O Sistema Único de Saúde e as demandas judiciais

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A saúde, direito de todos e dever do Estado, nem sempre se cumpre como rege a Constituição Federativa do Brasil, de 1988. Frente à postura omissa do Estado no cumprimento de seus deveres e, do cidadão na busca de seus direitos, surge a demanda judicial.

              RESUMO

A saúde, direito de todos e dever do Estado, nem sempre se cumpre como rege a Constituição Federativa do Brasil, de 1988. Frente à postura do Estado no cumprimento de seus deveres e, do cidadão na busca de seus direitos, surge a demanda judicial. A Demanda Judicial é caminho que todo cidadão busca o direito de acesso a serviços de saúde pública. Neste contexto, o Direito Sanitário se faz presente como uma vitória democrática que assegura aos cidadãos o cumprimento do direito. O presente este estudo tem como objetivo tratar este tema das demandas judiciais, no que diz respeito ao direito à saúde àquelas pessoas às quais é negada a assistência às suas necessidades de saúde. Trata-se de um estudo bibliográfico, onde o referencial foi selecionado de formas a considerar aquelas fontes bibliográficas que apresentaram relevância no assunto. Foi observado que as demandas aumentam a cada ano. Os motivos mais comuns se situam na fragilidade do Estado frente ao cumprimento de seu dever constitucional. O gestor público situa-se cúmplice e co-responsável da má condução do ente público. Também foi observada a falta de critérios técnicos na eleição de prioridades e morosidade nas ações que necessitam celeridade. Recomenda-se priorizar ações com critérios técnicos e políticos que considerem o cidadão e as necessidades epidemiológicas da população, bem como, elevar o debate público a respeito da legislação em saúde, de maneira especial, naquilo que diz respeito às responsabilidades constitucionais do Estado através de gestores e profissionais da saúde.


PALAVRAS-CHAVE: Necessidades e Demandas de Serviços de Saúde; Direito à Saúde; Sistema Único de Saúde; Saúde Pública; Poder Judiciário.

O direito caracteriza-se em transcender a história e não ficar na história, para fundar os direitos do homem (BOBBIO, 1992). O autor demonstra que devido à necessidade da existência do direito, os homens começaram a converter em Leis as necessidades sociais. Demonstra também que os direitos dos homens, por mais fundamentais que sejam, são direitos históricos, nascidos conforme as circunstâncias históricas em lutas por novas liberdades contra velhos poderes, nascidos de forma gradual. Cita ainda, que os Direitos do homem, a paz e a democracia são momentos necessários do movimento histórico. Sem direitos do homem reconhecidos e protegidos, não há democracia, e sem democracia não existem condições pacíficas para solucionar os conflitos. A democracia é a sociedade dos cidadãos, não de referido estado, mas para o cidadão do mundo.

Estudos salientam a importância do conhecimento da Legislação da saúde pelo usuário com a finalidade de exercer seus direitos de cidadão: “Considerações sobre a Judicialização do Acesso a Saúde”, de Francisco Viegas Neves da Silva; “Direito Fundamental a Saúde”, de Mariana Filchtinert Figueiredo; “Direito à Saúde”, de Julio Cesar Ballerini Silva; “Direitos Fundamentais: orçamento e reserva do possível”, Ingo Wolfgang Sarlet (organizador); “Direito à Vida e à Saúde: impactos orçamentários e judicial”, diversos autores; “Gestão Pública: melhores práticas”, diversos autores; “Reserva do Possível: a efetividade dos direitos sociais no direito brasileiro”, de Fabiana Okchstein Kelbert.

Ressaltando de forma clara que a proteção à vida, garantida pela Magna Carta, é dever sagrado do Estado e um desafio para a nossa era diante da famigerada teoria reserva do possível, representando um dos assuntos mais atuais nos espaços de debates do Direito Sanitário. Porém, não devemos esquecer que a teoria Reserva do Possível, surgiu na Alemanha em 1960, quando a Suprema Corte daquele país analisou uma demanda judicial propostas por estudantes que não haviam sido admitidos em escolas de medicina de Hamburgo e Monique em face da política de limitação do numero de vagas. A pretensão foi fundamentada no artigo 12 da Lei Fundamental daquele Estado, segundo o qual “todos os alemães tem direito a escolher livremente sua profissão, local de trabalho e seu centro de formação”. Um fenômeno totalmente desconhecido no passado, mas que atualmente surge diante das omissões do Estado na luta por um bem maior.

Na atualidade é um dos principais argumentos usados pelo Estado/gestor, para eximir-se de suas responsabilidades e das demandas judiciais, porém não podemos esquecer que aqui tratamos do bem maior do cidadão a vida, e não vagas em universidades. Acredito que o poder judicante usando de seu poder constitucional deve dar um basta à famigerada teoria, a luz da Magna Carta e o princípio da dignidade humana.

Ademais, os cidadãos ainda encontram muitas resistências ao acesso à saúde, cobranças ilegais, negações descaradas e impunes, omissão dos gestores, agravadas ainda pelo desconhecimento das normas do Sistema Único de Saúde (SUS) pelo próprio usuário. As normas do SUS são de ordem pública e interesse social. Então é questão de Direitos Humanos o respeito aos direitos dos cidadãos usuários do SUS, por quem quer que seja, pois, se inserem com forma de valorizar a qualidade de vida da pessoa humana e erigi-lo como sujeito de direito em sociedade.

Diante da conjuntura de relações mundiais, as pessoas, de modo geral, estão cada vez mais conscientes no que tange os direitos do homem, frente aos novos paradigmas que surgem. Eis que o não exercício de direitos caracteriza uma crescente contradição à cidadania. Outro aspecto a destacar é o atendimento ao usuário quando na condição em que a prática do preconceito é evidente, não apenas em sua relação de assistência, mas também em relação à procura, como situações de vagas em filas de espera.

Hoje não se concebe uma democracia moderna sem o respeito às desigualdades, inclusive, no do sistema de saúde, perpassando pela inclusão de todos os setores discriminados no domínio dos bens de serviço. A desigualdade não é apenas econômica, mas bem mais complexa e assim deve ser tratada, utilizando-se de todas as ferramentas possíveis. O Direito à Saúde, buscado através do Judiciário, também tem sua grande parcela de contribuição. Este setor, como instância decisória, também precisa aperfeiçoar a lógica da igualdade e o desenvolvimento do cidadão como ser humano. Bem como, fazer o que é de sua natureza, ou seja, fazer com que se cumpra o direito assegurado em lei, fazer com que se cumpra o direito a ter direito. O presente artigo, de natureza bibliográfica, tem como objetivo estudar o Direito à Saúde, buscado através do Judiciário.


                                              DEMANDAS JUDICIAIS NA EFETIVAÇÃO DO DIREITO À SAÚDE

O SUS muito já avançou nestes 20 anos, seja na implantação da atenção primária, da cobertura vacinal, das consultas especializadas, dos diagnósticos por imagem, dos medicamentos, dos transplantes, do tratamento aos portadores DST/AIDS, Programa Saúde da Família (PSF), Programa uma Infância Melhor (PIM), dentre outros. Muito embora seja um processo em constante evolução, a cada dia novas dificuldades surgem e se verifica que o Estado falha e se omite na prestação de serviços do SUS, sejam nas consultas especializadas, exames de média e alta complexidade, cirurgias eletivas, no fornecimento de medicamentos que, lamentavelmente, chegam há levar meses para análise administrativa de fármacos excepcionais.

O cidadão luta pela sua dignidade, mas, cansado acaba buscando-a no poder judicante, que tem de exercer um serviço social diante da inércia estatal. Este caminho passa a ser visto aos olhos dos cidadãos como o poder da cidadania. Já o Estado utiliza da teoria Reserva do Possível, como argumento impeditivo da intervenção judicial e desculpa genérica para justificar a sua omissão. Pois o paciente e o judiciário são vítimas da situação omissa do Estado quando da gestão dos escassos recursos públicos. Assim, o judiciário se vê incumbido de administrar, mesmo sabido que esta não é a sua função.

O tema Demandas Judiciais, em especial o Direito à Saúde, assunto instigador de doutrinadores e operadores do direito, tende a abarcar e discutir a enorme vinculação existente em proteger o bem maior que se possui – a vida - conexo ao princípio constitucional da dignidade da pessoa humana.

Muito embora as ações judiciais tenham induzido os gestores a criarem mecanismos para incorporar os tratamentos mais eficazes com base em evidências científicas, para os gestores o argumento é de que a obtenção de medicamentos por meio da Defensoria Pública, Ministério Público e do Judiciário, prestigia interesses individuais e das Indústrias farmacêutica, em detrimento dos direitos coletivos (SANTOS, 2010). Tais decisões garantem o fornecimento de medicamentos essenciais devido ao descumprimento por parte do Estado/Gestor de programas de assistência farmacêutica, mais atualizados, modernos e mais confortáveis ao paciente. Ou então, de que adiantaria tanto se falar na humanização do SUS, se a realidade é cruel?

Considerando tal vinculação que lhe é conferida equiparação a cláusula pétrea, ou seja, cláusula proibitiva de retrocesso social. O Direito Sanitário é uma disciplina que estuda o Direito a Saúde, e que vem a satisfazer as pretensões dos indivíduos na sociedade, garantindo seus direitos e demonstrando seus deveres. Descendo do plano ideal ao plano real, uma coisa é falar dos direitos do homem, dos novos direitos cada vez mais extensos, e justificá-los com argumentos mais convincentes. Outra coisa é garantir-lhe uma proteção mais efetiva por parte do Estado. Sobre isso, é oportuno destacar que a consideração de Bobbio (1992), que refere a satisfação das pretensões vai se tronando mais difícil, tanto quanto mais as mesmas aumentam, e, por conseguinte, a qualidade acaba por ficar aquém do esperado.

No atual contexto sócio-econômico e político, é possível afirmar que o SUS avançou muito nestes 20 anos, mas também não se pode esquecer que é um processo em constantes mutações. Também é verificado que na medida em que a população cresce, mais o Estado corta verbas da saúde, sem critérios ou ainda usando como critérios a politicagem na saúde e não políticas de saúde. Acaba por fazer com isso, que a população se socorra do Poder Judiciário para a efetivação de seu direito constitucional, à saúde.

Salientando ainda que, a não concretização de muitos direitos e garantias do usuário do SUS caracterizam uma crescente contradição à cidadania. Pois, há um grande contingente da população que não efetiva o direito a saúde por desconhecê-los. É, pois, apropriado aprofundar o tema, debatendo e discutindo com os Conselhos Municipais de Saúde, formas de uma efetivação mais célere dos serviços prestados aos usuários do SUS. A falta de conhecimento do Direito Sanitário, em nada contribui na construção de uma cidadania participativa, na qual o usuário do SUS age ativamente buscando exteriorizar uma contradição latente enquanto membro desta coletividade.

O reconhecimento de um direito, como vem sendo adotado pela maioria da jurisprudência, acarreta uma maior ampliação dos deveres estatais e dispêndio de verbas para arcar com as suas responsabilidades. Assim, não pode o poder Estatal se amparar em Portarias de sua criação para frear a efetivação destes direitos dos cidadãos, quando de forma hedionda passa a numerar parâmetros para consultas médicas e exames, como se vírus e bactérias que assolam nossas populações soubessem cumprir determinações administrativas.

Importante trazer a lume o outro lado da moeda, o conhecido acordo do Aspecto de Direito de Propriedade Intelectual Relacionados ao Comércio (TRIPS). Neste sentido, percebemos o interesse e alegria da indústria farmacêutica, no direito a saúde dos brasileiros, pois, se trata do acréscimo no custo dos tratamentos médicos em relação à concessão estatal de medicamentos excepcionais.

O referido acréscimo ocorre em razão da existência de dois fatores preponderantes, onde o primeiro consiste na instituição do SUS com o advento da Constituição Federativa do Brasil de 1988, em que houve a universalização do acesso a saúde garantido pelo Estado, quer de forma espontânea ou judicial. O segundo aspecto acontece em vista da adesão do Brasil ao acordo TRIPS, em 1994, no qual houve comprometimento do país que deveria respeitar o direito das empresas privadas de obter lucros com as suas patentes.

Para o gestor, ainda há o argumento da Reserva do Possível, que tem a sua origem no Direito Alemão, só que quando lá surgiu se discutiam as vagas em Universidades Públicas. Mas aqui no Brasil se discute o princípio constitucional da dignidade humana, ou seja, se discute o direito à saúde e à vida, o que nos demonstra uma realidade bem antagônica daquela do Direito Alemão.

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Importante destacar a lição do Professor e Desembargador Ingo Wolfgang Sarlet:

A Reserva do Possível constitui, em verdade (considerada toda a sua complexidade), espécie de limite jurídico e fático dos direitos fundamentais, mas também poderá atuar, em determinadas circunstâncias, como garantia de direitos fundamentais, por exemplo, na hipótese de conflito de direitos, quando se cuidar da invocação – observados sempre os critérios da proporcionalidade e da garantia do mínimo existencial em relação a todos os direitos – da indisponibilidade de recursos com o intuito de salvaguardar o núcleo de outro direito fundamental (SARLET apud KELBERT, 2011, p. 71-72).

Existem ainda as reclamações dos  gestores  sobre a interferência do Poder Judiciário a respeito das finanças do Poder Executivo. Alguns gestores alegam inclusive que o Judiciário estaria Legislando de forma positiva ao interferir nas políticas publicas do Executivo, ferindo o poder da discricionariedade. Neste estudo não cabe analisar tal questão no mérito da suposta Legislação positiva. O que ocorre do Poder Judiciário é estar então praticando uma legislação social e exercendo uma função social, que não é exercida pelo Poder Executivo. Por sinal muito salutar ao Estado Democrático de Direito e também aos cidadãos que dele se socorrem. Até poucos anos atrás os cidadãos eram taxados pela CPMF para a Saúde, por imposição do Poder Executivo, mas de lá pra cá, não houve melhorias na saúde com a referida taxação, muito pelo contrário, surgiram escândalos financeiros que levaram a crer que tal verba foi usada para outros fins que não o da saúde.

Destarte, é de bom alvitre citar ainda que esta interferência do Judiciário é salutar a Democracia na garantia dos direitos do cidadãos consagrados na Magna Carta. O que leva a crer que a saúde necessita urgente rever alguns protocolos, trâmites burocráticos e manter-se devidamente atualizada, aberta aos novos recursos em saúde e sem ter em primeiro lugar preço. A vida do cidadão não tem preço, não é substituível.

Somente o estudo abstrato da norma legal não permite um aprofundamento mais substancial no que se refere a uma concreta melhora de qualidade de vida das pessoas que buscam os serviços do SUS. Para tal, é necessário o gestor avançar bem mais nesse sentido, de forma arrojada para que se possa realizar uma boa socialização dos direitos fundamentais, e a prática de políticas de saúde que realmente venham a atender as demandas da população.

O discurso da cidadania se materializa, pois, democraticamente quando enunciado pelos sujeitos sociais e políticos, visando erigi-los em espaço político reivindicatório de direitos, seja, de velhos direitos estratificadamente reconhecidos ou, de novos direitos, bem como em espaço de exercícios de direitos estatais e para-estatais. Significa que o sentido democrático da cidadania é um discurso postular da possibilidade permanente do dissenso (conflito), ao defender a existência da pluralidade discursiva e do direito aos direitos, indefinidos não congelados (CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR, 2011).

E, segundo Figueiredo (2009, p. 81-82):

[...] o direito a saúde é bastante complexo e a diversidade de ações e prestações compõe o conteúdo deste direito fundamental, pois ligado a ausência de enfermidades e propugna o aspecto positivo da obtenção do estado de completo bem estar físico, mental e social, uma saúde palpável e não mais tão somente preventiva.

                                                     MAIORES DEMANDAS JUDICIAIS EM SAÚDE

O contexto de maiores necessidades geradoras das demandas judiciais pode ser observado, por exemplo, em dados fornecidos pela Procuradoria Geral do Estado do RS (RIO GRANDE DO SUL, 2011). Estes dados dizem a respeito de Demandas Judiciais no âmbito da 5ª Coordenadoria Regional de Saúde de Caxias do Sul.

QUADRO 1. Demandas judiciais nos serviços do Sistema Único de Saúde, no âmbito da 5ª Coordenadoria Regional de Saúde, Caxias do Sul. Rio Grande do Sul, Brasil, 2011.

Demandas Judiciais     2006       2007      2008      2009      2010       2011*       Total demanda

Cirurgia                                 05            10             03             03            05             01                     27

Exame                                  03             01            02             00             01             01                    08

Internação                            01             04            01             05             02              01                   14

Medicamentos             235         404        182         200          178          25              1.224

Prótese                          03           03           01          01            00          00                 08

Tratamento                   18            16           04          05             21         25                 89

Outros                           08            33         403        576           984        255             2.259

Total ano                     273           471        596        790         1.191       308            3.629


             Fonte: Procuradoria Geral do Estado do Estado do RS.
             * Dados até o mês de maio/2011.
 

Observa-se que nos últimos cinco anos as demandas judiciais em relação ao SUS têm crescido. São demandas requerendo medicamentos, consultas especializadas, cirurgias eletivas, próteses e tantas outras carências que faltam aos usuários quando busca uma prestação de serviço mais efetiva e competente por parte do Estado. A natureza de maior demanda está concentrada nos medicamentos, apresentando uma prevalência de 32,81% no item.

Desta forma, com a consolidação do binômio, necessidade e possibilidade o mercado brasileiro tem proporcionado os maiores faturamentos das gigantes empresas da industria farmacêutica. Exemplo disso é que o medicamento Interferon Peguilado utilizado no tratamento de Hepatite C, custa nos Estados Unidos R$ 481,00. Enquanto que no Brasil, mesmo isento de impostos federais sai por R$ 785,00 até R$ 1.185,00, dependendo do poder de barganha de cada Estado. Esta situação, dos elevados gastos despendidos pelo Estado brasileiro é demonstrada de forma cabal que a grama do referido medicamento equivale em pecúnia a cem kilos de ouro.

Mas, não podemos inocentar o Estado brasileiro, porque o mesmo mantém-se inerte no momento de fiscalizar uma nova patente, porque em sua maioria são drogas já conhecidas que sofrem mínimas alterações, de eficácia duvidosa e já recebem nova patente, novos custos e novos adeptos. É uma verdadeira capitalização de patentes, que oneram o erário público, mas para os medicamentos de ultima geração no mercado e importante na sobre vida do usuário, já não existe celeridade e sim uma grande morosidade e falta de vontade.

Da mesma forma, a lista de medicamentos disponibilizada aos cidadãos, é antiquada e até ultrapassada em alguns casos, devido aos grandes avanços dos estudos genéticos nos últimos 10 anos. Uma das vedetes da nova safra de medicamentos disponibilizadas no mercado é o Avastin, aprovado nos Estados Unidos e na Europa para o tratamento do câncer colorretal quando a doença já produziu metástases.

Sem previsão de lançamento no Brasil, tem apresentado bons resultados no combate a outros tipos de câncer. É a primeira droga a utilizar à tática da anti angiogênese, a idéia de impedir a criação de novos vasos sanguíneos que alimentam o tumor e, com isso, matá-lo de fome. O remédio reduz em 34% o risco de óbito em pacientes que utilizam a droga associada com a quimioterapia. Nos Estados Unidos, o custo do tratamento é de US$ 4.400 por mês. E ai vem o Erbitux, o Iressa e outros similares. Tratamento estes que seriam importantes se estivesse a disposição pelo SUS a todos os cidadãos.

Estas drogas não aprovadas no Brasil devido a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) condicionar à aprovação do medicamento a adoção do menor preço praticado no mundo. E até acabar os direitos de patente do Laboratório, vai longe, e quando recebe a autorização de comercialização no mercado interno, já está ultrapassado. E os laboratórios fabricantes alegam que o custo de desenvolvimento de uma droga de ultima geração é de US$ 850 milhões e precisam recuperar o investimento.

Desta forma, enquanto a indústria não baixa os preços e o Estado e os planos de saúde não oferecem os remédios, sobra para os médicos a difícil decisão de indicar o tratamento possível em vez do mais adequado.

Na tentativa de limitar custos, o SUS adota protocolos de tratamento. Assim, para cada tipo de câncer há um elenco de drogas e esquemas terapêuticos pré- estabelecidos e por vezes já ultrapassados. Se um hospital quiser oferecer o que há de mais promissor a um paciente, ele pode. Porém, o reembolso realizado pelo SUS é baseado no valor do tratamento padrão, ficando a instituição no prejuízo. De bom alvitre citar aqui que os protocolos do SUS não são atualizados há quase 10 anos. Alguns outros, mais raramente, sofreram alguma modificação na conduta médica quanto a finalidade original, como é o caso do Viagra. Este passou a ser usado como bronco dilatador para pessoas com sérios problemas respiratórios, já com seus efeitos colaterais não existe registros de como os pacientes estão reagindo aos seus efeitos colaterais.

A carência não se limita aos recursos mais modernos. Pelas regras do SUS, os médicos não podem indicar quimioterapia após a cirurgia de câncer de pulmão. Mas tal procedimento reduz em 15% risco de morte por recidiva da doença. O Ministério da Saúde alega que não é possível alterar protocolos a cada droga que chega no mercado. A mudança depende de análises das vantagens e por isso leva tempo. Mas afinal, vantagem pra quem?

Da mesma forma, o Taxotere, uma das principais ferramentas no tratamento de tumores de mama e próstata. Foi liberado no Brasil em 1995, mas até hoje não é oferecido pelo SUS. Nos planos de Saúde privados, pior ainda, não vão além do que o estabelecido pela rede pública. Também o Hercepin que aumenta a sobrevida das mulheres com câncer de mama, liberado há mais de 06 anos, também não consta no sistema da rede pública.

Não poderíamos deixar de fora os cardiopatas, pois, estes são os mais negligenciados pela saúde pública brasileira. Vejamos a contradição, enquanto o SUS atende 80% dos pacientes de AIDS, fornece tratamento com medicamentos modernos, aprovados em Lei, 32% da população cardiopata, morre de doenças cardiovasculares devido a escolhas chamadas prioridades pelo Estado, mas que por vezes não passam de manobras politiqueiras.

As estatinas entraram na lista dos medicamentos excepcionais do Ministério da Saúde, garantido o fornecimento de cinco tipos desses remédios, porém, a conseqüência é velha conhecida. Falta de medicamentos nas unidades de dispensação e o drama e angustia do paciente se renova a cada nova receita.

Pesadelo maior é o acesso aos stents, dispositivos metálicos implantados nas artérias durante a angioplastia para mantê-las desobstruídas. O stent convencional custa entre R$ 3.000,00 a R$ 5.000,00, porém a vedete da cardiologia moderna é o stent farmacológico, que libera gradualmente nas artérias drogas como a rapamicina ou o paclitaxel. Essas substâncias reduzem o risco de restenose (novo entupimento), provocado por reação imunológica do organismo contra o dispositivo implantado. Este medicamento está acessível somente via judicial, afinal para o gestor o mínimo é o suficiente. E os planos de saúde privados, nem isso oferecem.

No plano das diabetes, o SUS oferece o básico do básico, não apresentando inovações que venham garantir conforto e qualidade de vida, modernidade e tranqüilidade ao paciente. A Insulina Exubera, inalável, é um produto que age rapidamente, dispensam picadas e não provocam a famigerada hipoglicemia.

Mais de um milhão de brasileiros sofrem com o Alzheimer, doença que devasta o cérebro de metade da população com mais de 60 anos. Os poucos recursos disponíveis visam proteger as células nervosas, mas lamentavelmente são de pouca valia. Infelizmente neste aspecto, parece que a cura e a ciência estão descompassadas de um resultado mais positivo.

Mas, se não há cura, ao menos investimentos em prioridades acertadas. Um exemplo que mostram que há recursos para atender as demandas. A partir da criação da Lei 9313/96, que garante a distribuição gratuita e universal de medicamentos, as demandas passaram a ser acolhidas pelo judiciário, pressionando com isso o executivo a se planejar de forma mais efetiva para atender as demandas da população, como o Programa Nacional da DST/AIDS, que hoje é visto no mundo inteiro como modelo de assistência e atenção aos pacientes portadores do HIV.


         Quanto mais inacessível os medicamentos modernos, mais produtiva se torna a indústria das ações judiciais contra o Estado. Este quadro da saúde, por vezes caótico enquanto dever do Estado proporciona para que o paciente, na busca de seu bem maior “a vida”, sinta-se obrigado a buscar no poder judicante a efetividade de seus direitos consagrados na Constituição Federal.

CONCLUSÃO

O gestor conta com a desinformação e ignorância do cidadão, e assim vai levando, em muitos casos e municípios, a política da maquiagem. Programas de saúde pública, que recebem atenção da mídia, muitas vezes sem importância, porém eleitoreiros são abraçados pelos gestores. Porém, aqueles que são vitais à sobrevida dos cidadãos e essencial ao seu bem maior, devido a custos ou mesmo interesses do executivo ou mesmo do legislativo, são adiados ou engavetados, fragilizando mais ainda quem já está a muito fragilizado, o cidadão.

Exemplo disso é o avanço da hepatite C, uma das maiores preocupações da Organização Mundial da Saúde (OMS). Estima-se que mais 3 milhões de brasileiros estejam infectados pelo vírus da hepatite. O Estado/gestor deveria alertar a população para fazer o teste. Pois, muitas pessoas possuem o vírus e não sabem o que contribui na proliferação da doença. Mas, como o tratamento é caro, as autoridades preferem não fazer o diagnóstico. É a economia na desgraça alheia, por isso a política de empurrar com a barriga para resolver adiante custa caro, muito caro às pessoas e ao país.

Novas drogas tendem a prolongar a vida dos portadores de doenças, o que acaba matando o cidadão é a falta de acesso a estas drogas. A revolta do vai e vem à rede publica, cansa o cidadão.

Considerando que tem levado anos para se atualizar determinados protocolos, não se podem ceifar vidas pela morosidade do sistema. O Estado, por um lado se coloca numa posição de vítima da judicialização (também chamada de indústria das liminares), enquanto que por outro, este mesmo Estado/gestor oferece sorrateiramente contratos de Pilantropia para determinados hospitais privados, que não prestam serviços ao SUS. Mas, ao oferecer isso, os mesmos se isentam de impostos, o mesmo Estado que se diz vítima, não fiscaliza, ou seja, estes que recebem incentivos fiscais, no momento em que adquirem equipamento de ultima geração em diagnósticos por imagem e outros equipamentos e em contra partida deveriam oferecer exames gratuitos ao SUS, bem como 60% de seus leitos a usuários do SUS, não o fazem e não são fiscalizados. Por que?

Um país que joga no ralo R$ 41,5 bilhões por ano em corrupção, 1,38% do PIB, não pode alegar que não possui recursos para a saúde. (RELATÓRIO FIESP/2011)

Assim, nenhum direito cuja efetividade pressupõe um gasto seletivo de valores arrecadados dos contribuintes, poderá vir a ser protegido de maneira unilateral pelo Judiciário sem considerações às conseqüências orçamentárias, pelo quais os outros dois poderes são responsáveis. Para a construção de uma cidadania concreta na qual se reflita a efetiva prestação de serviços de saúde por parte do estado, de forma universal, igualitária e eqüitativa, então teríamos sim uma sociedade mais justa e digna.

É privilegiando este espaço que podemos propiciar a construção de uma cidadania efetiva, criando referenciais explícitos de propostas de políticas de saúde públicas, econômicas e educacionais, de forma, a não flutuar no olimpo dos abstratos discursos ideológicos do politicamente correto.

Nos últimos seis anos são crescentes as demandas judiciais. Por que isso ocorre? Por que o cidadão é encaminhado de um lado para outro? Por que o Estado adia o quanto pode de forma a protelar a necessidade vital para o cidadão usuário do serviço público de saúde? Os cidadãos que mais se encontram à margem da informação e conhecimento, também seriam os excluídos de seus direitos sociais?

Refletir através deste trabalho, onde o Estado falha na prestação de serviços do SUS foi possível verificar que, no que tange às demandas judiciais, a tendência é ao aumento destas, devido à morosidade e estratégias ineficazes da parte dos gestores, executivo e por vezes também o legislativo, do ente público.

Segundo Timm (2010, p. 52):

[...] não se trata aqui, de pôr em discussão a essencialidade dos direitos sociais para a sociedade. Não se trata igualmente de questionar a sua importância, mas trata sim de buscar a melhor maneira de fazê-lo, ou seja, maior eficiência, nota-se inclusive que eficiência não é apenas um valor para os economistas ou para o mercado, mas tem o dever o Estado, a luz do artigo 37 da Magna Carta.

Questões acima levantadas, as quais não são o foco específico deste estudo, porém não menos importantes, merecem ser aprofundadas em próximos estudos.

Propõe-se ampliar debate ampliado junto às instituições formadoras dos gestores e profissionais da saúde. Este debate com o fim de impulsionar novas posturas em saúde. Para que estas ao menos minimizem o descaso, omissão ou desatenção do Estado, que são comprovados através do elevado e acelerado aumento das demandas judicantes nos serviços de saúde pública.

Ainda se propõe a inserção de estudos a respeito da legislação em saúde, para demonstrar a importância do Direito Sanitário como fator indispensável para a qualidade de vida da população. E por fim, tornar mais acessível e pública a responsabilidade jurídica do Estado Gestor, com o fim de este efetivar ações de políticas publicas eficazes em saúde, como: melhor malha da atenção primária, atualização de parâmetros de exames, especialidades em saúde e, principalmente o fornecimento de medicamentos de forma mais célere. Valorizar o cidadão e considerar o direito constitucional à saúde, sem que este seja forçado ao caminho do Judiciário para assegurar o direito a ter seu direito efetivado.

Concluímos que na verdade, faltam leitos e quando na hora de uma emergência não é considerado o Princípio da Dignidade Humana, e sim números falaciosos e camuflados para esconder a verdade dos fatos.

 O direito  à vida e à saúde são de observância cogente em uma sociedade que pretender ser democrática. É função do Estado garantir o acesso a todos aos meios de recuperação de saúde, pois nos dizeres da Constituição Federal brasileira, “a saúde é direito de todos e dever do Estado, que lamentavelmente não vem sendo observados pelos nossos  Gestores  em Saúde.

   Esta brutal realidade que assola a vida do cidadão- usuário do SUS, e não são apenas os leitos, faltam consultas, cirurgias, medicamentos, etc.... Infelizmente o Estado prefere ser omisso as necessidades do usuários do SUS, preferindo perder mesmo que judicialmente as Demandas e milhões e milhões, dificultando o acesso do cidadão a rede SUS.

   A legislação é bonita, a realidade, monstruosa. Uma singela análise da jurisprudência brasileira evidencia o caos instalado no Sistema Único de Saúde. Se a falta de vagas em unidades de tratamento intensivo fosse algo inesperado poder-se-ia entender a omissão estatal.

   No entanto, a falta de leitos em UTI’s é um problema recorrente e que impede que várias pessoas, das mais variadas idades e condições sociais tenham respeitados os direitos plasmados na Constituição Federal.

   A falta de vagas em UTI’s  e  em  leitos hospitalares é algo que deve envergonhar os gestores do Sistema Único de Saúde de forma geral e ao Ministro da Saúde e a Presidente da República de forma especial, pois tais autoridades são responsáveis por ditar as políticas públicas a serem seg                                         

Urge que se destaque que não podem tais mandatários, no delineamento das estratégias a serem seguidas pelo Estado, se afastar do princípio da dignidade da pessoa humana e do direito à vida e do direito à saúde.

  É incompreensível que nos dias de hoje em que o gênero humano tenha ao seu dispor tão grande abundância de riquezas, possibilidades e poderio econômico, um ser humano não encontre  um leito de UTI para receber o tratamento médico de que necessita, para salvar seu bem mais precioso  a VIDA!!!!.

REFERÊNCIAS


BOBBIO, Norberto. A Era dos Direitos. 5 ed. Rio de Janeiro: Campus, 1992.


KELBERT, Fabiana Okchstein. Reserva do Possível e a efetividade dos direitos sociais no direito brasileiro. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2011.


FIGUEIREDO, Mariana Filchtiner. Direito Fundamental à Saúde. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2009.


RIO GRANDE DO SUL. Procuradoria Geral. Dados a respeito de Demandas Judiciais. 5ª Coordenadoria Regional de Saúde. Porto Alegre: PGE/RS, 2011.


SANTOS, José Sebastião dos e Ana Carla Bliacherine (organizadores). Direito à Vida e à Saúde.São Paulo, Ed Atlas, 2010.


TIMM, Luciano Benetti. Direitos Fundamentais, orçamento e reserva do possível. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2010.
Referências Consultadas


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Corrupção Custos Econômicos e Propostas de Combate – Relatório FIESP- 2011-www.fiesp.com.br . acesso 22 set 2011.

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Sobre os autores
Aramis Kraide Alves

Especializando em Direito Sanitário pela Escola de Saúde Pública do Rio Grande do Sul; ano 2010/2011 -Especialista em Direito do Consumidor pela Universidade Regional Integrada – URI- Campus Santo Ângelo, ano 2002/2003; Bel. Direito pela Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul – UNIJUÍ, Campus Santa Rosa, ano 2000.

Sandra Regina Martini Vial

Pós-Doutora em Direito. Professora da Fundação do Ministério Público, da Universidade do Vale do Rio dos Sinos e da Scuola Dottorale Internazionale Tulio Ascarelli. Professora visitante da Universitá Degli Studi Di Laremo/Itália. Membro do Conselho Superior da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio Grande do Sul.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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