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A nova lei de trânsito no Brasil: obrigatoriedade do teste de alcoolemia e sua inconstitucionalidade

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04/11/2016 às 14:38
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DAS CONCLUSÕES

É sabido que o álcool e as demais drogas ilícitas são responsáveis por grande parte da violência no mundo inteiro, não sendo diferente no Brasil.

Anualmente, em apenas dois dados oficiais, o Brasil registra 105 ( cento e cinco) mil mortes, sendo 60 mil pessoas assassinadas e 45 mil mortes registradas no Trânsito brasileiro. Certamente, grande parte destas mortes tem vinculação direta com o uso abusivo de drogas.

Nenhum profissional sério pode ignorar estas estatísticas e nem defender o uso de drogas, sejam lícitas ou ilícitas, em atividades recreativas e muito menos nas atividades profissionais.

Agora o que as autoridades públicas não podem e nem devem é querer buscar a solução de problemas sociais atropelando direitos e suprimindo garantias fundamentais conquistadas a duras penas.

Assim, a meu sentir as novas disposições do artigo 165-A, da Lei nº 13.281/2016, que prevê severas consequências para quem recusar a submeter-se a teste ou exame de alcoolemia constitui-se numa insofismável e grave violação do sagrado direito ao silêncio do cidadão e contumélia irremissível ao princípio da não produção de provas contra si, nemo tenetur se detegere, previstas na Constituição da República e no Pacto de San José da Costa Rica, além de constituir clara violação ao princípio do não confisco, isto porque quando a lei impõe uma pena de quase 04 salários mínimos para o ato de recusa, diretamente estará confiscando o próprio bem do condutor.

Imaginamos um condutor de uma motocicleta usada, ano 1990, que se recusa a submeter-se ao teste de alcoolemia. O valor da multa pode ser até superior ao preço de seu veículo.

E mais. Imaginamos que o veículo seja instrumento de trabalho, e o condutor tenha o seu direito de dirigir suspenso por 12 meses.

Isto não seria abrupta supressão ao exercício de atividade profissional, que segundo o inciso XIII, do art. 5º da Constituição da República, "é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer"?

Por fim, é salutar reafirmar para não deixar nenhum resquício de dúvidas sobrevoando nas ondas atmosféricas e nas mentes férteis das pessoas.

Nunca um profissional responsável, de espírito comunitário e comprometido com os ideais de liberdade e valores éticos deve defender e advogar a triste e nefasta combinação perigosa entre álcool e veículo.  

Mas existe uma grande distância entre o profissionalismo na gestão pública eficiente em quaisquer de suas vertentes, executiva, legislativa e judiciária, e a contínua preocupação com a rígida disciplina do modelo de estado democrático de direito.

Violar um princípio é insurgir com pena de morte contra todo o sistema de garantias de um povo fragilizado diante de um estado boçal, avassalador e truculento.

Aliás, conforme assevera CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO, com extrema maestria:

"Violar um princípio é muito mais grave que transgredir uma norma qualquer. A desatenção ao princípio implica ofensa não apenas a um específico mandamento obrigatório, mas a todo o sistema de comandos. É a mais grave forma de ilegalidade ou inconstitucionalidade, conforme o escalão do princípio atingido, porque representa insurgência contra todo o sistema, subversão de seus valores fundamentais, contumélia irremissível a seu arcabouço lógico e corrosão de sua estrutura mestra. Isto porque, com ofendê-lo, abatem-se as vigas que o sustêm e alui-se toda a estrutura nelas esforçada."

Destarte, a meu sentir, respeitando opiniões em contrário, a afoita norma do artigo 165-A da Lei nº 13.281/2016 possui uma sombra quente e incômoda de ilegalidade, sendo, portanto, norma de duvidosa constitucionalidade, matéria que deve ser levada à Suprema Corte Brasileira para decidir a respeito.   

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Sobre o autor
Jeferson Botelho Pereira

Jeferson Botelho Pereira. Ex-Secretário Adjunto de Justiça e Segurança Pública de MG, de 03/02/2021 a 23/11/2022. É Delegado Geral de Polícia Civil em Minas Gerais, aposentado. Ex-Superintendente de Investigações e Polícia Judiciária de Minas Gerais, no período de 19 de setembro de 2011 a 10 de fevereiro de 2015. Ex-Chefe do 2º Departamento de Polícia Civil de Minas Gerais, Ex-Delegado Regional de Governador Valadares, Ex-Delegado da Divisão de Tóxicos e Entorpecentes e Repressão a Homicídios em Teófilo Otoni/MG, Graduado em Direito pela Fundação Educacional Nordeste Mineiro - FENORD - Teófilo Otoni/MG, em 1991995. Professor de Direito Penal, Processo Penal, Teoria Geral do Processo, Instituições de Direito Público e Privado, Legislação Especial, Direito Penal Avançado, Professor da Academia de Polícia Civil de Minas Gerais, Professor do Curso de Pós-Graduação de Direito Penal e Processo Penal da Faculdade Estácio de Sá, Pós-Graduado em Direito Penal e Processo Penal pela FADIVALE em Governador Valadares/MG, Prof. do Curso de Pós-Graduação em Ciências Criminais e Segurança Pública, Faculdades Unificadas Doctum, Campus Teófilo Otoni, Professor do curso de Pós-Graduação da FADIVALE/MG, Professor da Universidade Presidente Antônio Carlos - UNIPAC-Teófilo Otoni. Especialização em Combate à corrupção, crime organizado e Antiterrorismo pela Vniversidad DSalamanca, Espanha, 40ª curso de Especialização em Direito. Mestrando em Ciências das Religiões pela Faculdade Unida de Vitória/ES. Participação no 1º Estado Social, neoliberalismo e desenvolvimento social e econômico, Vniversidad DSalamanca, 19/01/2017, Espanha, 2017. Participação no 2º Taller Desenvolvimento social numa sociedade de Risco e as novas Ameaças aos Direitos Fundamentais, 24/01/2017, Vniversidad DSalamanca, Espanha, 2017. Participação no 3º Taller A solução de conflitos no âmbito do Direito Privado, 26/01/2017, Vniversidad DSalamanca, Espanha, 2017. Jornada Internacional Comjib-VSAL EL espaço jurídico ibero-americano: Oportunidades e Desafios Compartidos. Participação no Seminário A relação entre União Europeia e América Latina, em 23 de janeiro de 2017. Apresentação em Taller Avanco Social numa Sociedade de Risco e a proteção dos direitos fundamentais, celebrado em 24 de janeiro de 2017. Doutorando em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidad Del Museo Social Argentino, Buenos Aires – Argentina, autor do Livro Tráfico e Uso Ilícitos de Drogas: Atividade sindical complexa e ameaça transnacional, Editora JHMIZUNO, Participação no Livro: Lei nº 12.403/2011 na Prática - Alterações da Novel legislação e os Delegados de Polícia, Participação no Livro Comentários ao Projeto do Novo Código Penal PLS nº 236/2012, Editora Impetus, Participação no Livro Atividade Policial, 6ª Edição, Autor Rogério Greco, Coautor do Livro Manual de Processo Penal, 2015, 1ª Edição Editora D´Plácido, Autor do Livro Elementos do Direito Penal, 1ª edição, Editora D´Plácido, Belo Horizonte, 2016. Coautor do Livro RELEITURA DE CASOS CÉLEBRES. Julgamento complexo no Brasil. Editora Conhecimento - Belo Horizonte. Ano 2020. Autor do Livro VIOLÊNCIA DOMÉSTICA. 2022. Editora Mizuno, São Paulo. articulista em Revistas Jurídicas, Professor em Cursos preparatórios para Concurso Público, palestrante em Seminários e Congressos. É advogado criminalista em Minas Gerais. OAB/MG. Condecorações: Medalha da Inconfidência Mineira em Ouro Preto em 2013, Conferida pelo Governo do Estado, Medalha de Mérito Legislativo da Assembléia Legislativa de Minas Gerais, 2013, Medalha Santos Drumont, Conferida pelo Governo do Estado de Minas Gerais, em 2013, Medalha Circuito das Águas, em 2014, Conferida Conselho da Medalha de São Lourenço/MG. Medalha Garimpeiro do ano de 2013, em Teófilo Otoni, Medalha Sesquicentenária em Teófilo Otoni. Medalha Imperador Dom Pedro II, do Corpo de Bombeiros, 29/08/2014, Medalha Gilberto Porto, Grau Ouro, pela Academia de Polícia Civil em Belo Horizonte - 2015, Medalha do Mérito Estudantil da UETO - União Estudantil de Teófilo Otoni, junho/2016, Título de Cidadão Honorário de Governador Valadares/MG, em 2012, Contagem/MG em 2013 e Belo Horizonte/MG, em 2013.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PEREIRA, Jeferson Botelho. A nova lei de trânsito no Brasil: obrigatoriedade do teste de alcoolemia e sua inconstitucionalidade. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 21, n. 4874, 4 nov. 2016. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/53468. Acesso em: 14 nov. 2024.

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