Os acordos de Leniência são instrumentos destinados a permitir que o infrator colabore com as investigações e repare o dano causado em troca da redução da pena.
Foi noticiado recentemente que a Instrução Normativa 74/2015 aprovada pelo TCU poderia minar os acordos de leniência celebrados no âmbito da operação Lava-Jato.
Esse entendimento parece ser fruto de uma análise apressada quanto ao verdadeiro alcance jurídico do aludido normativo.
Inicialmente é preciso esclarecer que existem, no ordenamento jurídico brasileiro, três leis de leniência: Lei 12.850/2013, que trata das delações/colaborações premiadas na esfera penal, o da Nova Lei Antitruste (Lei 12.529/2011), relativo aos acordos de leniência referentes a infrações concorrenciais e de mercado, e o da Lei Anticorrupção (Lei 12.846/2013), que diz respeito aos atos contra a Administração Pública.
A norma recentemente aprovada pelo TCU diz respeito aos acordos de leniência estabelecidos no âmbito da Lei 12.846/2013, ou seja, aqueles firmados pela CGU e demais órgãos administrativos correlatos do judiciário e legislativo.
Os casos destacados seriam os acordos nos quais as empreiteiras colaborariam com a CGU (Controladoria Geral da União) para evitarem a aplicação de multa de 0,1% a 20% do faturamento bruto do exercício e a publicação extraordinária da decisão condenatória.
A bem da verdade a instrução do TCU, ora criticada, retirou o protagonismo do Governo Federal, leia-se Presidência da República, na avaliação da validade do acordo, o que parece uma iniciativa bem-vinda, pois em tese traria mais imparcialidade ao processo. Importante ressaltar que as delações premiadas celebradas no âmbito do poder Judiciário (Lei 12.850/2013), com as pessoas físicas envolvidas na Lava-Jato, não passarão pelo crivo do TCU, ou seja, aqueles ajustes que visam o perdão judicial ou a redução da pena imposta pelo juiz.
Outro ponto, que poderia causar alguma controvérsia, é que a declaração de inidoneidade para licitar ou contratar com a Administração Pública, sob pena de ferir o princípio da legalidade, não deve ser tratada nesses acordos da CGU, uma vez que são regidas por normas distintas (art. 87, IV da Lei 8.666/93 e art. 46 da Lei 8.443/92). Assim ao aceitarem o acordo de leniência com a CGU, as empreiteiras somente terão em seu horizonte a redução ou dispensa da multa e da publicação da condenação, em que pese a prévia celebração a esses ajustes possam trazer algum reflexo positivo na avaliação futura pelo TCU quanto à inidoneidade dessas pessoas jurídicas, assim como a resistência em aderir poderá produzir efeitos contrários.
Veja que a própria Lei 12.846/2013, como não poderia deixar de ser, tendo em vista o princípio da inafastabilidade da jurisdição, assinala que a responsabilização na esfera judicial por iniciativa da AGU ou do MP, na qual as envolvidas poderão sofrer sanções mais gravosas como a própria dissolução da pessoa jurídica, prescinde da responsabilização na esfera administrativa.
Logo o entendimento adotado por alguns setores da sociedade ao considerarem que a instrução fragilizou a operação Lava-Jato é açodada, pois, ao revés, a norma, no mínimo, reduziu o poder do Executivo Federal quanto à independência na condução do acordo levado a efeito pela CGU.