções para os problemas postos, após amplo debate legislativo, cria e impõe, a Lei nº 10.792/2003, alterando a Lei de Execução Penal. Nasce o Regime Disciplinar Diferenciado no âmbito nacional.

O RDD foi concebido3 para atender às necessidades prementes de combate ao crime organizado e facções criminosas. O novo sistema carrega a bandeira da efetividade, arvora-se da capacidade de criar medo e temor ao macro criminoso. Funda-se em um mecanismo de rigor, que, de forma exemplar, neutraliza e anula a ação pontual de determinados presos, “salvaguardando” a segurança pública e a disciplina interna dos estabelecimentos prisionais.

A mídia aplaudiu, a opinião pública acalmou-se e 10 (dez) anos após a instituição do sistema, pende no Supremo Tribunal Federal, em fase final de julgamento a análise da constitucionalidade do Regime Disciplinar Diferenciado (ADI nº 4162).


2- HIPÓTESES DE APLICAÇÃO DO RDD

O RDD se propõe como um regime de disciplina carcerária especial, caracterizado por maior grau de isolamento do preso e de restrições ao contato com o mundo exterior.4 Sua criação não inaugura distinta modalidade de regime de pena privativa de liberdade. Cria sim, um incidente de execução com natureza acautelatória.

O regime disciplinar diferenciado consiste na aplicação, por um prazo máximo de 360 dias, sem prejuízo da repetição da sanção por nova falta grave, até o limite de um sexto da pena aplicada das seguintes medidas (LEP art. 52):

1) recolhimento em cela individual;

2) limitação das visitas semanais a duas pessoas, sem contar as crianças, com duração de duas horas;

3) limitação da saída da cela por 2 horas diárias para banho de sol.

As hipóteses de aplicação do Regime Disciplinar Diferenciado são:

1) como sanção disciplinar, em decorrência da prática de falta grave consistente em crime doloso, que ocasione subversão da ordem ou da disciplina interna (LEP, art. 52, caput, e art. 53, V).

[...]

2) para condenados ou presos provisórios que apresentem alto risco para a ordem ou a segurança do estabelecimento penal ou da sociedade (LEP, art. 52, § 1º);

3) para condenados ou presos provisórios sobre os quais recaiam fundadas suspeitas de envolvimento ou participação, a qualquer título, em organizações criminosas, quadrilha ou bando (LEP, art. 52, § 2º).


3- RDD: Inspirações internacionais para implantação do Regime

A ideia de instituir um regime diferenciado de cumprimento de pena para os detentos considerados “de alta periculosidade” tem origem no sistema prisional americano (Eastern State Penitenciary, no estado da Pensilvânia, em 1820). Aplicava-se um confinamento solitário que visava conduzir o detento ao remorso e por conseguinte à reabilitação, mediante o isolamento, privações sensoriais e proibição de contato físico. No entanto, logo se tornou evidente que o isolamento extremo provocava o desequilíbrio emocional, psicológico e mental dos prisioneiros5.

Frente a incisividade dos estudos6, em 03 de março de 1890 (Habeas Corpus impetrado por James Medley), a Suprema Corte Americana condenou explicitamente o confinamento solitário7 dos detentos.

O RDD sofre acentuada inspiração do "cárcere duro" do direito italiano, aplicado largamente no combate ao crime organizado. O Código Penitenciário Italiano é uma legislação de emergência, alterada, exatamente, durante um período de grave crise de ordem interna, com crescimento do poder da Máfia e deflagração de diversos atentados terroristas.

Entretanto, a inspiração filosófica do RDD8 é encontrada na Supermax America (Special housing units-SHU, special control units-SCU, special management units-SMU). A Supermax9 detém acentuado rigor, mas, distingui-se do confinamento solitário, uma vez que admite a saída da cela por 1 (uma) hora, mas não para banho de sol e sim para o ocupar uma outra cela onde o detento poderá caminhar algemado. Só poderá tomar banho a cada dois dias; não sendo autorizados a se reunir sequer para atividades religiosas ou para refeições. As celas são construídas de forma que os detentos não possam ver uns aos outros, e mesmo o contato com os guardas é mínimo, já que a maioria das tarefas rotineiras – vigilância, abertura e travamento das portas, comunicação interna – é totalmente automatizada. O detento não tem direito de ver TV a não ser que tenha bom comportamento e só após um ano de permanência no Regime; não terá direito a informações de pessoas que vivam a um raio de 90 (noventa) quilômetros da prisão e qualquer outra correspondência será primeiramente lida pelo responsável do estabelecimento prisional. Por fim, as visitas de advogados são bastante restritas. As celas não têm janelas, e as luzes são controladas pelos guardas, que geralmente as deixam acesas 24 horas por dia10.

De plano, identificamos acentuada semelhança entre o RDD e a Supermax Americana, sobretudo, porque o primeiro tem particularidades indígenas, as quais inauguram um conflito ideológico. De um lado, os adeptos do sistema, os quais subjulgam indispensável a pronta e enérgica resposta estatal, do outro, doutrinadores e operadores do direito os quais questionam a constitucionalidade do regime entendendo-o como método desumano de aniquilamento de personalidade.

Para desvendar a constitucionalidade do regime e sua adequabilidade criminológica é imperiosa a apreciação dos efeitos do confinamento disciplinar diferenciado.

3.1 Análise das informações fornecidas pela Secretaria da Administração Penitenciária/Coordenadoria de Unidades Prisionais da Região Oeste de São Paulo/Centro de Readaptação Penitenciária, Dr. José Ismael Pedrosa. Presidente Bernardes, São Paulo – Brasil

A Secretaria da Administração Penitenciária, pela Coordenadoria de Unidades Prisionais da Região Oeste de São Paulo11 nos forneceu valorosas e atualizadas informações sobre Regime Disciplinar Diferenciado12. Os dados delineiam o funcionamento do Centro de Readaptação Penitenciária, Dr. José Ismael Pedrosa, de Presidente Bernardes, excelência na aplicação do RDD. O relatório declina, dentre outras informações que:

  1. O Centro  de  Readaptação  Penitenciária,  dispõe  de  160  (cento e sessenta)  vagas  para  detentos  em  cumprimento  de  RDD,  sendo esta sua capacidade máxima.

  2. No  cumprimento  do Regime Disciplinar Diferenciado, os presos são alocados em  celas  individuais  (artigo 52, inciso II, da Lei nº 7.210/84, alterada pela Lei nº 10.792/2003).

  3. Visando  garantir  a  segurança  do  estabelecimento  e  a  preservação  da integridade  do  patrimônio  público,  os itens de habitabilidade das celas (pias,  vasos  sanitários,  camas,  mesas,  etc.)  são  maciços e fixos.

  4. Os portões de  acesso  aos  pátios  de sol de cada ala, bem como os portões da chamada gaiola  central  (estes  dando  acesso  aos quatro principais corredores da unidade),  são  dotados  de mecanismo remoto de abertura e trancamento. Nas entradas  de cada ala/setor/dependência da unidade, há o sistema de portões sequenciais criando áreas intermediárias para contenção.

  5. Desde  sua  inclusão  no Centro,  os  presos são alocados nos Pavilhões Habitacionais  de modo a não se permitir a proximidade e evitar ao máximo o contato  entre  presos. Esse  cuidado  é  mantido  quando  da formação dos grupos de presos para os períodos  de  banho  de  sol,  ocasião  na  qual os presos são submetidos a revista corporal e inspeção em suas celas, evitando que delas saiam para os pátios portando quaisquer objetos, materiais e anotações.

  6. Aos  presos  é  vedado  comunicar-se  com  os  demais. Durante as movimentações  internas os presos permanecem algemados  e  são escoltados por no mínimo 03 agentes penitenciários portando equipamentos de segurança.

  7. Preferencialmente,  não  ocorre a movimentação de mais de um preso por vez, nos corredores das áreas de segurança.

  8. Os  agentes  em  vigilância  nas dependências internas e os que realizam as rondas externas se mantêm atentos, ininterruptamente, aos contatos mantidos entre  os  presos a partir de suas celas (chamados “salves”), no intuito de identificar e registrar quaisquer mensagens de conteúdo suspeito.

  9. Nenhum  funcionário adentra às áreas de segurança do Centro sem compor a escala de servidores para cada ocasião, ou sem o conhecimento e autorização da  Diretoria  de  Segurança.  Servidores que não compõem as Equipes de Segurança  não transitam sozinhos naquelas áreas, e qualquer contato com os internos somente é realizado com a presença de pelo menos dois servidores.

  10. Os presos  apenas  podem  se  corresponder  com  pessoas cadastradas em um rol específico  para  correspondências. Deste rol, apenas podem fazer parte os familiares  e  seus  advogados,  dos quais  são  exigidos documentos comprobatórios  de  identidade,  parentesco e endereço. Todas as remessas e recebimentos de correspondências são registrados em livro próprio.

  11. A  estrutura de segurança do Centro de Readaptação conta com uma Central de Circuito  Fechado  de TV com 105 câmeras, bloqueador de celulares, 3 (três) portais  detectores de metais, 2 (dois) aparelhos de Raio-X para revista de volumes, e um Canil com 08 (oito) cães.

  12. A  unidade  é  dotada  de  equipamento de videoconferência para reduzir os deslocamentos  dos  internos,  atendendo a demanda de audiências dos presos deste  Centro  de  Readaptação  e  de outros estabelecimentos prisionais da Região Oeste do Estado.

  13. Indagados sobre os procedimentos adotados para redução dos danos naturais do encarceramento diferenciado a Secretaria manifestou que fornece atendimento  periódico  pelos  assistentes  sociais  e  psicólogos.

  14. Biblioteca  com 2.599 títulos e mais de 2.900 volumes. Os detentos podem manter  em  cela  até  3  volumes  deste  acervo, além de até mais 2 livros particulares que podem ser trazidos por seus familiares visitantes; não  há  previsão  de  atividades  de trabalho. Excepcionalmente, aos  internos  que  manifestem  interesse e cumpram determinados requisitos   de   natureza   disciplinar   é   disponibilizada  “orientação educacional”,  individualmente,  nos  termos  exigidos  pelo  MEC  e pela Secretaria Estadual de Educação para a devida certificação.

  15. O relatório menciona que o Centro de Readaptação Penitenciária  foi  avaliado  como  uma  das  cinco mais modernas e seguras unidades  prisionais  do  país  (vide  pag.  457 do citado Relatório), e no ranking  das  melhores  unidades  penais  consta como a 2ª do Estado de São Paulo e 10ª do Brasil (vide pag. 466 do mesmo Relatório).

  16. Dados de 2005, orçam gastos de aproximadamente R$1.561,43 (um mil quinhentos e sessenta e um reais)  por  preso,  em  valores  não corrigidos. Não foram consideradas as despesas  com  gêneros  alimentícios,  pois  são  adquiridos, preparados e fornecidos por outra unidade prisional.

  17. Indagado sobre a demanda de vagas, o Centro de Reabilitação menciona que não  dispõe  de  elementos  suficientes  para tecer considerações sobre a demanda  ou  carência de vagas. Declina que, a população carcerária mensal tem  se  mantido,  há  mais  de 3 anos, abaixo dos 40% da capacidade total. Atualmente (em 11/04/2013) conta com 17 (dezessete) internos.

  18. Quanto às visitas dos familiares dos presos e demais pessoas, eventualmente, existem dias e horários pré-estabelecidos,  bem  como  regras de segurança preventiva específicas a serem observadas. Não  há  visita  íntima e, em conformidade com a regulamentação vigente, há dias  específicos  para  a visita familiar, que acontece uma vez por semana pelo  período máximo de 2 (duas) horas, em parlatórios também equipados com grade  e  vidro  temperado  que  impedem  o  contato  físico e a entrega de objetos.

  19. Indagado sobre a efetividade do sistema no que se refere a perda de gestão do preso sobre as organizações criminosas, fora informado que as rotinas preventivas de segurança aplicadas no Centro têm, como um de seus objetivos, justamente este.

As informações coligidas realçam o rigor e organização do sistema. Muito embora haja acentuada demanda pela inclusão de detentos no RDD, a população carcerária mensal dos presos, no Presídio de Presidente Bernardes, tem  se  mantido,  há  mais  de 3 anos, abaixo dos 40% da capacidade total. Atualmente (em 11/04/2013) conta com 17 (dezessete) internos.

Outra não é a realidade dos presídios federais, aos 14 de maio de 2013 obtivemos resposta a pesquisa de campo efetivada frente ao Ministério da Justiça. O Agente Penitenciário Federal, Sérgio Quirino, por ordem da Diretoria do Sistema Penitenciário Federal informou que, nesta data, existiam 832 (oitocentos e trinta e duas) vagas nas 04 (quatro) Penitenciárias Federais, sendo que 510 (quinhentas e dez) estavam ocupadas.

Diariamente, o Sistema Penitenciário Federal recebe cerca de 30 (trinta) pedidos de novas inclusões. Todavia, conforme preceitua a Lei 11.671, em seu art. 3º, somente serão recolhidos em estabelecimentos penais de segurança máxima aqueles cuja medida se justifique no interesse da segurança pública ou do próprio preso, condenado ou provisório. A mesma Lei, em seu art. 11 § 1º, diz que o número de presos, sempre que possível, será mantido aquém do limite de vagas, para que delas o juízo federal competente possa dispor em casos emergenciais. Mesmo com, somente, 62% das vagas ocupadas, o processo de inclusão nos Presídios Federais (os quais também aplicam o RDD) é bastante rigoroso.

Estes dados demonstram que a inclusão no RDD sofre rigorosa ponderação de conveniência, necessidade e adequabilidade, delineando o rigor e excepcionalidade da aplicação da medida.

O Estado não ignora os efeitos nocivos causados pelo encarceramento duro, dotando o sistema prisional de equipe multidisciplinar de psicólogos, psiquiatras e assistentes sociais para atendimento do reeducando.

Se uma das graves consequências da segregação individual extrema é a possibilidade de degeneração mental do preso, o relatório demonstra a existência de medidas preventivas aptas a reduzir os danos psicológicos causados. Biblioteca  com 2.599 títulos e mais de 2.900 volumes. Os detentos podem manter  em  cela  até  3  volumes  deste  acervo, além de até mais 2 livros particulares que podem ser trazidos por seus familiares visitantes; embora não haja previsão  de  atividades  de trabalho, excepcionalmente, aos  internos  que  manifestem  interesse e cumpram determinados requisitos   de   natureza   disciplinar   é   disponibilizada  “orientação educacional”,  individualmente,  nos  termos  exigidos  pelo  MEC  e pela Secretaria Estadual de Educação para a devida certificação; o contato familiar é assegurado, nas visitas semanais.

Não podemos ignorar que alguns indivíduos apresentam alto potencial de lesividade, aptos a corromper todo o sistema prisional em que encontram-se incursos, assim como, de gestionar a criminalidade, mesmo estando sob a custódia do Estado. É exatamente a estes indivíduos que se aplica o RDD.

No que toca a sua “maior virtude”, qual seja a neutralização do preso frente às organizações criminosas, a Secretaria da Administração Penitenciária relata e demonstra a inexistência de fugas ou incidentes como entrada de celulares ou outro objeto capaz de oportunizar a comunicação do preso com o mundo exterior.

O RDD não acabou com a violência urbana; não aboliu as execuções e rebeliões carcerárias. Ele não é, e nunca será um instrumento apto a implementar a extinção das organizações criminosas, entretanto, consegue neutralizar delinquentes pontuais, sendo temido pela comunidade criminosa. Neste ponto, realça uma função intimidadora da pena.

Toda reação governamental defensiva deve estar circunscrita ao limites do Direito Penal. Todo “mal” imposto pelo Estado deve guardar consonância com os Direitos Constitucionais. A população tem um desejo crescente de proteção que se associa a demanda por mais castigo, que deve ser canalizado racionalmente pelo Estado. A pena não deve ser exacerbada “em termos populistas”13, mas sim, aplicada dentro de um critério de utilidade.

Se é verdade que o funcionamento de uma execução de pena diferenciada passa por considerações de absoluta necessidade, subsidiariedade e eficácia, dentro de um contexto de emergência, não menos verdade é que o Regime Disciplinar Diferenciado deve respeitar a ordem legal e constitucional brasileira, bem como, estar em consonância com políticas criminais saudáveis. A execução de pena brasileira acelera no sentido de um Direito Penal de terceira velocidade14 o qual manifesta-se como instrumento de combate às situações excepcionais de emergência, incrementa a prisão e expande o direito penal ao tempo em que relativiza direitos e garantias individuais. Sob a ótica desta tendência, devemos analisar o fenômeno RDD como possível representatividade de um Direito Penal do inimigo.


4- Direito Penal do inimigo

Ao levantar um regime disciplinar diferenciado de execução de pena o Estado elege um inimigo potencial, tendo que combatê-lo para justificar e reafirmar a confiança no próprio sistema. Bodin já advertia que é saudável (c’ est une chose slutaire) para o corpo da República buscar e punir severamente os ‘bruxos’ (inimigos). De outra maneira, existe o perigo do próprio povo matar a pedradas os magistrados e os bruxos15.

O inimigo sempre existiu! O direito pré moderno já identificava o tratamento penal diferenciado16. A essência do inimigo tem suas origens no direito romano. Carl Schimit, teórico do Estado Absoluto resgatou os preceitos romanos ao estabelecer o estrangeiro como hostil17, elegendo-o como inimicus, negando-lhe toda sorte de direito, impondo, ao mesmo, por consequência, severas e pontuais repressões.

Desde sua própria origem18o poder punitivo mostrou formidável capacidade de perversão montada na perspectiva de contenção social pela imposição do medo, legitimando verdadeiras políticas de aniquilamento. Na idade moderna a Europa presenciou uma perseguição política e social denominada caça as bruxas. Calcava-se no malefício exponencial das mesmas19. A bruxa era o inimigo a ser combatido e eliminado, sua identificação detinha critérios, que hoje são compreendidos como absolutamente insensatos. Não longe, a brutalidade nazista vitimou centenas de milhares de judeus, enquanto o stalinismo eliminava diretamente aqueles que podiam se tornar indesejáveis segundo a paranoia do autocrata20.

A teoria do Direito Penal do Inimigo foi apresentada pela primeira vez durante uma palestra proferida no Seminário de Direito Penal, ocorrido no ano de 1985, em Frankfurt, pelo doutrinador Günther Jakobs. Sua doutrina21, ciente da gravidade de algumas atividades delitivas, impõe a reação diferenciada da sociedade contra o inimigo.

Jakobs cria, na verdade, a figura do não cidadão (inimigo/hostil), para o qual o direito penal vigente não teria eficácia. Quando alguém, por livre iniciativa, decide adotar o crime como “estilo de vida” ou modus vivendi, abandonando assim o status de cidadão, torna-se um inimigo do Estado. Para combatê-lo submerge um direito de reação contra o hostil e não mais contra o fato criminoso.

Jakobs não inova, não cria o inimigo e, muito menos, inaugura as medidas de emergência, porém, a franqueza do vocabulário é o seu acerto. Torna explícito a existência de inimigos estatais e seu inevitável caráter de não pessoa, ele desnuda o fenômeno, admite a figura do hostil dentro do Estado de Direito, muito embora, tente fazê-lo, alocando o direito do inimigo fora do dogma do direito penal.

O grande problema é que a aplicação de um direito penal do inimigo que desconheça os limites do próprio direito penal, da lei e dos sistemas de garantias, remete-nos a um sistema de não direito, colocando em jogo a existência ou a identidade constitucional do próprio Estado.

Ao consagrar o conceito de hostil alvorece um modelo de Estado absoluto onde a neutralização do mal eleito e a eliminação do obstáculo coligido justificam, por si só, o direito penal do inimigo. Suprimem-se garantias individuais sob a perspectiva de que a agressão Estatal é necessária para salvaguarda da sociedade.

Toda identificação do inimigo se baseia em um mito, gerando uma relação inversa entre o grau de irracionalidade e brutalidade do poder repressivo e o nível de elaboração do discurso que procura legitimá-lo22. O poder punitivo sempre esteve pautado em uma seletividade estrutural, reprimindo de modo diferente os iguais e os estranhos, os amigos e os inimigos.

A prerrogativa de escolha do inimigo é do Estado, o qual, nem sempre o elege em razão da gravidade do crime praticado, mas sim, por vezes, do caráter do agente, seu estilo de vida, personalidade, antecedentes, conduta social e dos motivos que o levaram à infração penal. Dentro desta concepção, surge a culpabilidade do caráter, culpabilidade pela conduta de vida ou culpabilidade pela insegurança que a mera existência do indivíduo gera para o estado. Inaugura-se uma culpabilidade por “eleição estatal”23, não raro, pela bandeira de um direito penal do autor.

Aqui reside o grande flagelo do direito penal no inimigo, pois, mais cedo ou mais tarde, o conceito de inimigo pode ser estendido àquele a quem o soberano tiver interesse em reprimir, viabilizando ações de neutralização por razões de poder ou conveniência.

Ao admitir o inimigo, assistimos a possibilidade da própria neutralização do Estado de Direito. O verdadeiro perigo do direito penal do inimigo não está na sua severidade de tratamento e sim na volatilidade da eleição do inimigo pela autoridade Estatal.

Jakobs, navega pela história da filosofia política e iluminista, indo de Hobbes até Kant, apresentando diversas fundamentações de um tratamento diferenciado para cidadãos e inimigos. A distinção feita por Jakobs tem cunho descritivo, e não, propriamente, crítico.

A doutrina contemporânea serve-se da nomeclatura (direito penal do inimigo) para descrever, criticamente, tendências da moderna legislação penal. Como enredo, parte do pressuposto lógico, de que, é impossível recusar a seres humanos o status de pessoa, para, por fim, inadmitir o tratamento do indivíduo como inimigo. Esta doutrina não ignora a funcionalidade de Jakobs, o qual, pretendia reestabilizar a norma violada em sua vigência. Ninguém desconhece que o propósito do criador fora edificar doutrinariamente um direito penal do inimigo que não contaminasse o direito penal do cidadão24.

O discurso de Jakobs aflora problemas de ordem conceitual, os quais dificultam a apreciação crítica da matéria. A expressão <<direito penal do cidadão>> é um pleonasmo; enquanto o <<direito penal do inimigo>>, uma contradição em seus termos25. A própria nomenclatura “direito penal do inimigo” não está suficientemente clara. De um ponto de vista semântico, sim: o direito penal do inimigo é o tipo ideal de um direito penal que não respeita o autor como pessoa, mas que almeja neutralizá-lo como fonte de perigo. Mas se o conceito é claro do ponto de vista semântico, permanece ele deveras obscuro no que diz respeito ao seu significado pragmático, isto é, às finalidades ou funções que se tentam alcançar com sua utilização no discurso científico26. Parte da doutrina utiliza a expressão com função crítico-denunciadora, ou seja, visa identificar em algum dispositivo a doutrina do inimigo para estigmatizá-lo, de plano, como antiliberal e contrário ao estado de direito, apontando, assim, a necessidade de reforma.

O que podemos afirmar, prematuramente, é que nem Jakobs, muito menos seus opositores são claros quanto ao conceito do ‘direito penal do inimigo’ o que leva a utilização não unívoca da expressão. Assim, a partir deste capítulo, pouco nos importará a maneira com que o criador vê sua criatura, e tampouco como ela é vista pelos participantes da discussão. O que nos importa é um questionamento de legitimidade: a aplicação do RDD, em si, pode contrastar os dogmas maiores do direito penal, que são a igualdade e a dignidade da pessoa humana?

Não negaremos a doutrina de Jakobs. Enfrentaremos o dogma do direito penal do inimigo na perspectiva do seu conceito legitimador-afirmativo27. Isto significa que, ao identificarmos no regime disciplinar diferenciado fragmentos da doutrina do direito penal do inimigo não condenaremos, de plano, o instituto. Teremos sim, a cautela de apreciar a legitimidade do RDD com base em pressupostos diversos daqueles que valem para os dispositivos tradicionais do direito penal do cidadão. Estes pressupostos serão a proporcionalidade e racionalidade.

Não iremos indagar se o direito penal do inimigo é ‘justo’, uma vez que a expressão justiça é instável, sujeita a ótica pessoal do hermeneuta. Mas, daremos vazão a análise da ‘legalidade, adequabilidade e constitucionalidade’ desta proposta de direito que, definitivamente, inspira o Regime Disciplinar Diferenciado.


5- RDD: A legitimidade da execução de pena do inimigo

O RDD se auto justifica na perspectiva de que viabiliza a neutralização do criminoso. Não se trata de um direito penal simbólico28. A dureza da sanção é fator de reafirmação da norma, pela utilização de seu caráter geral protetivo. Combate-se um ‘hostil’, o integrante das organizações criminosas

É inquestionável que o RDD identifica-se com o dogma do direito penal do inimigo, uma vez que, se atinge, de forma acentuada, o direito de liberdade do reeducando, suprimindo, ao máximo, todo seu contato com o mundo extra muro.

Fragmento da doutrina, contemplando uma perspectiva funcionalista da sanção, subentende que a política brasileira de cumprimento de pena não ampararia a execução de pena em Regime Disciplinar Diferenciado. Esta corrente parte do pressuposto que o artigo 1° da LEP 29 traça, uma política criminológica pautada pela necessidade de integração social do ergastulado, visando o processo de reinserção comunitária30.

Com o surgimento do RDD, outorgou-se a reclusão nova natureza, com dúplice função: intimidadora (pedagógica) e acautelatória, visando promover o isolamento necessário para a segurança dos presídios e da sociedade.

No RDD a pena se justifica pelo seu caráter negativo geral (intimidação) e especial (segregação e inocuização)31, percebendo-se um afastamento da política ressocializadora, mas, sem que haja abandono à humanidade da pena.

O aspecto ressocializador da sanção não é a expressão máxima e única da dignidade da pena. A prisão é a modalidade de pena mais estigmatizante que existe no direito brasileiro, independentemente de como ela seja aplicada. A reclusão é, por si só dessocializante.32

O ideal ressocializador é do Estado e não, específico da pena, de modo que não podemos transferir para instância punitiva estatal, de forma inoportuna o fardo de “transformar” o delinquente. A instância adequada para transformação social é a educacional ou assistencial. É saudável que políticas sociais sejam implementadas na execução da pena, mas elas não são requisitos necessários e imperativos da sanção extrema, que é a privativa de liberdade.

É vã ilusão, esperar que a segregação de liberdade possa provocar a ressocialização do indivíduo. O problema da violência criminal, seja ela difusa ou organizada, não será resolvido por meio da promulgação de leis penais segregativas.

A prisão, no regime que for, perverte, corrompe, deforma, avilta, embrutece, é uma fábrica de reincidentes, é uma universidade às avessas, onde se diploma o profissional do crime, normalmente, pelo ambiente perverso que ela propicia. Entretanto, este argumento não pode ser subterfúgio para inércia estatal. O Estado deve cumprir sua função social de garantir a segurança pública, mesmo quando, para tanto, deva o ‘indivíduo infrator’ sofrer acentuada restrição em suas liberdades individuais.

A bem da verdade, o RDD demonstra toda a incompetência do Estado no combate a grave criminalidade e, principalmente, anuncia a falência do sistema prisional ordinário. A segregação extrema fomenta alguns aspectos maléficos da pena privativa de liberdade33, mas garante a gênese do estado democrático de direito, que é a segurança da sociedade. Sem segurança, há falsa liberdade de todos.

O cárcere é ambiente nefasto, promiscuo e subversor extremo do reeducando, mas, infelizmente, necessário, no estágio evolutivo que nos encontramos. Enquanto novas alternativas não surgem, um embate ideológico deve ser resolvido: Direitos Individuais x Segurança Pública da Sociedade.

Para Becaria34 a prevenção é melhor solução do que a punição. As instâncias de contenção social como a escola e família são ambientes mais seguros e, ao mesmo tempo hábeis para tornar os homens menos inclinados à pratica do mal35. Políticas sociais36, desvinculadas da pena de segregação, estas sim, seriam hábeis a diminuir as desigualdades e efetivar processos de inclusões sociais eficientes para diminuir as taxas de criminalidade. É uma utopia, pensar que, a pena privativa de liberdade alcançaria este objetivo.

O RDD busca eficiência na neutralização do inimigo pungente, ciente de que toda prisão, ao tempo que furta a liberdade retira certa "dose" de dignidade do indivíduo. A prisão é um dos preços que se impõe à violação das normas penais, e, como medida extrema, deve provocar no espírito público a impressão mais eficiente e perdurável e, igualmente, menos cruel no organismo do culpado37.

Só existe uma forma de resolver o impasse posto (Dignidade Humana x Segurança Pública): analisar os efeitos do confinamento em RDD, identificando a possível existência de excessos na segregação rígida. Inauguramos, pois, a análise da suposta crueldade do regime, sem nos esquivar de apreciar a necessidade de proteção eficiente da segurança pública.


6- OS EFEITOS DO CONFINAMENTO DISCIPLINAR DIFERENCIADO

Na Ação Direita de Inconstitucionalidade (ADI) nº 4.162 a Advocacia Geral da União manifestou-se, categoricamente, no sentido de que o Regime Disciplinar Diferenciado "não imprime dor nem sofrimento físico ou mental ao agente"38. Percebe-se que o então Advogado-Geral da União, e atual Ministro do Supremo Tribunal Federal, Dias Toffoli, parte de uma premissa equivocada, a qual furta-lhe a oportunidade de melhor análise do tema.

Em 1983, por determinação da Corte de Apelações do Estado de Massachusetts, Stuart Grassian, renomado psiquiatra e professor da Universidade de Harvard, realizou a avaliação de quinze presos da Prisão de Walpole, mantidos em confinamento solitário pelo período médio de dois meses. Embora os presos, a princípio, tentassem convencer o entrevistador de que não se sentiam afetados pelo isolamento, por temerem a retaliação por parte dos guardas prisionais, as entrevistas e testes a que foram submetidos apontaram sintomas específicos comuns a todos os detentos, indubitavelmente resultantes da solidão e da privação de estímulos sensoriais39: hipersensibilidade generalizada a estímulos externos; distorções de percepção; alucinações; delírios; distúrbios físicos; agressividade; paranoia e perda do autocontrole.

Grassian sustenta que:

[...] o isolamento social, associado ao confinamento extremo são nocivos para o funcionamento da mente. O dano causado por tal confinamento pode resultar em prolongada ou permanente deficiência psiquiátrica, incluindo limitações que podem comprometer seriamente a capacidade do detento de se reintegrar à comunidade após ser solto da prisão (GRASSIAN,1994)40.

As conclusões de Grassian foram corroboradas por Craig Haney (1994), doutor em psicologia social e Diretor do Departamento de Estudos Legais da Universidade de Santa Cruz, no Novo México, em um estudo realizado com 100 detentos do presídio de segurança máxima de Pelican Bay, na Califórnia41.

O que se constata é que o isolamento extremo tem efeitos a longo prazo, que resulta na perda das habilidades sociais, da capacidade de conviver e de estabelecer relacionamentos42. Negar a severidade da segregação diferenciada imposta pelo RDD equivale a negar a existência do próprio regime. Não será negando os problemas que alcançaremos as soluções.

O RDD detém a função, bem definida, de neutralização do grave delinquente, visando a salvaguarda da sociedade. Ele rompe com a romântica percepção da pena como veículo único de ressocialização. O Regime Disciplinar Diferenciado Brasileiro aplica severo isolamento em cela individual com a imposição de considerável sofrimento mental ao preso43. ?Rômulo de Andrade Moreira44 chega a denominar o RDD de “monstro”, identificando o regime posto como veículo capaz de levar o detento a loucura e debilidade, avesso a qualquer possibilidade de ressocialização.

A criminalidade grave não é uma patologia social, mas sim, parte da fisiologia natural de qualquer sociedade sã45. Toda nação constrói alternativas hábeis ao combate do transgressor. Ocorre que, em um Estado de Direito, há limites para a opressão estatal, e, um destes limites é a proibição de imposição de penas cruéis. Assim, elevamos o seguinte questionamento: Seria o Regime Disciplinar Diferenciado uma alternativa constitucionalmente válida para o combate às organizações criminosas e o grave delinquente?


7- CONSTITUCIONALIDADE DO RDD: penas cruéis x dignidade da pessoa humana.

Identificar o RDD como silhueta do Direito Penal do inimigo e não analisar sua constitucionalidade, seria como descrever o funcionamento de uma cadeira elétrica, sem se pronunciar a favor ou contra a pena de morte46.

O rigor do RDD atentaria contra o princípio da humanidade das penas e por conseguinte representaria violação a dignidade da pessoa humana? Seria o RDD sanção disciplinar cruel? Se a resposta a umas destas indagações for positiva, ressoa a inconstitucionalidade do sistema.

Não existe legislação complementar que forneça o conceito de tratamento desumano, cruel ou degradante, assim, em face da ausência de uma definição precisa utilizamos o conceito de tortura, uma vez esta é uma das versões patentes de desumanidade e crueldade.

O Decreto nº 40, de 15 de fevereiro de 1991, promulga a Convenção contra a Tortura e Outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanas ou Degradantes47. De acordo com a mencionada Convenção tortura é:

Artigo 2º. Para os efeitos desta convenção, entender-se-á por tortura todo ato pelo qual são infligidos intencionalmente a uma pessoa penas ou sofrimentos físicos ou mentais, com fins de investigação criminal, como meio de intimidação, como castigo pessoal, como medida preventiva, como pena ou com qualquer outro fim. Entender-se-á também como tortura a aplicação, sobre uma pessoa, de métodos tendentes a anular a personalidade da vítima, ou a diminuir sua capacidade física ou mental, embora não causem dor física ou angústia psíquica48.

O artigo 1º da Convenção contra Tortura e outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes, ratificada pelo Brasil em 28/09/1989, disciplina que: "Artigo 1º - [...] Não se considerará tortura as dores ou sofrimentos que sejam consequências unicamente de sanções legítimas, ou que sejam inerentes a tais sanções ou delas decorram.”

O legislador brasileiro ordinário, para efeitos penais, definiu como tortura, o ato de

I- Constranger alguém com emprego de violência ou grave ameaça, causando-lhe sofrimento físico ou mental: a) com o fim de obter informação, declaração ou confissão da vítima ou de terceira pessoa; b) para provocar ação ou omissão de natureza criminosa; c) em razão de discriminação racial ou religiosa; II- submeter alguém, sob sua guarda, poder ou autoridade, com emprego de violência ou grave ameaça, a intenso sofrimento físico ou mental, como forma de aplicar castigo pessoal ou medida de caráter preventivo (artigo 1º da Lei nº 9.455/97).

O legislador brasileiro49 afastou-se do conceito internacional de tortura. Enquanto os tratados exigem que o sofrimento físico ou mental seja agudo, para a Lei 9.455/97, basta que a lesão seja praticada com dolo, sem mensuração do suplício sofrido pela vítima. A legislação penal pátria exige um elemento subjetivo especial do agente, consistente na finalidade de obter informação, declaração ou confissão, para provocar ação ou omissão de natureza criminosa.

A restrição de liberdade conjecturada pelo RDD não representa manifestação de tortura. Representa, aflição corporal e psíquica, naturais a espécie de segregação (prisão). Não existe, na conduta do agente carcerário, um fim específico de torturar. A sanção imposta pelo RDD decorre da legislação regularmente imposta, razão pela qual, inexiste violação a humanidade da pessoa segregada.

A jurisprudência da Corte Europeia de Direitos Humanos, subentende que uma conduta só pode ser enquadrada como tortura quando possuir quatro elementos: “envolvimento de funcionário público, dolo de torturar, intenso sofrimento ou graves sequelas sofridas pela vítima – físicas, morais e psicológicas – e a finalidade de obter informação, confissão da vítima ou de terceiro, castigar, intimidar, coagir ou discriminar”50.

A ordem constitucional brasileira51, atenta a regência internacional, veda a imposição de qualquer espécie de pena cruel ao tempo em que reafirma o fundamento da dignidade da pessoa humana. De tudo dito, ressoa uma pergunta instigante: Identificada a patente severidade do RDD, podemos afirmar que a segregação diferenciada representa, por tal razão, ofensa a dignidade da pessoa humana ?

O debate gira em torno da ponderação entre a dignidade individual da pessoa, que se encontra inserida no Regime Diferenciado, e a segurança pública de toda a sociedade.

Não existem garantias absolutas.

Visando harmonizar os interesses em conflito, o RDD se justifica, na perspectiva de que, o Poder Público tem a obrigação de aplicar medidas capazes de garantir a proteção eficiente para segurança da coletividade.

Neste sentido é o Habeas Corpus nº 40.300 do Superior Tribunal de Justiça, que reconheceu a constitucionalidade do RDD:

[...] não há falar em violação ao princípio da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da CF), à proibição da submissão à tortura, a tratamento desumano e degradante (art. 5º, III, da CF) e ao princípio da humanidade das penas (art. 5º, XLVII, da CF), na medida em que é certo que a inclusão no RDD agrava a restrição á liberdade de locomoção, já restrita pelas próprias circunstâncias em que se encontra o custodiado, contudo não representa, per si, a submissão do encarcerado a padecimento físico ou psíquico, impostos de modo vexatório, o que somente restaria caracterizado na hipóteses em que houvesse, por exemplo, o isolamento em celas insalubres, escuras ou sem ventilação. Ademais, o sistema penitenciário, em nome da ordem e da disciplina, bem como da regular execução das penas, há que se valer de medidas disciplinadoras, e o regime em questão atende ao primado da proporcionalidade entre a gravidade da falta e a severidade da sanção52.

Na aplicação do RDD não ocorrem sofrimentos físicos ou psíquicos imotivados e despropositados, razão pela qual, desponta nítida a constitucionalidade do RDD no plano do controle abstrato de constitucionalidade.

O sofrimento decorrente do isolamento é consequência única da sanção imposta pela legislação53. Se reconhecermos o RDD como cruel, frente a austeridade da pena privativa de liberdade colocaríamos, em cheque, a própria constitucionalidade do regime fechado, uma vez que, os dois, levam os detentos a semelhantes fastídios.

A aplicação do Regime Disciplinar Diferenciado deve devotar atenção a dupla dimensão do princípio da proporcionalidade: a proibição do excesso (Übermassverbot) e a proibição da proteção deficiente (Untermassverbot). Assim, sempre que a medida se demonstrar excessiva e desarrazoada, posta-se por ilegítima a segregação diferenciada.

Se o RDD detém natureza de medida cautelar/disciplinar, a sua aplicação deve obedecer um critério de excepcionalidade. É imprescindível que haja ponderação dos valores constitucionais em jogo, razão pela qual, apenas o caso concreto poderá realçar a dimensão dos princípios em conflito. Será a motivação da sentença, em sede de controle difuso ou concreto que outorgara a racionalidade necessária para aplicação do RDD, de modo que, não se pode falar, antecipadamente, que o RDD é medida que sempre violará o princípio da proporcionalidade.

Identificamos a possibilidade de incorporar o RDD na lógica securitária da exceção, sem implodir, isto é, sem alterar a configuração política do Estado de Direito. Preceituamos a possibilidade de outorgar a doutrina do inimigo, contornos de constitucionalidade, quando a medida de exceção imposta (RDD) guardar completa obediência ao sistema constitucional em que é inserida. A aplicação racional do RDD respeita as garantias individuais ao tempo em que preserva a segurança pública.

Muito embora a doutrina do inimigo vislumbre a possibilidade de imposição de ‘medidas aflitivas, eficazes e excepcionais’, percebemos que, a severidade e rispidez do RDD encontra-se circunscrita dentro da razoável reação Estatal, revestindo-se de constitucionalidade. Mesmo que identificássemos, singela opressão a integridade do preso, deveríamos sopesar que nem as garantias devem ser entendidas tão rigidamente que impeçam a eficácia no combate ao crime organizado, nem a busca de eficácia deve levar à dissolução das garantias e do Estado de Direito. Sempre que este equilíbrio é rompido ou por via de excesso de garantismo ou por via de uma eficácia a qualquer preço, é dado um passo, respectivamente, no sentido da descrença na capacidade de os Estados de Direito lidarem com situações extremas ou no sentido da sua corrupção e conversão em Estado autoritário (DIAS, 2009, p. 687).


8- Teoria da Proporcionalidade e o Direito Penal do Inimigo

O princípio da proporcionalidade nasce no direito americano, onde é conhecido como princípio da razoabilidade, mas atinge o seu ápice no direito alemão Verhaltnismaßigkeitsgrudsatz. Tanto o direito americano como o alemão dão a esse princípio fundamentos distintos: neste, ele funda-se no estado democrático de direito; naquele, no devido processo legal, no que foi seguido pelo Supremo Tribunal Federal Brasileiro no julgamento da ADIN 958-3/RJ.

Nenhum direito fundamental é ilimitado, visto encontrar os seus limites nos demais direitos igualmente consagrados pela Carta Magna (princípio da relatividade ou convivência das liberdades públicas). Surge a teoria da proporcionalidade como instrumento de ponderação, principalmente, entre o interesse particular vulnerado e o interesse estatal na persecução penal ou segurança pública.

Alexy54 resolve o problema da colisão de princípios constitucionais através da ponderação dos interesses opostos, observando, de forma pontual, que a ponderação abstrata dos valores se impõe no caso concreto, onde os princípios ganham, cada qual, peso particular. O processo de ponderação pode levar a um inquestionável subjetivismo na decisão judicial, entretanto, não há um decisionismo abstrato, uma vez que a ponderação deve ser operada em uma juízo de racionalidade fundamentada, que estabelecerá a preferência lógica entre os princípios opostos.

Para fundamentar a preferibilidade de um princípio ao outro, as razões elencadas, podem ser, a título de exemplo, a intenção original do legislador, as consequências benéficas ou maléficas de certa decisão e as opiniões dogmáticas e jurisprudenciais.

Entretanto, a aplicação desmedida da proporcionalidade pode servir de instrumento de frustração das garantias constitucionais, tornando letra morta a disposição constitucional.

É tênue a linha que divide a mitigação de um princípio da abolição do mesmo. A proporcionalidade não deve ser instrumento de aniquilamento, mas sim de harmonização, submetendo o princípio de menor relevância ao de maior valor social. A sua aplicação não pode estar condicionada, simplesmente, à identificação de determinada criminalidade. O poder seletivo, de eleger o ‘grave criminoso’ está sempre nas mãos de agências que o empregam segundo interesses conjunturais e o usam também com outros objetivos, como o de seleção dos inimigos estatais55.

O uso desmedido da teoria da proporcionalidade pode tornar a proteção constitucional da dignidade da pessoa humana, ilusória, inútil e frágil. Sem contenção da força pública, o Estado de direito pode se transformar em Estado de Polícia, residindo aqui a importância das garantias.

Daniel Sarmento busca, então, equacionar uma fórmula matemática para aplicação da proporcionalidade preconizando que "o nível de restrição de cada interesse será inversamente proporcional ao peso específico que se emprestar, no caso, ao princípio do qual ele se deduzir, e diretamente proporcional ao peso que se atribuir ao princípio protetor do bem jurídico concorrente" (SARMENTO, 2000, p. 104).

A fórmula de Sarmento demonstra a imprecisão da própria equação. A maior incerteza na aplicação do princípio da proporcionalidade está na errônea individualização dos valores em jogo56.

Os direitos e garantias individuais não são responsáveis pelo aumento dos conflitos sociais e da violência, mas enfrentar o problema sob essa perspetiva é mais simples, mais fácil, menos oneroso e politicamente mais vantajoso57. O sistema penal, de forma autofágica, alimenta-se do argumento ideológico da segurança para justificar as suas extrapolações de limites. Desta forma, o princípio da proporcionalidade pode se constituir em instrumento de negação do direito, reduzindo a Constituição a uma simples folha de papel. A invocação ideológica do princípio da proporcionalidade tem constituído a válvula de escape das agências judiciais para atender os reclames “da lei e da ordem”, acolhidos pelo senso comum com a aparência de que atuam de acordo com a sua finalidade constitucional, fulminando, dia-a-dia, a eficácia dos direitos e garantias tão duramente conquistados ao longo da história.

Conter a aplicação vulgarizada do princípio da proporcionalidade a partir do reconhecimento da sua deslegitimação parcial é uma exigência da democracia. Garantir a sua aplicação excepcional para defesa da segurança pública e prevenção de perigo é uma necessidade prudente. O tormento da jurisprudência estará em achar o ponto de equilíbrio, um vez que os critérios de tal ponderação não poderão encontrar assento seguro exclusivamente na lei, mas sim no caso concreto e, especificamente, na decisão judicial. Se nenhuma garantia é absoluta o processo de ponderação se torna inevitável, encontrando, na suficiente motivação da sentença a possibilidade de controle judicial pertinente da razoabilidade.

O uso do princípio da proporcionalidade, embora seja manifestação de um direito processual penal do inimigo, representa um Estado de polícia que pulsa no coração de um Estado de direito. Haverá sempre um dialética contínua entre o poder investigativo estatal e os direitos e garantias individuais, entre o Estado de direito e o Estado de polícia. Zaffaroni afirma que:

O Estado de polícia que o Estado de direito carrega em seu interior nunca cessa de pulsar, procurando furar e romper os muros que o Estado de direito lhe coloca. Quanto maior é a contenção do Estado de direito, mais próximo se estará do modelo ideal, e vice-versa, mas nunca se chegará ao modelo ideal porque para isto seria preciso afogar definitivamente o Estado de polícia e isso implicaria uma redução radical – ou uma abolição – do próprio poder punitivo (ZAFFARONI, 2007, p. 170).

As garantias são limites redutores, mas não aniquiladores, das pulsões naturais do Estado de polícia. Será na ponderação sensata dos interesses que a proporcionalidade se legitimará no caso concreto validando a opressão pontual da liberdade do reeducando.

O Regime Disciplinar Diferenciado é medida disciplinar contemplada pela lei. Com respeito ao contraditório e o devido processo legal a medida é imposta em caráter excepcional e por tempo determinado. Equipe multidisciplinar (psicólogos e assistentes sociais), assim como, atividades intelectuais visam diminuir o flagelo do cárcere duro. Por tudo dito, a medida é humana e respeita os primados constitucionais que asseguram a dignidade do reeducando sem se descurar da segurança pública.

Impossível negar sua severidade, tão quanto é inquestionável sua humanidade. Será no processo de ponderação, observados os postulados da proporcionalidade em sua tríplice dimensão (adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito)58 que a jurisprudência vai delimitar sua aplicação e não no controle abstrato de constitucionalidade. Nesta perspectiva, garantimos a possibilidade de combate ao ‘inimigo’ com medidas eficazes, dentro do sistema de garantias, assegurando que estas medidas sejam excepcionais, para não contaminar o Estado de Direito.


CONSIDERAÇÕES FINAIS

Identificamos, no regime disciplinar diferenciado, fragmentos da doutrina do direito penal do inimigo.

O inimigo é uma construção tendencionalmente estrutural do discurso legitimador do poder punitivo, ele sempre existiu. Na realidade, o que muda, é o contexto histórico com que o Estado se legitima a elegê-lo, calca-se, não raro, em situações eleitas como “emergenciais”. Sua escolha, pode servir de instrumento ao tirano, possibilitando a perseguição de determinados grupos de pessoas por razões de "conveniência". Aqui reside o calcanhar de Aquiles do Direito Penal do Inimigo, já que a admissão da figura do inimigo pode neutralizar a bússola da ciência penal, a qual, sem norte, perde seu poder de contenção do poder punitivo.

A abordagem da legalidade do RDD não pode depender da verificação do seu etiquetamento como expressão do direto penal do inimigo. Isto porque, a discussão sobre o direito penal do inimigo passa por problemas de ordem conceitual e de ordem emocional.

Constatamos a patente severidade do RDD, ao tempo em que reconhecemos sua utilidade, necessidade, excepcionalidade e adequação.

Sob a ótica brasileira, o RDD não representa manifestação de tortura estatal, uma vez que a segregação acentuada não se reveste de crueldade, sendo assegurado ao preso, todos os direitos compatíveis com a pena de prisão. Preserva-se, desta forma, a dignidade humana, pois o regime não coisifica e muito menos humilha o segregado. Diferenciamos, Direito de Brutalidade, ao tempo em que admitimos um direito penal de exceção.

Na ponderação dos bens em conflito (segurança pública x dignidade da pessoa humana) apenas o caso concreto delimitará o princípio preponderante. É impossível atribuir, no plano abstrato, valores aos princípios constitucionais em conflito, razão pela qual, é equivocada a pretensão esboçada na ADI 4.162, na qual se pretende a declaração de inconstitucionalidade do RDD, em sede de controle concentrado. A constitucionalidade do RDD será reafirmada argumentativamente em todas as hipóteses em que o problema for posto em causa, tornando a racionalidade uma peça viva do ideário do Estado de Direito59.

Ninguém dirá que a vida e segurança da coletividade é menos importante do que a integridade pessoal dos cidadãos que a compõe. O dilema é nefasto, mas, pode ser resolvido no controle difuso, onde a capacidade argumentativa do juiz outorgará legitimidade/ou não ao RDD.

Não será pelo binômio ‘mais crime/mais castigo’ emprestado do eterno conto de Dostoiévski que se encontrarão as alternativas de embate a criminalidade. Entretanto, a proteção eficiente da sociedade deve ser imposta pelo Estado. O Regime Disciplinar Diferenciado, ao tempo em que rompe com o paradigma da prisão como instrumento de ressocialização, detecta na privação de liberdade um importante e necessário instrumento de neutralização do grave delinquente. A pena aplicada mantém o seu caráter comunicativo de reafirmação da vigência da norma e ganha funcionalidade de prevenção do perigo.

Os criminosos são pessoas, devendo ter sua dignidade respeitada. Não podemos compreender um Estado sem tragédias, nem demitir-se de intervir na tragédia60. A segregação extrema, de fato, fomenta alguns aspectos maléficos da pena privativa de liberdade61, mas garante a gênese do estado democrático de direito, que é a segurança da sociedade em um Estado de emergências impostas pelo crime organizado.

Será na motivação da sentença, em sede de controle difuso ou concreto que outorgaremos a racionalidade necessária para aplicação do RDD, de modo que, não se pode falar, antecipadamente, que o RDD é medida cruel ou desumana.

Para Becarria62, o caminho da luz (exclusão da criminalidade), que esclarece o tormento da multidão, não pode vir da prisão desmedida, sob pena da luz se tornar mais perigosa do que as trevas, uma vez que, a falsa solução é mais perigosa do que o problema. Entretanto, o Estado tem o dever de agir na proteção dos bens jurídicos de índole constitucional, outorgando alternativas ao combate da criminalidade. A constitucionalidade do RDD deriva acima de tudo de sua utilidade e necessidade, para fazer frente a uma tragédia pontual e contemporânea, o crime organizado. Em um ‘futuro próximo’ haveremos de ter novas alternativas de contenção, enquanto o ‘presente’ é ciente de que mais vale acender uma vela do que amaldiçoar a escuridão63. Resta-nos aguardar que o Supremo Tribunal Federal mantenha a vela acesa.


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ZAFFARONI, Eugênio Raúl; BATISTA, Nilo Alagia; ALAGIA, Alejandro; SLOKAR, Alejandro. Direito Penal Brasileiro. V.1. Rio de Janeiro: Renavan, 2003.

WEIS, Carlos. O Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária entende inconstitucional o regime disciplinar diferenciado. In: Boletim IBCCRIM. São Paulo, 2005.


Notas

1 Augusto Silva Dias entende que o Estado Democrático de Direito não necessita e nem deve ceder à lógica do inimigo no difícil combate ao terrorismo e restante do crime organizado, sob pena de transmudar num Estado autoritário. In: AA. VV. Que futuro para o direito penal?: simpósio em homenagem a Jorge de Figueiredo Dias, por ocasião dos 20 anos do código penal português,. Organizado por Mário Ferreira Monte; Maria Clara Calheiro; Fernando Conde Monteiro, artigo de Augusto Silva Dias, Os Criminosos são pessoas? Eficácia e garantias no Combate do crime Organizado, p. 708.

2 A pena privativa de liberdade é a reação habitual frente a fatos de certa gravidade, entretanto, se ela não contiver efeito de segurança, a coação passa a significar nada. JAKOBS, Günther; MELIÁ, Manoel Cancio.  Direito Penal do inimigo: noções e críticas. 4. ed. atual. e ampl. Porto alegre: Livraria do Advogado, 2009, pág. 22.

3 Guilherme de Souza Nucci, 2006, p. 961.

4 Mirabete (2004, p. 149)

5 PAIXÃO, Ana Clara Victor da. Longe dos olhos, fora do tempo: o confinamento solitário como regime especial de cumprimento de pena. Disponível em: <http://www.ibccrim.org.br>. Acesso em: 10 abril 2013.

6 Na Alemanha, que passara a adotar o modelo prisional americano, um estudo clínico datado de 1898, desenvolvido a partir da análise dos surtos psicóticos verificados entre os detentos, já se registrava sintomas tais como “alucinações extremamente vívidas nas várias modalidades sensoriais, incluindo as de natureza auditiva, tátil ou olfativa; eventos dissociativos, com amnésia subsequente; agitação e excitação motora, com violência não dirigida, e alucinações geralmente descritas como de perseguição (GANSER, apud GRASSIAN, 1983). GRASSIAN, Stuart. Psychopathological Effects of Solitary Confinement. American Journal of Psychiatry, vol. 140, p. 1450-1454, American Society of Psychiatry, 1983.

7 O confinamento solitário foi abolido oficialmente nos EUA em 1913. Sustentou a Suprema Corte que, um número considerável de prisioneiros, mesmo após um curto confinamento, cai em um estado de semi-imbecilidade, da qual é quase impossível retirá-los, e outros se tornam violentamente insanos; outros, ainda, cometem suicídio; enquanto que aqueles que suportam melhor o suplício não são, geralmente, reformados, e em muitos casos nunca recuperam atividade mental suficiente para serem de qualquer utilidade para a comunidade Human Rights Watch. Long-Term Solitary Confinement of Political Prisoners. HRW Report, Vol. 16, Nova York, 2004. 35 p.

8 (OLIVEIRA, 2003). OLIVEIRA, Edmundo. Direito penal e direitos humanos. Revista Jurídica Eletrônica Consulex. A. VII, n. 158, 15 de ago. 2003.

9 Departamento de Justiça dos EUA. Supermax Prisons: Overview and general consideration, Washington-DC, 1999. 44 p.

10 LYND, Alice. What is a supermax prison?, Disponível em <http:// www.spunk.org/texts/prison/sp001611.txt> Último acesso em 03 de dezembro de 2004.

11 Relatório Técnico de Luciano Cesar Orlando, Diretor Técnico II do Centro de Readaptação Penitenciária Dr. José Ismael Pedrosa, Coordenadoria de Unidades Prisionais da Região Oeste, Secretaria da Administração Penitenciária. Obtido aos 16 de abril de 2013, via ofício-email s/nº.

12 Aos 14 de maio de 2013, em pesquisa de campo, também obtivemos vastas informações da Diretoria do Sistema Penitenciário Federal. O ofício recebido relata detalhes do funcionamento dos Presídios de Segurança Máxima Federal, os quais, executam pena em Regime Disciplinar Diferenciado. Em síntese, o sistema adotado assemelha-se ao utilizado pelo Presídio de Presidente Bernardes/São Paulo.

13 SILVA SÁNCHEZ, Jésus-Maria. A expansão do Direito Penal Aspectos da Política Criminal nas sociedades pós-industriais.,Tradução Luiz Otávio de Oliveira Rocha, São Paulo, Revista dos Tribunais, 2011, pag. 208.

14 SILVA SÁNCHEZ, Jésus-Maria. A expansão do Direito Penal Aspectos da Política Criminal nas sociedades pós-industriais.,Tradução Luiz Otávio de Oliveira Rocha, São Paulo, Revista dos Tribunais, 2011, pag197.

15 J. Bodin, De la peine qui méritent les sorciers, 212-217, Paris, chez Jacques du Pues, Libraire Iuré, 1587. pp. 215-217, apud, ZAFFARONI, E. Raúl. O Inimigo no Direito penal. 2. ed, junho de 2007. Rio de Janeiro: Renavan, 2007, págs. 89.

16 Platão desenvolveu a ideia de que o infrator é inferior devido à sua incapacidade de acender o mundo das ideias puras. Quando esta incapacidade se mostrava irreversível, ele deveria ser eliminado. Protágoras sustentava, na antiguidade uma teoria preventiva geral e especial da pena, mas também postulava um direito penal diferenciado, segundo o qual os incorrigíveis deviam ser excluídos da sociedade. Las Leyes, IX (Platão, Obras Completas, Bibliográfica Omeba, Buenos Aires, 1967, T, IV, pp. 95 e ss) e Platão, Protágoras; Alfredo Verdross, La filosofia del derecho del mundo occidental, México, 1962, p. 35.

17 Carl Schimit, El concepto de lo político, p, 23.

18 Hobbes e Kant muito embora moderados, já levantavam a bandeira da possibilidade de existência de um direito penal do hosti dentro do Estado de direito. Rosseau, em um discurso mais invasivo, preceituava que determinados tipos de delinquentes, notadamente os assassinos, tinham que ser combatidos e eliminados. O discurso do ódio de Rousseu preconizava que “todo malfeitor, ao atacar o direito social, torna-se, por suas ações, rebelde e traidor da pátria, deixando de ser membro dela ao violar suas leis e até lhe fazer a guerra. Então, a conservação do Estado é incompatível com a sua; é preciso que um dos dois pereça, e quando se executa o culpado é mais como inimigo do que como cidadão. Jean-Jacques Rousseau, El Contrato social, trad. De Consuelo Berges, Madri, 1973, p. 37

19 Norman Cohn, Los demônios familiares de Europa, Madri, 1980, apud, ZAFFARONI, E. Raúl. O Inimigo no Direito penal. 2. ed, junho de 2007. Rio de Janeiro: Renavan, 2007, págs. 34.

20 Nos Estados Unidos, desde o 11 de setembro de 2001, o sistema norte Americano encontrou um inimigo de certa substância no chamado terrorismo. Sob o discurso da prevenção penal empreendeu guerra contra o Iraque, utilizando o poder bélico como poder punitivo e de neutralização do inimigo.

21 JAKOBS, Günther; MELIÁ, Manoel Cancio.  Direito Penal do inimigo: noções e críticas. 4. ed. atual. e ampl. Porto alegre: Livraria do Advogado, 2009.

22 ZAFFARONI, E. Raúl. O Inimigo no Direito penal. 2. ed, junho de 2007. Rio de Janeiro: Renavan, 2007, págs. 65.

23 CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal: parte especial. v.3. 3 ed. rev. atual. São Paulo: Saraiva, 2005, pág. 302.

24 JAKOBS, Günther; MELIÁ, Manoel Cancio.  Direito Penal do inimigo: noções e críticas. 4. ed. atual. e ampl. Porto alegre: Livraria do Advogado, 2009. Pg.51.

25 JAKOBS, Günther; MELIÁ, Manoel Cancio.  Direito Penal do inimigo: noções e críticas. 4. ed. atual. e ampl. Porto alegre: Livraria do Advogado, 2009. Pg.57

26 GRECO, Luís, Sobre o chamado dirieto penal do inimigo, Revista Brasileira de Ciências Criminais, São Paulo, RT, 2005, Pag.93.

27 GRECO, Luís, Sobre o chamado direito penal do inimigo, Revista Brasileira de Ciências Criminais, São Paulo, RT, 2005, Pag.94.

28 Quando a pena só cumpre a função simbólica e retributiva, esta última será irracional e antijurídica, por que se vale de um homem como instrumento para a sua simbolização, o usa como um meio e não como um fim em si, ''coisifica'' um homem, ou por outras palavras, desconhece-lhe abertamente o caráter de pessoa, com o que viola o princípio fundamental em que se assentam os Direito Humanos. Zafaroni, Eugênio Raul, PIERANGELI, José Henrique , Manual de Direito Penal Brasileiro, Ed. RT, 2005. Pg. 337.

29 Art. 1°. A execução penal tem por objetivo efetivar as disposições da sentença ou decisão criminal e proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado e do internado.

30 A Convenção Americana sobre Direitos Humanos contempla no artigo 5º, item 6, que as penas privativas da liberdade devem ter por finalidade essencial a reforma e a readaptação social dos condenados. Pacto de São José da Costa Rica Decreto n. 768 de novembro de 1992.

31 ZAFFARONI, Eugênio Raúl; BATISTA, Nilo Alagia; ALAGIA, Alejandro; SLOKAR, Alejandro. Direito Penal Brasileiro, V.1, Rio de Janeiro, Renavan, 2003, p. 487.

32 Preciosa a Lição de Munõs Conde, para quem, educar para a liberdade em condições de não liberdade não é somente difícil, mas uma utopia irrealizável. MUNÕS CONDE, Francisco. Direito Penal Controle Social. Trad. Cíntia Toledo Miranda Chaves. Rio de Janeiro, Forense, 2005, p.85.

33 REGHELIN, Elisangela Melo. Regime disciplinar diferenciado: do canto da sereia ao pesadelo. Boletim IBCCRIM. São Paulo, v.14, n.168, p. 18, nov. 2006.

34 Beccaria, Cesare, Dos Delitos e das Penas, São Paulo: Hemus, 1983, p. 68

35 Beccaria, Cesare, Dos Delitos e das Penas, São Paulo: Hemus, 1983, p. 70

36 Bruno Seligman Menezes (2006, p.19) comenta que ao erigir o apenado como inimigo: "o Estado "vinga" a sociedade de todos os problemas relacionados à criminalidade, segurança pública, incutindo nela — sociedade — um falso sentimento de segurança. (...) O que se está pretendendo fazer, desde a instituição do Regime Disciplinar Diferenciado é colocar o preso como inimigo da sociedade. Assim, um Estado ausente na sua função de Estado-provedor se faz presente na função de Estado-ditador, Estado-tirano, Estado-autoritário, e restringe direitos e garantias constitucionais, porque não tem competência, ou vontade política, de desenvolver uma política de inclusão social, que busque assegurar ao preso a ressocialização, não dentro das masmorras, mas fora delas, assegurando-lhe um emprego, uma remuneração digna, assistência social, psicológica. Entretanto, política desta natureza não é de fácil implementação, não traz retorno eleitoral imediato.”

37 Beccaria, Cesare, Dos Delitos e das Penas, São Paulo: Hemus, 1983, p. 43

38 Parecer exarado nos autos da ADI nº 4.162, pelo, então, Advogado-Geral da União, José Antônio Dias Toffoli, aos 24 de novembro de 2008.

39 PAIXÃO, Ana Clara Victor da. Longe dos olhos, fora do tempo: o confinamento solitário como regime especial de cumprimento de pena. Disponível em: <http://www.ibccrim.org.br>. Acesso em: 10 abril de 2013.

40 GRASSIAN, Stuart. Psychopathological Effects of Solitary Confinement. American Journal of Psychiatry, vol. 140, p. 1450-1454, American Society of Psychiatry, 1983. HANEY, Craig. Infamous Punishment: The Psychological Consequences of Isolation. National Prison Project Journal, 1994.

41 A organização internacional Human Rights Watch, registra evidências dos efeitos psicológicos negativos do isolamento extremo, que podem ser encontrados em observações pessoais, estudos descritivos e pesquisas sistemáticas conduzidas durante um período de quatro décadas, por pesquisadores de diferentes continentes. GRASSIAN, Stuart. Psychopathological Effects of Solitary Confinement. American Journal of Psychiatry, vol. 140, p. 1450-1454, American Society of Psychiatry, 1983. HANEY, Craig. Infamous Punishment: The Psychological Consequences of Isolation. National Prison Project Journal, 1994.

42LYND, Alice. What is a supermax prison? Disponível em <http://www.spunk.org/texts/prison/sp001611.txt> Último acesso em 10 de abril de 2013.

43 CUNHA, Rogério de Vidal. O Regime Disciplinar Diferenciado, o Simbolismo Penal e o Princípio da Humanidade das Penas. Universo Jurídico, Juiz de Fora, ano XI, 24 de jan. de 2006.?Disponível em:<http://uj.novaprolink.com.br/doutrina/2447/O_REGIME_DISCIPLINAR_DIFERENCIADO__O_SIMBOLISMO_PENAL_E_O_PRINCIPIO_DA_HUMANIDADE_DAS_PENAS >. Acesso em: 06 de mar. de 2013.

44 MOREIRA, Rômulo de Andrade. Esse monstro chamado RDD. Disponível em: <http://www.ibccrim.org.br>. Acesso em: 24 de abril de 2013.

45DURKHEIM, Émil. As regras do método sociológico. Trad. Pietro Nassetti. São Paulo: Martin Claret, 2001, pag. 82-90

46 Munõs Conde, F. De nuevo sobre el “Derecho penal del enemigo”, Buenos Aires, 2005, p. 70

47 Aprovada pelo Decreto Legislativo nº 4, de 23/05/1989 - DOU de 24/05/1989.

48 Grifo nosso.

49 O Código Penal Português (artigo 243), entende como prática de tortura quem, tendo por função a prevenção, perseguição, investigação ou conhecimento de infrações criminais, contraordenacionais ou disciplinares, a execução de sanções da mesma natureza ou a proteção, guarda ou vigilância de pessoa detida ou presa, a torturar ou tratar de forma cruel, degradante ou desumana para obter confissão, depoimento, informação ou mesmo para impor castigo ou implementar intimidação

50 Selmouni v. France, 25803/94, Council of Europe: European Court of Human Rights, 28/07/99. Disponível em http://www.unher.org/refworld/docid/3ac6b70210.html acesso em 06 de agosto de 2013.

51 Artigo 5°, XLVII, alínea “e” da CF

52 HC 40300 / RJ. Relator Ministro Arnaldo Esteves Lima. Data do Julgamento 07/06/2005. Data da Publicação 20/08/2005, DJ, p.312. RT vol. 843, p. 549.

53 A Procuradoria da República, na brilhante voz do Procurador da República Roberto Monteiro Gurgel Santos e da Vice Procuradora Deborah Macedo Duprat de Britto Pereira, advertiu que, No RDD, não há violação alguma à integridade física ou psíquica do preso, que continua a ostentar, como qualquer outro custodiado, todos os seus direitos fundamentais, notadamente os previstos no artigo 41 da LEP (ADI nº 4.162).

54 Cfr. Robert Alexy, Teoría de los derechos fundamentales, Ernesto Garzón Valdéz Madrid (trad.), Centro de Estudios Constitucionales, 1997, p. 89.

55 Neste sentido: Zaffaroni: p. 155 -183.

56 Cfr. Tocker, 1974, p. 626-627 apud Luiz Francisco Torquato Avolio, 2003, p. 67

57 Cfr. Fabiana Lemes Zamalloa do Prado, Limites à prova no processo penal: relação de poder e poderação de interesses no Estado Democrático de Direito, dissertação mestrado, Universidade Federal de Goiás, Faculdade de Direito, Goiânia-Goiás, 2006.

58BARROSO, Luís Roberto (Org.). A nova interpretação constitucional: ponderação, direitos fundamentais e relações privadas. Rio de Janeiro: Renovar, 2006, p.348.

59 DIAS, Agusto Silva, Torturando o Inimigo ou Libertando da Garrafa o Gênio do Mal? Sobre a Tortura em Tempos de Terror, Estudos em Homenagem ao Prof. Doutor Jorge de Figueiredo Dias. Organização, ANDRADE, Manuel da Costa e outros, Boletim da Faculdade de Dirieto da Universidade de Coimbra, Volume I, Editora Coimbra, 2009, pag 227.

60 DIAS, Augusto Silva, “Os criminosos são pessoas? Eficácia e garantia no combate ao crime organizado”, AA.VV., Que Futuro para o Direito Processual Penal?, Simpósio em Homenagem a Jorge De Figueiredo Dias, por ocasião dos 20 anos do Código de Processo Penal português (coord.: Mário Ferreira Monte) Coimbra: Coimbra Editora, 2009, pp. 687 e segs.

61 REGHELIN, Elisangela Melo. Regime disciplinar diferenciado: do canto da sereia ao pesadelo. Boletim IBCCRIM. São Paulo, v.14, n.168, p. 18, nov. 2006.

62 Beccaria, Cesare, Dos Delitos e das Penas, São Paulo: Hemus, 1983, p. 68

63 Confúcio


Autor

  • Danni Sales Silva

    Promotor de Justiça no Estado de Goiás Ex. Promotor de Justiça no Estado do Tocantins. Pós Graduado em Direito Penal. Especialista em Ciências Criminias pela UL (Universidade Lisboa). Especialista em Direito Processual Penal. Mestrando em Ciências Criminias pela Faculdade de Direito de Lisboa. Bacharelando em Filosofia pela PUC-GO. Professor de Direito Penal e Processo Penal. Professor de Pós Graduação em Direito Processual Penal na Rede Juris de Ensino e PUC/GO. Pesquisador pelo Max Planck Institute for Foreign and International Criminal Law in Freiburg i. Br., Germany. Membro do IBCCrim (Instituto Brasileiro de Ciências Criminais). Membro da Confraria do Júri

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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SILVA, Danni Sales. Regime disciplinar diferenciado: dissecando a constitucionalidade da execução de pena do inimigo. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 3934, 9 abr. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/27564. Acesso em: 24 abr. 2024.