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O ativismo judicial em face à teoria de Dworkin: a questão do canabidiol.

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4. CONCLUSÃO

Em vista dos argumentos apresentados, compreende-se que o ativismo judicial é essencial para se preservar a democracia e a Constituição de um país. Levando em consideração que se trata de um instrumento jurídico com a finalidade de defender os direitos dos indivíduos, sobretudo os fundamentais, a sua prática deve ser observada.

Diante do estudo realizado à luz do pensamento de Dworkin (2014), nota-se que o mesmo entende que o ativismo judicial não se trata de uma alternativa que o Judiciário pode escolher, mas sim, de um compromisso entre os tribunais e os direitos dos cidadãos. Nesse sentido, o filósofo compreende que, quando direitos e princípios constitucionais estão sendo discutidos no âmbito judicial, o magistrado deve defendê-los, mesmo que o preço a ser pago seja de ser contramajoritário.

À vista disso, infere-se que a prática do ativismo ocasiona a intervenção do Judiciário em questões sociais ou políticas que não foram contempladas pelos demais poderes, em razão de sua inércia ou sua falta de credibilidade. Assim, se um tribunal tem postura ativista e defende os direitos morais dos indivíduos contra o Estado, a atividade judiciária estará garantindo a democracia.

Desse modo, ao se analisar a situação do fenômeno do Brasil, levando em consideração as teses de Pogrebinschi, revela-se que a prática do ativismo ainda é insuficiente em relação às demandas nos tribunais. Apesar de o número de ações impetradas no STF ser significativo, o mesmo não deve ser utilizado como indicador de atividade judiciária, porque o que importa são os resultados obtidos com essas ações.

Assim sendo, embora nos últimos anos a discussão acerca do ativismo tenha sido ampliada, ele vem sendo cada vez mais apequenado diante das decisões legalistas proferidas no país. Na visão de Pogrebinschi (2012), a mídia atua como a principal contribuinte desse falso silogismo, pois na realidade o Judiciário não é ativista.

Diante dessa situação, utilizou-se o exemplo do CBD, o qual demonstra que o Judiciário ainda não está preparado para cuidar de questões tão importantes como os direitos fundamentais dos indivíduos. Nesse contexto, tendo em vista que a obtenção da substância leva à concretização do direito à saúde e do princípio da dignidade da pessoa humana, denota-se que o ativismo no Brasil tem sido realizado de forma parcimoniosa, contrariando o seu verdadeiro objetivo.

Nessa perspectiva, ao serem analisadas algumas decisões proferidas pelos magistrados brasileiros acerca do CBD, pode-se constatar que os juízes e tribunais não tem reconhecido o verdadeiro objetivo que a concessão do CBD traz consigo, qual seja o acesso ao direito da saúde. Em decisões infundadas, o Judiciário demonstra que ainda é inapto para valer-se de “guardião dos direitos fundamentais”, uma vez que nega aos pacientes um medicamento essencial à sua saúde, dignidade e, porque não à sua vida.

Diante disso, é preciso refletir sobre a atual conjuntura do ativismo no Brasil. Levando em consideração a importância de sua prática e seriedade, os juízes e tribunais deveriam atentar-se ao seu exercício e priorizar a defesa dos direitos morais dos indivíduos, na busca de garantir que princípios constitucionais como o da dignidade da pessoa humana sejam alcançados e realmente efetivados.

Embora o ativismo ainda seja praticado de modo insuficiente no Brasil, o Judiciário não deve se apequenar e deixar de exercê-lo, pois o que envolve tudo isso é um bem maior: a garantia de que a democracia e os princípios elencados pela Constituição Federal serão preservados, com o objetivo final de defender os direitos dos cidadãos. Dessa maneira, em conformidade com o entendimento de Pogrebinschi (2012), o Judiciário deve agir e se posicionar de modo contramajoritário, de forma que os direitos dos indivíduos sejam protegidos e assegurados.

Portanto, conclui-se que o Poder Judiciário é, ainda, a única saída para resolver os conflitos que envolvem direitos morais e princípios. Os juízes e tribunais devem se preparar mais para tratar de questões tão essenciais como os direitos morais. Sendo o STF o guardião da Constituição, não pode se abster diante de omissões e violações dos direitos fundamentais que ocorrem frequentemente nos demais poderes.

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Ademais, o exercício do ativismo judicial também é pertinente para que, ao final, as ideias de Dworkin sejam alcançadas, pois para ele o fenômeno “provou ser um dispositivo valioso e plenamente democrático para reduzir a injustiça política a longo prazo” (DWORKIN, 1997, p. 02). Assim, nada mais justo que sua prática – se realizada na defesa dos indivíduos e da Constituição – seja observada.


REFERÊNCIAS

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ANVISA. Resolução da Diretoria Colegiada - RDC n° 17 de 06 de maio de 2015. Define os critérios e os procedimentos para a importação, em caráter de excepcionalidade, de produto à base de Canabidiol em associação com outros canabinóides, por pessoa física, para uso próprio, mediante prescrição de profissional legalmente habilitado, para tratamento de saúde. Disponível em: <https://portal.anvisa.gov.br/documents/10181/2867344/%283%29RDC_17_2015_COMP.pdf/d0b13b61-7b6d-476c-8177-6b866c7a9b10>. Acesso em: 01 abr. 2017.

ANVISA. Resolução da Diretoria Colegiada – RDC nº 66 de 18 de março de 2016. Dispõe sobre a atualização do Anexo I (Listas de Substâncias Entorpecentes, Psicotrópicas, Precursoras e Outras sob Controle Especial) da Portaria SVS/MS nº 344, de 12 de maio de 1998, e dá outras providências. Disponível em: <https://portal.anvisa.gov.br/documents/ 33880/2568070/RDC662016.pdf/3fc2e4d6-d371-403f-b2c2-9f2972f6a85d. Acesso em: 20 mar. 2017.

BARROSO, Luís Roberto. Judicialização, Ativismo Judicial e Legitimidade Democrática. Revista Atualidades Jurídicas – Revista Eletrônica do Conselho Federal da OAB, jan./fev. 2009. Disponível em: <https://www.oab.org.br/editora /revista/users/revista/1235066670174218181901.pdf> Acesso em: 15 mar. 2017.

BARROSO, Luís Roberto. No mundo ideal, Direito é imune à política; no real, não. 2010. Disponível em: <https://www.conjur.com.br/2010-fev-16/mundo-ideal-direito-imune-politica-real-nao-bem-assim?pagina=2>. Acesso em: 14 ago. 2017.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil (1988). Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao compilado.htm>. Acesso em: 24 mar. 2017.

CARVALHO, Carlos Eduardo Araújo de. Ativismo judicial em crise. 2009. Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/12781/ativismo-judicial-em-crise>. Acesso em: 31 jul. 2017.

DIAS, Bruno dos Santos. Ativismo judicial: o poder judiciário como protagonista do necessário controle para a discricionariedade desregrada e omissão injustificada do poder executivo. 2013. Disponível em: <https://www.emerj.tjrj.jus.br/paginas/trabalhos_conclusao/1semestre2013/trabalhos_12013/BrunoSantosDias.pdf>. Acesso em: 04 ago. 2017.

DWORKIN, Ronald. Juízes políticos e democracia. O Estado de São Paulo. Coluna Espaço Aberto, 26 de abril de 1997. Disponível em: <https://acervo. estadao.com.br/pagina/#!/19970426-37810-nac-0002-opi-a2-not>. Acesso em: 20 out. 2017.

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_______. O império do direito. 3. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2014.

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GOMES, Luiz Flávio. STF – ativismo sem precedentes?. O Estadão de São Paulo, 2009. Disponível em: <https://opiniao.estadao.com.br/noticias/geral,stf-ativismo-sem-precedentes,379413>. Acesso em: 31 jul. 2017.

MALDONADO, Maurílio. Separação dos poderes e sistema de freios e contrapesos: desenvolvimento no estado brasileiro. Revista Jurídica ''9 de Julho'', São Paulo, Imprensa Oficial do Estado de São Paulo v.2, jul. 2003.

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TASSINARI, Clarissa. Jurisdição e ativismo judicial: Limites da atuação do Poder Judiciário. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2013.


Notas

3 Será citado comumente como CBD.

4 Hard case é quando, no caso concreto: a) não há regra que se aplique; b) quando há mais de uma regra; ou c) quando a solução do caso causa estranheza aos costumes.

Disponível em: <https://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura &artigo_id=10222>. Acesso: 12 ago. 2017.

5 A origem do fenômeno no Brasil deu-se com a promulgação da vigente Constituição, a qual trouxe inúmeros direitos e garantias aos cidadãos, marcando um período de redemocratização. Sem dúvidas, um marco histórico brasileiro, considerado como a “era dos direitos”.

6 ADPF (Arguição de descumprimento de preceito fundamental) 54 – aborto em anencéfalos: “Capitaneados por memorável voto do ministro Marco Aurélio Mello – que completa 25 anos de brilhante atuação no Supremo – 8 dos ministros votaram que sim, e o STF julgou procedente a ADPF 54, para declarar a inconstitucionalidade da interpretação segundo a qual a interrupção deste tipo de gravidez é conduta tipificada nos artigos 124, 126, 128, incisos I e II, do CP”. Disponível em: https://www.migalhas.com.br/Quentes/17,MI[221]398,51045-Marco+Aurelio+Mello+ Decisao+historica+do+STF+permite+aborto+de+feto. Acesso em: 06 ago. 2017. A ADPF 54 foi uma das mais polêmicas decisões proferidas mediante o ativismo judicial. Após anos de discussão, o STF liberou a interrupção da gravidez de fetos anencéfalos. O exemplo é necessário para que se demonstre a importância de um tribunal ativista que trabalha em prol dos direitos dos indivíduos.

7 1) Não é verdade que o STF tem uma atuação contramajoritária, isto porque é inexpressivo o número de decisões declarando a inconstitucionalidade, em todo ou em parte, de leis e atos normativos promulgados pelo Congresso Nacional. 2) Ao contrário do que se diz, o STF reforça a vontade majoritária representada no Congresso Nacional, isto porque ele vem confirmando a constitucionalidade das leis e atos normativos em 86,68% das ADIs e ADPFs. 3) Não é verdade que o STF atua de forma ativista; portanto, não é verdadeiro dizer que ele colmata as supostas lacunas deixadas pelo Legislativo, uma vez que, para cada declaração de inconstitucionalidade, havia uma média de 11,75 projetos de lei tratando da mesma matéria específica em tramitação no Congresso. 4) Não há enfraquecimento do poder majoritário do Legislativo, uma vez que, em decorrência da declaração de inconstitucionalidade, o Congresso propõe uma média de 6,85 projetos de lei versando sobre a mesma matéria. 5) Ao contrário do que se afirma, o STF fortalece a atuação do Legislativo, obrigando-o a legislar sobre determinadas matérias. 6) O comportamento do Supremo não se alia a nenhuma coalizão majoritária do Congresso, porque o a relação entre ADPFs e ADIs reconhecidas é proporcional. 7) O STF tem se utilizado de recursos jurídicos para preservar ao máximo a palavra do Legislativo, como a interpretação conforme, a nulidade parcial sem redução de texto e a modulação de efeitos.” (POGREBINSCHI, 2012, apud STRECK, 2013).

8 ADI = Ação Direta de Inconstitucionalidade.

9 RDC = Resolução da Diretoria Colegiada.

10 Política Nacional de Medicamentos aprovada pela Portaria nº 3.916, de 30 de outubro de 1998.

11 Será citado comumente como SUS.

12 Resolução CFM nº 2.113/2014, publicada no Diário Oficial da União em 16/12/14, seção I, p. 183. – Aprova o uso compassivo do Canabidiol para o tratamento de epilepsias da criança e do adolescente refratárias aos tratamentos convencionais.

13 A Constituição Federal de 1988 tratou dos direitos e garantias fundamentais em cinco capítulos específicos (artigos 5º a 17), assegurando a plena inserção destes comandos em nosso ordenamento jurídico máximo.

Disponível em: https://www.ambito-juridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=1176 9. Acesso em: 12 de out de 2017.

14 BRASIL. Tribunal de Justiça do Paraná (5ª Câmara Cível). Agravo de Instrumento nº15998624-PR. Agravante: Estado do Paraná. Agravado: Ministério Público. Relator: Des. Leonel Cunha. Curitiba, 14 de fevereiro de 2017. Disponível em: https://tj-pr.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/435780348/agravo-de-instrumento-ai-15998624-pr-1599862-4-acordao. Acesso em: 24 de out de 2017.

15 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 1594707-RJ. Recorrente: Pedro Henrique Siqueira Dias, representado por Aline Agata Siqueira Dias. Recorrido: União e outros. Relator: Ministro Benedito Gonçalves. Brasília, 1º de agosto de 2017. Disponível em: https://stj.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/487033203/recurso-especial-resp-1594707-rj-2016-0108031-5. Acesso em: 24 de out de 2017.

Sobre as autoras
Gabrielle Karine Castagna

Acadêmica do curso de Direito do Centro Universitário Univel - Cascavel/PR.

Kátia Rocha Salomão

Professora associada a Univel, onde atua no ensino de filosofia geral, hermenêutica jurídica e seus desdobramentos. Possui especialização em Filosofia Política e Jurídica (UEL-2006), Mestrado na área de Filosofia (Unesp-2008), com ênfase em ética e filosofia política. Doutoranda em Filosofia (UNIOESTE-PR), aspectos éticos e políticos. Tem experiência na área de Filosofia Geral e Jurídica, Filosofia da Educação, Filosofia da Arte, Filosofia na Administração, Ética, Metodologia Científica e Hermenêutica jurídica.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CASTAGNA, Gabrielle Karine; SALOMÃO, Kátia Rocha. O ativismo judicial em face à teoria de Dworkin: a questão do canabidiol.: Resoluções nº 03/2015, 17/2015 e 66/2016. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 23, n. 5453, 6 jun. 2018. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/65658. Acesso em: 23 nov. 2024.

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