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Licença por motivo de doença em pessoa da família: efeitos da Lei nº 12.269/2010 sobre situações consolidadas

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01/06/2012 às 10:08
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7 Função comissionada / Cargo em comissão

Por força da anterior redação do §2º, art. 83, da Lei nº 8.112/1990, os vencimentos do servidor licenciado por LPF-Remunerada, restringiam-se à remuneração do cargo efetivo, e quaisquer valores de função comissionada ou cargo em comissão eram suspensos.

A nova redação do artigo guarda correspondência com a anterior, como se pode ler no §2º, art. 83, da Lei nº 8.112/1990, no texto vigente:

A licença de que trata o caput, incluídas as prorrogações, poderá ser concedida a cada período de doze meses nas seguintes condições:

I - por até 60 (sessenta) dias, consecutivos ou não, mantida a remuneração do servidor; e

II - por até 90 (noventa) dias, consecutivos ou não, sem remuneração.

Contudo, não se incluíram na Lei nº 8.112/1990 os primeiros 30 dias da LPF, que consistem em tempo de efetivo exercício, conforme instituído pela Lei nº 12.269/2010. Enquanto a redação anterior do Estatuto dos Servidores restringia a remuneração de cargo/função, a nova redação não impõe óbice a essa remuneração nos primeiros 30 dias de licença “em cada período de 12 (doze) meses a contar da data da primeira licença gozada”, conforme o já citado parágrafo único, do art. 24, da Lei nº 12.269/1990.

Em coerência com os critérios já suscitados, sugere-se que sejam calculados os períodos gozados de LPF, até o limite de 30 dias, e que sejam restituídos os valores de efetivo exercício de cargo/função comissionada outrora retidos, desde 12/12/1990.


8 Quintos / VPNI

Após um período de incertezas quanto à interpretação da Lei nº 8.911/1994, o Tribunal de Contas da União definiu que é admitida a incorporação de parcelas de quintos, na forma da redação original dessa lei, no período de 09/04/1998 e 04/09/2001 (data da edição da Medida Provisória 2.225-45). Essa incorporação dependia de tempos de efetivo exercício, em cargos em comissão ou funções comissionadas, conforme art. 3º da Lei nº 8.911/1990:

Art. 3º Para efeito do disposto no § 2º do art. 62 da Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990, o servidor investido em função de direção, chefia e assessoramento, ou cargo em comissão, previsto nesta Lei, incorporará à sua remuneração a importância equivalente à fração de um quinto da gratificação do cargo ou função para o qual foi designado ou nomeado, a cada doze meses de efetivo exercício, até o limite de cinco quintos. (Revogado pela Lei nº 9.527, de 10.12.1997. Grifo acrescentado.)

Assim sendo, a inclusão dos primeiros 30 dias, a cada 12 meses, de LPF na contagem de tempo, guarda coerência com o critério adotado, conforme instituído pelo parágrafo único do art. 24 da Lei nº 12.269/2010, de considerar aqueles dias como efetivo exercício, seja em cargo efetivo, seja em cargo em comissão ou função comissionada.

Concordemente, devem ser recalculados os tempos dos servidores no exercício de cargo em comissão ou função comissionada até 04/09/2001, incluindo-se os períodos de LPF mencionados, objetivando a revisão dos períodos de incorporação da vantagem dos quintos.


9 Vantagem do Art. 193 da Lei nº 8.112/1990

O art. 193 da Lei nº 8.112/1990, revogado em 1997 pela Lei nº 9.527, estabelecia que

O servidor que tiver exercido função de direção, chefia, assessoramento, assistência ou cargo em comissão, por período de 5 (cinco) anos consecutivos, ou 10 (dez) anos interpolados, poderá aposentar-se com a gratificação da função ou remuneração do cargo em comissão, de maior valor, desde que exercido por um período mínimo de 2 (dois) anos.

§ 1° Quando o exercício da função ou cargo em comissão de maior valor não corresponder ao período de 2 (dois) anos, será incorporada a gratificação ou remuneração da função ou cargo em comissão imediatamente inferior dentre os exercidos.

§ 2° A aplicação do disposto neste artigo exclui as vantagens previstas no art. 192, bem como a incorporação de que trata o art. 62, ressalvado o direito de opção.

O Tribunal de Contas da União, no Acórdão de Plenário nº 2.076/2006, aos que, por ocasião da aposentadoria, satisfizeram os pressupostos temporais estabelecidos até a data de 19/01/1995, assegurou o benefício da opção ali mencionada. A essência desses pressupostos era o “exercício de função de direção, chefia assessoramento, assistência ou cargo em comissão”. Portanto, quando da apuração dos que se qualificavam ao direito declarado, não foram incluídos os períodos de LPF, visto que não consistiam em efetivo exercício. Contudo, o advento da Lei nº 12.269/2010 estabeleceu novo critério, impondo em que os primeiros 30 dias de LPF, a cada 12 meses, devam ser inseridos no cálculo.

Para apuração dos servidores que poderão se qualificar nesse direito, é necessário verificar a contagem do(s) período(s) de exercício em Função Comissionada – FC ou Cargo em Comissão – CC até 19/01/1995. Constatado que o servidor exerceu FC ou CC, caso se apure a ocorrência de LPF no período de exercício dessa FC ou CC, devem-se inserir os primeiros 30 dias da LPF, a cada 12 meses, até a data limite de 19/01/1995. Essa solução atinge os que se qualificam para esse direito e que têm a perspectiva de se aposentarem com tal vantagem. A revisão por ocasião da aposentadoria apenas surtirá efeitos caso a contagem seja significativa para o implemento do pressuposto temporal estabelecido no art. 193 da Lei nº 8.112/1990, ou seja, 5 anos consecutivos ou 10 anos interpolados em efetivo exercício de FC ou CC, até 19/01/1995.

Deve-se rever também a contagem de tempo em exercício de FC ou CC, de servidores que já se aposentaram mas não fizeram jus à vantagem da opção assegurada pelo já mencionado Acórdão de Plenário do TCU, nº 2.076/2006, computando-se os períodos de LPF, nos termos do art. 24 da Lei nº 12.269/2010. Saliente-se que a inclusão da parcela da opção nos proventos somente poderá ser autorizada caso a contagem retroativa de LPF seja significativa para o implemento do pressuposto temporal estabelecido no art. 193 da Lei nº 8.112/1990.

Por outro lado, há servidores que já se aposentaram e que se beneficiaram da vantagem do art. 193 da Lei nº 8.112/1990, tendo-se qualificado, portanto, ao direito. Nesses casos, deve-se fazer a revisão da contagem de tempo no exercício da FC/CC, para se verificar se a inclusão desses dias de LPF, em efetivo exercício, qualificam o(a) servidor(a) para a incorporação da opção de FC ou CC em categoria mais elevada. Assim constatado, deve ser oferecida ao servidor a oportunidade da opção, nos termos da lei.


10 Anuênios[7]

A Medida Provisória 2.225-45/2001 assegurou, aos que acumularam tempo de efetivo exercício no serviço público até 08/03/1999, o direito outrora vigente no art. 67 da Lei nº 8.112/1990:

O adicional por tempo de serviço é devido à razão de cinco por cento a cada cinco anos de serviço público efetivo prestado à União, às autarquias e às fundações públicas federais, observado o limite máximo de 35% incidente exclusivamente sobre o vencimento básico do cargo efetivo, ainda que investido o servidor em função ou cargo de confiança.

Parágrafo único. O servidor fará jus ao adicional a partir do mês em que completar o qüinqüênio.

(Redação dada pela Lei nº 9.527, de 10.12.97) (Revogado pela Medida Provisória nº 2.225-45, de 2001, respeitadas as situações constituídas até 8.3.1999)

Concordemente com o que vigorava até então, não eram contados os tempos de LPF no cálculo dos anuênios, que poderiam ser postergados pela suspensão do tempo de efetivo exercício.

A Lei nº 12.269/2010 determinou a contagem dos primeiros 30 dias de LPF, a cada 12 meses, como efetivo exercicio, como já exposto. Assim sendo, sugere-se que se faça novo cálculo, com a incorporação desses períodos ao tempo de efetivo exercício dos servidores, retroativos a 12/12/1990. Constatada diferença a favor do servidor, deve ser ressarcida.


11 Adicionais de insalubridade/periculosidade

O art. 68 da Lei nº 8.112/1990 estabelece que “Os servidores que trabalhem com habitualidade em locais insalubres ou em contato permanente com substâncias tóxicas, radioativas ou com risco de vida, fazem jus a um adicional sobre o vencimento do cargo efetivo”.

A percepção desse adicional é suspensa quando o servidor deixa de exercer o tipo de trabalho que dá origem ao pagamento do mesmo, e a LPF também enseja a suspensão do pagamento. (Decreto nº 97.458, de 15/01/1989, art. 3º.) Essa determinação vem sendo seguida pela Administração Federal, como um todo. Doravante, outra deverá ser sua conduta, em relação à LPF em seus primeiros 30 dias, em cada 12 meses, que devem ser contados como tempo de efetivo exercício.

Assim sendo, sugere-se a realização de levantamento para identificar os servidores que, exercendo atividades insalubres ou perigosas, tiveram de se ausentar por força LPF. Uma vez identificados, que sejam-lhes ressarcidos os valores devidos, retroativos a 12/12/1990.


12 Da prescrição

Diante de todo o exposto, não há como deixar de abordar o conceito da prescrição, para fins de pagamento dos efeitos financeiros que poderão advir das revisões suscitadas. A Lei nº 12.269/2010 ordena a consideração do tempo de LPF “como de efetivo exercício, para todos os fins, [...] a partir de 12 de dezembro de 1990”, segundo determinado no art. 24, P.U. Reconhecido o dever de ressarcir os valores retidos de progressão/promoção funcional, auxílio-alimentação, abono de permanência, e outros, passa-se agora a tratar dos efeitos financeiros desse reconhecimento.

Restam dúvidas quanto à extensão dos efeitos financeiros resultantes da aplicação da citada norma. As soluções possíveis são:

1.   retroagi-los à data de 12/12/1990, indicada pela Lei nº 12.269/2010,;

2.   aplicar a prescrição quinquenal, retroativa a cinco anos da data da vigência da Lei nº 12.269/2010, em 22/06/2005, em aplicação do Decreto nº 20.910/ 1932; 

3.   não produzir efeitos financeiros, restringindo os efeitos financeiros apenas a situações ocorridas a partir de 22/06/2010, Lei nº 12.269/2010, entendendo que tudo ocorreu conforme a regra legal vigente.

Neste respeito, sugere-se a imediata rejeição dessa última forma de conceber a aplicação da norma. De fato, os atos pretéritos, assim como os efeitos financeiros já produzidos, constituem atos jurídicos perfeitos, e se inserem no curso do tempo como situações estáveis. Diz o já citado inciso XXXVI, art. 5º, da Constituição da República Federativa do Brasil, de 1988: “A lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada”. Contudo, como tantas vezes já se mencionou neste parecer, o texto da Lei nº 12.269/2010, art. 24, parágrafo único, declara expressamente que

serão considerados como de efetivo exercício, para todos os fins, os períodos de gozo de licença a partir de 12 de dezembro de 1990 cuja duração máxima, em cada período de 12 (doze) meses a contar da data da primeira licença gozada, seja de até 30 (trinta) dias.

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Impedir a produção de efeitos financeiros retroativos a 12 de dezembro de 1990 é negar ao texto legal a sua vigência. A ideia não é desconstituir atos jurídicos, mas lhes atribuir efeitos que, àquele tempo, não podiam prosperar.

Admitidos, portanto, que devem existir efeitos financeiros pretéritos, segundo determinado pelo próprio texto da Lei nº 12.269/2010, resta abordar o seu alcance. A segunda interpretação possível é a de se aplicar a prescrição quinquenal aos valores a serem ressarcidos, a contar de 22 de junho de 2005, quer dizer, a cinco anos da vigência da Lei.[8] Esse prazo quinquenal estaria coerente com a aplicação da Lei nº 8.112/1990, art. 110, inciso I, onde se determina que “o direito de requerer prescreve [...] em 5 (cinco) anos, quanto aos atos [...] que afetem interesse patrimonial e créditos resultantes das relações de trabalho”.

Outras normas tratam do assunto. O Decreto nº 20.910/1932 estabelece que:

Art. 1º As dividas passivas da União, dos Estados e dos Municípios, bem assim todo e qualquer direito ou ação contra a Fazenda Federal, Estadual ou Municipal, seja qual for a sua natureza, prescrevem em cinco anos contados da data do ato ou fato do qual se originarem.

Igualmente, a Súmula nº 33 da Advocacia Geral da União[9] orienta aquele órgão a observar a prescrição quinquenal no pagamento retroativo de licenças a servidores públicos federais, nos seguintes termos:

É devida aos servidores públicos federais civis ativos, por ocasião do gozo de férias e licenças, no período compreendido entre outubro/1996 e dezembro/2001, a concessão de auxílio-alimentação, com fulcro no art. 102 da Lei nº 8.112/90, observada a prescrição qüinqüenal. [Sic.]

Não obstante as determinações sobre prescrição quinquenal, a Lei nº 12.269/2010 silencia quanto a limitações aos fins para que a lei deve retroagir. O art. 24, parágrafo único, tantas vezes destacado neste texto, declara que

serão considerados como de efetivo exercício, para todos os fins, os períodos de gozo de licença a partir de 12 de dezembro de 1990 cuja duração máxima, em cada período de 12 (doze) meses a contar da data da primeira licença gozada, seja de até 30 (trinta) dias. (Grifos acrescentados)

Novamente, impedir a produção de efeitos financeiros retroativos a 12 de dezembro de 1990 é negar ao texto legal a sua vigência.

Portanto, considera-se que melhor é que se adote a primeira opção, de permitir a produção de todos os efeitos financeiros, desde 12 de dezembro de 1990, nos próprios termos da Lei nº 12.269/2010. Parece Ademais, é perfeitamente admissível, segundo o ordenamento jurídico vigente, fazer com que a norma retroaja, garantido que os efeitos não sejam prejudiciais ao direito adquirido ou a situações efetivamente consolidadas no tempo. A Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro, Decreto-Lei nº 4.657/1942, no já citado art. 6º, §1º, assim determina:

Art. 6º A Lei em vigor terá efeito imediato e geral, respeitados o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada.

§ 1º Reputa-se ato jurídico perfeito o já consumado segundo a lei vigente ao tempo em que se efetuou.

Nessa perspectiva, seriam devidos valores retidos, desde 12/12/1990, pelas circunstâncias mencionadas neste parecer.

De outra parte, quanto aos efeitos financeiros decorrentes da revisão, nos mesmos termos do foi considerado acima, questiona-se o critério a ser adotado quanto aos juros moratórios, sempre tendo em mente que se limitam aos primeiros 30 dias da licença, durante 12 meses, conforme o parágrafo único do art. 24, da Lei nº 12.269/2010.:

1.   se retroativos a 12/12/1990, segundo sugerido pelo art. 24, p.u., da Lei nº 12.269/2010;

2.   se retroativos a 22/06/2005, em aplicação da prescrição quiquenal;

3.   ou se retroativos apenas a 22/06/2010, data da vigência da Lei nº 12.269/2010.

Coerentemente com a posição adotada na questão do ressarcimento dos valores apurados, considera-se que melhor é que se adote este último critério, e se paguem juros somente a partir da vigência da Lei nº 12.269/2010, visto que todos os atos anteriores, decorrentes da não consideração períodos de LPF como efetivo exercício, se encontravam revestidos de legalidade, por estarem conforme ao ordenamento jurídico vigente.

De todo modo, faz-se necessária a aplicação de todos os efeitos financeiros, com incidência de juros moratórios, a partir de 22/06/2010, data da vigência da Lei nº 12.269/2010. Desde esta data, são devidos juros de mora aos prejudicados pela não aplicação da Lei nº 12.269/2010.

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Sobre o autor
Emir Couto Manjud Maluf

Servidor público federal em Belo Horizonte(MG) Bacharel em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais. Especialista em Direito Processual pelo Instituto de Educação Continuada da PUC-Minas, 2011. Especialista em Filosofia pela Universidade Gama Filho, 2012.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MALUF, Emir Couto Manjud. Licença por motivo de doença em pessoa da família: efeitos da Lei nº 12.269/2010 sobre situações consolidadas. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3257, 1 jun. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/21905. Acesso em: 29 mar. 2024.

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