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A interferência do Estado na instituição familiar

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20/09/2018 às 23:54
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Por que a escola não pode interferir na educação sexual de seu filho e por que o Estado brasileiro deve proteção à família?

O presente trabalho tem por finalidade tecer sutis considerações de um importante tema evidente na atualidade, o qual diz respeito às funções e finalidades do poder estatal em relação à instituição familiar.

Notório é, que a função precípua do Estado, conforme previsto nos primeiros artigos da Constituição Federal busca um desenvolvimento político e social, a fim de que diversos conflitos sejam solucionados, tais quais como carências sociais, ocorridas em diferentes grupos da sociedade, assegurando a segurança, a justiça e o bem-estar social para os membros da coletividade, destarte, o Estado visa criar uma estabilidade social.

Sabe-se que para a mantença desses diversos objetivos, principalmente no que se diz respeito a uma coexistência pacífica entre os membros dessa sociedade, o Estado necessita intervir, disciplinando atos de caráter abusivos, intolerantes e contrários ao ordenamento jurídico, reprimindo-os de diversas formas para o restabelecimento do equilíbrio sócio-político de uma sociedade organizada, zelando assim pela garantia da estabilidade e da durabilidade das normas preestabelecidas.

Entretanto, tem-se por alguns que certos atos de reprimenda estatal, constituem-se em atos autoritários de opressão e exercício de um poder despótico, excedendo alguns limites que por certo devem ser respeitados, provocam-se assim, efeitos reversos ao que deveria proporcionar o Estado como garantidor da paz, segurança e do bem-estar social.

Em especifico, tratar-se-á desta interferência no âmbito familiar, verificando as intervenções existentes no ordenamento jurídico, que permitem que o Estado atue de forma significativa e preventiva na família, os pontos assertivos que deve continuar a exercer o Estado, e quais aqueles que não são compatíveis com a ordem e segurança nacional. Analisar-se-á os efeitos da má atuação do poder estatal nessa instituição, principalmente ao que se refere a menores impúberes e os diversos conflitos que os envolve.

Para uma maior compreensão, deve-se a priori, compreender a instituição familiar, quais são suas funções, garantias, direito e deveres.

O estudo pormenorizado do assunto pretendido tem por objetivo a compreensão da atuação estatal, reavaliando os atos repressivos do Estado que poderão afetar a sociedade de maneira prejudicial, principalmente no que concerne a família. Ademais traz o entendimento do que se pode e o que se deve modificar, aperfeiçoando ideias e desenvolvendo melhorias sociais, tanto nas atuações do Estado, quanto no seio da própria família. Destarte, passar-se-á a entender quais as questões emergenciais que devem ser tomadas pelo Estado para reprimir atos incompatíveis com o bem social e seguridade da coletividade, e quais ultrapassam o poder que lhe é atribuído.


Família

Nos primórdios da História o chefe da família, que se tratava do ascendente mais velho detinha o direito de punir os seus membros. Nessa etapa da evolução social a família acabara por vingar as ofensas sofridas por um dos seus membros enquanto que o chefe punia qualquer dos familiares que violasse as tradições da família até mesmo com a morte. Posteriormente as famílias foram se submetendo a autoridades, como os mais sábios, ou mais valentes. Com o passar do tempo o poder exercido tornou-se impessoal e institucionalizado pertencendo a uma sociedade juridicamente organizada, conhecida como Estado. (GUSMÃO, 2008, p.364/365).

Derivado do latim família, de famel (escravo doméstico), em sentido estrito se trata de uma sociedade conjugal; em sentido lato quer dizer: “conjunto de pessoas ligadas pelo vinculo de consanguinidade” (Clovis Bevilaqua, apud, SILVA, 2010, p. 351). Em regra, procedem de um tronco ancestral comum, entretanto, podem ser consideradas aquelas que se formam a partir de adoção ou mesmo por afinidade.

Segundo Eunice Ribeiro Durham, “famílias são grupos sociais estruturados por meio de relações de afinidade, descendência e consanguinidade e se constituem em unidade de reprodução humana”. Para Elisabeth Jelin “a família é uma instituição formadora de futuras gerações e mediadora entre a estrutura social e o futuro dessa estrutura” (apud, SILVA e SILVA, 2010, p. 137. e p. 139.).

A família, como instituição social, é uma entidade anterior ao Estado, anterior à própria religião e também ao direito. É uma instituição que resistiu a todas as transformações que sofreu a humanidade, quer de ordem consuetudinária, econômica, social, científica, social ou cultural, através da história da civilização, sobrevivendo praticamente incólume (OLIVEIRA, 2002, p. 22).

Pode se dizer que a família é a base da sociedade e tem especial proteção do Estado (art. 226 C.F) logo, se aquela não existisse não haveria este, assim a família está de fato e sem sombra de dúvida interligada a formação moral do indivíduo e sua integração no convívio social.

Além do Estado, como organização social há grupos sociais menores que cooperam com o Estado em algumas áreas, visando sempre o bem comum, esses devem ter liberdade suficiente para desenvolver suas atividades, sendo amparados pelo Estado toda vez que lhe faltarem condições para o exercício de seu pleno direito. Um desses grupos de cooperação com o Estado é a instituição familiar (DE CICCO e GONZAGA, 2011, p. 138 e 139). 1

Observa-se claramente a intenção do legislador no art. 227 da CF ao declarar que a educação é dever da família, da sociedade e do Estado.

A milenar proteção da família como instituição, unidade de produção e reprodução dos valores culturais, éticos, religiosos e econômicos, dá lugar à tutela essencialmente funcionalizada à dignidade de seus membros, em particular no que concerne ao desenvolvimento da personalidade dos filhos. (Apud, TEPEDINO, 1997. p. 397).

O Estado deve fornecer à família condições adequadas para o crescimento e proteção desta, garantindo recursos educacionais, científicos e morais aos indivíduos que compõe esse grupo, ademais, deve fornecer suporte financeiro para que possam ter uma vida digna atendendo suas necessidades básicas.


Do poder familiar

Poder familiar é o poder que exerce os pais sobre os filhos em educação e desenvolvimento dos mesmos, os pais têm a obrigação de zelar e proteger os filhos até que este alcance a maioridade e a devida capacidade civil. Os pais devem assistir criar e educar os filhos menores, e os maiores tem o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade. Em síntese, exercer o poder familiar é participar de forma ativa na vida dos filhos menores (LUZ, 2009, p. 257).

Pode-se dizer que se trata de um conjunto de direitos e deveres incumbindo aos pais, o desenvolvimento dos filhos no que tange a formação do indivíduo como pessoa e o dever de zelar pelos bens da prole.

Washington de Barros Monteiro define o poder familiar “...como o conjunto de obrigações, a cargo dos pais, no tocante à pessoa e bens dos filhos menores. Por natureza, é indelegável”.

Trata-se de uma necessidade natural na qual “não basta alimentá-los e deixá-los crescer a lei da natureza” Deve os pais educá-los e dirigi-los. (GONÇALVES, 2013, p. 307)

A natureza do poder familiar é personalíssima, sendo irrenunciável e indelegável. O poder familiar não pode ser alienado nem renunciado, delegado ou substituído, todavia há exceções como o consentimento para que terceiro adote o filho ou em caso de suspensão ou perda do poder familiar decorrente de processo judicial assegurado o contraditório e ampla defesa (LUZ, 2009, p. 257).

O art. 166 do Estatuto da Criança e do Adolescente estabelece quanto ao pedido de colocação do menor em família substituta, todavia este deve ser feito em juízo, sendo apreciados pelo Juiz os motivos que ensejam a procedência do pedido.

Enquanto menores os filhos se sujeitam ao poder familiar (art. 160 do Código Civil). Assim que atingido a maioridade tal poder será extinto, entretanto, antes de atingido a maioridade poderá ocorrer à extinção do poder familiar, em casos de emancipação, previstos no parágrafo único de art. 5º do Código Civil.


Limites para atuação estatal

O limite para atuação do Estado nas instituições, não só na família, mas nas demais instituições que cooperam com ele, é a liberdade individual de cada um, tendo respeito às decisões, opiniões e a dignidade da pessoa humana.

Cabe aos pais o desenvolvimento dos filhos, aos filhos o de obediência e ao Estado cabe formular políticas de auxílio à criança e adolescente como em casos de atuação abusiva dos pais, aplicando as consequências previstas em lei, tais como a suspensão e a destituição do poder familiar, conforme apreciadas anteriormente, sanções estas aplicadas aos genitores que colocam em perigo a segurança ou a dignidade do filho.

Enquanto que a família exerce função basilar na formação íntegra e moral desses indivíduos em desenvolvimento, a intervenção do Estado no poder familiar evita excessos por parte dos genitores, ou seja, o Estado nada mais é que um ente público que atua de forma a fiscalizar as relações familiares.

O Código Civil, em seu artigo 1513, retrata que é defeso a qualquer pessoa de direito público ou privado interferir na comunhão da vida instituída pela família, cabendo aos pais o controle sobre a família e ao Estado o papel de formular e executar a política de atendimento aos direitos da criança e do adolescente, juntamente com a sociedade, controlando os excessos na atuação dos pais ou quando estes não cumprem o disposto em lei.

Conforme descrito nos capítulos anteriores é perceptível à intervenção do Estado nas relações paterno-filiais. Entretanto não deve haver confusão entre o dever da família para com seu filho e o dever do Estado no controle dessa relação. Infelizmente o que se vê na atualidade é uma inversão de funções, com o Estado interferindo nas áreas que não lhes é devida e deixando de cumprir o fim pelo qual foi instituído, pois este não pode livremente convencionar direitos e deveres, visto que já estão definidos imperativamente pela Lei do Direito de família.


AnÁlise de medidas estatais no âmbito familiar.

Lei da Palmada - Lei 13.010/14.

A Lei da Palmada se trata de alterações na Lei 8.069/90 (Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA), e na Lei 10.406/02 (Código Civil), decorrendo de uma emenda constitucional que tramitava desde 2010 no Congresso Nacional.

A referida Lei busca uma mudança cultural e tem o objetivo de definir como sendo “castigo corporal” toda “ação de natureza disciplinar ou punitiva com o uso da força física que resulte em dor ou lesão à criança ou adolescente”, cominando aos “infratores” penas que vão da “advertência”, passando pelo “encaminhamento a programas de proteção à família” e “orientação pedagógica”. Vale ressaltar que não se aplica apenas ao ambiente doméstico, mas também a cuidadores de crianças e adolescentes - na escola, nos abrigos, nas unidades de internação.

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O legislador definiu nos incisos I e II do art. 18-A, o castigo físico e tratamento cruel ou degradante. In verbis:

I – Castigo físico: ação de natureza disciplinar ou punitiva com o uso de força física que resulte em: sofrimento físico ou lesão à criança e ao adolescente;

II - Tratamento cruel ou degradante: conduta ou forma cruel de tratamento que humilhe, ameace gravemente ou ridicularize a criança ou o adolescente.

Quanto às sanções aplicáveis ao infrator estas estão elencadas no Art. 129 do mesmo dispositivo, in verbis:

São medidas aplicáveis aos pais ou responsável:

I - encaminhamento a programa oficial ou comunitário de proteção à família;

II - inclusão em programa oficial ou comunitário de auxílio, orientação e tratamento a alcoólatras e toxicômanos;

III - encaminhamento a tratamento psicológico ou psiquiátrico;

IV - encaminhamento a cursos ou programas de orientação;

V - obrigação de matricular o filho ou pupilo e acompanhar sua frequência e aproveitamento escolar;

VI - obrigação de encaminhar a criança ou adolescente a tratamento especializado;

VII - advertência;

VIII - perda da guarda;

IX - destituição da tutela;

X - suspensão ou destituição do familiar. (Expressão substituída pela Lei nº 12.010, de 2009)

Parágrafo único. Na aplicação das medidas previstas nos incisos IX e X deste artigo, observar-se-á o disposto nos arts. 23 e 24”.

Tal Lei provocou uma série de questionamentos na população e gerou críticas tanto positivas quanto negativas. Um dos pontos mais questionáveis neste novo diploma é quanto ao critério que será utilizado pelo autor da denúncia ou dos conselhos tutelares, logo os pais ou responsáveis ficarão à mercê de critérios subjetivos de quem os denuncie.

Para a maioria dos pais a Lei representa uma interferência direta do Estado na forma como os pais devem educar os filhos. O novo dispositivo é visto por muitos como verdadeira agressão do Estado à instituição familiar, segundo a nova lei, os pais ou responsáveis considerados “infratores” serão submetidos a tratamento “psicológico ou psiquiátrico”, por ter dado uma palmada educativa num filho.

Os que defendem a Lei se fundamentam na arguição de que o castigo físico deve ser extinto, pois não tem nenhum objetivo educativo, alegam estes não ser um método adequado para adquirir o respeito e obediência das crianças e dos adolescentes. Destarte, defendem como melhor forma de educar o diálogo entre pais e filhos (MOREIRA, 2010).

Um ponto questionável e de relevância, é que a referida lei prevê, mas não define políticas ou programas de tratamento, não aponta recursos, tampouco quais os estabelecimentos que serão submetidas tais crianças e adolescentes (inciso VI do diploma supracitado) (JUNIOR, 2014).

Tal lacuna no referido dispositivo provoca certa instabilidade e insegurança jurídica, não impedindo que a criança seja separada da família e internada em estabelecimento inadequado ou em regime de internato, sem comunicação com os pais durante certo período (JUNIOR, 2014).

No entanto o mais grave são as “outras sanções cabíveis” a que se refere o referido dispositivo, por exemplo, pode gerar até a perda do poder familiar.

O artigo 1634 da Lei 10.406, de 10/01/2002 (novo Código Civil), passa a ter seguinte redação:

Art. 1634 – Compete aos pais, quanto à pessoa dos filhos menores:

VII. Exigir, sem o uso de força física, moderada ou imoderada, que lhes prestem obediência, respeito e os serviços próprios de sua idade e condição.

Conforme descrito acima o artigo 1.634 do Código Civil proíbe o uso de qualquer força física, moderada ou mesmo imoderada. Entretanto mais uma vez há um impasse quanto à questão, pois o Estado não explica como os pais poderão “exigir”, sem o uso de força física, moderada ou imoderada, de seus filhos que lhes prestem a obediência e o respeito (MOREIRA e TREVIZANI, 2016)

Quando um pai sente necessidade de corrigir um filho usando este tipo de ação e depois sofre por tê-lo feito, significa que preferia não ter usado a palmada, mas não teve alternativa. Significa que tentou de outras formas, mas não conseguiu. E é importante conseguir mostrar à criança que ela tem limites e que existem regras que devem ser seguidas. Dentro de uma família deve e precisa existir hierarquia Saber e determinar o que pode e o que não pode. Importante esclarecer que dizer NÃO, não significa rejeição ou agressão ao filho. Na verdade, o NÃO pode e deve ser uma demonstração de uma crença na capacidade e força dele. A noção de que se pode atender todas as necessidades da criança de forma a poupá-la de qualquer dor somente terá como resultado uma criança desadaptada e sem preparo para a vida em sociedade. Mas quando o NÃO, não funciona, resta aos pais a demonstração física do não. E esta demonstração é exatamente a palmada. Note-se que falamos em palmada. Não exaltamos o uso da força e da violência, mas o uso físico do NÃO. (RODRIGUES e TOMÉ, 2014).

Deveras, diariamente muitas crianças são espancadas sendo física e moralmente maltratadas. No entanto, há que se discriminar a prática abusiva da não abusiva referente aos meios de correção ou disciplina, visto que apenas a primeira deve ser punível. Com efeito, a Lei Penal prescreve os crimes tais como maus tratos e lesões corporais, logo esta ter-se-ia por suficiente para coibir os excessos por parte dos pais. Não havendo necessidade do novo dispositivo.

Em entrevista concedida ao Jornal “Hoje Em Dia” a juíza Luziene Barbosa Lima, da 6ª Vara Criminal de Belo Horizonte, considera inócua a medida. Para ela, a nova lei invade a liberdade de um pai corrigir seus filhos dentro dos princípios constitucionais. “Não vejo mal algum em aplicar palmadinhas e, sobretudo o diálogo para impor limites. O que é inadmissível são agressões físicas extremas”, disse, considerando que é comum no Brasil formular leis sem analisar o aspecto cultural da educação da família. Observa ainda a magistrada que o Estado costuma implementar novas leis mas não implementa políticas educacionais para que elas sejam devidamente respeitadas. “No caso da ‘lei da palmada’, não há programas sociais que garantam as penalidades”, diz. (MOREIRA e TREVIZANI, 2016).

Não se pode esperar que valores (certos ou errados), sempre presentes em nossa cultura sejam mudados de uma hora para outra sem ao menos fornecer alternativa eficaz aos pais e responsáveis.

Há um exagero deliberado do poder soberano, pois o Estado não apresentou quaisquer soluções ou alternativas, somente impôs uma conduta à sociedade.

Com efeito, assevera a advogada Carmen Nery, especialista em administração legal, que a lei interfere em assuntos familiares e pode gerar um denuncismo que sobrecarregaria o Judiciário. "Agora, o juiz vai verificar se tal chinelada fere ou não fere a Lei da Palmada", diz. (RODRIGUES e TOMÉ, 2014)

O que chama atenção de muitos, é que o Estado que sempre esteve alheio às necessidades familiares e que nunca amparou de fato o bem-estar da família esteja por agora interferindo de forma invasiva na instituição, alegando como justificativa “proteger a criança e o adolescente”. Questiona-se assim, a atuação efetiva desse “Estado” protetor nas escolas.

Mais de 2 mil anos após o ensinamento de Pitágoras, o Estado brasileiro continua a adotar medidas inócuas e imediatas para reprimir a violência, em vez de investir nas políticas públicas voltadas às crianças, diz administradora-executiva da Fundação Abrinq”. Por volta de 500 anos a.C., Pitágoras, pai do conceito de Justiça, norteadora do Direito, declarou: “Educai as crianças para que não seja necessário punir os adultos” (OLIVEIRA, 2014).

Observa-se ainda que os autores da referida Lei são os mesmos que pregam a descriminalização do uso das drogas, deixando claro que o fim não é proteger crianças, jovens e adolescentes da violência, mas o fim é meramente político.

Até pouco tempo atrás o Estado alegava que a educação era responsabilidade da família. Porém busca atualmente impedir que a família eduque seus filhos da maneira como entendem ser correto, ainda que para os pais se trata de correção coerente. Tem-se por muitos que a verdadeira correção moderada forma um cidadão de respeito, sem que esta criança ou adolescente precise futuramente sofrer nas mãos de policiais ou bandidos.

"A família não é uma democracia. E as crianças não têm os mesmos direitos e deveres que os pais. Porque, no fim das contas, os pais é que são os adultos e têm de assumir as suas responsabilidades" (PHILLIPS, 2009).

Destarte, tem-se por claro e esclarecido que os pais devem exercer com autonomia sua função de detentor da autoridade na entidade familiar, sem interferências arbitrarias do Estado, sendo que aos pais pertence o poder familiar, e ao Estado o poder de coibir os abusos do exercício desse poder que deveria os pais exercer com a devida responsabilidade.

Cartilhas de caráter sexual nas escolas

Existem várias tentativas, infelizmente aprovadas pelo MEC, de educar crianças de 6 a 12 anos sexualmente, exemplificando e explicando sobre o ato sexual, prazer e masturbação.

Tem-se por maioria da população, com razão, que tais cartilhas de teor sexual são impróprias para as crianças ainda mais se estas estão entre 6 e 12 anos.

Preceitua de maneira clara e coerente o Estatuto da Criança e do adolescente:

Art. 79. As revistas e publicações destinadas ao público infanto-juvenil não poderão conter ilustrações, fotografias, legendas, crônicas ou anúncios de bebidas alcoólicas, tabaco, armas e munições, e deverão respeitar os valores éticos e sociais da pessoa e da família.

A criança é influenciada pelo que vê, sendo altamente influenciável e não sabe ainda distinguir o que é adequado para a sua idade. Até porque se fosse o contrário, esta não necessitaria da figura dos pais, detentores do poder familiar. A criança conforme determina o artigo 3º do Código Civil é absolutamente incapaz de exercer pessoalmente os atos da vida civil.

Além de o fato ser indiscutivelmente de caráter inconstitucional e ilegal, consiste em violação aos direitos da criança e do adolescente e da família, além de ferir o princípio da dignidade da pessoa humana.

Neste sentido, preleciona o próprio Estatuto da Criança e do Adolescente:

Art. 17. O direito ao respeito consiste na inviolabilidade da integridade física, psíquica e moral da criança e do adolescente, abrangendo a preservação da imagem, da identidade, da autonomia, dos valores, idéias e crenças, dos espaços e objetos pessoais.

Art. 18. É dever de todos, velar pela dignidade da criança e do adolescente, pondo-os a salvo de qualquer tratamento desumano, violento, aterrorizante, vexatório ou constrangedor.

Em matéria divulgada pela revista VEJA: “Propaganda de cigarro influencia crianças de 5 e 6 anos” fica evidente que crianças são influenciadas através de propagandas, imagens e informações que lhe são expostas.

Foi realizada pesquisa em seis países (Brasil, China, Índia, Nigéria, Paquistão e Rússia), com o maior número de adultos fumantes do globo, segundo dados de 2011 da Organização Mundial da Saúde. Os pesquisadores mediram o nível de influência das propagandas de cigarro nas crianças, analisando se elas eram capazes de reconhecer logotipos de diversas marcas de cigarros. Os resultados foram considerados alarmantes: das 2.243 crianças que participaram do estudo, 68% reconheceram ao menos uma marca do produto (VEJA 2013).

Por estarem em fase de desenvolvimento às crianças não distinguem o caráter persuasivo ou as conotações irônicas embutidas em informações, propagandas entre outras formas de divulgações.

A infância preservada e cuidada é a base para uma vida adulta saudável. Por meio do brincar, a criança aprende e exercita sua criatividade, expressa seus talentos inatos e vai constituindo sua personalidade de um modo lúdico e prazeroso. Ao ingressar prematuramente no mundo adulto, com o corpo e a mente ainda em formação, a criança, ou mesmo o pré-adolescente, não tem estrutura física e psicológica formada para defender seus direitos, controlar seus impulsos, reivindicar respeito e, muito menos, identificar em si um desejo genuíno de relacionar-se sexualmente. Portanto, ao induzir as crianças a desejarem o que nem sabem se desejariam e a adotarem valores distorcidos e artificiais, a publicidade atropela a infância, contribuindo para mudanças no curso natural do desenvolvimento infantil” (CRIANÇA E CONSUMO, 2009).

Ainda que crianças estejam iniciando a vida sexual mais cedo, não se justifica a distribuição de tais cartilhas, não se pode incentivar tal ato, pois as crianças dessa faixa etária ainda não têm formação física e nem psicológica adequada. A alternativa de fato mais coerente para aquelas que iniciam sua atividade sexual precocemente é fornecer programas de orientação através de meios conscientizadores.

Lamentavelmente, o que se observa hoje, em muitos casos, é um processo de adultização da criança, borrando ainda mais os limites entre a infância e o adulto, e interferindo no processo de constituição de sua identidade. Esse processo provoca a inserção prematura da criança no universo adulto, exigindo dela competências que ela ainda não está preparada para exercer. Torna a própria criança alvo de consumo, deixando-a vulnerável, exposta e sem estrutura para proteger-se. Significa roubar-lhe um tempo precioso da vida induzindo-a a um comportamento adulto. (SALVA, 2014).

Outro ponto debatido que vale analisar, é que esta exposição da criança e do adolescente a tais conteúdo é uma grande porta para a prática da pedofilia, podendo levar a legalização de tal ato como apoiam algumas minorias ideológicas apoiadas por certos partidos políticos.

Segundo a teoria psicanalítica, a maioria das crianças, por volta dos seis anos, entra em uma fase denominada latência, que corresponde ao período entre a segunda infância e a adolescência... E é nesse período que a criança canaliza a produção da energia sexual para sua socialização e aprendizagem, além de ser também um tempo providencial para o alcance de sua maturidade genital e para a construção das barreiras psíquicas que a ajudarão, mais tarde, a conter e administrar o instinto sexual. Porém, essa fase de latência é como um sono leve, do qual a criança pode ser despertada precocemente caso seja exposta a mensagens inadequadas à sua idade. É por isso que os estímulos de cunho erótico antes da consolidação desse processo podem ser responsáveis por muitos distúrbios. (CRIANÇA E CONSUMO, 2009).

Conforme mencionado nos capítulos anteriores à família cabe o papel de ensinar os filhos, inclusive, moralmente, a própria lei elenca diversos deveres desta instituição para com a prole.

O art. 12 da Convenção Americana sobre Direitos Humanos em que o Brasil é signatário, assinada na Conferência Especializada Interamericana sobre Direitos Humanos, em San José, Costa Rica, em 22 de novembro de 1969 declara, in verbis:

“Os pais, e quando for o caso os tutores, têm direito a que seus filhos ou pupilos recebam a educação religiosa e moral que esteja acorde com suas próprias convicções”.

Logo a educação moral e religiosa cabe aos pais e não existe qualquer previsão que transfira esse direito às escolas.

Ademais os pais têm a responsabilidade de educar os filhos, não o fazendo responderão pela negligência, conforme descreve Art. 249.do Estatuto da Criança e do adolescente, in verbis:

Descumprir, dolosa ou culposamente, os deveres inerentes ao pátrio poder familiar ou decorrente de tutela ou guarda, bem assim determinação da autoridade judiciária ou Conselho Tutelar: (Expressão substituída pela Lei nº 12.010, de 2009) Vigência Pena - multa de três a vinte salários de referência, aplicando-se o dobro em caso de reincidência.

Destarte, é a família que tem a obrigação de zelar pela educação moral da criança e se não o fizer esta será responsabilizada e não a escola, Ministério Público ou Conselho tutelar.

Infelizmente o que se nota atualmente é que crianças e adolescentes estão cada vez mais indefesas dentro das próprias escolas. É consenso entre a maioria que educação sexual não é função da escola cabendo a ela apenas a educação cientifica e biológica.

Conforme pesquisa feita pela Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE), em Paris, em uma lista de 64 países baseando-se em dados de 2012, “o Brasil é segundo país com pior nível de aprendizado, cerca de 12,9 milhões de estudantes com 15 anos de idade não têm capacidades elementares para compreender o que leem, nem conhecimentos essenciais de matemática e ciências” (ISTOÉ, 2016)

Conforme visto o Estado infelizmente não tem capacidade para tratar do referido assunto, se analisar de maneira crítica, porém real, o Estado mal consegue cumprir as funções que lhe são próprias, seria incoerente acreditar que este possa substituir a Instituição Familiar e educar sexualmente crianças e adolescentes incentivando-os a precocidade sexual.

Ao Estado cabe salvaguardar a liberdade das famílias, de modo que estas possam escolher com retidão a escola ou os centros que julguem mais convenientes para a educação dos seus filhos. Certamente, no seu papel de tutelar o bem comum, o Estado possui determinados direitos e deveres sobre a educação, mas tal intervenção não pode chocar com a legítima pretensão dos pais de educar os seus próprios filhos em consonância com os bens que eles defendem e vivem, e que consideram enriquecedores para a sua descendência. (MOREIRA, 2016).

Vale mencionar o comentário de Magali dos Reis - Doutora em educação infantil e professora na PUC Minas. “Em educação infantil não se usa cartilha. Nessa idade é necessário brincar. A sexualidade, apenas como forma de diferenciação entre menina e menino, deve ser naturalizada e não ressaltada” (...)

Essas abusividades do Estado nos remete a insegurança, pois se invasivamente o mesmo adentra na esfera por ele constitucionalmente protegida o que se supõe é que este pode agir em qualquer área nos remetendo a instabilidade de regime. Considerando a interferência abusiva não é absurdo imaginar que em poucos tempos poder-se-ia alterar o regime democrático para o autoritarismo monárquico.

Quanto a cartilhas que abordam a homossexualidade, sua divulgação e distribuição nas escolas também se tratam de abusiva invasão aos Direitos de Família e afetam os direitos e garantias inerentes a esta conforme visto no art. 12 da Convenção Americana de Direitos humanos, supramencionada.

Não se trata a questão de preconceito quanto à opção sexual, mas de invadir a instituição familiar e seus princípios, além de induzir uma maturidade precoce para as crianças, o que é inaceitável. “Tentar normalizar o gay dentro das escolas é uma violência a quem pensa e projeta a educação de seus filhos de forma diferente”. (CANAL GAMA, 2013)

Ainda que haja discordância é inegável que esse é um direito que ampara a família.

Não se deve tratar a questão do ponto de vista religioso, mas sim com embasamento no simples direito a que tem a família de educar seus filhos conforme valores e princípios próprios (art. 12 da Convenção Americana de Direitos humanos).

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Sobre a autora
Keila Taynã da Silva

Advogada - Graduada em Direito com OAB/concluída em: 2016 Faculdade Anhanguera - Jundiaí /SP Atuação na área Jurídica na avaliação de provas documentais e orais, apresentação de pareceres e acompanhamento de processos. Trabalho social - assistência jurídica a pessoas carentes.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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