4. Qual a data do início do benefício da aposentadoria por invalidez, quando o segurado pleiteia o melhoramento ou a proteção de aposentadoria por invalidez anteriormente já implementada pelo INSS?
A data do início do benefício da aposentadoria por invalidez será a data da citação válida em juízo do INSS (DIB=DCV) igualmente nas circunstâncias em que o segurado pleiteia o melhoramento ou a proteção de aposentadoria por invalidez anteriormente já concretizada pela autarquia previdenciária federal (implementada seja por decisão administrativa da entidade previdenciária, seja por força de ordem judicial), a exemplo de pedidos de (a) revisão de aposentadoria por invalidez para valor mais vantajoso para o segurado ou de (b) conversão do benefício previdenciário respectivo em modalidade mais vantajosa (por exemplo, a pretensão de que o auxílio-doença se convole em aposentadoria por invalidez), bem como de (c) restabelecimento ou de (d) manutenção de aposentadoria por invalidez, casos em que o segurado poderá deflagrar diretamente a jurisdição do Poder Judiciário, salvo se o exame do mérito da causa judicial previdenciária implicar a análise de matéria de fato ainda não levada ao conhecimento da Administração Previdenciária, o que ocasionará a extinção do processo judicial sem a resolução do mérito, por ausência de interesse de agir.
Quanto à dispensa da prévia postulação administrativa, quando o segurado não está pleiteando a obtenção original de um benefício previdenciário e sim o seu melhoramento ou a proteção (evitação da perda) de benefício anteriormente materializado pela Administração Previdenciária, vale a pena se proceder à leitura dos itens 29 a 33 do didático voto condutor do Ministro-Relator Roberto Barroso, proferido em 3 de setembro de 2014, no julgamento paradigmático do multicitado Recurso Extraordinário n.º 631.240/MG (o qual, reprisa-se, proporcionou a Tese do Tema de Repercussão Geral n.º 350):
[...] 29. As principais ações previdenciárias podem ser divididas em dois grupos: (i) demandas que pretendem obter uma prestação ou vantagem inteiramente nova ao patrimônio jurídico do autor (concessão de benefício, averbação de tempo de serviço e respectiva certidão etc.); e (ii) ações que visam ao melhoramento ou à proteção de vantagem já concedida ao demandante (pedidos de revisão, conversão de benefício em modalidade mais vantajosa, restabelecimento, manutenção etc.).
30. No primeiro grupo, como regra, exige-se a demonstração de que o interessado já levou sua pretensão ao conhecimento da Autarquia e não obteve a resposta desejada. No segundo grupo, precisamente porque já houve a inauguração da relação entre o beneficiário e a Previdência, não se faz necessário, de forma geral, que o autor provoque novamente o INSS para ingressar em juízo.
31. Isto porque, como previsto no art. 88 da Lei nº 8.213/1991, o serviço social do INSS deve “esclarecer junto aos beneficiários seus direitos sociais e os meios de exercê-los e estabelecer conjuntamente com eles o processo de solução dos problemas que emergirem da sua relação com a Previdência Social, tanto no âmbito interno da instituição como na dinâmica da sociedade”. Daí decorre a obrigação de a Previdência conceder a prestação mais vantajosa a que o beneficiário faça jus, como prevê o Enunciado nº 5 do Conselho de Recursos da Previdência Social (“A Previdência Social deve conceder o melhor benefício a que o segurado fizer jus, cabendo ao servidor orientá-lo nesse sentido”).
32. Assim, uma vez requerido o benefício, se for concedida uma prestação inferior à devida, está caracterizada a lesão a direito, sem que seja necessário um prévio requerimento administrativo de revisão. A redução ou supressão de benefício já concedido também caracteriza, por si só, lesão ou ameaça a direito sindicável perante o Poder Judiciário. Nestes casos, a possibilidade de postulação administrativa deve ser entendida como mera faculdade à disposição do interessado.
33. Portanto, no primeiro grupo de ações (em que se pretende a obtenção original de uma vantagem), a falta de prévio requerimento administrativo de concessão deve implicar a extinção do processo judicial sem resolução de mérito, por ausência de interesse de agir. No segundo grupo (ações que visam ao melhoramento ou à proteção de vantagem já concedida), não é necessário prévio requerimento administrativo para ingresso em juízo, salvo se a pretensão depender da análise de matéria de fato ainda não levada ao conhecimento da Administração. Há, ainda, uma terceira possibilidade: não se deve exigir o prévio requerimento administrativo quando o entendimento da Autarquia Previdenciária for notoriamente contrário à pretensão do interessado. Nesses casos, o interesse em agir estará caracterizado. [...] (BRASIL, 2018h, grifos nossos)
Ante o exposto, formulam-se, para fins de exemplificação, as seguintes hipóteses:
Hipótese n.º 1: Se o INSS, ao decidir acerca de requerimento administrativo protocolizado pelo segurado perante a autarquia previdenciária, concedeu benefício previdenciário inferior ao devido e o segurado prejudicado, ao vergastar tal decisão administrativa, provocou diretamente o Poder Judiciário (não interpôs recurso administrativo ou qualquer outra impugnação administrativa), a data do início de benefício quanto ao novo valor da aposentadoria por invalidez será a data da citação válida em juízo da autarquia previdenciária federal (DIB=DCV).
Hipótese n.º 2: Se o INSS reduziu ou suprimiu aposentadoria por invalidez e o segurado prejudicado, ao atacar tal decisão administrativa, provocou diretamente o Poder Judiciário (não interpôs recurso administrativo ou qualquer outra impugnação administrativa), a data do início de benefício quanto ao valor restabelecido da aposentadoria por invalidez será também a data da citação válida da entidade previdenciária (DIB=DCV).
Com efeito, se o segurado-administrado-jurisdicionado opta pelo acionamento direto da via judiciária, deve arcar com o ônus correspondente de que a data do início do pagamento do valor revisado ou restabelecido do benefício seja o dia em que, mediante a citação válida do INSS, a autarquia previdenciária federal se tornou ciente do pleito daquele.
4.1 Súmula TNU n.º 22
Ambas as atuais orientações jurisprudenciais acima referidas, defluentes do STF (Recurso Extraordinário n.º 631.240/MG e Tese do Tema de Repercussão Geral n.º 350) e do STJ (Recurso Especial n.º 1.369.165/SP, Tese do Tema de Recurso Repetitivo n.º 626 e Súmula STJ n.º 576), delineadas no contexto do Regime Geral da Previdência Social, discrepam da antecedente orientação da Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais consignada na contextura da Assistência Social e consubstanciada na Súmula TNU n.º 22, de 31 de agosto de 2004, centrada no laudo médico-pericial como norte para se definir a data do início do benefício:
Súmula TNU n.º 22
Se a prova pericial realizada em juízo dá conta de que a incapacidade já existia na data do requerimento administrativo, esta [data do requerimento administrativo] é o termo inicial do benefício assistencial. (BRASIL, 2018m, grifos nossos)
É que a Súmula TNU n.º 22 havia sido editada em uma conjuntura pretoriana diferente, porque a sua redação foi baseada em julgados da época que, promanados das Turmas Recursais dos Juizados Federais do Mato Grosso (Processo Judicial n.º 2003.36.00.700272-7) e do Distrito Federal (Processo Judicial n.º 2002.34.00.70.4413-7), bem como do STJ (Recursos Especiais n.os 305.245/SC, 475.388/ES e 478.206/SP), reverberaram orientação pretoriana diversa da que hoje predomina no STJ e no STF, no que diz respeito ao termo inicial de benefício da Seguridade Social, visto que naquela tessitura jurisprudencial pretérita o laudo médico-pericial definia qual seria a data do início do benefício a ser adimplido pelo INSS.
É sintomático, por exemplo, este trecho da ementa do precitado Recurso Especial n.º 475.388/ES (rememore-se, invocado pela TNU como um dos precedentes judiciais a lastrearem a sua Súmula n.º 22):
[...] O termo inicial para a concessão da aposentadoria por invalidez é a data da apresentação do laudo pericial em juízo, caso não tenha sido reconhecida a incapacidade na esfera administrativa. [...] (BRASIL, 2018f, grifos nossos)
Também é uma fotografia daquele panorama jurisprudencial de outrora (diverso do atual) esta passagem da ementa do acórdão do supracitado Recurso Especial n.º 478.206/SP (também inserido pela TNU no rol de precedentes judiciais a alicerçarem a sua Súmula TNU n.º 22):
[...] É pacífica a jurisprudência desta Corte no sentido de que, em se tratando de benefício decorrente de incapacidade definitiva para o trabalho, ou seja, aposentadoria por invalidez, o marco inicial para a sua concessão, na ausência de requerimento administrativo, será a data da juntada do laudo médico-pericial em juízo. [...] (2018d, grifos nossos)
Em outros dizeres, os acórdãos que serviram de espeque para a redação da Súmula TNU n.º 22 foram lavrados em uma época em que o laudo médico-pericial apresentado em juízo influía na demarcação da data do início de benefício da Seguridade Social (Assistência Social e Previdência Social), seja quando definia a data do início do benefício como sendo a data da entrada do requerimento (DIB=DER), ao afiançar que a incapacidade era contemporânea à data em que protocolizada a petição administrativa, tal qual divisa, de modo expresso, a própria Súmula TNU n.º 22, seja quando, na ausência de prévia postulação administrativa, fixava a data da juntada em juízo do laudo médico-pericial como termo inicial da aposentadoria por invalidez (DIB=DJJL), a exemplo do preconizado pelos julgados dos Recursos Especiais n.os 475.388/ES e 478.206/SP, cujas ementas foram acima reproduzidas e restaram inseridos no rol de julgados que embasou a concepção da Súmula TNU n.º 22.
Portanto, em verdade, a Súmula TNU n.º 22 foi uma tentativa de definir no seio da Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais o papel a ser exercido pelo laudo judicial médico-pericial como pilastra para se demarcar a data do início do benefício da Assistência Social, em um momento da jurisprudência (convém rememorar) em que o LMP tinha um papel influente para definir, de forma geral, o termo inicial do benefício da Seguridade Social, (a) quer apontando a data do início do benefício como sendo a data da entrada do requerimento administrativo no âmbito do INSS (DIB=DER), ao atestar que a incapacidade já existia quando da postulação administrativa, (b) quer servindo de reforço para a orientação jurisprudencial de que, na ausência de antecedente requerimento administrativo, a data da juntada em juízo do laudo médico-pericial consubstanciaria a data do início de benefício (DIB=DJJL).
Fábio Moreira Ramiro, ao comentar a Súmula TNU n.º 22, clarifica que a lógica por ela explicitamente adotada para a data do início do benefício de prestação continuada (BPC) no âmbito da Assistência Social em face de incapacidade também é aplicável para a data do início do benefício na seara do Regime Geral de Previdência Social (auxílio-doença e aposentadoria por invalidez) em face também de incapacidade:
[...] A súmula em apreço consagra o posicionamento de que a retroação do termo inicial à data de entrada do requerimento administrativo somente encontra justificativa quando a prova pericial realizada em juízo constata e afirma que a incapacidade já existia àquela época. “Contrario sensu”, se a prova pericial não pode determinar a data de início da incapacidade, por não ter a parte autora carreado aos autos elementos de prova hábeis a permitir ao perito tal conclusão, a DIB (data de início do benefício) deverá corresponder à data de realização da perícia médica – e não à [data da] juntada do laudo em juízo, como se costuma ver na prática forense – porquanto somente a partir dessa data evidenciou-se, sem que subsistem dúvidas, a existência da incapacidade.
Malgrado o enunciado refira-se a benefício assistencial, é perfeita [a] sua aplicabilidade também aos benefícios previdenciários por incapacidade, aposentadoria por invalidez e auxílio-doença, em razão de a eles se aplicarem os mesmos fundamentos de verificação de incapacidade, bem assim a fixação do termo inicial do benefício. [...] (RAMIRO, 2017, p. 141-142, grifos nossos)
Portanto, caso se olvidassem as atuais orientações jurisprudenciais perfilhadas pelo STF (Recurso Extraordinário n.º 631.240/MG e Tese do Tema de Repercussão Geral n.º 350) e pelo STJ (Recurso Especial n.º 1.369.165/SP, Tese do Tema de Recurso Repetitivo n.º 626 e Súmula STJ n.º 576) e se adotasse a orientação anteriormente alinhavada pela TNU, por intermédio de sua Súmula n.º 22, bem como pela jurisprudência que fomentou a redação de tal verbete sumular, chegar-se-ia a este conjunto de conclusões:
1. A data da entrada do requerimento administrativo no âmbito do INSS é a data do início de benefício por incapacidade, seja no Regime Geral de Previdência Social (auxílio-doença e aposentadoria por invalidez), seja na Assistência Social (BPC), caso, na data da postulação administrativa, já houvesse a incapacidade, de acordo com o laudo médico-pericial. Em suma, DIB=DER.
2. Se o laudo médico-pericial apresentado em juízo, juntado aos autos da ação judicial previdenciária, não atestar que a incapacidade já existia na data da entrada do requerimento administrativo no âmbito do INSS, a data do início de benefício por incapacidade, seja no RGPS (auxílio-doença e aposentadoria por invalidez), seja na Assistência Social (BPC), será a data da juntada em juízo do laudo médico-pericial. Em suma, não sendo possível comprovar que a incapacidade era anterior ou contemporânea ao pleito administrativo, então DIB=DJJL.
No entanto, consoante a atual jurisprudência predominante do STF e do STJ, o laudo médico-pericial não corporifica esse papel central na definição do termo inicial de benefício a ser adimplido pela autarquia previdenciária federal que antes lhe cabia quando da gênese da Súmula TNU n.º 22.
De qualquer forma, como crítica a esses constructos pretorianos, obtempera-se que o mais adequado do ponto de vista da realidade fática e da proteção da pessoa inválida é que a data do início do benefício da aposentadoria por invalidez seja a data do início da incapacidade (DIB=DII), independentemente de o benefício da Seguridade Social haver sido concedido na esfera administrativa ou na seara judicial.
Por outro lado, na impossibilidade de se comprovar que a data do início da incapacidade é anterior ou contemporânea à data da entrada do requerimento administrativo no INSS, seria incongruente com a realidade fática e deletério à salvaguarda do segurado que a data do início do benefício da Seguridade Social (por exemplo, a data do início da aposentadoria por invalidez no RGPS) fosse somente a data da juntada ao processo judicial do laudo médico-pericial (DIB=DJJL), o que ignoraria ou menosprezaria o fato relevante de que a autarquia previdenciária federal, quando acostado o laudo judicial aos autos respectivos, encontrava-se em mora (a) desde a data da entrada do requerimento administrativo (DIB=DER), ou, em caso de provocação direta da Justiça por iniciativa do segurado-jurisdicionado, (b) desde a data da citação válida em juízo da autarquia previdenciária federal (DIB=DCV).
Por isso, mostra-se lúcida a ensinança de Ibrahim: “Em qualquer benefício por incapacidade, fixar a DIB na data de juntada do laudo judicial é evidente aviltamento das prerrogativas securitárias do seguro.” (IBRAHIM, 2018, p. 578, grifos nossos)
É um aviltamento, tendo-se em mira que a entidade previdenciária, quando coligido o laudo judicial à cartilha processual respectiva, já se encontrava em mora, uma vez que previamente cientificada a respeito da pretensão do segurado na arena judicial ou, a depender do caso concreto, tanto na via judicial quanto na via administrativa.
Em verdade, a título de crítica a essa construção pretoriana, pondera-se que o mais apropriado, sob a óptica da realidade fática e da salvaguarda da pessoa inválida, é que, em regra, a data do início da incapacidade prepondere como a data do início do benefício (DIB=DII), salvo quando não for possível se comprovar a DII, seja na via administrativa, seja via judicial, circunstância em que, então sim, deve prevalecer como DIB a data do requerimento administrativo no âmbito do INSS (DIB=DER), remanescendo a data da citação válida em juízo da autarquia previdenciária federal como termo inicial do benefício previdenciário (DIB=DCV) tão só em caso de provocação direta do Poder Judiciário nas hipóteses excepcionais em que for inexigível a prévia postulação administrativa.