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Contratação de mão de obra temporária para as atividades-fim de empresas estatais federais segundo o entendimento do Tribunal de Contas da União

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Agenda 26/02/2014 às 12:20

As contratações de empresas fornecedoras de mão de obra temporária pelas estatais, salvo em casos extraordinários e urgentes, ou quando o dever de licitar for inexigível, devem sempre ser precedidas de processos licitatórios regulares.

SUMÁRIO: 1 Introdução. 2 terceirização e mão de obra temporária: breves comentários. 3 Linhas gerais sobre o regramento da terceirização na Administração Pública Federal. 4 A possibilidade de contratação de mão de obra temporária pelas empresas estatais, segundo o entendimento do Tribunal de Contas da União. 5 Conclusão. Referências.

RESUMO: O presente artigo tem como objetivo apresentar o entendimento do Tribunal de Contas da União acerca da possibilidade ou não de contratação, pelas empresas estatais federais, mão de obra temporária com base na Lei nº 6.019/79.

PALAVRAS-CHAVE: Administração Pública. Terceirização. Mão de obra temporária.


1. INTRODUÇÃO

São frequentes os questionamentos judiciais envolvendo empresas estatais federais e tendo como objeto a regularidade da celebração de contratos de terceirização de serviços pelas referidas entidades.

Uma das formas de terceirização impugnadas é a contratação de empregados temporários pelas empresas estatais para as suas atividades finalísticas, sob o regime da Lei nº. 6.019/79.

Coloca-se em xeque a legitimidade dessas contratações com base em razões que invocam o princípio do concurso público e defendem a aplicabilidade às estatais do Decreto nº. 2.271/97 (que traz vedação à terceirização das atividades-fim da Administração) e da Lei 8.745/1993 (contratação emergencial de servidores público mediante processo seletivo público).

Sem pretensão de esgotar a questão, este artigo apresentará brevemente o entendimento do Tribunal de Contas da União sobre a contratação de mão de obra temporária com esteio na Lei nº 6.019/79 pelas empresas estatais.


2. TERCEIRIZAÇÃO E MÃO DE OBRA TEMPORÁRIA: BREVES COMENTÁRIOS

De forma preliminar à abordagem do ponto fulcral do presente estudo, o instituto da terceirização trabalhista e o regime de mão de obra temporária da Lei nº. 6.019/79 merecem ser objeto de breves considerações, ainda que superficiais.

Respeitando a complexidade e as divergências que envolvem o assunto, entende-se por terceirização trabalhista o conceito elaborado por Maurício Godinho Delgado, citado por Dayse Almeida: “Terceirização é o fenômeno no qual se dissocia a relação econômica de trabalho da relação justrabalhista que lhe seria correspondente. Por tal fenômeno insere-se o trabalhador no processo produtivo do tomador de serviços, sem que se estendam a este os laços justrabalhistas, que se preservam fixados com uma entidade interveniente” (DELGADO, 2011, p. 426).

De forma geral, o entendimento doutrinário e pretoriano consolidado é no sentido de inviabilidade jurídica da terceirização trabalhista, em razão da violação aos direitos sociais dos trabalhadores, dado o aumento da precarização das relações trabalhistas (ALMEIDA, 2012). As exceções a essa vedação são as hipóteses listadas nos clássicos itens I e III do Enunciado nº. 331 da Súmula de Jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho, adiante colacionado:

CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. LEGALIDADE (nova redação do item IV e inseridos os itens V e VI à redação) - Res. 174/2011, DEJT divulgado em 27, 30 e 31.05.2011 I - A contratação de trabalhadores por empresa interposta é ilegal, formando-se o vínculo diretamente com o tomador dos serviços, salvo no caso de trabalho temporário (Lei nº 6.019, de 03.01.1974).

[...]

III - Não forma vínculo de emprego com o tomador a contratação de serviços de vigilância (Lei nº 7.102, de 20.06.1983) e de conservação e limpeza, bem como a de serviços especializados ligados à atividade-meio do tomador, desde que inexistente a pessoalidade e a subordinação direta.

[...]”.

Uma dessas formas de terceirização lícita é a contratação de mão de obra temporária, regida pela Lei nº 6.019/79, sendo possível terceirizar o âmbito da atividade-fim do empregador, como se infere do item I do Enunciando de Súmula acima transcrito: “A contratação de trabalhadores por empresa interposta é ilegal, formando-se o vínculo diretamente com o tomador dos serviços, salvo no caso de trabalho temporário (Lei nº 6.019, de 03.01.1974)”.

Em igual sentido, a Vólia Bomfim Cassar assim se refere à mão de obra temporária da Lei nº. 6.019/79: “É permitida, inclusive, a terceirização de atividade-fim, sem descaracterizar a intermediação de mão de obra realizada pela interposta pessoa” (CASSAR, 2011, p. 527).

No entanto, deve-se realçar a necessidade de observância dos requisitos da Lei nº. 6.019/74 para que esse tipo de terceirização não transborde dos limites da legalidade. Entre eles, destacam-se a transitoriedade do motivo ensejador da contratação, a necessidade de regularidade registral da empresa de trabalho temporário perante o Ministério do Trabalho e Emprego e a limitação temporal à escalação de cada trabalhador para o mesmo tomador de serviços, salvo autorização do órgão fiscalizador do trabalho, conforme os artigos 2º, 5º e 10 do referido diploma:

Art. 2º - Trabalho temporário é aquele prestado por pessoa física a uma empresa, para atender à necessidade transitória de substituição de seu pessoal regular e permanente ou à acréscimo extraordinário de serviços.

Art. 5º - O funcionamento da empresa de trabalho temporário dependerá de registro no Departamento Nacional de Mão-de-Obra do Ministério do Trabalho e Previdência Social.

Art. 10 - O contrato entre a empresa de trabalho temporário e a empresa tomadora ou cliente, com relação a um mesmo empregado, não poderá exceder de três meses, salvo autorização conferida pelo órgão local do Ministério do Trabalho e Previdência Social, segundo instruções a serem baixadas pelo Departamento Nacional de Mão-de-Obra.

Visto isso, sejam tecidos expeditos comentários acerca do regramento da terceirização no âmbito da Administração Pública Federal.


3. LINHAS GERAIS SOBRE O REGRAMENTO DA TERCEIRIZAÇÃO NA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA FEDERAL

No âmbito da Administração Pública Federal, há autorização genérica para a execução indireta de serviços contida no artigo 10, §7º, do Decreto-Lei nº. 200/67, que assim dispõe: “Para melhor desincumbir-se das tarefas de planejamento, coordenação, supervisão e contrôle e com o objetivo de impedir o crescimento desmesurado da máquina administrativa, a Administração procurará desobrigar-se da realização material de tarefas executivas, recorrendo, sempre que possível, à execução indireta, mediante contrato, desde que exista, na área, iniciativa privada suficientemente desenvolvida e capacitada a desempenhar os encargos de execução”.

Com efeito, é o Decreto nº. 2.271/97 que estabelece as diretrizes para a execução indireta de serviços, asseverando essa possibilidade nos casos de atividades acessórias, instrumentais ou complementares às atividades finalísticas dos órgãos administrativos, conforme o art. 1º e respectivo §1º do Regulamento:

Art . 1º No âmbito da Administração Pública Federal direta, autárquica e fundacional poderão ser objeto de execução indireta as atividades materiais acessórias, instrumentais ou complementares aos assuntos que constituem área de competência legal do órgão ou entidade.

§ 1º As atividades de conservação, limpeza, segurança, vigilância, transportes, informática, copeiragem, recepção, reprografia, telecomunicações e manutenção de prédios, equipamentos e instalações serão, de preferência, objeto de execução indireta.

Note-se que o referido Decreto vedou expressamente a execução indireta de atividades abrangidas pelas competências das categorias funcionais próprias do órgão ou entidade, exceto quando houver disposição legal em sentido contrário ou quando se tratar de carreira extinta ou em extinção. Esta é a norma inserta no §2 do art. 1º:

§ 2º Não poderão ser objeto de execução indireta as atividades inerentes às categorias funcionais abrangidas pelo plano de cargos do órgão ou entidade, salvo expressa disposição legal em contrário ou quando se tratar de cargo extinto, total ou parcialmente, no âmbito do quadro geral de pessoal.

Note-se, por oportuno, que nem toda execução indireta de serviço coincide com o conceito de terceirização trabalhista, lembrando que esta somente ocorre quando houver a integração do empregado terceirizado na dinâmica de funcionamento interno da tomadora de mão de obra. Assim, dependendo da forma como um contrato administrativo de prestação de serviços for estruturado, tratar-se-á de mera prestação de serviço cível ou de terceirização trabalhista em sentido estrito1.

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Assim, a terceirização em sentido estrito ou trabalhista ocorre normalmente nos contratos em que há a chamada “dedicação exclusiva de mão de obra”, termo que caracteriza as avenças administrativas nas quais “[...] o contratado aloca seus funcionários com exclusividade na sede da Administração para que, em seu nome, executem certa e determinada atividade”2, conforme definição da Advocacia-Geral da União constante na fundamentação da nova redação da Orientação Normativa nº. 23/2009 da AGU.

Prosseguindo, em nível regulamentar de segundo grau, a Instrução Normativa nº. 02/2008, do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, é o conjunto de normas que rege a contratação de serviços terceirizados pela Administração Pública Federal Direta, autárquica e fundacional, de forma geral3.

Nessa Instrução Normativa, detalha-se a vedação à terceirização de atividades abrangidas pelo quadro de servidores próprios do órgão ou entidade, já constante no Decreto nº. 2.271/97. Veja-se:

Art. 9º É vedada a contratação de atividades que:

I - sejam inerentes às categorias funcionais abrangidas pelo plano de cargos do órgão ou entidade, assim definidas no seu plano de cargos e salários, salvo expressa disposição legal em contrário ou quando se tratar de cargo extinto, total ou parcialmente, no âmbito do quadro geral de pessoal;

II - constituam a missão institucional do órgão ou entidade; e

III - impliquem limitação do exercício dos direitos individuais em benefício do interesse público, exercício do poder de polícia, ou manifestação da vontade do Estado pela emanação de atos administrativos, tais como:

a) aplicação de multas ou outras sanções administrativas;

b) a concessão de autorizações, licenças, certidões ou declarações;

c) atos de inscrição, registro ou certificação; e

d) atos de decisão ou homologação em processos administrativos.

Com efeito, verificado o óbice à terceirização de atividades titularizadas pelo quadro de carreira da Administração Direta, autárquica e fundacional, esta, caso precise de força de trabalho para atuar em suas atividades-fim em caráter emergencial, não pode contratar mão de obra temporária junto a alguma empresa fornecedora valendo-se da Lei nº. 6.019/79, e sim iniciar, via de regra, processo seletivo público regido pela Lei nº. 8.745/93, estabelecendo vínculo administrativo diretamente com os servidores temporários.

O problema surge quando se observa que tanto o Decreto nº. 2.271/97 quanto a Instrução Normativa nº. 02/2008/MPOG são direcionados à Administração Direta, autárquica e fundacional, ou seja, aos entes e entidades federais de Direito Público.

O entendimento corrente aduz que as referidas normas são aplicáveis, no que couber, às entidades administrativas de Direito Privado4, incluídas as empresas estatais, uma vez que baseadas em boas práticas chanceladas pelo Tribunal de Contas da União.

Entretanto, tal incidência seria mantida no que concerne à vedação da terceirização de atividades abrangidas pelas carreiras funcionais da Administração, sem temperamentos? Ou o regime jurídico misto das estatais imporia solução alternativa, em atenção ao princípio constitucional da eficiência, no caso de necessidade transitória de mão de obra relacionada à sua atividade-fim? Adiante, será exposto o entendimento do Tribunal de Contas da União a respeito de tais indagações.


4. A POSSIBILIDADE DE CONTRATAÇÃO DE MÃO DE OBRA TEMPORÁRIA PELAS EMPRESAS ESTATAIS, SEGUNDO O ENTENDIMENTO DO TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO.

Não foram muitas as oportunidades em que o Tribunal de Contas da União se debruçou de forma específica sobre a possibilidade de utilização da Lei nº. 6.019/79 pelas empresas estatais. Os julgados a seguir comentados envolvem principalmente a Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos - ECT, a qual costuma celebrar contratos administrativos com empresas fornecedoras de mão de obra temporária, a fim de evitar a descontinuidade de suas atividades finalísticas, consideradas de caráter essencial pelo Tribunal Superior do Trabalho5.

Em um primeiro momento, o Tribunal de Contas da União, em sintético julgado, consubstanciado no Acórdão nº 16/2003 – 2ª Câmara, considerou que as empresas estatais, ou contratam diretamente, formando vínculo empregatício, ou contratam com base na Lei nº. 6.019/79, não lhes sendo aplicável a Lei nº. 8.745/93.

No caso, a empresa estatal (sociedade de economia mista) Financiadora de Estudos e Projetos – FINEP admitiu empregados temporários entre 1992 e 1994, sendo tal atitude considerada ilegal por Unidade Técnica do TCU, em razão de suposta violação ao princípio do concurso público (artigo 37, II, da Constituição Federal). Entretanto, o Ministro Relator Benjamin Zymler, discordou desse entendimento. Vejam-se os trechos mais relevantes de seu voto:

“Trata-se de processo admissão de diversos servidores para integrar os quadros da empresa Financiadora de Estudos e Projetos (FINEP), para trabalhar temporariamente no Convênio BIRD n 3.629 BR, efetuadas entre 1992 e 1994. Todas as admissões receberam parecer que concluíram por sua ilegalidade.

A Secretaria de Fiscalização de Pessoal, após realização de diligência, propôs a ilegalidade das presentes admissões, uma vez que não teria sido realizado processo seletivo simplificado, nos termos da Lei nº 9.745/93 (sic) (fls. 21/22). Propôs, ainda, a aplicação do Enunciado nº 106 da Súmula de Jurisprudência do TCU em relação às quantias recebidas de boa-fé.

O Ministério Público acolheu as proposta da Unidade Técnica (fl. 22-v).

[...]

Com as devidas vênias da Unidade Técnica e do Ministério Público, entendo a Lei nº 8.745/93 não se aplica às presentes admissões. Em primeiro lugar, porque a maior parte das admissões é anterior à Lei, que foi publicada no diário Oficial da União de 10.12.1993. Em segundo lugar, porque essa norma não se aplica às empresas públicas e sociedades de economia mista, nem tampouco às atividades executadas pela FINEP.

Assim sendo, só havia duas formas de as estatais contratarem: i) com formação de vínculo empregatício, mediante realização de concurso público; ii) sem vínculo empregatício, com base na Lei nº 6.019/74”.

Todavia, não foi explicitada a razão da inaplicabilidade da Lei de Servidores Temporários, sendo relevante destacar que uma das particularidades do caso era o fato de parte das contratações terem sido anteriores à própria Lei nº. 6.019/79.

Em um segundo momento, o Tribunal de Contas da União, ao examinar os resultados de auditoria relativa à certa contratação de mão de obra temporária pela Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos – ECT, considerou, no seio do Acórdão nº 3.566/2008 – 2ª Câmara, que a norma aplicável à contratação temporária para as estatais seria a Lei nº. 8.745/93 e não a Lei nº 6.019/79, em atenção ao inciso IX do artigo 37 da Constituição (“a lei estabelecerá os casos de contratação por tempo determinado para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público”).

Inclusive, no caso, o Ministro Relator Raimundo Carneiro discordou da Unidade Técnica do TCU, a qual se centrou ao exame da questão fática do preenchimento dos requisitos do art. 2º da Lei nº. 6.019/79 para a contratação de mão de obra temporária, não pondo em xeque a aplicabilidade do referido diploma legal a esse tipo de entidade administrativa6. Sejam colacionados os pontos mais importantes do Voto do Ministro Relator:

“2. Ainda que se reconheça que a Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos é pessoa jurídica de direito privado, não é menos verdade que se trata de Empresa Pública Federal que, portanto, compõe a Administração Pública Indireta, motivo pelo qual não está isenta da aplicação do regramento contido no referido dispositivo constitucional e, por conseguinte, da realização de concurso público para contratação objetivando a execução de seus misteres.

3. Por este mesmo motivo, não se justifica a alegação de que à Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos não se aplicariam as disposições do Decreto nº 2.271/91, visto que ele visa disciplinar a contratação de serviços pela Administração Pública Federal direta, autárquica e fundacional e a ECT, conforme já reconhecido pelo Supremo Tribunal Federal, equipara-se às entidades autárquicas.

[...]5. Dessa forma, a presente Representação merece ser julgada procedente, na medida em que não restam dúvidas quanto ao objeto do contrato em análise nos presentes autos (fls. 47 - Volume Principal), onde fica clara a intenção pela contratação de mão-de-obra permanente e regular para a execução de atividade-fim da Entidade, bem como quanto à natureza da contratação que deu origem à representação em tela, vez que permitir a execução da referida avença seria legitimar autêntica burla à contratação sem concurso público praticada pela Entidade no âmbito da Diretoria Regional de Rondônia.

6. Este entendimento, a propósito, já foi sumulado por esta Corte de Contas, consoante se depreende da disposição contida no Enunciado nº 231, verbis:

"A exigência de concurso público para admissão de pessoal se estende a toda a Administração Indireta, nela compreendidas as Autarquias, as Fundações instituídas e mantidas pelo Poder Público, as Sociedades de Economia Mista, as Empresas Públicas e, ainda, as demais entidades controladas direta ou indiretamente pela União, mesmo que visem a objetivos estritamente econômicos, em regime de competitividade com a iniciativa privada." (grifos de transcrição)

7. Por fim, seguindo a mesma linha de raciocínio, cumpre também destacar que a contratação de servidores temporários, por tempo determinado, deve se realizar nos estritos termos do que dispõe a Constituição da República, em seu art. 37, inciso IX:

IX - a lei estabelecerá os casos de contratação por tempo determinado para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público;"

8. Sendo assim, para se criar funções temporárias, é necessário o preenchimento dos requisitos "necessidade temporária" e "excepcional interesse público", o que, a toda evidência, não foi demonstrado no caso em tela. Ademais, nos termos da Lei nº 8.745/1993, os servidores temporários não ocupam nem cargo nem emprego público, não podendo, como ocorreu no caso trazido à baila nos presentes autos, ser contratado por subordinação à CLT, pois sua contratação deve ser formalizada por meio de contrato e precedida de processo seletivo simplificado sujeito a ampla divulgação, inclusive através do Diário Oficial da União (art. 3º da Lei nº 8.745/1993).

9. Portanto, irregular a contratação efetivada pela Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos. Primeiro por desobedecer o disposto no inciso II, do art. 37 da Constituição da República e, segundo, por não observar o disposto na Lei nº 8.745/1993, a qual dispõe sobre a contratação por tempo determinado.

Com essas considerações, adoto a proposta de encaminhamento da Unidade Técnica, com a ressalva quanto à aplicação do disposto na Lei nº 8.745/1993 e VOTO no sentido de que o Tribunal adote o Acórdão que ora submeto à apreciação deste Colegiado”.

No entanto, o Acórdão nº 3.566/2008 foi objeto de impugnação pela ECT, a qual, por intermédio de seu Departamento Jurídico, opôs pedido de reexame da questão, ensejando nova manifestação do TCU, consubstanciada no Acórdão nº 3.888/2011 – 2ª Câmara.

Nesse julgado, que passou a sedimentar de vez o entendimento da Corte de Contas da União, a Unidade Técnica responsável pela análise do feito e o Ministério Público junto ao TCU alteraram as suas conclusões anteriores, passando a compreender que, em decorrência da natureza predominante de direito privado da ECT no que concerne às relações entre essa entidade e os seus servidores, não lhe seria aplicável o regime da Lei nº 8.745/93 para a contratação temporária de empregados, e sim a Lei nº 6.019/79.

Com efeito, sejam vistos os argumentos da Unidade Técnica do TCU. Primeiramente, o órgão técnico examinou os âmbitos de incidência tanto da Lei nº. 8.745/93 quanto da Lei nº. 6.019/79:

“15. A par das necessidades de contratação temporária de servidores para atender excepcional interesse público, o constituinte originário estabeleceu que ‘a lei estabelecerá os casos de contratação por tempo determinado para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público’, nos termos do art. 37, IX, da Constituição Federal.

16. Com o objetivo de regulamentar esse dispositivo constitucional, em 9.12.1993, foi editada a Lei 8.745/1993.

17. Essa Lei, então, dispõe sobre a contratação por tempo determinado para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público, além de disciplinar outras providências.

18. Contudo, embora se destine à Administração Pública, deve ser enfatizado o âmbito de competência desse normativo. Além de ser uma lei federal, ou seja, de abrangência dos órgãos da Administração Pública federal, nem todas as entidades federais estão sujeitas a esse diploma. De acordo com o seu art. 1º, a Lei 8.745/1993 alcança os órgãos da Administração Federal direta, as autarquias e as fundações públicas.

19. Observe-se que essa Lei não se aplica às empresa públicas, até porque o regime de atividade destas implica maior celeridade nas repostas às demanda ou às necessidades impostas pelo mercado.

[...]

24. A Lei 6.019/1974 dispõe sobre o trabalho temporário nas empresas urbanas, além de disciplinar outras providências.

[...]

27. Embora também discipline a contratação temporária de mão de obra, não se confunde com a Lei 8.745/1993, senão vejamos.

28. Primeiro, destina-se à iniciativa privada ou à entidade pública que possua natureza jurídica de direito privado, mas, em ambos os casos, com sua mão de obra regida pela Consolidação das Leis do Trabalho – CLT.

29. Segundo, há possibilidade legal de haver contratação tanto de pessoa física quanto de empresa de trabalho temporário, para que esta forneça a mão de obra temporária, com a ressalva expressamente consagrada em seu art. 10, in verbis:

[...]

30. Essa restrição possui o condão de não se efetivar o vínculo laboral entre o empregado da empresa de trabalho temporário e a empresa tomadora do serviço, cuja repercussão, inexoravelmente, implicaria gastos indevidos, no caso da ECT, para a empresa tomadora.

31. Não há vínculo de hierarquia, subordinação e remuneração entre o empregado da empresa para esse fim contratada e a empresa contratante do trabalho temporário, ressalvada eventual responsabilidade subsidiária.

32. Por fim, há responsabilidade solidária da empresa tomadora no que tange ao recolhimento das contribuições previdenciárias, bem como à remuneração e indenizações previstas na Lei 6.019/1974, de acordo com seu art. 16.

33. Dessa forma, a Lei 6.019/1974 aplica-se aos empregados sujeitos ao regime da CLT.

[...]

34. O Decreto 2.271/1997 dispõe sobre a possibilidade de a Administração Pública Federal direta, autárquica e fundacional executar indiretamente as atividades materiais acessórias, instrumentais ou complementares aos assuntos que constituem área de competência legal. Tem-se, pois, a possibilidade de terceirização das atividades nas hipóteses delineadas por esse diploma.

[...]

36. Observe-se que há vedação à terceirização de atividade fim do órgão ou entidade. Essa vedação não se verifica nos dispositivos da Lei 6.019/1974, motivo por que possuem aplicação distinta.”

Prosseguindo, a Unidade Técnica ressaltou que, muito embora a ECT (e, por analogia, outras estatais prestadoras de serviços públicos) sofra forte influxo do Direito Público, o regime do relacionamento dessa entidade com os seus servidores seria predominantemente de Direito Privado, o que ensejaria a incidência da Lei nº 6.019/79 em detrimento da Lei º 8.745/93:

“'49. Em que pese haver simbiose entre o público e o privado na regência dos direitos e deveres dos empregados das empresas públicas, estes são regidos pela CLT, em consonância com a personalidade jurídica de direito privado de que se reveste a ECT, ou seja, os empregados das empresas públicas são contratados sob o regime da CLT.

50. Sob esse enfoque deve ser analisada a contratação de empregados temporários, no caso concreto, pela ECT.

51. Uma vez verificada a CLT como instrumento preponderante para contratação de pessoal das empresas públicas, é razoável que eventual contratação temporária de empregados e terceirização ocorra sob a égide do Direito Privado.

52. Nesse contexto, a Lei 6.019/1974 deve ser observada pelas empresas públicas para a contratação de trabalho temporário para atender à necessidade transitória de substituição de seu pessoal regular e permanente ou a acréscimo extraordinário de serviços, uma vez que o regime de contratação de seus empregados se dá pela CLT.

53. Esse é o entendimento defendido no Voto condutor do Acórdão 16/2003/TCU-2ª Câmara, de lavra do Ministro Benjamin Zymler, cujo excerto é a seguir transcrito:

[...]”

Em conclusão, a Unidade firmou a compreensão no sentido de que a ECT poderia tanto se valer da Lei nº. 6.019/79 para contratar, após regular licitação, empresas fornecedoras de mão de obra temporária:

“54. Ocorre que a contratação de trabalho temporário, independentemente de se relacionar à atividade fim ou meio do órgão ou entidade, nos termos da Lei 6.019/1974, pode ocorrer de duas formas: contratação de pessoa física ou contratação de empresa de trabalho temporário.

55. Se se referir à contratação de pessoa física para trabalho temporário, há de ser obervado processo seletivo simplificado. Caso haja contratação de empresa de trabalho temporário, deve-se observar a competente licitação, observada a Lei 6.019/1974, em especial, seu art. 10.

[...]

62. Nesse sentido, parece ter havido equivoco na premissa adotada nas instruções anteriores, pois a natureza autárquica, como defendido nesta instrução, aplica-se tão somente à questão tributária da ECT e não à sua natureza jurídica de direito privado, conforme reconhecido pelo Relator da deliberação recorrida, Ministro Raimundo Carrero.

63. Uma vez adotada premissa equivocada, não há falar em imposição de contratação temporária de mão de obra pela ECT com fundamento na Lei 8.745/1993 e no Decreto 2.271/1997. Nesse sentido, assiste razão à ECT.

[…]

66. A Lei 8.745/1993 constitui o instrumento por meio do qual a Administração Pública pode contratar pessoal temporariamente para prestar serviços em seus quadros.

67. Ocorre que essa Lei é federal e de abrangência aos órgãos da Administração Federal direta, autárquica e fundacional, sem que conste sua sujeição às empresas públicas, conforme consignado em seu art. 1º

68. Como se depreende do entendimento do Supremo Tribunal Federal, a ECT possui natureza autárquica para fins tributários, sem que essa exegese alcance sua personalidade jurídica de direito privado, inclusive como reconhecido pelo Relator da deliberação recorrida, motivo por que não há impor à ECT a observância do disposto na Lei 8.745/1993, bem como no Decreto 2.271/1997. Nesse sentido, assiste razão à ECT”.

Já o Ministério Público junto ao TCU exarou parecer com semelhantes razões:

“Em uma primeira análise das razões recursais, a Serur posicionou-se pelo não provimento dos apelos, por entender que a ECT estaria sujeita à observância tanto da Lei nº 8.745/1993 quanto ao Decreto nº 2.271/1997 no que se refere à contratação de mão-de-obra temporária. Concordei com essa conclusão.

Todavia, antes do julgamento dos apelos, a ECT trouxe aos autos elucidativo memorial fundado em jurisprudência do STF que lançou novas luzes sobre a matéria e levou a Secretaria de Recursos a rever seu posicionamento. Ou seja, considerando que o Supremo Tribunal Federal entende que, em relação a questões trabalhistas, a ECT é regida pelo regime jurídico aplicável às empresas públicas, a Serur acolheu a tese de que, ao realizar contratação temporária de mão-de-obra, a ECT deve observar as disposições constantes da Lei nº 6.091/1974 e não as regras da Lei nº 8.745/1993 e do Decreto nº 2.271/1997, pois estes normativos aplicam-se à Administração Direta, autarquias e fundações públicas federais.

[...]

O recebimento e o exame do memorial apresentado pela ECT demonstram o zelo pela ampla defesa e pelo contraditório existente no âmbito do Tribunal de Contas da União. O presente caso comprova como a aplicação do princípio do formalismo moderado pode contribuir positivamente para o saneamento de processos no âmbito da Corte de Contas Federal.

Diante do exposto, este Representante do Ministério Público manifesta-se de acordo com a proposta formulada pela Serur às fls. 154/55.”

Ao acolher integralmente as razões da Unidade Técnica e se alinhar ao entendimento do MPTCU, o Ministro Relator Aroldo Cedraz votou pela reforma do Acórdão anterior (nº 3.566/2008), levando em consideração também a importância “dos transtornos operacionais e dos custos que decorreriam da alteração de procedimentos de contratação” caso a estatal não pudesse se valer da Lei nº 6.019/79. Seja transcrito trecho de voto do Relator:

“3. Basicamente, a questão gira em torno da aplicação, às contratações temporárias de pessoal dos Correios, dos dois normativos há pouco mencionados.

4. Para os gestores e para a ECT, aqueles diplomas não se aplicariam àquela entidade em virtude: (a) da natureza de empresa pública dos Correios; (b) da incidência daquelas normas exclusivamente em relação à administração direta, às autarquias e às fundações; (c) da inexistência, naqueles normativos, da hipótese específica de contratação dos serviços que ora são obtidos mediante empresas de mão de obra temporária; e (d) dos transtornos operacionais e dos custos que decorreriam da alteração de procedimentos de contratação.

5. Como mostraram a Serur e o MPTCU – cujas manifestações, integralmente transcritas no relatório que antecedeu este voto, incluo entre os fundamentos desta deliberação – são procedentes tais argumentos.

6. De fato, ao dispor sobre a contratação por tempo determinado para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público, a Lei 8.745/1993, em seu art. 1º, limitou sua extensão à administração federal direta, às autarquias e às fundações públicas. Excluiu, assim, as empresas públicas e as sociedades de economia mista, cujas atividades exigem regime jurídico diferenciado, dada a necessidade de maior celeridade na resposta a exigências do mercado.

7. Tal entendimento acerca da questão, aliás, já havia sido anteriormente expresso por esta Corte no acórdão 16/2003 – 2ª Câmara. Frise, ainda, que, naquela mesma oportunidade, também se considerou que contratações temporárias de pessoal pelas empresas estatais devem ser regidas pela Lei 6.019/1974, exatamente como procedeu a ECT no caso ora em discussão”.

Por fim, a conclusão do Acórdão nº 3.888/2011 – 2ª Câmara foi no sentido da reforma do Acórdão nº 3.566/2008 – 2ª Câmara, para acolher as razões da ECT e de outros interessados, pacificando a possibilidade de utilização da Lei nº 6.019/79 pelas empresas estatais.

Sobre o autor
Thales Alessandro Dias Pereira

Advogado da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos. Bacharel em Direito pela Universidade Federal do Maranhão. Pós-graduando em Direito Público pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PEREIRA, Thales Alessandro Dias. Contratação de mão de obra temporária para as atividades-fim de empresas estatais federais segundo o entendimento do Tribunal de Contas da União. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 3892, 26 fev. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/26793. Acesso em: 26 dez. 2024.

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