A Justiça Federal vem firmando posição de que a intimação judicial sobre a penhora de faturamento não tem o condão de transferir a posse do bem à justiça.
Com base nesse entendimento tem recusado denúncias de apropriação indébita contra sócios de empresas que deixaram de transferir parte do faturamento penhorado para pagamento de dívidas exigidas judicialmente.
Para o Ministério Público Federal, a inércia do sócio caracterizaria apropriação de coisa alheia móvel de que tinha posse, mesmo notificado a entregá-la, crime cuja pena é de um a quatro anos de reclusão e multa.
No entanto, ao analisar o caso de um sócio de uma borracharia que, apesar de intimado da penhora, deixou de efetuar o depósito de 20% do faturamento, a 11ª Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região 3ª Região confirmou a decisão de primeira instância, que recusou a denúncia por atipicidade da conduta e falta de justa causa (Processo nº 2014.61.22.000511-4/SP).
Segundo a decisão, “observa-se que o crime de apropriação indébita não se materializa quando coisa dada em depósito pertence ao próprio devedor, uma vez que não há como se apropriar de coisa que já lhe pertence”, pois, “a mera penhora do faturamento não transfere a propriedade da coisa fungível (dinheiro) para o credor (...), o faturamento penhorado pertence à empresa executada, restando que o denunciado, na qualidade de administrador, não se apropriou de coisa alheia”.
A decisão ainda considerou que o artigo 169 do Código Penal, que tipifica a apropriação indébita, considera crime “apropriar-se alguém de coisa alheia vinda ao seu poder por erro, caso fortuito ou força da natureza” e, no caso, não havia crime porque os rendimentos pertenciam ao sócio, em virtude da atividade desenvolvida na borracharia.
Outro caso, apreciado pela 7ª Turma do TRF da 4ª Região, reverteu a condenação em primeira instância de um sócio de um bar que deixou de pagar dívida trabalhista de R$ 1,8 mil, que seria descontada em quatro parcelas do faturamento.
Para o juiz de primeiro grau, após a nomeação do sócio como depositário judicial, competia-lhe apenas a guarda dos valores, e, ao deixar de depositar em juízo os valores que lhes foram entregues, o réu teria se apropriado de bens que não integravam o seu patrimônio.
A posição do TRF da 4ª Região está em consonância com o entendimento de não existe mais prisão do depositário infiel, sumulado pelo Supremo Tribunal Federal no enunciado com teor vinculante nº 25.
Além disso, corrobora jurisprudência pacífica de que o Direito Penal não pode ser utilizado como subterfúgio para cobrança de dívidas ou para punir condutas onde a aplicação de outras áreas do direito é suficiente.