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Novo entendimento sobre o aborto: estaria o STF exercendo um poder que não deve?

Novo entendimento sobre o aborto: estaria o STF exercendo um poder que não deve?

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Para os jurisconsultos contemporâneos, o “povo” tem valores retrógrados e inconvenientes, é reacionário, ultraconservador e não consegue compreender o altíssimo patamar civilizatório de progresso que eles, os guardiões da moralidade e dos valores supremos da humanidade e do bem-estar social, pretendem estabelecer no seio da sociedade.

Essa decisão teratológica da 1ª Turma do STF proferida em 29/11/2016 (descriminalização do aborto cometido até o terceiro mês de gestação - Habeas Corpus 124.306) é fruto de movimentos ideológicos de esquerda, que há um bom tempo permeiam as discussões doutrinárias concernentes ao Direito Constitucional. Tal movimento é instrumentalizado pelas teorias do “Neoconstitucionalismo”, da “Nova Hermenêutica Constitucional”, do “Pós-positivismo”, do “Pluralismo Interpretativo”, cujos defensores militam diuturnamente para derribar as normas, princípios e valores estabelecidos democraticamente pelos representantes do “POVO”. Na verdade, os defensores destas Teorias se enojam quando leem o parágrafo único do art. 1º da Constituição Federal que estabelece que “todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição”. Para esses Jurisconsultos contemporâneos, o “POVO” tem valores retrógrados e inconvenientes, é reacionário, ultraconservador e não consegue compreender o altíssimo patamar civilizatório de progresso que eles, os Guardiões da Moralidade e dos valores supremos da humanidade e do Bem-Estar Social, pretendem estabelecer no seio da sociedade.

Para os nossos Jurisconsultos contemporâneos, como o “POVO” possui valores retrógrados e ultrapassados, tal conservadorismo reflete-se diretamente nos representantes do “POVO”, no caso, o Poder Legislativo. Assim, os Guardiões Supremos da Moralidade resolveram eles próprios promoverem as mudanças na legislação que entendem imprescindíveis para se alcançar tal patamar civilizatório, compreendido somente por uma altíssima sabedoria e iluminação. O fato do “POVO”, em sua grande maioria, não compartilhar dos valores defendidos por tais “Monopolistas” da Ética e das Virtudes (o que implica na manutenção da legislação “retrógrada” como a que criminaliza o aborto) é um mero detalhe que pode ser facilmente superado quando se tem o poder de dizer o que é o direito e aplicá-lo em última instância.

O FATO de três ou quatro cabeças resolverem descriminalizar por decisão judicial uma conduta que fere um bem jurídico considerado de grande relevância para a sociedade, que é a vida do Nascituro, enquanto tal medida não seria nem de longe adotada pelos representantes do “POVO” que exercem o poder em nome de 200 milhões de brasileiros, parece não representar, para os “Monopolistas” da Ética e das Virtudes, UMA FORTE VIOLÊNCIA INSTITUCIONAL AO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO.

A independência entre os Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário prevista na Constituição Federal de 1988 (art. 2°) nada representa para os paladinos das virtudes, pois são as três ou quatro cabeças supremas que positivam o direito. Não querem nem mais interpretar as normas jurídicas através do salto triplo carpado hermenêutico que costumavam utilizar para impingir o modelo civilizatório que tanto almejam, pois agora se perdeu o temor institucional, não há mais pudor republicano: O MINISTRO DO SUPREMO É O LEGISLADOR DA SOCIEDADE. ELE É O ESTADO. ELE É O PODER.

Não vai demorar muitos anos para que os SUPREMOS JURISCONSULTOS DA NAÇÃO ENTREM NAS IGREJAS COM SUAS TEORIAS E COM SUA ALTÍSSIMA COMPREENSÃO DE MUNDO PARA ESTABELECER OS LIMITES DA LIBERDADE DE CONSCIÊNCIA E RELIGIÃO (fixar quais pontos de doutrina podem ser estabelecidos ou não por determinada vertente religiosa). OS ILUMINADOS ENTRARÃO NAS FAMÍLIAS COM OS SEUS VALORES PROGRESSISTAS PARA DETERMINAR COMO OS PAIS DEVERÃO EDUCAR SEUS FILHOS EM ASPECTOS MORAIS E IDEOLÓGICOS.

Não vão demorar muitos anos para que um comentário como este (“RETRÓGRADO”, “ULTRAPASSADO”, “ULTRACONSERVADOR” na visão dos “Monopolistas” da Virtude) passe a ser considerado crime de opinião, pois é lesivo aos VALORES PROGRESSISTAS DO ALMEJADO PROJETO CIVILIZATÓRIO.

Engana-se quem pensa que a fome dos ILUMINADOS é pouca, eles querem TUDO, querem REVOLUCIONAR OS VALORES FUNDAMENTAIS DA SOCIEDADE. Todavia, para tal revolução prescinde-se do “POVO” e seus REPRESENTANTES, retrógrados e reacionários.

Quem tem ouvidos ouça o que os sinais do tempo têm a dizer!



Informações sobre o texto

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

COQUEIRO, Samuel da Fonseca. Novo entendimento sobre o aborto: estaria o STF exercendo um poder que não deve? . Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 21, n. 4906, 6 dez. 2016. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/54245. Acesso em: 18 abr. 2024.