Capa da publicação Disputa de guarda de animais de companhia em sede de divórcio e dissolução de união estável.

Disputa de guarda de animais de companhia em sede de divórcio e dissolução de união estável.

Reconhecimento da família multiespécie?

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31/07/2015 às 12:38
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[1] Neste sentido, Cfr. EPSTEIN, Richard A. "Animals as Objects, or Subjects, of Rights", em John M. Olin Program in Law and Economics Working Paper n. 171, 2002. Disponível em: http://www.law.uchicago.edu/files/files/171.rae_.animals.pdf Acesso em: 05/05/2015.

[2] Cfr. MCLAIN, Tabby. “Adapting the Child´s Best Interest Model to Custody Determination of Companion Animals”, em Journal of Animal Law, Vol. 6, pp. 151-168, 2010, p. 153.

[3] Importa referir que, explicitamente inspirado nesses ordenamentos, foi apresentado no Congresso Nacional o PLS n. 351/2015 de autoria do Senador Antônio Anastasia, que visa incluir um parágrafo único no Art. 82 do Código Civil brasileiro, expressamente determinando que “os animais não serão considerados coisas”. Note-se que, ao contrário dos ordenamentos que serviram de inspiração (onde os animais passaram a uma categoria inominada, sendo determinado que não são coisas, mas sem explicação do que – de fato – seriam), o legislador brasileiro pretende que os animais deixem de ser “coisas” e passem a ser “bens”. Nas palavras do Senador Anastasia, na justificativa do PLS, “isso porque partimos da premissa que no Brasil, juridicamente, “bem” está ligado à ideia de direitos sem, necessariamente, caráter econômico, ao passo que “coisa” está diretamente ligada à ideia de utilidade patrimonial”. Note-se que, no Brasil, essa diferenciação não faz qualquer sentido, principalmente prático. Ademais, os animais,  já estão abrangidos dentro da noção de bens móveis, que engloba os bens materiais, incorpóreos e semoventes, entrando nesta última categoria. Importa ainda referir que o CC brasileiro não particulariza coisas de bens, interessando, apenas que possam ser objeto de uma situação ou relação jurídica, integrando o patrimônio do indivíduo. O termo bens termina por abranger direitos e coisas, como indica VILLAS BOAS, Regina Vera. “Perfis dos conceitos de bens jurídicos”, em Doutrinas essenciais, vol. 4: Direito civil – parte geral/ Gilmar Ferreira Mendes; Rui Stoco (Orgs.). São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, pp. 1313-1344, 2011, p. 1315 e p. 1320. Também inclui os animais na categoria dos bens móveis, MIRANDA, Pontes de. Tratado de direito privado, t. II: Bens. Fatos jurídicos/Ovídio Rocha Barros Sandoval (atualizador). São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2012, p. 100.

[4] Cfr. HUSS, Rebecca J. “Valuing Man's and Woman's Best Friend: The Moral and Legal Status of Companion Animals”. Disponível em: http://www.animallaw.info/articles/arus86marqlr47.htm Acesso em 13/05/2013.

[5] O cachorro Avery fugiu de casa e foi recolhido pela “carrocinha” e levado para um abrigo. Os donos o encontraram, mas não tinham à época dinheiro para pagar as taxas referentes ao animal e fizeram um acordo para buscá-lo quando tivessem o montante para saldar a dívida. Todavia, antes do prazo avençado, o cachorro foi abatido.

[6] Essa mudança de uma instância para a outra mostra que, no mínimo, o animal deixou de ser considerado um objeto qualquer para, pelo menos, ser considerado um objeto de “valor inestimável”. Para uma análise completa do caso, veja-se “Groundbreaking Court Ruling Takes Dogs Beyond "Property" Status; Major Pet Industry Groups Not Happy”. Disponível em: http://www.dogster.com/the-scoop/groundbreaking-court-ruling-takes-dogs-beyond-property-status-major-pet-industry-groups-not-happy Acesso em: 13/05/2015.

[7] 10.000 dólares pela angústia mental e estresse emocional; 10.000 dólares de compensação pela perda da companhia; e 10.000 dólares em danos punitivos. Além de quase 7.000 dólares em custas processuais e honorários advocatícios. SIMMONS, Schyler P. “What is the Next Step For Companion Pets in the Legal System?: The Answer May Lie With the Historical Development of the Legal Rights For Minors”, em Texas A&M Law Review, Vol. 1, Fall, pp. 253-285, 2013, pp. 265-266.

[8] Somente em 1986 houve o primeiro curso de direito dos animais nos EUA. Em 2008 há havia quase 100 Faculdades de Direito dos Estados Unidos já ofereciam cursos de direito dos animais ou grupos de pesquisa voltados a essa matéria, inclusive segmentos com foco na guarda de pets. WHARTON, T. Christopher. “ Fighting Like Cats and Dogs: The Rising Number of Custody Battles Over the Family Pet”, cit., p. 441.

[9] Cfr. Kotloff, Eric. “All Dogs Go To Heaven... Or Divorce Court: New Jersey Unleashes a Subjective Value Consideration to Resolve Pet Custody Litigation in Houseman v. Dare”, em Villanova Law Review, vol. 55, pp. 447-474, 2010, p. 448.

[10] “O Reino Animal (Reino Metazoa ou Animalia) é composto por seres vivos multicelulares, heterotróficos (buscam seu alimento no meio onde vivem), geralmente dotados de locomoção e capacidade de responder ao ambiente. O homem (Homo sapiens) é classificado como pertencente ao Reino Animalia”. NEVES, Helena Telino. “A controversa definição da natureza jurídica dos animais”, em Animais: Deveres e Direitos/ Maria Luísa Duarte; Carla Amado Gomes (coords). Lisboa: Instituto de Ciências Jurídico-Políticas, pp. 81-89, 2015, p. 81. Portanto, pelo fato de o homem ser cientificamente classificado como animal, é possível a utilização da terminologia “animal não humano” para referir-se aos outros animais.

[11] Em 2005, em pesquisa feita pela Princeton Survey Research Associates International, 85% dos entrevistados (em um universo de 3014 pessoas contactadas por telefone) afirmaram considerar seu cão ou cães membros da entidade familiar. Resultado disponível em: http://www.pewresearch.org/question-search/?keyword=dogs&x=-471&y=-349 Acesso em: 04/05/2015.

[12] Tradução livre de American Pet Products Manufacturing Association.

[13] Na análise do que se chama de “pet parents” (pais de animais, em tradução livre), aponta-se que 63% dos lares norte-americanos possuem animais de companhia, sendo 44 milhões de lares com pelo menos um cachorro e trinta e oito milhões de lares com pelo menos um gato. 80% dos donos de cachorros compram presentes de aniversário ou de Natal para seus cães, assim como 66% dos donos de gatos. Cfr. GREGORY, John Dewitt. “Pet Custody: Distorting Language and the Law”, em Family Law Quarterly, Vol. 44, n. 1, pp. 35-64, Spring 2010, p. 37-38.

[14] A título de informação, em 2009, a Agência Australiana de Estatísticas (Australian Bureau of Statistics) revelou em pesquisa que cerca de 63% dos 6,6 milhões de lares australianos possuem algum tipo de animal de companhia, sendo essa uma das maiores taxas do mundo. Cfr. WHITE, Steven. “Companion animals: members of the family or legally discarded objects?”, em University of New South Wales Law Journal, Vol. 32, n. 3, pp. 852-878, 2009, p. 852, nota 1.

[15] Estima-se que no Brasil haja mais de 35 milhões de cachorros, 25 milhões de peixes e quase 20 milhões de gatos. Os dados são da Associação Brasileira da Indústria de Produtos para Animais de Estimação (Abinpet). Cfr. “Cachorro é o animal de estimação em maior número no país”. Disponível em: www.rankbrasil.com.br Acesso em: 13/05/2015.

[16] Cfr. SIMMONS, Schyler P. “What is the Next Step For Companion Pets in the Legal System?: The Answer May Lie With the Historical Development of the Legal Rights For Minors”, cit., p. 254.

[17] Números extraídos de www.ibge.gov.br . Acesso em 12/05/2015.

[18] Muito embora não faça parte do objeto do presente estudo, é imperioso ressaltar que, em virtude da EC 66/2010, entende-se que a separação judicial deixou de existir no ordenamento jurídico brasileiro.

[19] Sociólogos indicam uma série de ocorrências que indicam que os animais de companhia galgaram o status de verdadeiros membros da família: existe um crescente número de casamentos e uniões que terminam pelo fato de um dos membros do casal não gostar de como o outro trata o animal de companhia; as pessoas demonstram a cada dia mais disposição em arcar com altos custos financeiros com veterinários e tratamentos com seus pets; a prática de pessoas deixarem heranças substanciais para os seus animais de estimação em seus testamentos ou para alguém sob a condição de cuidarem dos animais; a benção de animais por padres e pastores; a prática de enterrar os animais da família em cemitérios de animais; o crescente número de psicólogos e terapeutas que atendem pacientes em extremo sofrimento, vivenciando o luto pela perda do seu animal de estimação. Cfr. neste sentido, BOGDANOSKI, Tony. “Towards an Animal-Friendly Family Law:  Recognising the Welfare of Family Law's Forgotten Family Members”, em Griffith Law Review, Vol. 19, n. 2, pp. 197-237, 2010, p. 208.

[20] Cfr. WHARTON, T. Christopher. “ Fighting Like Cats and Dogs: The Rising Number of Custody Battles Over the Family Pet”, em Journal of Law and Family Studies, Vol. 10, n. 2, pp. 433-441, 2008, p. 435.

[21] Nos EUA, esse tipo de demanda está a se tornar tão comum que alguns Estados e cidades criaram varas especializadas para solucionar apenas esse tipo de litígio, as chamadas “pet courts”. Afirma-se que, como o sistema de proteção de menores, as varas de animais de companhia dão algum tipo de proteção aqueles que não podem proteger a si próprio. Cfr. SIMMONS, Schyler P. “What is the Next Step For Companion Pets in the Legal System?: The Answer May Lie With the Historical Development of the Legal Rights For Minors”, cit., pp. 258-259.

[22] Cfr. EPSTEIN, Richard A. “Animals as Objects, or Subjects, of Rights", em Animal Rights: Current Debates and New Directions/ Cass R. Sunstein; Martha C. Nussbaum (Eds.). New York: Oxford University Press, pp. 143-161, 2004, p. 143 e ss.

[23] Consultar VARSI, Enrique. “Mi hirro ... Mi perro: la naturaleza jurídica de las mascotas”, disponível em: http://www.enriquevarsi.com/2009_10_01_archive.html Acesso em: 13/05/2013.

[24] Cfr. em igual sentido, SIMMONS, Schyler P. “What is the Next Step For Companion Pets in the Legal System?: The Answer May Lie With the Historical Development of the Legal Rights For Minors”, cit., p. 256.

[25] Tradução livre de “cur on the streets”.

[26] Cfr. em igual sentido, SIMMONS, Schyler P. “What is the Next Step For Companion Pets in the Legal System?: The Answer May Lie With the Historical Development of the Legal Rights For Minors”, cit., p. 259.

[27] Como indica, SIMMONS, Schyler P. “What is the Next Step For Companion Pets in the Legal System?: The Answer May Lie With the Historical Development of the Legal Rights For Minors”, cit., p. 281. RANKIN apud WHARTON, T. Christopher. “Fighting Like Cats and Dogs: The Rising Number of Custody Battles Over the Family Pet”, cit., p. 441, afirma em igual sentido que “if corporations can be persons in the eyes of law, if ships can be persons in the eyes of the law, then the law should be able to figure out something for animals”.

[28] Como afirmamos em artigo relacionado a navios, os navios individualizam-se pela sua identidade, ou seja, nome, tonelagem, arqueação, porto de inscrição, e também pelos papéis de bordo, classe e nacionalidade. As peculiaridades de identificação do navio fizeram emergir na doutrina (em especial, a anglo-saxônica) uma comparação entre o navio e uma pessoa, no sentido de atribuí-lo personalidade. Os que perfilham desse juízo, argumentam que se individualiza o navio pelo nome, da mesma maneira que ocorre com as pessoas. Sustentam, ainda, que existiria uma certa similitude entre o estado civil das pessoas e o registro dos navios.

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Entretanto é entendimento majoritário que, apesar de tais semelhanças, não se deve proceder, no âmbito jurídico, a tal comparação, uma vez que, para todos os efeitos jurídicos, o regime do navio é de um bem e não de um indivíduo. Desta forma, o navio deve ser considerado como objeto de direito e não sujeito de direitos. Cfr. CHAVES, Marianna. “Venda de Navios: Panorama Luso-Brasileiro e Internacional”, em Revista Magister de Direito Empresarial, Concorrencial e do Consumidor, vol. 31, Fev./Mar., pp. 51-80, 2010, p. 53.

[29] Tradução livre de: “living property”.

[30] Cfr. MCLAIN, Tabby. “Adapting the Child´s Best Interest Model to Custody Determination of Companion Animals”, cit., pp. 161-162. O melhor interesse do animal tem servido de argumento, inclusive, para disputas que não se originam em relações familiares (pelo menos não reconhecida pela maioria, muito embora exista quem fale de “família de amigos” ou “fraternidade socioafetiva”). Veja-se o curioso caso do gato “Grady”, que era disputado por dois amigos, ex-colegas de quarto (roomates). Depois de uma análise do caso concreto, a Corte decidiu – no caso Zovko v. Gregory – que o interesse de “Grady” deveria preponderar sobre os interesses de propriedade de ambas as partes. Assim, ao contrário do que determinaria uma leitura fria da legislação aplicável, terminou determinando que o gato deveria ficar com a parte que não era o seu legítimo proprietário. WHARTON, T. Christopher. “ Fighting Like Cats and Dogs: The Rising Number of Custody Battles Over the Family Pet”, cit., p. 437.

[31] NEVES, Helena Telino. “A controversa definição da natureza jurídica dos animais”, cit., pp. 87-88.

[32] Cfr. GREGORY, John Dewitt. “Pet Custody: Distorting Language and the Law”, cit., p. 39

[33] Neste sentido, assevera Dimitre Braga Soares que “paralelamente à mudança na arquitetura dos ambientes familiares, um outro elemento passou a fazer parte cada vez mais forte da família moderna: os animais de estimação. Mas não simplesmente os animais de estimação nos seus papéis tradicionais, mas agora como legítimos membros da família. É cada vez mais comum encontramos pessoas que tratam os seus cães e gatos como parentes. O caráter afetivo das relações que eram totalmente preenchidas com filhos tem sido trespassado para cães e gatos”. SOARES, Dimitre Braga. “Animais de estimação e Direito de Família”. Disponível em: http://www.ibdfam.org.br/artigos/detalhe/531 Acesso em: 13/05/2013.

[34] Neste sentido, consultar LEAL, Adisson; SANTOS, Victor Macedo. “Decisão comentada – Reflexões sobre a posição jurídica dos animais de estimação perante o direito das famílias: TJRJ”, em Revista IBDFAM Famílias e Sucessões, Vol. 9 (maio/jun.), pp. 159-177, 2015, p. 167.

[35] Já que seres humanos possuem dignidade e meras coisas, não. Como bem afirma Kant, com a sua doutrina racionalista, “no reino dos fins tudo tem ou um preço ou uma dignidade. Quando uma coisa tem um preço, pode-se pôr em vez dela qualquer outra equivalente; mas quando uma coisa está acima de todo o preço, e, portanto não permite equivalente, então tem ela dignidade”. KANT, Immanuel. Fundamentação da metafísica dos costumes/ Paulo Quintela (trad.). Lisboa: Edições 70, 1986, p. 70

[36] Esses rituais ocorrem, inclusive, quanto o animal morre. Hoje é comum nos depararmos com cemitérios de animais de estimação. Diferentemente de outros tipos de “propriedade”, não jogamos os nossos pets simplesmente em uma lixeira quando eles partem. Não é incomum que se façam rituais e velórios antes dos enterros dos animais de companhia, tal e qual acontece com os humanos.

[37] Cfr. em igual sentido, WHITE, Steven. “Companion animals: members of the family or legally discarded objects?”, cit., pp. 855-856.

[38] Como indica Adrian Franklin citado por WHITE, Steven. “Companion animals: members of the family or legally discarded objects?”, cit., p. 860.

[39] Na ocasião da batalha judicial, na Suprema Corte de New Jersey, para determinação de quem ficaria com  o cachorrinho “Love”, o juiz John Tomasello afirmou que cachorros seriam cadeiras, móveis, carros, pensões, que cães não eram crianças. Cfr. Kotloff, Eric. “All Dogs Go To Heaven... Or Divorce Court: New Jersey Unleashes a Subjective Value Consideration to Resolve Pet Custody Litigation in Houseman v. Dare”, cit., p. 447.

[40] A título ilustrativo, pode-se trazer à colação a disposição do Código Civil alemão. O BGB, em seu       §90a que os animais não são coisas, que são protegidos por leis especiais e que são regulados pelo direito de propriedade, com as necessárias adaptações, exceto nos casos previstos em contrário. (No original: § 90a Tiere - Tiere sind keine Sachen. Sie werden durch besondere Gesetze geschützt. Auf sie sind die für Sachen geltenden Vorschriften entsprechend anzuwenden, soweit nicht etwas anderes bestimmt ist). Tomando em consideração a singularidade dos animais, o BGB ainda estabelece na segunda parte do § 903 que o proprietário de um animal deve, ao exercer seus poderes, levar em consideração as disposições especiais relativas à proteção dos animais. (No original: § 903 Befugnisse des Eigentümers - Der Eigentümer einer Sache kann, soweit nicht das Gesetz oder Rechte Dritter entgegenstehen, mit der Sache nach Belieben verfahren und andere von jeder Einwirkung ausschließen. Der Eigentümer eines Tieres hat bei der Ausübung seiner Befugnisse die besonderen Vorschriften zum Schutz der Tiere zu beachten.). Helena Telino critica a solução dada no ordenamento germânico. A jurista afirma que as modificações realizadas no BGB, a exemplo do Código Civil Suíço e do Código Civil Austríaco revelam uma tendência no sentido da não permanência dos animais na categoria de coisas, em prol de uma melhor proteção. Entretanto, como indica, não são mais considerados coisas, mas lhes foi aplicado – ainda que com adaptações – o regime jurídico da propriedade. “A desqualificação dos animais como coisas, sem qualificá-lo como pessoa e sem classificá-lo como terceiro gênero criou uma incógnita jurídica. Novamente: não são os nomes dados às realidades que as transformam juridicamente, mas o regime que lhes é dispensado. E o regime jurídico continuou sendo o das coisas”. NEVES, Helena Telino. “A controversa definição da natureza jurídica dos animais”, cit., p. 88. No mesmo problema incorrerá o Brasil, se aprovar o referido PLS n. 351/2015. O ZGB suíço, em seu artigo Art. 641a (Introduzido por Lei Federal de 04 de Outubro de 2002 – Animais – e em vigor a partir de Abril de 2003) estabelece: II. Animaux: 1- Les animaux ne sont pas des choses; 2- Sauf disposition contraire, les dispositions s'appliquant aux choses sont également valables pour les animaux. De igual maneira, o ABGB austríaco estabelece em seu § 285a que, “Tiere sind keine Sachen; sie werden durch besondere Gesetze geschützt. Die für Sachen geltenden Vorschriften sind auf Tiere nur insoweit anzuwenden, als keine abweichenden Regelungen bestehen”, analogamente à legislação suiça e alemã. Aliás, ambas foram inspiradas no Allgemeines bürgerliches Gesetzbuch, já que o diploma austríaco é de 1811, tendo esse dispositivo entrado em vigor por reforma legislativa no ano de 1988.

[41] A relação entre o animal de companhia e o(s) dono(s) é bastante similar à relação parental. A maioria das pessoas adquire, ganha ou adota o seu animal de companhia quando ele ainda é filhote, criando-o e educando-o como faria com o seu próprio filho humano. Os donos dão banhos, alimentam, pagam despesas médicas para manter os seus bichinhos saudáveis. Ensinam os seus animais a socializarem e serem simpáticos com outros animais e com outros humanos, a comer toda a sua comida e a saberem diferenciar o certo do errado. Neste sentido, consultar SIMMONS, Schyler P. “What is the Next Step For Companion Pets in the Legal System?: The Answer May Lie With the Historical Development of the Legal Rights For Minors”, cit., pp. 264-265.

[42] Ou ao resto dos bens, se considerarmos os animais de companhia como bens semoventes. A doutrina já se manifesta no sentido de que manter os animais de companhia nessa classificação legal de semoventes de pouco ou nenhum valor econômico não mais se sustenta pois não coaduna com a realidade social do papel dos pets nas famílias contemporâneas, como indica BOGDANOSKI, Tony. “Towards an Animal-Friendly Family Law: Recognising the Welfare of Family Law's Forgotten Family Members”, cit., p. 229.

[43] Cfr. SIMMONS, Schyler P. “What is the Next Step For Companion Pets in the Legal System?: The Answer May Lie With the Historical Development of the Legal Rights For Minors”, cit., p. 271.

[44] Direito Civil - Reconhecimento/dissolução de união estável - Partilha de bens de semovente - Sentença de procedência parcial que determina a posse do cão de estimação para a ex-convivente mulher – Recurso que versa exclusivamente sobre a posse do animal – réu apelante que sustenta ser o real proprietário – conjunto probatório que evidencia que os cuidados com o cão ficavam a cargo da recorrida - Direito do apelante/varão em ter o animal em sua companhia – animais de estimação cujo destino, caso dissolvida sociedade conjugal é tema que desafia o operador do direito – Semovente que, por sua natureza e finalidade, não pode ser tratado como simples bem, a ser hermética e irrefletidamente partilhado, rompendo- se abruptamente o convívio até então mantido com um dos integrantes da família – Cachorrinho “Dully” que fora presenteado pelo recorrente à recorrida, em momento de especial dissabor enfrentado pelos conviventes, a saber, aborto natural sofrido por esta – vínculos emocionais e afetivos construídos em torno do animal, que devem ser, na medida do possível, mantidos – Solução que não tem o condão de conferir direitos subjetivos ao animal, expressando-se, por outro lado, como mais uma das variadas e multifárias manifestações do principio da dignidade da pessoa humana, em favor do recorrente – Parcial acolhimento da irresignação para, a despeito da ausência de previsão normativa regente sobre o thema, mas sopesando todos os vetores acima evidenciados, aos quais se soma o principio que veda o non liquet, permitir ao recorrente, caso queira, ter consigo a companhia do cão dully, exercendo a sua posse provisória, facultando-lhe buscar o cão em fins de semana alternados, das 10:00 hs de sábado às 17:00hs do domingo. Sentença que se mantém. 1. Cuida-se de apelação contra sentença que, em demanda de dissolução de união estável c/c partilha de bens, movida pela apelada em face do apelante, julgou parcialmente procedente o pedido para reconhecer e dissolver a união estável havida entre as partes e determinou, ainda, que a autora ficasse com a posse do cão de estimação da raça cocker spaniel. 2. Insurge-se o réu unicamente com relação à posse do animal de estimação, sustentando, em síntese, que o cachorro foi adquirido para si, ressaltando que sempre cuidou do cão, levando-o para passear e para consultas ao veterinário, destacando, ainda, que sempre arcou com os seus custos, inclusive com a vacinação. 3. De fato, da análise do conjunto probatório infere-se que a parte autora logrou comprovar que era a responsável pelos cuidados do cão dully, 4. Contudo, não se pode ignorar o direito do apelante de, ao menos, ter o animal em sua companhia. Questão envolvendo animais de estimação cujo destino, caso dissolvida sociedade conjugal é tema que desafia o operador. 5. Semovente que, por sua natureza e finalidade, não pode ser tratado como simples bem, a ser hermética e irrefletidamente partilhado, rompendo-se abruptamente o convívio até então mantido com um dos integrantes da família. 6. Cachorrinho “dully” que fora presenteado pelo recorrente à recorrida, em momento de especial e extremo dissabor enfrentado pelos conviventes, a saber, aborto natural sofrido por esta. Vínculos emocionais, afetivos construídos em torno do animal, que devem ser, na medida do possível, mantidos. 7. Solução que, se não tem o condão de conferir direitos subjetivos ao animal, traduz, por outro lado, mais uma das variegadas e multifárias manifestações do princípio da dignidade da pessoa humana, em favor do recorrente. 8. Recurso desprovido, fixando-se, porém, a despeito da ausência de previsão normativa regente o thema, mas sopesando todos os vetores acima evidenciados, aos quais se soma o princípio que veda o non liquet,permitir ao recorrente, caso queira, ter consigo a companhia do cão dully, exercendo a sua posse provisória, devendo tal direito ser exercido no seu interesse e em atenção às necessidades do animal, facultando-lhe buscar o cão em fins de semana alternados, às 10:00h de sábado, restituindo-lhe às 17:00hs do domingo. Nega-se provimento ao recurso. Acórdão em Segredo de Justiça. (TJRJ, 22ª C. Cível, AC 0019757-79.2013.8.19.0208, Rel. Des. Marcelo Lima Buhatem, j. 27/01/2015).

[45] Acórdão do processo 0019757-79.2013.8.19.0208, disponível em: http://s.conjur.com.br/dl/posse-compartilhada-cao-estimacao.doc Acesso em: 05/05/2015.

[46] Em suas palavras: “Além da sempre operante sociedade protetora dos animais há um sem número de programas e séries de televisão, publicações especializadas, sítios virtuais, comunidades em redes sociais, pet shops, todas especializadas no tema. Uma miríade de interfaces todas voltadas a tratar dessa cada vez mais imbricada relação homem x animal de estimação”. Acórdão do processo 0019757-79.2013.8.19.0208, cit.

[47] Nas palavras do Desembargador Buhatem: “Neste sentido, é preciso mais justamente por ser de estimação e afeto, destinado não ao abate ou ao trabalho, mas ao preenchimento de necessidades humanas emocionais, afetivas, que, atualmente, de tão caras e importantes, não podem passar despercebidas aos olhos do operador. Não custa dizer que há animais que compõem afetivamente a família dos seus donos, a ponto da sua perda ser extremamente penosa”. Acórdão do processo 0019757-79.2013.8.19.0208, cit.

[48] Tradução livre de “teaching an old Law new tricks”, tópico de um artigo sobre o tema, onde o autor afirma que há uma insatisfação generalizada com aplicação do direito das coisas, puro e simples, na solução de casos relacionados à guarda de animais de companhia. Desta forma, afirma-se que, na ausência de uma legislação específica sobre o tema, o direito aplicável deve ser considerado de forma mais moderna e harmonizado com o papel crescente que os animais de companhia possuem nas estruturas familiares. Neste sentido, ver Kotloff, Eric. “All Dogs Go To Heaven... Or Divorce Court: New Jersey Unleashes a Subjective Value Consideration to Resolve Pet Custody Litigation in Houseman v. Dare”, cit., p. 457.

[49] Ainda nas palavras do julgador: “Com efeito, a separação é um momento triste, delicado, dissaboroso, envolvendo sofrimento e rupturas. Em casais jovens ou não, muitas vezes o animal “simboliza” uma espécie de filho, tornando-se, sem nenhum exagero, quase como um ente querido, em torno do qual o casal se une, não somente no que toca ao afeto, mas construindo sobre tal toda uma rotina, uma vida ...”. Acórdão do processo 0019757-79.2013.8.19.0208, cit.

[50] Acórdão do processo 0019757-79.2013.8.19.0208, cit.

[51] A doutrina especializada assevera que o magistrado deverá sempre identificar e analisar o “melhor interesse do animal” na hora de decidir sobre a custódia do animal de companhia. Como indica Kotloff, Eric. “All Dogs Go To Heaven... Or Divorce Court: New Jersey Unleashes a Subjective Value Consideration to Resolve Pet Custody Litigation in Houseman v. Dare”, cit., p. 457.

[52] Buscando-lhe às 08:00h do sábado, restituindo-lhe às 17:00h do domingo, na residência da ex-companheira. Cfr. Acórdão do processo 0019757-79.2013.8.19.0208, cit.

[53] Cfr. “Justiça carioca fixa guarda alternada de cachorro após dissolução conjugal”. Disponível em: http://www.ibdfam.org.br/noticias/5593/Justiça+carioca+fixa+guarda+alternada+de+cachorro+após+dissolução+conjugal Acesso em: 05/05/2015.

[54] LEAL, Adisson; SANTOS, Victor Macedo. “Decisão comentada – Reflexões sobre a posição jurídica dos animais de estimação perante o direito das famílias: TJRJ”, cit., p. 174.

[55] Até mesmo a doutrina que defende a permanência dos animais na categoria das coisas defende a necessidade de alterações. Neste sentido, Helena Telino afirma que “Sendo o animal objeto de transações, poderia, sem negar sua natureza, deixá-lo figurar no direito das coisas, mas criando uma nova categoria específica: as coisas comportariam as coisas insensíveis (inanimados) e as sensíveis (os animais), baseada no critério da exteriorização do sentimento (...).

A criação desta dualidade reconheceria as particularidades do animal em relação às outras coisas e recordaria o dever de respeitá-los, sem dotá-los de personalidade jurídica.

Deve haver uma mudança da concepção do significado de “coisa”. O animal, por ser vivo e capaz de sofrer, seria protegido por si, admitindo que possa ter alguns interesses em manter seu bem-estar. Mesmo classificados como coisas e objetos de relações jurídicas, esta mudança de paradigma traria uma maior conscientização da condição de ser vivo do animal”. NEVES, Helena Telino. “A controversa definição da natureza jurídica dos animais”, cit., p. 88.

[56] Em regra, a propriedade do animal, se transfere – seja na hipótese de doação, seja na hipótese de uma compra e venda – pela tradição. Em um eventual litígio pelo animal, para fazer prova dessa tradição, os recibos e contratos podem ser grandes aliados das partes, ou grandes inimigos.

[57] No ordenamento brasileiro, a translatividade dominial se aperfeiçoa apenas pela tradição, em se tratando de bens móveis. Já em Portugal, o art. 408º do Código Civil dispõe em seu n. 1 que, “a constituição ou transferência de direitos reais sobre coisa determinada dá-se por mero efeito do contrato, salvas as exceções previstas na lei”. Portugal, assim como Itália e Polônia, seguiu o sistema adotado pelo Código francês, onde a compra e venda é contrato de transferência da propriedade, de efeito real instantâneo, onde o domínio se transfere ao adquirente pelo simples consentimento, sem a necessidade da tradição. A troca de consentimentos que figura no contrato por si só é suficiente para converter o comprador em proprietário. Assim, no Código Civil português é atribuído efeito real à compra e venda. Daí a importância dos recibos e, principalmente, dos contratos nesses ordenamentos.

[58] Nesse sentido, inúmeros tribunais norte-americanos tem atribuído a “guarda” dos animais de estimação de família às partes que não eram os titulares legais daquela “propriedade”, revelando uma abordagem de tratamento da custódia do animal que coloca uma maior ênfase no bem estar do pet do que nos direitos de propriedade das partes. Cfr. BOGDANOSKI, Tony. “Towards an Animal-Friendly Family Law:  Recognising the Welfare of Family Law's Forgotten Family Members”, cit., p. 217.

[59] SHUFFIELD, Lacy L. “Pet Parents - Fighting Tooth and Paw for Custody: Whether Louisiana Courts Should Recognize Companion Animals as more than Property”, em Southern University Law Review, Vol. 37, n. 1, pp. 101-125, 2009, p. 101.

[60] O PL n. 1058/2011, de autoria do Dep. Marco Ubiali, que dispunha sobre a guarda de animais de estimação nos casos de extinção do casamento e união estável foi arquivado em Janeiro de 2015.

[61] Denotada pela utilização da expressão bens, posse, propriedade.

[62] Como se adverte na doutrina norte-americana, outorgar a guarda ou a posse do animal apenas àquele que conseguir provar de forma mais contundente o direito de propriedade através de pagamentos de contas relativas ao sustento do animal pode ser pouco razoável e injusto. Cfr. neste sentido Kotloff, Eric. “All Dogs Go To Heaven... Or Divorce Court: New Jersey Unleashes a Subjective Value Consideration to Resolve Pet Custody Litigation in Houseman v. Dare”, cit., p. 455.

[63] Também parece concordar com o recurso à legislação familiarista o Prof. Zeno Veloso. Nesse sentido, afirma que “penso que um juiz sabido, inteligente, humano, usando os princípios gerais de direito ou a analogia, pode, sim, estabelecer a guarda de animais domésticos, seja a guarda unilateral, seja a compartilhada, tomando por base o princípio da afetividade, que, a cada dia mais, cada vez mais, deve reger a vida familiar e definir as questões de família”. VELOSO, Zeno. “Na separação quem fica com o cachorrinho?”, em Jornal O Liberal. Belém, 18 de julho de 2015.

[64] Sobre as crianças como propriedade nos EUA dos século 18, consultar SIMMONS, Schyler P. “What is the Next Step For Companion Pets in the Legal System?: The Answer May Lie With the Historical Development of the Legal Rights For Minors”, cit., p. 255.

[65] Alguma doutrina indica que o reconhecimento dos animais de companhia como membros da entidade familiar poderia acarretar, em algum futuro, por exemplo, na conformação de um vínculo conjugal entre uma pessoa e seu animal de estimação. Neste sentido, ver LEAL, Adisson; SANTOS, Victor Macedo. “Decisão comentada – Reflexões sobre a posição jurídica dos animais de estimação perante o direito das famílias: TJRJ”, cit., p. 171. Data venia, no afã de crítica a ideia da família multiespécie, parece haver o esquecimento de uma das mais elementares noções dentro do direito matrimonial e pressuposto para a validade do casamento: a capacidade. Diante da impossibilidade de um animal manifestar a sua vontade, ainda que lhes fosse reconhecida personalidade jurídica, seriam totalmente incapazes de manifestarem o seu consentimento, de modo inequívoco, para o que quer que fosse. Portanto, o casamento celebrado entre um animal e uma pessoa, não seria válido.

[66] Aliás, o melhor interesse do animal foi especificamente apontado como elemento de consideração, no TJRJ, para a concessão do direito de convivência, em finais de semanas alternados, do cãozinho “Dully”, com aquele que não foi considerado o seu legítimo proprietário.

[67] Como se indica na doutrina norte-americana, qualquer determinação de melhor interesse de um ser vivo estaria incompleta sem o componente físico. Relativamente aos animais de companhia, as necessidades físicas são relativamente óbvias até para o mais inexperiente dos guardiães (ainda que existam necessidades não consideradas inevitáveis por alguns, como esterilização e castração). Grosso modo, em termos físicos, os animais necessitam de água, comida, tratamento adequado, cuidados de saúde e um ambiente apropriado para o seu tamanho e espécie. O bem-estar psicológico do pet também deverá ser considerado na análise do seu bem-estar global. Pesquisas indicam que existem métodos científicos para determinação do estado emocional do animal, que utilizam processos comportamentais e biológicos. Standards comportamentais e hormonais servem para indicar se o bem-estar animal, em termos psicológicos, está sendo alcançado. Existem algumas sugestões de comportamento cuja presença ou ausência podem servir como indicadores de estados emocionais positivos ou negativos nos animais, como: comportamento brincalhão, aproximação de outros animais, automutilação, vocalização, comportamentos de coleta ou exploratórios, etc. Em termos biológicos, flutuações hormonais são indicativas de determinadas emoções. A presença, ausência ou nível de concentração de certos hormônios ou a medição de certos processos psicológicos podem caracterizar estados emocionais de um animal que é incapaz de comunicar verbalmente essas emoções. Cfr. MCLAIN, Tabby. “Adapting the Child´s Best Interest Model to Custody Determination of Companion Animals”, cit., pp. 153-154.

[68] Estreita relação não significa, no entanto, relação equivalente ou igual.

[69] Consultar neste sentido, SIMMONS, Schyler P. “What is the Next Step For Companion Pets in the Legal System?: The Answer May Lie With the Historical Development of the Legal Rights For Minors”, cit., p. 272.

[70] Como também ocorre nos EUA. Neste sentido, cfr. Kotloff, Eric. “All Dogs Go To Heaven... Or Divorce Court: New Jersey Unleashes a Subjective Value Consideration to Resolve Pet Custody Litigation in Houseman v. Dare”, cit., p. 447.

[71] Já existem legislações locais, nomeadamente em cidades da California, do Colorado, de Arkansas e de Rhode Island que se referem aos cuidadores dos animais de companhia como “guardiões” e não como “donos”. Cfr. SIMMONS, Schyler P. “What is the Next Step For Companion Pets in the Legal System?: The Answer May Lie With the Historical Development of the Legal Rights For Minors”, cit., p. 272. Em 2007, o Wisconsin se tornou o primeiro Estado a aprovar uma legislação que permite que casais estabeleçam em acordo um regime de guarda e visitação do seu animal de estimação. Na hipótese de não chegarem a um consenso, o estatuto permite que o juiz determine a guarda ou ainda determine que o pet seja alocado em um abrigo local e quem lá chegar primeiro fica com o gato, cachorro e até mesmo com o peixinho dourado. Em 2008, o Estado do Michigan aprovou lei parecida, que determina que todos os pedidos de divórcio devem incluir uma lista dos animais de estimação do casal, suas espécies e quando foram comprados ou “adotados”. Os divorciandos devem apresentar quaisquer acordos ou pactos relativos à guarda dos animais, caso contrário o juiz decidirá com quem e como ele deve ficar. WHARTON, T. Christopher. “Fighting Like Cats and Dogs: The Rising Number of Custody Battles Over the Family Pet”, p. 441.

[72] Só para apontar uma dessas singularidades, com a emancipação ou a chegada da maioridade, extinto estará o poder familiar e a obrigação dos pais de terem os filhos em sua companhia (na lógica de custódia). Os animais de companhia jamais serão “emancipados” dos seus “pais”, cuja responsabilidade persistirá até a morte do pet.

[73] Como muitos estudos revelam, não dá para se reivindicar uma concordância absoluta e perfeita entre os interesses dos seres humanos e dos animais. A outro giro, nada impede que esses interesses sejam compatibilizados, não existindo forçosamente conflitos entre proprietários e seus animais domésticos.

[74] Como afirmamos em outra oportunidade. Cfr. “Justiça carioca fixa guarda alternada de cachorro após dissolução conjugal”, cit.

[75] Por exemplo, no caso Houseman v. Dare, julgado pela Suprema Corte de New Jersey, as partes exercem a posse alternada do seu cão de treze anos por períodos de 5 meses. No caso Myers v. Myers, julgado em Maryland, muito embora a lei do Estado determine que em caso de desacordo sobre o destino de um animal o mesmo seja vendido e seu produto partilhado entre as partes, o juiz da disputa afirmou que havia apelado para o bom senso ao verificar o amor equiparável das duas partes pelo cachorro. Assim, determinou que cada um tivesse com ele por períodos alternados de 6 meses. Cfr. KOEPSEL, Kirsten M. “A Public Policy Argument for Mediation of Pet Custody Disputes”, em Mid-Atlantic Journal on Law & Public Policy, vol. 2, n. 1, pp. 83-100, 2013, pp.91-92.

[76] Já há precedente judiciais, inclusive no Brasil, no sentido de pagamento de prestação alimentícia in natura (ração de boa qualidade) a cachorros.

[77] Em uma interessante e dispendiosa disputa de custódia sobre um animal adotado em um abrigo, um casal norte-americano, ao dissolver seu casamento concordou que "guarda compartilhada" ou a posse partilhada após o divórcio não teria estaria de acordo com o melhor interesse de sua cadela “Gigi”. Durante o julgamento de três dias, a ex-esposa produziu um vídeo chamado “Um Dia na Vida de Gigi”, com a cadelinha dormindo debaixo de sua cadeira no trabalho, brincado em casa e jogando com bolinhas na praia. A ex-esposa também encomendou e apresentou como prova na corte, em São Francisco, um “estudo de vínculo canino”, de autoria de um especialista em comportamento animal para mostrar ao tribunal que seu estilo de vida era mais adequado para Gigi e que ela tinha atuado como cuidadora principal de Gigi. Depois de levar em consideração o status quo, bem como o papel da mulher como principal cuidadora durante o casamento, o tribunal concordou que Gigi ficaria melhor com a ex-esposa e outorgou-lhe a “guarda” permanente de Gigi. Cfr. BOGDANOSKI, Tony. “Towards an Animal-Friendly Family Law:  Recognising the Welfare of Family Law's Forgotten Family Members”, cit., p. 217.

[78] Cfr. Kotloff, Eric. “All Dogs Go To Heaven... Or Divorce Court: New Jersey Unleashes a Subjective Value Consideration to Resolve Pet Custody Litigation in Houseman v. Dare”, cit., pp. 459-460.

[79] Nesse sentido, afirma-se na doutrina que, não raras vezes, os tribunais norte-americanos impõe àqueles que não ficaram com a “guarda” do animal, responsabilização pela sua manutenção, a pedido da parte que obteve a “guarda”. Ao determinar que quem não obteve a custódia do pet preste alimentos, os juízes terminam por reconhecer que alguns animais de companhia – como filhos – podem ser caros (mormente os cães de grande porte) e que o futuro bem-estar desses animais exige que a sua manutenção por ambas as partes, pós divórcio ou separação, continue até o fim da sua vida. BOGDANOSKI, Tony. “Towards an Animal-Friendly Family Law: Recognising the Welfare of Family Law's Forgotten Family Members”, p. 221.

[80] Cfr. SIMMONS, Schyler P. “What is the Next Step For Companion Pets in the Legal System?: The Answer May Lie With the Historical Development of the Legal Rights For Minors”, cit., p. 274.

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