Resumo: O presente artigo tem como finalidade informar aos leitores breve nota histórica sobre o dissenso doutrinário-jurisprudencial que se estabeleceu a partir da década de 1990 sobre o tema da possibilidade ou não de se aplicar a progressão de regime aos condenados em crimes rotulados como hediondos ou equiparados. Para tanto, verificar-se-á o status do pensamento jurídico doutrinário e o posicionamento jurisprudencial locais anteriores ao julgamento da ação de habeas corpus n. 82.959/SP, que tramitou perante o Supremo Tribunal Federal e que passou, a partir de então, a nortear o tema.
Visão geral sobre o assunto
É cabível o benefício da progressão do regime de cumprimento de pena, não apenas pelo que dispõe o art. 44, da Lei n. 11.343/06 (outrora o artigo 44 do Projeto de Lei n.º 115), como, também, em face do atual posicionamento do Supremo Tribunal Federal acerca da possibilidade de aplicação do benefício aos condenados por crimes rotulados de hediondos e/ou equiparados.
Em momento anterior, a doutrina dividia-se em duas grandes correntes, sendo que a primeira delas, que contava, até então, com o entendimento dos Tribunais Superiores, apontava para a constitucionalidade da limitação trazida pelo art. 2.º, § 1.º, da Lei n.º 8072/90, que impedia a progressão de regimes penais quando o crime pratica fosse hediondo ou equiparado, desde que expresso na sentença penal condenatória. Em suma, tal corrente afirmava que caberia à legislação infraconstitucional disciplinar acerca do regime de cumprimento de pena e demais efeitos gravosos da condenação por crimes daquelas espécies. Não haveria, por tal motivo, ferimento ao princípio constitucional da individualização da pena, tendo em vista que cabe ao próprio legislador ordinário a prerrogativa de sistematizar o cumprimento de pena, a progressão de regimes, bem como as limitações específicas àqueles condenados por crimes hediondos e assemelhados.
Tal posicionamento é revelado, à guisa de exemplo, por Alexandre de Moraes e Gianpaolo Smanio, como segue: Essa previsão não padece de qualquer inconstitucionalidade. A obrigatoriedade legal do cumprimento da pena, em caso de condenação por crimes hediondos ou assemelhados não ofende o princípio da individualização da pena, uma vez que se trata de matéria infraconstitucional a ser disciplinada por Lei ordinária. Assim, da mesma forma como o legislador tem a discricionariedade para a criação de regimes de cumprimento de pena, bem como de hipóteses de progressão e regressão entre os diversos regimes previstos, poderá também instituir algumas hipóteses em que a progressão será absolutamente vedada. (MORAES, Alexandre de, e SMANIO, Gianpaolo Poggio: Legislação Penal Especial. 7.ed. São Paulo – Atlas. 2004. p.74/75).
A jurisprudência do STF, durante longo tempo, admitiu a tese acima transcrita, sendo que vedou reiteradas vezes a possibilidade de condenados em crimes hediondos e assemelhados de conhecer da progressão do regime de cumprimento de pena, restando, assim, o cumprimento de pena em regime integralmente fechado. É o que verificamos, por exemplo, no HC n.º 75.634-4/SP, Relator Ministro Carlos Velloso:
EMENTA: PENAL. PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. REVISÃO CRIMINAL: PROVA. TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES E DROGAS AFINS. REGIME FECHADO. LEI 8.072/90, ART. 2º, § 1º. CONSTITUCIONALIDADE. I. - A prova, para a revisão criminal, há que ser produzida judicialmente, com obediência ao princípio do contraditório. II. - A pena por crime previsto no art. 2º, § 1º, da Lei 8.072/90, será cumprida em regime fechado. Inocorrência de inconstitucionalidade. C.F., art. 5º, XLIII. Precedentes do STF: HC 69.657-SP, Min. F. Rezek, RTJ 147/598; HC 69.603-SP, Min. P. Brossard, RTJ 146/611; HC 69.377-MG, Min. C. Velloso, "DJ" de 16.4.93. III. - H.C. indeferido.
Haja vista posição pacificada entre os Tribunais foi editado entendimento sumular, como se verifica em STF, 698, para a qual não se estende aos demais crimes hediondos a admissibilidade de progressão no regime de execução da pena aplicada ao crime de tortura.
Contudo, em 23 de fevereiro de 2006, o Pleno do STF julgou a questão da inconstitucionalidade da vedação à progressão de regimes, em sede de controle difuso de constitucionalidade, sendo que apuramos a seguinte decisão em HC n.º 82.959:
DECISÃO: O TRIBUNAL, POR MAIORIA, DEFERIU O PEDIDO DE HABEAS CORPUS E DECLAROU, "INCIDENTER TANTUM", A INCONSTITUCIONALIDADE DO § 1º DO ARTIGO 2º DA LEI Nº 8.072, DE 25 DE JULHO DE 1990, NOS TERMOS DO VOTO DO RELATOR, VENCIDOS OS SENHORES MINISTROS CARLOS VELLOSO, JOAQUIM BARBOSA, ELLEN GRACIE, CELSO DE MELLO E PRESIDENTE (MINISTRO NELSON JOBIM). O TRIBUNAL, POR VOTAÇÃO UNÂNIME, EXPLICITOU QUE A DECLARAÇÃO INCIDENTAL DE INCONSTITUCIONALIDADE DO PRECEITO LEGAL EM QUESTÃO NÃO GERARÁ CONSEQÜÊNCIAS JURÍDICAS COM RELAÇÃO ÀS PENAS JÁ EXTINTAS NESTA DATA, POIS ESTA DECISÃO PLENÁRIA ENVOLVE, UNICAMENTE, O AFASTAMENTO DO ÓBICE REPRESENTADO PELA NORMA ORA DECLARADA INCONSTITUCIONAL, SEM PREJUÍZO DA APRECIAÇÃO, CASO A CASO, PELO MAGISTRADO COMPETENTE, DOS DEMAIS REQUISITOS PERTINENTES AO RECONHECIMENTO DA POSSIBILIDADE DE PROGRESSÃO. VOTOU O PRESIDENTE. PLENÁRIO, 23.02.2006. (Relator Ministro Marco Aurélio).
Ainda, acerca do acima julgado noticiou o STF:
Em discussão: saber se o regime integralmente fechado previsto pela lei dos crimes hediondos fere o princípio da individualização da pena. Se a Lei nº 9.455/97, que define os crimes de tortura, teria derrogado o parágrafo 1º do art. 2º da Lei nº 8.072/90, que estabelece a forma de regime totalmente fechado de cumprimento da pena para os crimes hediondos. Por fim, se a Lei nº 8.072/90 somente enquadra como hediondos os crimes de estupro e de atentado violento ao pudor quando cometidos com grave lesão ou seguidos de morte. Procuradoria Geral da República (PGR): opina pelo indeferimento da ordem. Julgamento: O relator, ministro Marco Aurélio, deferiu o pedido de HC para cassar o acórdão do STJ e assentar o direito do paciente à progressão no regime de cumprimento da pena. O ministro Carlos Ayres Britto acompanhou o relator. Os ministros Joaquim Barbosa e Carlos Velloso indeferiram o pedido, divergindo de Marco Aurélio, e o ministro Cezar Peluso acompanhou o relator e cancelou ex officio o aumento da pena do artigo 226, III, do Código Penal. O ministro Gilmar Mendes apresentou seu voto-vista para declarar a inconstitucionalidade do § 1º do artigo 2º, com eficácia ex-nunc. (http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=66160&caixaBusca=N).
O ponto de conversão jurisprudencial encontra lastro na segunda corrente doutrinária acima aludida. Trata-se de posicionamento lecionado pelo eminente jurista Alberto Silva Franco. Segundo seu ensinamento, flagrante é a inconstitucionalidade do disposto no art. 2.º, § 1.º, Lei n.º 8072/90, vez que o mesmo fere os princípios da individualização da pena (art. 5.º, XLVI, CF/88) e da humanidade da pena (art. 5.º, III, XLVII e LXIX, CF/88). Poderíamos, ademais, adicionar os princípios da legalidade (art. 5.º, II e XXXIX, CF/88) e isonomia (art. 5.º, caput e I, CF/88), para lastrearmos o posicionamento favorável à declaração de inconstitucionalidade da norma acima indicada.
Nas palavras do autor,
o sistema progressivo de pena privativa de liberdade está, também, vinculado ao princípio constitucional da individualização da pena. Tal princípio garante, em resumo, a todo cidadão, condenado em processo-crime, uma pena particularizada, pessoal, distinta e, portanto, inextensível a outro cidadão, em situação fática idêntica ou assemelhada. (...) Não há dúvida de que a individualização da pena assume, na Constituição Federal, a condição de direito fundamental do cidadão, posicionado frente ao poder repressivo do Estado. Não é possível, em face da ordem constitucional vigente, a cominação legal de pena, exata na sua quantidade, na aplicação ou execução de pena, sem intervenção judicial, para efeito de adapta-la ao caso concreto, ao delinqüente ou às vicissitudes do seu cumprimento. (...) [não haveria] ...um processo individualizador da pena: tudo já estaria pré-disposto, o que estaria em atrito com o próprio conceito de individualização que quer dizer “considerar individualmente”... Este é o sentido e o objetivo da norma constitucional. (FRANCO, Alberto Silva: Crimes Hediondos. 4.ed. São Paulo – RT – 2000. p. 162/163).
Em páginas posteriores, arremata o jurisconsulto: "A exclusão do sistema progressivo conflita, também, com o princípio da humanidade da pena (art. 5.º, III, XLVII e LXIX, CF/88). (...) Pena exercitada com um único e uniforme regime prisional, significa pena desumana (...), não exerce nenhuma influência psicológica positiva no sentido de seu reinserimento social". (Op. Cit. p. 166).
Sob nossos olhos, a doutrina esposada pelo Dr. Silva Franco e recentemente admitida pelo Pleno do STF (HC 82.959 e seguintes), é a melhor expressão do Direito acerca do tema da possibilidade de conceder progressão de regime carcerário ao réu condenado por crime hediondo ou assemelhado. Não ignoramos, naturalmente, a gravidade das condutas elencadas pela Lei n.º 8072/90. Tão menos, ignoramos os males que as mesmas causam à sociedade e à vida da vítima e de seus familiares. Aplaudimos a iniciativa do constituinte originário em desenvolver bases mínimas para a sistemática dos crimes hediondos, deixando ao legislador ordinário a prerrogativa de fundar verdadeiro sistema sobre os mesmos. Contudo, como jurista, não nos é permitido suportar flagrante desrespeito à Norma Constitucional pátria.
Originariamente, disposto foi, no art. 5.º XLIII, CF/88, base sistemática a ser adotada pela legislação infraconstitucional, incluindo o rol taxativo de crimes assemelhados aos hediondos, a necessidade de o legislador eleger quais os crimes deveriam ser taxados como hediondos e, finalmente, limitações constitucionalmente previstas àqueles que fossem condenados pela prática de tais crimes. De acordo com o referido dispositivo, a insuscetíbilidade de graça, anistia e inafiançáveis, são efeitos específicos aos crimes hediondos. Não indicara, contudo, o constituinte pátrio, limitação acerca da progressão de regime carcerário.
É de se compreender, portanto, que a escolha do constituinte originário estabelece numerus clausus, não devendo ser aumentada ou restringida pelo legislador ordinário, sob pena de ferir-se direitos e garantias fundamentais dos indivíduos. Inconstitucionais se revelarão, portanto, aumento ou redução do número constitucional de limitações aos direitos dos condenados por crimes hediondos ou assemelhados. A hipótese de cumprimento de pena no regime integralmente fechado não encontra lastro no Texto Constituinte originário, devendo-se, por conseguinte, afastar-se o legislador constituinte reformador e ordinário da sanha de inovar em detrimento dos direitos e garantias fundamentais do humano.
A inexistência de tal regra limitativa quando da publicação do Texto Constitucional impede que o legislador contemporâneo opere reforma com o fim de incluí-la no corpo do art. 5.º, XLIII, CF/88, tendo em vista os direitos e garantias individuais consistirem cláusula pétrea (art. 60, § 4.º, IV, CF/88). Do mesmo modo, a elaboração de norma infraconstitucional, no sentido de criar limite à progressão de regime prisional, instituindo, por exemplo, cumprimento de pena em regime integralmente fechado, estará infringindo diretamente o disposto no art. 5.º, XLIII, CF/88, além dos princípios da individualização da pena, isonomia, legalidade e humanidade da pena.
Questão interessante, pois, revelou-se pela inovação trazida no bojo da Lei n.º 9455/97. De acordo com seu art. 1.º, § 7.º, o condenado pelo crime de tortura deve iniciar o cumprimento de pena privativa de liberdade no regime fechado, podendo, não obstante, atingido os requisitos, progredir para regime mais brando. Quando da publicação de tal diploma, questionou-se acerca da revogação ou manutenção do disposto no art. 2.º, § 1.º, da Lei n.º 8072/90. Jurisprudência, contudo, firmou-se no sentido de que a Lei de Tortura é norma especial, não aplicando a inovação aos demais crimes assemelhados ou aos hediondos. Tanto assim foi que o Supremo Tribunal Federal editou a súmula n.º 698, acima transcrita. Era a posição, por exemplo, de Júlio Fabbrini Mirabete[1].
Hoje, contudo, em face da decisão incidenter tantum emitida pelo Pretório Excelso, é justo concluir que a súmula restará cancelada. Ao menos, no presente, sua aplicação é destituída de sentido.
Acerca, ainda, da Lei de Tortura, como nota histórica, Silva Franco posiciona-se favoravelmente à concessão de seu inovar para os demais crimes hediondos e assemelhados, não se falando na aplicação do princípio da especialidade. Colaciona, inclusive, interessante voto do Ministro Marco Aurélio, que se refere ao tema ao apontar que
...há de ter-se presente o que Tércio Sampaio Ferraz aponta como ‘princípio hermenêutico da unidade da Constituição’ no que direciona à lógica, ao afastamento de conclusões conducentes a verdadeiro paradoxo, e este é revelado com a óptica de encerrar a ordem jurídico-constitucional base para tratamento diferenciado de casos a envolver crimes que foram tidos como dotados de semelhante potencial agressivo e, o que é pior, albergando-se tratamento mais favorável, considerado o regime de cumprimento de pena, ao mais repugnante, ao mais ofensivo à dignidade do homem, à própria natureza, como é o de tortura. (...) Verifica-se, na espécie, derrogação tácita do art. 2.º da Lei n.º 8072/90. Em face da incompatibilidade decorrente de imposição constitucional de um sistema harmônico de disciplina penal – inc. XLIII do art. 5.º -, não mais subsiste, por opção político-legislativo-criminal revelada no art. 1.º, § 7.º, da Lei n.º 9.455/97, a regra, alias conflitante com o próprio princípio constitucional de individualização da pena – inc. XLVI do mesmo art. 5.º -, reveladora do esdrúxulo cumprimento de pena, na integralidade, em regime fechado. (FRANCO, Alberto Silva: Op. Cit. p. 184/185).
Não bastassem os argumentos acima declinados, o Pleno do STF, em reunião aos 16 de dezembro de 2009, editou a Súmula Vinculante n. 26, a qual afirma que
para efeito de progressão de regime no cumprimento de pena por crime hediondo, ou equiparado, o juízo da execução observará a inconstitucionalidade do artigo 2º da Lei 8.072/90 (...) sem prejuízo de avaliar se o condenado preenche, ou não, os requisitos objetivos e subjetivos do benefício, podendo determinar, para tal fim, de modo fundamentado, a realização de exame “criminológico”.
A incompatibilidade entre os direitos e garantias fundamentais do indivíduo sempre conflitaram com a imposição de cumprimento de pena integralmente fechado pelo réu condenado pela prática de crime hediondo ou assemelhado. Parcelas da doutrina e da jurisprudência sempre questionaram tal realidade, valendo-se, como lhes era possível, de postulados constitucionais e teses de direito positivo, à filosofia do Direito, em alguns pontos, mas o trabalho doutrinário bem sistematizado é verdadeiramente reconhecido pela decisão do Pretório Magno, que considera inconstitucional a impossibilidade de progressão de regime de cumprimento de pena nos casos acima indicados.
Assim sendo, não apenas a ausência do impedimento no bojo do art. 44, da Lei n. 11.343/06 (outrora o art. 44, do Projeto de Lei n.º 115), revela a possibilidade de adotar-se a progressão de regime nos casos de tráfico de drogas, como, principalmente, por toda a digressão legal e constitucional que acima foi ofertada.
Conclusões
1) A Constituição Federal, em seu artigo 5º, XLIII, inaugurou no Ordenamento Jurídico brasileiro a rotulação de determinados crimes como hediondos e, também, outros, os quais foram posteriormente enunciados como equiparados a hediondos, quais sejam a prática de tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e de drogas afins e o terrorismo;
2) Os últimos foram rotulados como equiparados a hediondos pela doutrina pátria, haja vista que nem a Constituição Federal, nem a Lei n. 8072/90, que dispôs sobre o artigo 5º, XLIII, do Texto Magno, referiram-se a tal expressão;
3) A Constituição Federal, em seu dispositivo acima referido, cometeu ao legislador ordinário o múnus de selecionar quais dentre os crimes previstos no Ordenamento Jurídico pátrio seriam rotulados como hediondos. Vale, nesse sentido, notar que a Constituição Federal não dedicou ao legislador infraconstitucional padrões mínimos para que tal seleção fosse realizada, vale dizer, não tolhendo essa seleção. Indiretamente, contudo, o Magno Texto imputou a três condutas, independentemente do lavoro do legislador infraconstitucional, os efeitos que então seriam suportados pelos crimes tipicamente hediondos. Dessa forma, vinculativamente, a execução das penas da prática de tortura, do tráfico ilícito de entorpecentes e de drogas afins e do terrorismo possuiriam efeitos comuns aos crimes hediondos que viriam a ser definidos a partir de 1990 pela legislação ordinária, quais seja, inafiançabilidade e a não suscetibilidade de graça ou anistia;
4) A seleção das condutas típicas se deu a partir da Lei n. 8072/90, que, além de eleger os comportamentos penalmente imputáveis como hediondos, determinou uma série de outras providências, dentre as quais o acréscimo de condutas típicas ao rol dos crimes do Código Penal pátrio e consequências penais e de execução penal;
5) Uma das consequências que envolveu a execução da pena dos crimes hediondos e equiparados inserta no referido regramento legal fora, exatamente, o cumprimento de pena em regime integralmente fechado e a impossibilidade de, diante de tal situação, progredir para regime menos severo;
6) Como observado na redação do artigo 5º, LXIII, o Texto Constitucional não determinou tais limitações aos direitos dos condenados sob nenhuma epígrafe, inclusive com relação àqueles cujas condutas se enquadram nos conceitos de hediondos ou equiparados;
7) A conclusão lógica, embora aduzida por parcela da doutrina minoritariamente, indicava que o legislador infraconstitucional extrapolara em sua função, pois excedera os casos típicos quando da inclusão dos efeitos possíveis (constitucionalmente prescritos) acerca da execução penal dos crimes hediondos e equiparados;
8) Doutrina e jurisprudência majoritárias dedicaram validade a tais restrições, as quais previstas pelo artigo 2º, da Lei n. 8072/90, afastando os relevantes e bem pautados argumentos contrários da doutrina então minoritária;
9) O panorama jurisprudencial e, por decorrência, doutrinário, conheceu de uma guinada em 23 de fevereiro de 2006, quando o Pleno do STF julgou a questão da inconstitucionalidade da vedação à progressão de regime, em sede de controle difuso de constitucionalidade, conforme se depreende da decisão em HC n.º 82.959/SP;
10) Posteriormente, a Lei n. 11.464/07 estabeleceu nova redação ao dispositivo legal em comento, para adaptar a lei à nova visão jurisprudencial e prever a possibilidade de progressão de regime de cumprimento de pena em favor dos condenados em crimes hediondos ou equiparados, embora de forma mais gravosa do que aqueles condenados por crimes que não se inserem nessas epígrafes (artigo 2º, § 2º, da Lei n. 8072/90);
11) Embora a referida norma tenha previsto a possibilidade de progressão de regime de cumprimento de pena, determinou que seu início se dará em regime inicialmente fechado, independentemente do quantum de pena aplicada no caso concreto (artigo 2º, § 1º, da Lei n. 8072/90);
12) O tema foi novamente objeto de análise pelo E. STF quando da edição da Súmula Vinculante n. 26, de 16 de dezembro de 2009, oportunidade em que se determinou à Magistratura nacional que "o juízo da execução observará a inconstitucionalidade do artigo 2º da Lei 8.072/90 (...) sem prejuízo de avaliar se o condenado preenche, ou não, os requisitos objetivos e subjetivos do benefício, podendo determinar, para tal fim, de modo fundamentado, a realização de exame “criminológico'", reconhecendo, portanto, indiretamente, que parcela do Poder Judiciário local não admitira a posição majoritária do Excelso Tribunal sobre a inconstitucionalidade do referido dispositivo legal. Diretamente, por outro lado, o Pretório reafirma seu posicionamento e o torna vinculante, com a finalidade de dedicar aos condenados em geral forma equânime de julgamento, lastreado, assim, na garantia da isonomia.
Bibliografia
FRANCO, Alberto Silva: Crimes Hediondos. 4.ed. São Paulo – RT – 2000;
MIRABETE, Júlio Fabbrini: Execução Penal: comentários à Lei n. 7210, de 11/7/1984. 8.ed. São Paulo. Atlas, 1997;
MORAES, Alexandre de, e SMANIO, Gianpaolo Poggio Smanio: Legislação Penal Especial. 7.ed. São Paulo – Atlas. 2004.
Nota
[1] MIRABETE, Júlio Fabbrini: Execução Penal: comentários à Lei n. 7210, de 11/7/1984. 8.ed. São Paulo. Atlas, 1997.