A Concessão de auxílio-acidente ao segurado especial: a reviravolta legislativa decorrente do advento da Lei 12.873/2013.
Luiz Rogério da Silva Damasceno*
Resumo: O presente artigo aborda a concessão do benefício previdenciário de auxílio-acidente ao segurado especial, abordando a mudança do disciplinamento do referido benefício após o advento da Lei 12.873/2013, avaliando os efeitos no tempo do referido diploma normativo.
Palavras Chaves: Benefício de auxílio-acidente. Segurado especial. Concessão. Lei 12.873/2013. Irretroatividade.
1. Introdução.
Entre as contingências sociais objetos da proteção previdenciária estão as incapacidades decorrentes de acidentes, sejam estes do trabalho ou de qualquer natureza.
Com efeito, o segurado do RGPS que padeça de incapacidade laboral decorrente de acidente de qualquer natureza faz jus, nos termos da legislação previdenciária, à proteção securitária pública, proteção esta que será definida a depender do grau da incapacidade.
Para a cobertura das incapacidades decorrentes de acidentes, a Lei 8.213/91 prevê basicamente três benefícios: aposentadoria por invalidez, auxílio-doença e auxílio-acidente.
Pretende-se neste artigo analisar o último dos mencionados benefícios, qual seja, o auxílio-acidente, mais precisamente em que situações e partir de quando o referido benefício passou a ser devido aos segurados especiais (trabalhador rural e pescador artesanal), analisando os efeitos decorrentes do advento da Lei 12.873/13 na sua concessão.
2. Auxílio-acidente: considerações acerca da sua hipótese de incidência.
O auxílio-acidente é um benefício previdenciário devido ao que segurado que, após a consolidação das lesões decorrentes de acidente de qualquer natureza, sofra, em razão das mesmas, redução de sua capacidade laboral.
A definição legal do benefício está prevista no art. 86, da Lei 8.213/91, in verbis:
Art. 86. O auxílio-acidente será concedido, como indenização, ao segurado quando, após consolidação das lesões decorrentes de acidente de qualquer natureza, resultarem sequelas que impliquem redução da capacidade para o trabalho que habitualmente exercia. (Redação dada pela Lei nº 9.528, de 1997)
A rigor, quando o segurado faz jus ao auxílio-acidente já não pode ser considerado incapaz, posto que o mesmo já se encontra apto a retornar ao desempenho de suas atividades laborativas habituais, ou para outra para a qual tenha sido reabilitado, contudo o mesmo não desempenhará seu trabalho com a mesma desenvoltura em razão das sequelas decorrentes do acidente sofrido.
Neste sentido, desde que do acidente sofrido resulte sequela definitiva, conforme as situações discriminadas no art. 104, caput, e no anexo III do Decreto 3.048/99, teremos as seguintes situações em que o auxílio-acidente será devido:
I – redução da capacidade para o trabalho que habitualmente exercia;
II – redução da capacidade para o trabalho que habitualmente exercia e exija maior esforço para o desempenho da mesma atividade que exercia à época do acidente; ou
III – impossibilidade de desempenho da atividade que exercia à época do acidente, porém permita o desempenho de outra, após processo de reabilitação profissional, nos casos indicados pela perícia médica do Instituto Nacional do Seguro Social.
Um exemplo esclarecerá melhor a hipótese de incidência do benefício em estudo.
Imaginemos a situação de um serralheiro que durante o desempenho de seu trabalho venha acidentalmente a decepar dois dedos da mão direita. Qual seria o benefício devido nessa situação? A resposta é: depende.
Nos primeiros dias ou até meses após o acidente, o autor vai estar totalmente impossibilitado de trabalhar seja em que ocupação for (não é possível trabalhar com a mão enfaixada e sentido dor!), desse modo fará jus auxílio-doença (incapacidade total e temporária).
Depois que o ferimento sarar, ou utilizando a linguagem do legislador, depois que as lesões se consolidarem, será necessário aferir se a lesão definitiva (amputação do dedo) impactará, ou não, na vida laboral do segurado. Só aqui a perícia médica do INSS vai aferir em que medida a sequela impactará na vida laboral do segurado.
No nosso exemplo hipotético, o cremos ser devido o auxílio-acidente (incapacidade parcial e permanente), uma vez que o desempenho da profissão de serralheiro depende essencialmente das mãos, de modo que haverá um aumento do grau de dificuldade ou de esforço para desempenhar o mesmo trabalho que o segurado exercia antes do acidente (item II supra).
Podemos, então, dizer que a incapacidade laboral que enseja a concessão do auxílio-acidente é a parcial e permanente para o trabalho. Assim, desde que o segurado, em razão de acidente de qualquer natureza, venha a sofrer uma redução definitiva da capacidade laboral, deve ser concedido o auxílio-acidente, como indenização, como uma forma de compensar ou reforçar os rendimentos obtidos com a capacidade laborativa remanescente.
Nos termos do art. 104, §4º, do Decreto 3.048/99, não dará ensejo ao benefício de auxílio-acidente o caso:
I – que apresente danos funcionais ou redução da capacidade funcional sem repercussão na capacidade laborativa; e
II – de mudança de função, mediante a readaptação profissional promovida pela empresa, como medida preventiva, em decorrência de inadequação do local de trabalho.
Por fim, calha frisar que a perda da audição, em qualquer grau, somente proporcionará a concessão do auxílio-acidente, quando, além do reconhecimento do nexo de causa entre o trabalho e o agravo, resultar, comprovadamente, na redução ou perda da capacidade para o trabalho que o segurado habitualmente exercia.
Feitas esta breve digressão acerca da hipótese de incidência do auxílio-acidente, passemos a analisar quais são os segurados que podem ser beneficiários, abordando mais especificamente a questão do segurado especial.
3. Beneficiários do auxílio-acidente antes do advento da Lei 12.873/13: o caso do segurado especial.
O benefício de auxílio-acidente não é devido a todo e qualquer segurado do RGPS. Por exemplo, o empregado doméstico, o contribuinte individual e o segurado facultativo não fazem jus ao benefício em questão.
Para se chegar a tal conclusão, não é preciso muito esforço de raciocínio, posto que, o art. 18, da Lei 8.213/91 estabeleceu expressamente quem teria direito à concessão do referido benefício, in verbis:
Art. 18. O Regime Geral de Previdência Social compreende as seguintes prestações, devidas inclusive em razão de eventos decorrentes de acidente do trabalho, expressas em benefícios e serviços:
I - quanto ao segurado:
a) aposentadoria por invalidez;
b) aposentadoria por idade;
c) aposentadoria por tempo de contribuição;
d) aposentadoria especial;
e) auxílio-doença;
f) salário-família;
g) salário-maternidade;
h) auxílio-acidente;
(...)
§ 1º Somente poderão beneficiar-se do auxílio-acidente os segurados incluídos nos incisos I, VI e VII do art. 11 desta Lei.
Pela literalidade do dispositivo acima transcrito, o intérprete apressado poderia chegar à conclusão que teriam direito ao auxílio-acidente, além do segurado empegado e do trabalhador avulso (incisos I e VI), o segurado especial (VII). Contudo, isso é apenas parcialmente verdade.
No caso específico do segurado especial, o intérprete precisa lançar mão do critério sistemático para chegar à conclusão correta acerca do direito ao benefício. É necessário fazer um cotejo legal com outros dispositivos da própria Lei 8.213/91 para saber em que condições o seguro especial faz jus ao auxílio-acidente.
Pois bem, analisando o rol de benefícios contido no inciso I, do art. 39, da Lei 8.21/91, que são aqueles cuja concessão para o segurado especial depende apenas da comprovação do exercício da atividade rural, percebe-se que, de fato, não há previsão do auxílio-acidente para o segurado especial, vejamos:
Art. 39. Para os segurados especiais, referidos no inciso VII do art. 11 desta Lei, fica garantida a concessão:
I - de aposentadoria por idade ou por invalidez, de auxílio-doença, de auxílio-reclusão ou de pensão, no valor de 1 (um) salário mínimo, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período, imediatamente anterior ao requerimento do benefício, igual ao número de meses correspondentes à carência do benefício requerido; ou
II - dos benefícios especificados nesta Lei, observados os critérios e a forma de cálculo estabelecidos, desde que contribuam facultativamente para a Previdência Social, na forma estipulada no Plano de Custeio da Seguridade Social.
Parágrafo único. Para a segurada especial fica garantida a concessão do salário-maternidade no valor de 1 (um) salário mínimo, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, nos 12 (doze) meses imediatamente anteriores ao do início do benefício. (Incluído pela Lei nº 8.861, de 1994)
Desse modo, a concessão do auxílio-acidente para o segurado especial, tal como a aposentadoria por tempo de contribuição, cairia na regra contida no dispositivo do inciso II, supra transcrito, ou seja, para fazer jus a percepção do referido benefício o segurado especial precisa estar contribuindo facultativamente.
É verdade que, na via administrativa, o INSS não vem condicionando a concessão do benefício ao recolhimento de contribuições facultativas, contudo, data máxima vênia, este não é o melhor entendimento, conforme a seguir passamos a expor.
No Brasil, a Previdência Social está organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, sendo conceituada como uma técnica de proteção social destinada a afastar necessidades sociais decorrentes de contingências que coloquem o segurado ou seus dependentes em estado de necessidade. Como os recursos são escassos e as necessidades são infinitas, a ideia é, portanto, cobrir apenas aquelas contingências que atinjam o status dignitatis do indivíduo (trabalhador/segurado).
Tanto isso é verdade que a própria Constituição Federal de 1988 cuidou de elencar as contingências sociais que ela considera como geradoras de um estado de necessidade digno de uma atenção mínima por parte da previdência social. Tais contingências encontram-se elencadas nos incisos do artigo 201, do Texto Magno, são elas:
I - cobertura dos eventos de doença, invalidez, morte e idade avançada;
II - proteção à maternidade, especialmente à gestante;
III - proteção ao trabalhador em situação de desemprego involuntário;
IV - salário-família e auxílio-reclusão para os dependentes dos segurados de baixa renda;
V - pensão por morte do segurado, homem ou mulher, ao cônjuge ou companheiro e dependentes, observado o disposto no § 2º.
De outro lado, é importante frisar, até para que não caia no esquecimento, que é da essência da previdência social a exigência de contribuição para o gozo cobertura oferecida pelos benefícios. O regime jurídico da previdência social, como um todo, parte da premissa da obrigação contributiva do segurado (Exs.: período de carência; cálculo do valor das prestações pecuniárias, etc). Assim, “O só estado de necessidade advindo de uma contingência social não dá direito à proteção previdenciária. Requer-se que a pessoa atingida pela contingência social tenha a qualidade, o “status” de contribuinte do sistema de previdência social”. (Eduardo Rocha Dias; José Leandro Monteiro de Macêdo, in Curso de Direito Previdenciário, Editora Método, 2008, p. 32).
Pois bem, partindo-se das premissas acima levantadas, é exatamente por esse motivo que entendemos que o segurado especial só faz jus ao benefício de auxílio-acidente se recolher contribuições como facultativo, não se aplicando para esse benefício a regra contida no inciso I, do art. 39, da Lei nº 8.213/91, que substitui a necessidade de contribuição por tempo de efetivo exercício de labor agrícola.
O rol de benefícios contidos no inciso I, do art. 39, da Lei 8.213/91 dispensa a contribuição do segurado especial em razão das já conhecidas peculiaridades de seu trabalho rural, eminentemente dependente das condições climáticas e voltado essencialmente para sua subsistência, prevendo justamente a cobertura mínima exigida pelo art. 201, da CF/88, razão pela qual deve ser interpretado de forma restrita.
Desse modo, como o auxílio-acidente não está elencado no inciso I, do art. 39, da Lei 8.213/91, nem o evento/contingência para a qual sua cobertura se destina, qual seja, indenizar o segurado em razão da redução de sua capacidade laboral em razão de acidente do trabalho, tem previsão na Constituição de 1988 (art. 201), logo, não há dúvida de que sua concessão deve seguir os ditames estabelecidos na legislação ordinária, in casu o inciso II, do art. 39, da Lei 8.213/91. Este mesmo raciocínio é aplicado à aposentadoria por tempo de contribuição para cuja concessão não há qualquer controvérsia quanto a exigência de contribuição como segurado facultativo.
É preciso dizer também que não há qualquer antinomia entre o art. 18, §1º e o art. 39, II, ambos da Lei n.º 8.213/91. Um não exclui o outro, uma vez que o segundo dispositivo é norma especial em relação ao primeiro, de modo que a previsão abstrata de direito ao recebimento de auxílio-acidente pelo segurado especial (art. 18, §1º) não implica necessariamente na ideia de que ele está dispensado da contribuição ou que bastaria comprovar o tempo de labor rural para fazer jus ao benefício. Absolutamente. As concessões de cada espécie de benefício previdenciário têm suas disposições específicas que, a despeito da regra geral contida no art. 18, devem ser seguidas como condição sine qua nom para o deferimento da proteção previdenciária.
Também não se sustenta a tese segundo a qual a necessidade de contribuições diretas do segurado especial estaria suprida pela contribuição incidente sobre a comercialização da produção, tal como previsto no inciso II, do art. 25, da Lei n.º 8.212/91, a qual dispõe acerca do custeio para fins de financiamento das prestações de trabalho, pois se assim fosse, teríamos que aplicar idêntico raciocínio para a aposentadoria por tempo de contribuição, para cujo gozo não há dúvida quanto a necessidade de contribuição facultativa pelo segurado especial, inclusive com base em jurisprudência sumulada do Egrégio Superior Tribunal de Justiça, vejamos:
Súmula 272, STJ: O trabalhador rural, na condição de segurado especial, sujeito à contribuição obrigatória sobre a produção rural comercializada, somente faz jus à aposentadoria por tempo de serviço, se recolher contribuições facultativas.
Reza o brocardo jurídico: “ubi eadem ratio, ibi idem ius statuendum” (onde há a mesma razão, deve-se empregar o mesmo direito). Desse modo, se a contribuição sobre a comercialização da produção não serve para a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição, também não servirá para a concessão de auxílio-acidente.
Nesse sentido, colacionamos alguns dos precedentes originários que serviram de base para adoção pelo STJ do enunciado da Súmula 272:
"A contribuição sobre percentual retirado da receita bruta da comercialização da produção rural, considerada como obrigatória, não garante ao segurado especial a aposentadoria por tempo de serviço. Tal benefício, conforme se depreende do exame dos arts. 11, inciso VII, e 39, I e II, da Lei nº 8.213/91, tem sua concessão condicionada ao recolhimento facultativo de contribuições, estas disciplinadas no art. 23 do Dec. 2.173/97, e substancialmente diversas daquelas efetuadas sobre a produção rural - art. 24 do mesmo decreto.[...] considerada esta como obrigatória e que garante ao segurado, tão somente, a percepção de aposentadoria por idade ou por invalidez, de auxílio-doença, de auxílio-reclusão ou de pensão. Cumpre esclarecer, ainda, que a contribuição facultativa é calculada sobre o salário-base do segurado especial, nos termos dos arts. 23, 37, III, e 38 do referido decreto. Não há qualquer similitude entre as duas formas de contribuições, que portanto, garantem a percepção, também, de benefícios diversos." (REsp 207434 RS, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 20/05/1999, DJ 01/07/1999).”
"Para a concessão de aposentadoria por tempo de serviço a rurícola qualificado como segurado especial, não basta a comprovação das contribuições incidentes sobre produtos industrializados (artigo 195, parágrafo 8º, da Constituição Federal); é imprescindível a comprovação da complementação da idade mínima, 60 anos para o homem e 55 para a mulher (artigo 48, parágrafo 1º, da Lei 8.213/91), além do recolhimento das contribuições à Previdência Social, vale dizer, da carência." (REsp 217826 RS, Rel. Ministro HAMILTON CARVALHIDO, SEXTA TURMA, julgado em 24/08/1999, DJ 22/11/1999, p. 209, REPDJ 29/11/1999).”
"O trabalhador rural enquadrado como segurado especial (produtor, parceiro, meeiro e arrendatário rural exercentes de suas atividades individualmente ou em regime de economia familiar - CF, art. 195, § 8º) para fins de aposentadoria por tempo de serviço deve comprovar um número mínimo de contribuições mensais facultativas (período de carência), uma vez que a contribuição obrigatória, incidente sobre a receita bruta da comercialização de sua produção (2,5%), apenas assegura a aposentadoria por idade ou por invalidez, auxílio-doença, auxílio-reclusão e pensão. Lei nº 8.213, de 1991 - arts. 11, VII, 24, 25, 26, III e 39, I e II." (REsp 233538 RS, Rel. Ministro FERNANDO GONÇALVES, SEXTA TURMA, julgado em 23/11/1999, DJ 17/12/1999).
Como se não bastasse isso, a jurisprudência recente do STJ vem se posicionamento justamente no mesmo sentido do sustentado nesta manifestação:
PREVIDENCIÁRIO. SEGURADO ESPECIAL. AUXÍLIO-ACIDENTE. CONTRIBUIÇÃO FACULTATIVA PARA A PREVIDÊNCIA SOCIAL.
1. Ao segurado especial - art. 11, VII, da Lei 8.213/91 - são garantidos os benefícios previstos na referida norma, desde que contribuam facultativamente para a Previdência Social (art. 39, II, da Lei 8.213/91).
2. Agravo Regimental não provido. (AgRg no AREsp 149912/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 22/05/2012, DJe 15/06/2012)
Em suma, sob a égide da legislação vigente à época do acidente, para fins de concessão do auxílio-acidente, deveria o segurado especial comprovar o recolhimento das contribuições previdenciárias nos termos do art. 39, II, da Lei nº 8.213/91, que garante aos segurados especiais a concessão “dos benefícios especificados nesta Lei, observados os critérios e a forma de cálculo estabelecidos, desde que contribuam facultativamente para a Previdência Social, na forma estipulada no Plano de Custeio da Seguridade Social”.
4. Advento da Lei 12.873/13 e o direito do segurado especial ao auxílio-acidente: impossibilidade de sua aplicação retroativa.
A concessão do auxílio-acidente ao segurado especial passou por substancial modificação após o advento da Lei 12.873/13. Com efeito, tal benefício passou a contar de forma expressa no rol dos benefícios devidos ao segurado especial, modificando a redação do inciso I, do art. 39, da Lei 8.213/91, in verbis:
Art. 39. Para os segurados especiais, referidos no inciso VII do art. 11 desta Lei, fica garantida a concessão:
I - de aposentadoria por idade ou por invalidez, de auxílio-doença, de auxílio-reclusão ou de pensão, no valor de 1 (um) salário mínimo, e de auxílio-acidente, conforme disposto no art. 86, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período, imediatamente anterior ao requerimento do benefício, igual ao número de meses correspondentes à carência do benefício requerido; ou (Redação dada pela Lei nº 12.873, de 2013)
Agora, tal como os demais benefícios do rol legislativo, basta a comprovação do exercício da atividade rural ou da pesca artesanal em regime de economia familiar para fazer jus ao benefício em questão.
Desse modo, não há mais dúvida acerca do direito do segurado especial ao benefício de auxílio-acidente independentemente de contribuições. Contudo, faz-se necessário fazer algumas ponderações.
Ao contrário do que se poderia pensar num primeiro momento, a nova previsão legislativa não vem a infirmar toda a tese sustentada acima acerca da necessidade de contribuições para que o segurado especial fizesse jus ao auxílio-acidente. Muito pelo contrário, ela a confirma.
Isso porque, pensar de modo diverso, tornaria o novel dispositivo simplesmente inócuo. Afinal de contas, para quê a inclusão do auxílio-acidente no rol do art. 39, I, se o segurado já fazia jus ao referido benefício? Assim, como não existem palavras inúteis na lei, é fácil chegar à conclusão de que o direito ao benefício somente surgiu após sua previsão legislativa.
E mais. A Lei 12.873/13 não pode ser aplicada retroativamente para acidentes ocorridos em períodos anteriores a sua vigência em atenção aos princípios da segurança jurídica, da irretroatividade da Lei e do tempus regit actum.
No disciplinamento das relações previdenciárias, é pacífico, na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, a impossibilidade de aplicação retroativa da lei. Inclusive, o próprio STF, no julgamento do RE 416.827-8/SC e do RE 415.454-4/SC, para fixar a irretroatividade da Lei nº 9.032/95 para fins de majoração da renda mensal dos benefícios de pensão por morte quando a concessão inicial foi embasada em Lei anterior, quanto no julgamento do RE 613.033/SP para determinar a impossibilidade da aplicação retroativa da referida Lei nº 9.032/95 para fins de majoração dos benefícios de auxílio-acidente concedidos em data anterior à vigência daquele diploma legal.
Em suma, a Lei 12.873/2013 garantiu ao segurado especial o direito ao recebimento do auxílio-acidente apenas com a comprovação da atividade rural em regime de economia familiar (ou pesca artesanal), contudo não pode retroagir de modo a ser aplicada a acidentes ocorridos anteriormente a sua vigência.
5. Conclusão.
O benefício de auxílio-acidente é devido quando o segurado, empregado ou trabalhador avulso, depois da consolidação de lesões decorrentes de acidente qualquer natureza, tem sua capacidade laboral reduzida.
O segurado também faz jus ao referido benefício, contudo há que se verificar a data da ocorrência do acidente para saber quando e que condições se dará a concessão.
Se a data do acidente for anterior ao advento da Lei 12.873/2013, o segurado especial precisa demonstrar que, além de exercer atividade rural em regime de economia familiar (ou pesca artesanal), que realizou contribuições para a Previdência Social na condição de facultativo.
Por outro lado, se o acidente ocorreu já na vigência da Lei 12.873/2013, o benefício é devido independentemente de contribuições, bastando para tanto a comprovação do exercício da atividade rural ou da pesca artesanal. E assim tem que ser em razão da observância do princípio da estabilidade das relações jurídicas, também conhecido pela expressão latina tempus regit actum.
REFERÊNCIAS
DIAS, Eduardo Rocha; MACÊDO, José Leandro Monteiro de. Curso de Direito Previdenciário, 3. ed. Editora Método, São Paulo, 2012.
AMADO, Frederico. Direito e Processo Previdenciário, 3.ed. Editora Jus Podivum, 2013.
IBRAHIM, Fábio Zambite. Curso de Direito Previdenciário. 14.ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2009.
KERTZMAN, Ivan. Cuso Prático de Direito Previdenciário, 7. Ed. Juspodivm, Salvador.