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Responsabilização do advogado público pela emissão de parecer jurídico

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14/01/2013 às 14:11
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6. EVOLUÇÃO JURISPRUDENCIAL EM TORNO DO ASSUNTO

Sobre o tema objeto do presente trabalho o STF já ter se manifestou em diversas oportunidades,destacado aqui os trechos principais. Inicialmente, no Mandato de Segurança 24.073-3, o Supremo Tribunal firmou o entendimento de que o parecer não é ato administrativo. Nessa oportunidade consta o entendimento de que a responsabilização do parecerista é possível, se amparada pelos pressupostos: erro grave, ato ou omissão praticado com culpa, in verbis:

“CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. TRIBUNAL DE CONTAS. TOMADA DE CONTAS: ADVOGADO. PROCURADOR: PARECER.-C. F., art. 70, parág. único, art. 71, II, art. 133. Lei n° 8.906, de 1994, art. 2°, 5 3º, art. T, art. 32, art. 34, IX.

I- Advogado de empresa estatal que, chamado a opinar, oferece parecer sugerindo contratação direta, sem licitação, mediante interpretação da lei das licitações. Pretensão do Tribunal de Contas da União emresponsabilizar o advogado solidariamente com o administrador que decidiu pela contratação direta: impossibilidade, dado que o parecer não é ato administrativo, sendo, quando muito, ato de administração consultiva, que visa a informar, elucidar, sugerir providências administrativas aserem estabelecidas nos atos de administração ativa.(Celso Antônio Bandeira de Mello, "Curso de Direito Administrativo", Malheiros, 13.ed. p. 377).

II- 0 advogado somente será civilmente responsável pelos danos causados a seus clientes ou a terceiros, se decorrentes de erro grave, inescusável, ou de ato ou omissão praticado com culpa, em sentido largo. (Cód. Civil, art. 159; Lei n" 8.906/94, art. 32)15.

III- Mandado de segurança deferido.”. (STF- MS 24.073-3/ DF).”

Em outra oportunidade, sob a relatoria do Min. Marco Aurélio, o STF se pronuncia a respeito do art. 38 da Lei 8.666/93, ou seja, a respeito das situações em que houver manifestação acerca das minutas de editais de licitação, contratos, acordos, convênios ou ajustes, e seus respectivos e eventuais aditivos.

ADVOGADO PÚBLICO - RESPONSABILIDADE - ARTIGO 38 DA LEI N° 8.666/93 - TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO - ESCLARECIMENTOS. Prevendo o artigo 38 da Lei n° 8.666/93 que a manifestação da assessoria jurídica quanto a editais de licitação, contratos, acordos, convênios e ajustes não se limita a simples opinião/alcançando a aprovação, ou não, descabe a recusa à convocação do Tribunal de Contas da União para serem prestados esclarecimentos. (STF- MS 24.584-1/DF).”

Ressalta-se que a referida decisão não confirmou a responsabilização dos pareceristas, uma vez que apenas negou a possibilidade de afastamento da convocação desses, pelo Tribunal de Contas, para prestar esclarecimentos.

Na terceira oportunidade, a relatoria coube ao Ministro Joaquim Barbosa, que trouxe novo entendimento acerca da matéria, já destacado em momento anterior nesse estudo:

“CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. CONTROLE EXTERNO. AUDITORIA PELO TCU. RESPONSABILIDADE DE PROCURADOR DE AUTARQUIA POR EMISSÃO DE PARECER TÉCNICO-JURÍDICO DE NATUREZA OPINTATIVA. SEGURANÇA DEFERIDA.

I- Repercussões da natureza jurídico-administrativa do parecer juridico: (i) quando a consulta é facultativa, a autoridade não se vincula ao parecer proferido, sendo que seu poder de decisão não se altera pela manifestação do-órgão consultivo; (ii) quando a consulta é obrigatória, a autoridade administrativa se vincula a emitir o ato tal como submetido à consultoria, com parecer favorável ou contrário, e se pretender praticar ato de forma diversa da apresentada à consultoria, deverá submetê-lo a novo parecer; (iii) quando a lei estabelece a obrigação de decidir à luzde parecer vinculante, essa manifestação de teor jurídica deixa de ser meramente opinativa e o administrador não poderá decidir senão nos termos da conclusão do parecer ou, então, não decidir.

II- No caso de que cuidam os autos, o parecer emitido pelo impetrante não tinha caráter vinculante. Sua aprovação pelo Superior hierárquico não desvirtua sua natureza opinativa, nem o torna parte de ato administrativo posterior do qual possa eventualmente decorrer dano ao erário, mas apenas incorpora sua fundamentação ao ato.

III- Controle externo: É licito concluir que é abusiva a responsabilização do parecerista à luz de uma alargada relação de causalidade entre seuparecer e o ato administrativo do qual tenha resultado dano ao erário. Salvo demonstração de culpa ou erro grosseiro, submetida às instâncias administrativo-disciplinares ou jurisdicionais próprias, não cabe a responsabilização do advogado público pelo conteúdo de seu parecer de natureza meramente opinativa.

Mandado de segurança deferido. (STF- MS 24.631-6/DF).”

Conforme este entendimento, no caso de parecer vinculante, isto é, se a decisão a ser tomada estiver adstrita aos termos do parecer, o advogado público será responsabilizado assim como o administrador, já que, neste caso, houve a parti­lha do ato decisório, uma vez que essa espécie de parecer possui o condão de vincular os atos administrativos praticados pelos gestores públicos. Nesse sentido, o entendimento de que a responsabilização do parecerista é possível, depende, para tanto, da aná­lise da natureza jurídica do parecer (caráter vinculante), bem como,nos casos de parecer facultativo ou obrigatório, caso evidenciado culpa ou erro grosseiro.

Entretanto, cabe ressaltar ainda que, diante de um parecer vinculante, o administrador, mesmo estando limitado a tomar a decisão nos termos dispostos no ato opinativo, possui a faculdade de, ao vislumbrar o parecer, decidir ou não decidir. Ou seja, o administrador público, dotado de outros elementos e fatores decisórios além dos aspectos técnicos demonstrados no parecer, e utilizando as prerrogativas de conveniência e oportunidade a ele conferidas, poderá tomar, ou não, a decisão.


7.RESPONSABILIDADE DO ADVOGADO PÚBLICO NOS PARECERES

Conforme já salientado, o Advogado Público submete-se a uma disciplina jurídico-constitucional peculiar, que mescla os regimes jurídicos do Advogado e dos servidores públicos. Nesse sentido, cabe observar que os advogados públicos são detentores de inviolabilidade em suas manifestações e atos, porém, enquanto funcionários da administração pública, têm como balizadores de seus atos o respeito e o cumprimento aos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência, expressos na Constituição.

Ademais, o Procurador, no exercício de sua função, não age em nome próprio, mas sim em nome do ente federativo que representa. De modo que, enquanto membro da Administração Pública, sua atuação é balizada pelo comando legal, buscando sempre atender ao interesse público, comprometendo-se com os preceitos da Constituição Federal e com o ordenamento jurídico, e não com o Governante. Nessa medida, tem-se que o Procurador possui independência e a autonomia funcional.

Portanto, é imprescindível que o Estado seja defendido em Juízo por profissionais de reconhecida capacidade técnica e que possam ser responsabilizados por ações ilegais ou abusivas e, em contrapartida, sejam dotados de independência funcional necessária para afastar influências indevidas dos governantes e políticos. Não é por outro motivo que o legislador constituinte impõe à estruturação da carreira da advocacia pública o ingresso através de concurso público de provas e títulos (art. 132, caput e § único, CF). Tal exigência decorre do fato de que o advogado público, sendo concursado, não estará atrelado aos interesses de qualquer dirigente, de modo que seu único compromisso será atuar em conformidade com o ordenamento jurídico e demais preceitos da Administração Pública.

No sentido de aprofundar o estudo sobre o tema,cabe diferenciar a atividade consultiva do parecerista e o trabalho do advogado de uma parte. O advogado da parte possui um trabalho essencialmente parcial, uma vez que deve defender o posicionamento de seu cliente. O consultor, por sua vez, tem um compromisso fundamental com o ordenamento jurídico e, uma vez cumprido esse compromisso, deve expor os elementos que o levaram a formar sua convicção.Portanto, o parecerista é compromissado com a ordem jurídica e com a justiça, o que o permite expor os fatores técnicos que o levaram a certas compreensões.

Nesse sentido, há muito se propala que o parecer jurídico é peça meramente opinativa, sem cunho decisório, não po­dendo, por isto, conduzir à responsabilidade do parecerista. Entretanto, conforme já citado, a doutrina e jurisprudência tem apresentado posicionamentos divergentes acerca do tema, colocando o Advogado Público como co-responsávelpela decisão administrativa tomada com base no parecer vinculante elaborado.

A figura do parecer vinculante nos coloca a discutir o posicionamento do STF acerca do tema, uma vez que nos pareceres obrigatório e facultativo o administrador tem a faculdade de acatar, ou não, os termos relatados pelo advogado público, contudo, no parecer vinculante o administrador, por sua vez, esta adstrito aos termos nele descritos tendo, desse modo, contornos de ato decisório.  Segundo o STF, tem-se que quando a lei estabelece a obrigação de decidir a luz de parecer vinculante,essa manifestação de teor jurídico deixa de ser meramente opinativa e a atuação do administrador passa a estar vinculada à conclusão do parecer. Nessa medida, o parecerista, ao emitir um parecer vinculante, responderia solidariamente pelos atos da administração nele baseados.

Em suma, conforme entendimento da doutrina dominante e jurisprudência, os advogados públicos que se manifestam em pareceres facultativos e obrigatórios, com conclusões bem fundamentadas e plausíveis, não serão responsabilizados, já que estes foram emitidos com base em elementos pautados na legalidade e ética. Portanto, nesses casos, observado os elementos técnicos, jurídicos e doutrinários, a manifestação jurídica do parecerista não poderá ser reprochada, ainda que possível sua contestação.Esse é o entendimento do Tribunal de Contas da União e da doutrina.

Cumpre ressaltar, ainda, que alguns doutrinadores entendem que, se caso o parecer possuir uma tese aceitável e coerente, não se deve responsabilizar o parecerista. Nesse sentido, tem-se que a divergência de interpretação norma­tivanunca poderá ser motivo para responsabili­zação de quem quer que seja. Mas cumpre ao assessor jurídico assinalar à autoridade pública os possí­veis caminhos existentes e, sobretudo, a ela mos­trar o grau de vulnerabilidade das teses existen­tes.

Entretanto, conforme já tratado, temos que na hipótese de parecer vinculante acatado pela autoridade administrativa o parecerista, verificado a ocorrência de qualquer dano, pode ser responsabilizado. Nessa situação, o parecer possui caráter decisório, tendo em vista que o administrador esta vinculado a atuar conforme os termos estabelecidos no parecer.

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Para além das situações descritas, cabe destacar, ainda, a hipótese em que seja elaborado um parecer facultativo teratológico a tal ponto que induza o Administrador a incorrer em ilegalidade que não cometeria, acaso não consultasse. Questionado a respeito, o parecerista poderá alegar tratar-se de parecer facultativo e escusar-se das conseqüências?

Adotando-se o entendimento de que a responsabilidade decorreria da natureza obrigatória ou facultativa do parecer, a resposta seria positiva. Contudo, cabe ressaltar que a responsabilidade não decorre somente da natureza do objeto, uma vez que esse agente também será responsabilizado ao emitir um parecer que apresente erro grosseiro com o ordenamento jurídico e caso evidenciado dolo ou culpa. Portanto, no exemplo citado acima também haveria responsabilização.

Ou seja, ao parecerista cabe observar o ordenamento jurídico e atuar em estrito cumprimento das normas legais que norteiam a conduta da Administração. Se o pare­cer se desviar desse caminho, impõe-se a aná­lise dos elementos motivadores dessa postura, e não poderia ser diferente, visto que no trato com os valores e bens públicos há que impor o zelo por parte de todos, notadamente daqueles que de­têm o conhecimento das leis e que dominam suas técnicas de utilização.


8.CULPA, COM ERRO GRAVE, E DOLO – RESPONSABILIZAÇÃODO ADVOGADO

Conforme já relatado, o advogado público poderá ser responsabilizado pela medida administrativa tomada em caso de parecer vinculante, verificada a ocorrência de qualquer dano ou irregularidade, e nos demais casos quando agir com dolo ou culpa e caso evidenciado erro inescusável. Nesse último caso é necessário que se analise a responsabilidade e a existência do nexo de causalidade entre os embasamentos de um parecer não plausível, omisso ou tendencioso, e a possibilidade de ocorrência do dano.

Portanto, não cabe ao interprete julgar a motivação do parecer, mas tão somente a ocorrência de intenção deliberada da prática delituosa de prejudicar, ou a ocorrência de imprudência, imperícia ou negligencia, ou seja, evidências de dolo ou culpa. Desse modo, é fundamental a importância de aferir, caso a caso, a existência de dolo ou de culpa, de erro grave, ou de outros elementos capazes de demonstrar a má-fé, a negligência, a imprudência ou a imperícia do parecerista. Dessa forma, há de se levantar o devido processo legal,assegurado o direito ao contraditório e ampla defesa, no qual o advogado público será individualmente responsabilizado por seu parecer, nos casos deculpa grave, dolo e nos casos de emissão de parecer vinculante que cause danos a terceiros.

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Sobre a autora
Gabriela Costa Xavier

Bacharel em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais. Bacharel em Administração Pública pela Fundação João Pinheiro. Pós-graduação em Direito Público pela Pontifícia Universidade Católica PUC/MG (em curso). Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental, lotada na Secretaria de Estado de Planejamento e Gestão de Minas Gerais. Atualmente ocupa o cargo de Gerente de Projeto na Secretaria Extraordinária da Copa do Mundo do Estado de Minas Gerais.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

XAVIER, Gabriela Costa. Responsabilização do advogado público pela emissão de parecer jurídico. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3484, 14 jan. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/23451. Acesso em: 21 nov. 2024.

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