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O agir comunicativo e a democracia deliberativa:

contribuições às políticas públicas educacionais no Brasil

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Agenda 05/08/2016 às 13:32

4 POLÍTICAS PÚBLICAS EDUCACIONAIS: UM OLHAR SOBRE O ENSINO SUPERIOR BRASILEIRO

As pesquisas abordando as políticas públicas são crescentes, no entanto, faz-se necessário especificar a concepção de políticas públicas que se adota em cada estudo, tendo em vista que este termo apresenta-se pouco definido em virtude de sua ampla utilização.

O conceito de política pública remete a questões coletivas, relacionadas a metas e encaminhamento de soluções para resolver problemas sociais nas mais diversas áreas. O Ministério da Saúde apresenta um conceito de políticas públicas relevante para a compreensão destas ações:

Políticas públicas configuram decisões de caráter geral que apontam rumos e linhas estratégicas de atuação governamental, reduzindo os efeitos da descontinuidade administrativa e potencializando os recursos disponíveis ao tornarem públicas, expressas e acessíveis à população e aos formadores de opinião as intenções do governo no planejamento de programas, projetos e atividades (BRASIL, 2006, p. 09).

O conceito exposto acima cita aspectos importantes na concepção de políticas públicas, dentre eles a descontinuidade administrativa ocorrida em virtude da mudança periódica dos governantes. Esta mudança é positiva na medida em que permite melhorias e avanços, no entanto, a descontinuidade também pode levar à criação de novas diretrizes, distintas ou até mesmo contraditórias em relação às anteriores, gerando desperdício de recursos financeiros. Ademais, ressalte-se que a definição apresentada pelo Ministério da Saúde expõe as políticas públicas como meio de participação dos cidadãos, uma vez que estes passam a conhecer as intenções do governo, podendo então apoiá-las, conhecer sua implementação ou até mesmo opor-se à sua execução (SCHMIDT, 2008).

Easton (1963 apud Schmidt, 2008) considera que, dentro de um sistema político, as políticas públicas são produtos e resultados. As políticas públicas originam-se do contexto sócio-político que cerca o sistema político. Esse contexto gera demandas e apoios ao sistema político. O sistema processa estas demandas através de suas instituições específicas do Estado, gerando decisões e políticas, que não são o fim do processo, pois há um processo de retroalimentação, constituindo-se novas demandas que levam a novos resultados e assim indefinidamente.

As políticas públicas tem se constituído como oportunidades para melhorar os serviços públicos e expandir a participação cidadã.  De acordo com Cunha e Costa (2003) tais políticas são criadas como uma resposta do Estado, na pessoa de seus entes públicos, às demandas que emergem da sociedade e do seu próprio interior, sendo expressão do compromisso público de atuação numa determinada área em longo prazo.

Ainda conforme Cunha e Costa (2003, p. 15):

O processo de formulação de uma política envolve a identificação dos diversos atores e dos diferentes interesses que permeiam a luta por inclusão de determinada questão na agenda pública e, posteriormente, a sua regulamentação como política pública. Assim pode-se perceber a mobilização de grupos representantes da sociedade civil e do Estado que discutem e fundamentam suas argumentações, no sentido de regulamentar direitos sociais e formular uma política pública que expresse os interesses e as necessidades de todos os envolvidos.

A análise das políticas públicas traz importantes contribuições para a compreensão do funcionamento das instituições políticas e de como estas lidam com as complexidades da realidade social na atualidade. Dentre as situações problemáticas vivenciadas ao longo dos anos pela sociedade brasileira destaca-se o acesso à educação. Como direito social previsto no artigo 6º da Constituição Federal de 1988 o direito à educação tem norteado a formulação de políticas públicas visando a democratização do acesso e a construção da inclusão social por meio da materialização deste direito.

Na atualidade, evidencia-se o objetivo das instituições educativas e das despesas públicas em educação de possibilitar certa mobilidade social. O objetivo reivindicado é que todos possam ter acesso à formação como meio de fomentar a inclusão social.

A inclusão social relaciona-se às iniciativas empreendidas pelo Estado e pela sociedade civil para enfrentar os processos de exclusão nas suas diversas esferas (social, econômica, política e cultural), de modo a tornar possível a todos ou ao maior número os benefícios que a sociedade possibilita apenas a certos segmentos (SCHMIDT, 2008).

Historicamente, a sociedade brasileira caracterizou-se pela predominância das camadas sociais mais altas no acesso à educação superior privada, ganhando destaque as políticas públicas desenvolvidas neste contexto com a finalidade de promover a inclusão de grupos até então excluídos deste nível do ensino, tendo em vista que no plano das políticas públicas, um dos debates centrais é o potencial de inclusão das políticas sociais e sua relação com as políticas intereconômicas adotadas no contexto da globalização.

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A expansão da educação superior foi acentuada a partir da década de 1990 com a promulgação da Lei n° 9.394/96 - Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) e com a aprovação do Plano Nacional de Educação (PNE), em consonância com o caráter neoliberal assumido pelo Estado. Diante da insuficiência de vagas no ensino público e da exigência cada vez mais expressiva por mão de obra qualificada para atuar no mercado capitalista, a procura por IES particulares aumentou.

Nesse contexto, passou-se a discutir acerca da ampliação das oportunidades de acesso de camadas populares ao ensino superior privado. As políticas públicas de acesso ao ensino superior visando a inclusão social tratam-se de medidas compensatórias, visando equilibrar o acesso aos bens sociais, levando-se em consideração o princípio da igualdade na escolaridade, bem como na inserção profissional mais qualificada (CURY, 2005).

Nas últimas décadas as políticas em torno da democratização do acesso à educação superior ganharam destaque, principalmente em virtude da relevância do espaço acadêmico diante das novas necessidades da sociedade capitalista. Como espaço complexo que envolve desde relações sociais ao desenvolvimento técnico-científico, às instituições de ensino superior atribuiu-se a função de formar o homem para o mundo do trabalho e para a própria sociedade. Nesse âmbito, as primeiras políticas públicas de acesso à educação superior no Brasil foram implantadas a partir das universidades públicas, como forma de estabelecer igualdade de direitos e oportunidades visando a redução das desigualdades socioeconômicas no país.

A igualdade de oportunidades no ensino superior é um desafio central para o Estado social no século XXI. Segundo Schmidt (2008) a  pobreza é o maior dos flagelos que a humanidade enfrenta no início do novo milênio. Flagelo de enorme magnitude e complexidade, associada à exclusão e desigualdade social ela se manifesta em todos os continentes, mas com rigor extremo na África, Ásia e América Latina. Essa situação deve-se em grande parte à desigualdade de oportunidades no acesso à educação superior, que possibilitaria a inclusão social.

O objetivo das políticas públicas de inclusão social na educação superior deve ser a formação de uma comunidade cívica que une alto grau de tolerância e elevado capital social, onde se respeite o direito à diferença e as robustas formas de interação e cooperação comunitária não se restringem a indivíduos que possuem as mesmas características, mas incluem indivíduos diversos sob o ponto de vista étnico, cultural, religioso, social e político.

No estabelecimento de políticas públicas que visam a inclusão social na educação superior a partir do capital social, o empoderamento das populações marginalizadas é elemento central. Em razão das múltiplas barreiras sociais que lhes são impostas, os pobres tem extrema dificuldade de ver-se como atores capazes de exercer alguma influência real no seu ambiente social e na esfera política. O empoderamento consiste numa transformação atitudinal de grupos sociais desfavorecidos que os capacita “para a articulação de interesses, a participação comunitária e lhes facilita o acesso e controle de recursos disponíveis, a fim de que possam levar uma vida autodeterminada, auto-responsável e participar do processo político” (BAQUERO, 2005, p.39).

No seu alcance mais amplo, este empoderamento resulta na criação das condições que habilitam os pobres à conquista dos direitos de cidadania. Com isto, expandem-se as possibilidades de ampliação das políticas de equidade na oferta educacional do ensino superior no Brasil.

As políticas públicas atualmente desenvolvidas pelo poder público no sentido de promover a inclusão social no meio acadêmico precisam ser constantemente avaliadas e revistas. De acordo com Costa e Castanhar (2003), a avaliação sistemática, contínua e eficaz de programas pode ser um instrumento fundamental para se alcançar melhores resultados e proporcionar uma melhor utilização e controle dos recursos neles aplicados, além de fornecer aos formuladores de políticas sociais e aos gestores de programas, dados importantes para o desenho de políticas mais consistentes e para a gestão pública mais eficaz.

A inclusão de grupos historicamente excluídos do ensino superior contribui para amenizar a desigualdade no acesso a este âmbito do ensino, bem como possibilita a convivência entre estudantes de classes sociais diferentes, colaborando para a redução da discriminação, com a geração de novas referências para a sociedade. No entanto, ainda que as políticas públicas tenham sido expandidas visando garantir a inclusão no ensino superior, precisam ser continuamente melhoradas para resolver totalmente os problemas de acesso e qualidade no sistema de educação superior brasileiro (OLIVEIRA et al, 2008).

As políticas públicas voltadas para a inclusão social no ensino superior brasileiro visam conceber o estudante como cidadão, em pleno gozo de seus direitos sociais, participativo social e politicamente. Isto é, a inclusão social é caracterizada pelo exercício da cidadania plena ou emancipatória, pela participação social, política e cultural, além do acesso aos direitos básicos. Nesse sentido, “[...] a efetivação de uma política pública voltada à inclusão social no ensino superior implica a garantia do acesso e permanência do aluno, a equidade de oportunidades e a efetivação da democratização do espaço escolar” (FACEIRA, 2004, p.16). 

A educação superior precisa oferecer condições para que os cidadãos tenham oportunidade de formação intelectual e assim possam agir como sujeitos atuantes socialmente e não oprimidos sob o jugo das desigualdades social e historicamente construídas. A atualização das políticas públicas, assim como a elaboração de novas políticas, deve passar, portanto, pelo prisma da inclusão social a fim de que se possa ter a garantia de que estão sendo adotas medidas eficazes para conviver-se em sociedade de forma harmônica e igualitária diante dos desafios da diversidade humana.

Sobre o autor
João Deusdete de Carvalho

Advogado e Economista, Procurador Público, Professor Assistente da URCA/CE, Estudou pós-graduação em Direito Processual Civil pela UFPI e, Pós-graduação em Planejamento pela FAO, Estudou Mestrado em Direito pela Universidade de Santa Cruz do Sul.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CARVALHO, João Deusdete. O agir comunicativo e a democracia deliberativa:: contribuições às políticas públicas educacionais no Brasil. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 21, n. 4783, 5 ago. 2016. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/51158. Acesso em: 25 nov. 2024.

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