Recentemente, a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) garantiu a um aposentado e seus dependentes o direito de continuar como beneficiários de plano de saúde coletivo operado pela Intermédici Serviços Médicos, isentos de carência, nas mesmas condições de cobertura assistencial e de preço per capita do contrato. O aposentado deverá assumir o pagamento integral da contribuição.
A decisão consolida o entendimento do Tribunal sobre o tema no sentido de garantir o cumprimento do art. 31 da Lei 9.656/98 que dispõe sobre o assunto da seguinte forma: “Ao aposentado que contribuir para produtos de que tratam o inciso I e o § 1o do art. 1o desta Lei, em decorrência de vínculo empregatício, pelo prazo mínimo de dez anos, é assegurado o direito de manutenção como beneficiário, nas mesmas condições de cobertura assistencial de que gozava quando da vigência do contrato de trabalho, desde que assuma o seu pagamento integral.”
No caso, a operadora do plano, sustentava a aplicação da Resolução n. 21/99 do CONSU (revogada desde 1/6/2012 pela Resolução Normativa n. 279/12 da ANS), que limitou a aplicação do disposto no art. 31 a aposentadorias ocorridas após 2 de janeiro de 1.999, informando ainda que a manutenção do aposentado e seus beneficiários no plano de saúde somente seria possível na modalidade individual, de maior custo mensal, e não mais na coletiva.
O caso do aposentado é mais um em um universo de milhares de ações judiciais que discutem o assunto. Com bastante frequência o Judiciário é chamado a resolver casos semelhantes, uma vez que as operadoras de saúde, muitas vezes, insistem, em total afronto à lei 9.656/98 e ao Código do Consumidor, justificar sua conduta em resoluções e normativas do setor.
Nesse sentido, é muito importante destacar que nenhuma resolução ou normativa do setor tem o poder de revogar lei existente. No caso julgado pelo STJ, o Tribunal entendeu que a Res. n. 21/99 do Conselho de Saúde Suplementar – CONSU extrapolou o poder regulamentar e fez restrição não existente na mencionada lei, sendo certo que o art. 31 da Lei 9.656/98 é autoaplicável, ou seja, contém todos os elementos necessários ao exercício dos direitos que assegura.
O julgado destacou ainda que a Lei n. 9.656/1998 aplica-se a fatos ocorridos a partir de sua vigência, mas o diploma deve atingir também as relações de trato sucessivo, mesmo que constituídas anteriormente, tal como foi o caso apreciado pelo STJ. Por fim, ressaltou que o art. 31 da Lei 9.656/98 determina que o beneficiário deve assumir integralmente a mensalidade do plano de saúde, fato esse que, por si só, deve ser entendido como garantia de manutenção do equilíbrio econômico-financeiro do contrato da apólice coletiva.
É de se destacar ainda que o princípio que motivou o legislador ao dispor sobre o assunto na Lei 9.656/98 é o chamado princípio da conservação do contrato, especialmente aplicado aos contratos de assistência médica. Cláudia Lima Marques destaca que contratos de assistência médica são “contratos de cooperação”, que “com o avançar da idade do consumidor, com o repetir de contribuições ao sistema e com o criar de expectativas legítimas de transferência de riscos futuros de saúde, os consumidores só têm a perder saindo de um plano. Assim, por exemplo, passados mais de 15 anos de convivência e cooperação contratual, rescindir o contrato ou terminar a relação contratual seria altamente negativo para os consumidores. Há o dever de boa-fé de cooperar para a manutenção do vínculo e para a realização das expectativas legítimas dos consumidores”.
O caso julgado pelo STJ é muito importante, especialmente porque deve abrir precedentes para julgamentos favoráveis aos aposentados que, atualmente, lutam na Justiça para garantir o direito de permanecer com o plano de saúde após a aposentadoria, contra empresas que, ao arrepio da legislação que regulamenta o setor (Lei 9.656/98) e do Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/90), prejudicam pessoas que durante anos a fio contribuíram para um plano de saúde e, no momento que mais precisam, têm seus direitos desrespeitados. É de ressaltar que, na maioria dos casos, os aposentados já são idosos, por vezes doentes e realizando tratamentos médicos no momento da aposentadoria, e, por isso, encontrarão muitas dificuldades para contratar outro plano de saúde.