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Primeiras impressões sobre a Lei n. 14.230/21

o enfraquecimento do combate à corrupção diante da limitação do poder investigativo do Ministério Público

Primeiras impressões sobre a Lei n. 14.230/21: o enfraquecimento do combate à corrupção diante da limitação do poder investigativo do Ministério Público

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A nova lei de improbidade, ao limitar o poder investigativo do Ministério Público dentro do próprio prazo para o exercício da pretensão sancionadora pelo Estado, engendra a proteção deficiente à moralidade administrativa.

Resumo: As alterações promovidas pela Lei n. 14.230/21, no tocante à Lei de Improbidade Administrativa, alteraram sensivelmente o trato da improbidade administrativa. Foram instituídas ferramentas e mecanismos para dificultar o combate à corrupção administrativa, tornando ainda mais dificultosa a investigação e punição dos infratores. Em assim agindo, o Poder Legislativo e o Poder Executivo incidiram em retrocesso social, afora terem violado o princípio da proibição da proteção deficiente, uma vez que a moralidade administrativa se constitui em direito fundamental.


Introdução.

A Lei n. 8.429/92 (Lei de Improbidade Administrativa LIA) tem por escopo a tutela do patrimônio público, inibindo e reprimindo os agentes que praticavam condutas ímprobas. Tamanha a relevância do instrumento que ela permanece vigente há quase vinte anos, prestando relevantes serviços à sociedade brasileira, sem que ela tivesse experimentado grandes alterações. Porém, o Poder Legislativo e o Poder Executivo, sob a bandeira do combate à corrupção, promoveram importantes alterações na LIA, por meio da Lei n. 14.230/21, desfigurando quase que por completo o diploma. De norma com viés protetivo do patrimônio público, pretendeu-se criar um diploma de proteção do próprio agente ímprobo.

Todas essas alterações acabam por desnaturar a própria função da LIA e colocam em enorme risco a proteção eficiente da moralidade administrativa como direito fundamental. E uma das formas que encontrou o legislador para dificultar o combate à corrupção administrativa foi justamente a criação de obstáculos ilegítimos para a própria investigação das condutas ímprobas, como se evidenciara nos capítulos que seguem.


1. A moralidade administrativa[1] como direito fundamental.

O conceito de moralidade encontra-se impregnada por uma carga ético-moral que antecede ao próprio direito positivo. Aqui interessa o conceito de moralidade qualificado pelo designo público, ou a moralidade administrativa.

O início da sistematização do instituto remonta ao começo do século XX, quando Maurice Hauriou concluiu que a ideia de moralidade administrativa estava umbilicalmente vinculada ao instituto do desvio de poder ou de finalidade. Daí porque a moralidade administrativa decorreria de um conjunto de regras de conduta tiradas da disciplina interior do Administração[2]. E essas regras de conduta, antes de subjetivismos, permitiriam um controle objetivo da atuação do agente público, obrigando-lhe não apenas a atuar dentro das balizas da legalidade, mas com fiel atenção à finalidade do ato, que deveria, obrigatoriamente, atender ao interesse coletivo. Como esclarece o doutor Leonardo Simchen Trevisan, citando Hauriou e Giacomuzzi:

No pensamento de Hauriou, a moralidade administrativa permitiria o controle jurisdicional da finalidade do ato, ultrapassando-se, com isso, o mero controle da legalidade, que, à época, em face das suas limitações, não poderia adentrar a esfera da discricionariedade do administrador. (GIACOMUZZI, 2002, p. 49-50). Hauriou concebe, ainda, essa moralidade como uma moralidade objetiva, ou seja, a ideia de que a Administração Pública deve cumprir uma determinada função, podendo ver declarados, pelo Conselho de Estado, como ilícitos os seus atos cujos motivos não sejam compatíveis com a finalidade geral da função administrativa. Essa moralidade objetiva constitui o ponto central da ideia de boa administração, que, segundo Hauriou, corresponderia à boa-fé do direito civil alemão. (GIACOMUZZI, 2002, p. 68). As noções de boa administração e moralidade administrativa surgem, assim, como elementos objetivos que permitiriam o controle dos elementos subjetivos da atuação do administrador. (GIACOMUZZI, 2002, p. 82). A moralidade administrativa, como concebida por Hauriou, é uma moralidade objetiva, ou seja, uma moralidade própria da Administração Pública, o conjunto de regras de conduta tiradas da disciplina interior da administração. (GIACOMUZZI, 2002, p. 84).[3]

É a partir dessas ideias de moralidade como conceito de norma de conduta, visando à boa administração, que surge a moralidade administrativa como instituto próprio e delimitado, entendida como uma moralidade objetiva destinada a sindicalizar os atos dos agentes públicos quando do trato com a res publica.

No Brasil, a incorporação do instituto se vê antes mesmo do advento da Constituição Federal de 1988, conforme se observa da Lei n. 4.717/65 (Lei da Ação Popular), em seu art. 2º, alíneas d e e[4]. Todavia, é certo que o instituto ganhou destaque com a Constituição Cidadã.

A partir da Constituição de 1988, a moralidade administrativa foi incorporada como (i) princípio norteador da atuação da Administração Pública e também como (ii) direito fundamental.

No aspecto principiológico, sustenta Hely Lopes Meirelles que:

A moralidade administrativa constitui, hoje em dia, pressuposto de validade de todo ato da Administração Pública (CF, art. 37, caput). Não se trata diz Hauriou, o sistematizador de tal conceito da moral comum, mas sim de uma moral jurídica, entendida como o conjunto de regras de conduta tiradas da disciplina interior da Administração. Desenvolvendo sua doutrina, explica o mesmo autor que o agente administrativo, como ser humano dotado da capacidade de atuar, deve, necessariamente, distinguir o Bem do Mal, o honesto do desonesto. E, ao atuar, não poderá desprezar o elemento ético de sua conduta. Assim, não terá que decidir somente entre o legal e o ilegal, o justo e o injusto, o conveniente e o inconveniente, o oportuno e o inoportuno, mas também entre o honesto e o desonesto. Por considerações de Direito e de Moral, o ato administrativo não terá que obedecer somente à lei jurídica, mas também à lei ética da própria instituição, porque nem tudo que é legal é honesto, conforme já proclamavam os romanos: non omne quod licet honestum est. A moral comum, remata Hauriou, é imposta ao homem para sua conduta externa; a moral administrativa é imposta ao agente público para sua conduta interna, segundo as exigências da instituição a que serve e a finalidade de sua ação: o bem comum.[5]

Mariano Pazzaglini Filho agrega o seguinte ao conceito de moralidade pública:

A moralidade significa a ética da conduta administrativa; a pauta de valores morais a que a Administração Pública, segundo o corpo social, deve submeter-se para a consecução do interesse coletivo. Nesta pauta de valores insere-se o ideário vigente no grupo social sobre honestidade, boa conduta, bons costumes, equidade e justiça. Em outras palavras, a decisão do agente público deve atender àquilo que a sociedade, em determinado momento, considera eticamente adequado, moralmente aceito.[6]

Tal definição é compartilhada pelos doutrinadores Celso Antônio Bandeira de Mello[7] e José Afonso da Silva[8] entre outros tantos[9].

Já no tocante à natureza de direito fundamental, observa-se que há resistência de parte da doutrina em reconhecer a moralidade como tal, o que se configura em dificuldade aparente e de fácil superação.

Primeiro, porque a moralidade administrativa, já em 1789, foi incorporada como direito natural do homem pela Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão. Como assentaram, à época, os representantes do povo Francês tendo em vista que a ignorância, o esquecimento ou o desprezo dos direitos do homem são as únicas causas dos males públicos e da corrupção dos Governos, resolveram declarar solenemente os direitos naturais, inalienáveis e sagrados do homem, a fim de que esta declaração, sempre presente em todos os membros do corpo social, lhes lembre permanentemente seus direitos e seus deveres; a fim de que os atos do Poder Legislativo e do Poder Executivo, podendo ser a qualquer momento comparados com a finalidade de toda a instituição política, sejam por isso mais respeitados; a fim de que as reivindicações dos cidadãos, doravante fundadas em princípios simples e incontestáveis, se dirijam sempre à conservação da Constituição e à felicidade geral (Preâmbulo).

Nos artigos 12º[10] e 15º[11] da Declaração, restou previsto o direito natural do homem de exigir dos agentes públicos a prestação de contas de suas atividades e que o exercício do munus publico se desse no interesse da coletividade, desprezando a atuação em proveito pessoal. Isto é, o direito à moralidade pública foi alçado a direito ancestral, emanado da própria natureza humana, independentemente da própria instituição do poder civil.

Segundo, a moralidade pública ascendeu à condição de direito fundamental com o próprio desenvolvimento daquilo que se denominou direitos de terceira dimensão. A partir de 1960, com a superação do olhar individualista do homem, valores humanistas como a fraternidade e a solidariedade ganharam protagonismo, fazendo com que se reconhecesse a existência de direitos voltados à proteção ao meio ambiente, à autodeterminação dos povos, bem como ao direito de propriedade sobre o patrimônio comum da humanidade. São direitos transindividuais, em rol exemplificativo, destinados à proteção do gênero humano[12].

Terceiro, o direito fundamental à probidade administrativa decorre, na Constituição Federal de 1988, como bem destaca Roberto Lima Santos[13], (i) do princípio republicano (art. 1º, caput); (ii) do princípio democrático (art. 1º, par. único); (iii) de seus fundamentos (art. 1º, incisos I a V: soberania; a cidadania; a dignidade da pessoa humana; os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa e o pluralismo político); (iv) dos objetivos fundamentais da República (art. 3º, incisos I a IV: construir uma sociedade livre, justa e solidária; garantir o desenvolvimento nacional; erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação); (v) da prevalência dos direitos humanos e da defesa da paz nas suas relações internacionais (art. 4º, I e VI); e (vi) dos demais princípios constitucionais administrativos, previstos no caput do art. 37 (legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência).

Ora, a probidade administrativa visa, dentre outras questões, a evitar aquilo que se denomina corrupção administrativa: o ato do administrador público praticado em desvio de finalidade ou de poder, em favor próprio ou de terceiro, com prejuízo à coisa pública, seja este material (perda patrimonial) ou imaterial (violação dos princípios e deveres morais). Como oportunamente ponderam Pazzaglini Filho, Rosa e Júnior:

a improbidade administrativa, designativo técnico para a denominada corrupção administrativa, promove o desvirtuamento da Administração Pública em vista de promover a afronta aos princípios vetores da ordem jurídica e revelar-se por meio da aquisição de vantagens patrimoniais obtidas com prejuízo do dinheiro público, pelo exercício nocivo das funções e empregos públicos, também pelo tráfico de influência no âmbito da atividade administrativa e pelo favorecimento particular de poucos que agem na contramão dos interesses pretendidos pela sociedade, através de favorecimentos ilícitos[14].

Ao praticar um ato corrupto, o agente público está contribuindo sensivelmente com a redução do capital ao alcance do Estado, o qual é necessário para a promoção de direitos essenciais do cidadão como a proteção à saúde, o meio ambiente saudável e todos os demais direitos sociais de terceira dimensão previstos na Constituição Federal de 1988. No mesmo sentido, pondera Rogério Pacheco Alves que a corrupção e a improbidade administrativa são fatores impeditivos à implementação plena dos direitos sociais fundamentais, sobretudo nos países subdesenvolvidos, colocando em risco o próprio Estado Democrático de Direito[15].

Ou seja, uma das principais facetas da moralidade administrativa, como já advertiam os revolucionários franceses em 1789, é garantir que o Estado mantenha em seu poder os meios e os recursos necessários para a satisfação de direitos fundamentais e, sobretudo, sociais do cidadão, evitando que agentes em desvio de poder e finalidade se apropriem desses ativos para benefício próprio. Nesse mesmo sentido se manifesta André de Carvalho Ramos, ao referir que esse agir em prol dos direitos humanos é erodido pelas práticas de corrupção, ou seja, para que o homem possa viver uma vida digna com a satisfação de suas necessidades materiais e espirituais básicas, devem atuar os agentes públicos com probidade, devendo o ordenamento jurídico possuir instrumento para zelar por tal conduta e reprimir, sancionando, os faltosos.[16]

A violação à moralidade por parte dos administradores públicos constitui impeditivo à aquisição dos direitos da cidadania e não deve ser analisada sob uma acepção restrita, mas deve ser compreendida como consectário fundamental de observância obrigatória para à aquisição dos direitos constitucionais previstos, a fim de se verificar a ampliação do conceito de cidadania de modo que esta acepção seja retratada na vida prática de todos como direito a ter direitos, como precisamente lembra a professora Renata Cristina Macedônio de Souza[17].

Não é por menos que há anos a doutrina faz referência à existência de um verdadeiro direito fundamental à boa administração pública. Juarez Freitas, exímio doutrinador gaúcho, assevera o seguinte sobre o tema:

Trata-se do direito fundamental à administração pública eficiente e eficaz, proporcional cumpridora de seus deveres, com transparência, motivação, imparcialidade e respeito à moralidade, à participação social e à plena responsabilidade por suas condutas omissivas e comissivas. A tal direito corresponde o dever de a administração pública observar, nas relações administrativas, a cogência da totalidade dos princípios constitucionais que a regem.[18]

Em sentido semelhante, Figueiredo Moreira Neto aduz que do princípio da boa administração emana um direito implícito de cidadania, irradiando daí sua feição de direito fundamental:

A boa administração, portanto, não é uma finalidade disponível, que possa ser eventualmente atingida pelo Poder Público: é um dever constitucional de quem quer que se proponha a gerir, de livre e espontânea vontade, interesses públicos. Por isso mesmo, em contrapartida, a boa administração corresponde a um direito cívico do administrado implícito na cidadania (grifos no original).[19]

Ainda, apresenta-se oportuno trazer à lume as ponderações realizadas por Ingo Wolfgang Sarlet, renomado jurista na área de direitos fundamentais. Segundo o autor, a Constituição Federal de 1988 consagrou um direito fundamental à boa administração, o qual está amparado principalmente, mas não exclusivamente, no art. 1º, inciso III, que consagra a dignidade da pessoa humana como fundamento da República. Para o ilustre doutrinador, uma boa administração só pode ser uma administração que promova a dignidade da pessoa e dos direitos fundamentais que lhe são inerentes, devendo, para tanto, ser uma administração pautada pela probidade e moralidade, impessoalidade, eficiência e proporcionalidade. A nossa Constituição, como se percebe, foi mais adiante. Além de implicitamente consagrar o direito fundamental à boa administração, ela já previu expressamente os critérios, diretrizes, princípios que norteiam e permitem a concretização dessa ideia de boa administração.[20]

Como bem observado pelo autor, o só fato de inexistir na legislação uma previsão textual e expressa acerca do direito à boa administração não engendra a conclusão de que ele não possui acento constitucional. São remansosas a doutrina e a jurisprudência no sentido de se admitir a existência de direitos fundamentais implícitos. O fato de se tratar de um direito implícito, apenas faz com que se exija do intérprete a exegese de um ou mais dispositivos para que, desse processo cognitivo, se extraia a efetiva essência da norma. E norma não é, nem nunca foi sinônimo de enunciado normativo, senão decorre dos sentidos construídos a partir da interpretação sistemática de textos normativos. Norma resulta do esforço hermenêutico empregado pelo intérprete.[21] Ainda, como leciona Canotilho:

O programa normativo-constitucional não se pode reduzir, de forma positivística, ao texto da Constituição. Há que densificar, em profundidade, as normas e princípios da constituição, alargando o bloco da constitucionalidade a princípios não escritos desde que reconduzíveis ao programa normativo-constitucional, como formas de densificação ou revelação específicas de princípios ou regras constitucionais positivamente plasmadas.[22]

Por fim, calha o registro que a União Europeia, em dezembro de 2000, quando da publicação da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, acabou por internalizar e positivar o direito fundamental à boa administração, no seu artigo 41º[23].

Nessa ordem de ideias, resulta tranquila a conclusão de que a moralidade administrativa, antes de se tratar de mero princípio orientador-interpretativo, cuida-se de um direito fundamental de todo o cidadão, imanente do direito à dignidade da pessoa humana.


2. Do princípio da proibição da proteção deficiente (üntermassverbot[24]) como parâmetro de controle de constitucionalidade.

Superada a fase histórica centrada no eu e a presunção de que as relações individuais são equilibradas, a sociedade e a própria noção de Estado evoluíram. O desiquilíbrio das relações individuais se agravou. Novos direitos foram apreendidos da realidade. Noções de coletividade e de fraternidade trouxeram novos coloridos para a definição de bens jurídicos. O plural era tão senão mais importante do que o singular no contexto contemporâneo de sociedade. Aos direitos fundamentais individuais, portanto, agregaram-se os direitos fundamentais transindividuais, cujo traço característico é justamente a compreensão de que o ser humano é um ser social e de que há bens e valores que se sobrepõe ao interesse individual, devendo por todos ser preservados.

Contudo, enquanto ao Estado bastava, inicialmente, a adoção de uma postura negativa (garantismo negativo) para a conservação dos direitos e liberdades individuais, a complexidade da dinâmica social, agravada pela disparidade econômico-social e pela existência de poderes sociais que atuam no plano da realidade de forma desequilibrada, fez despertar a necessidade de que o Estado passasse para uma atuação proativa, seja para garantir o próprio exercício dos direitos e liberdades individuais, seja para albergar os novos direitos reconhecidos (de terceira dimensão). Assim, ao papel clássico do Estado (respeito às garantias individuais por abstenção) agregou-se uma atuação destinada a proteger e concretizar esses direitos, tendo por objetivo a promoção da igualdade social e a dignidade da pessoa humana em sentido amplo.

É aqui que reside o núcleo do princípio da proibição da proteção deficiente (üntermassverbot), outra face do princípio da proporcionalidade: prevendo a Constituição Federal direitos fundamentais, é atribuição do Estado a adoção de postura tendente a concretizar esses direitos e colocá-los a salvo de investidas ilegítimas, seja de parte dos particulares ou do próprio Estado. Em assim não agindo, incorre em inconstitucionalidade por não tutelar, de forma eficaz, os direitos postos. Isso porque os direitos fundamentais, na condição de normas que incorporam determinados valores e decisões essenciais que caracterizam sua fundamentalidade, servem, na sua qualidade de normas de direito objetivo e independentemente de sua perspectiva subjetiva, como parâmetro para controle de constitucionalidade das leis e demais atos normativos estatais[25].

Reforço que há direitos que exigem uma postura ativa por parte do Estado para fins de suas salvaguardas e para sua própria promoção. Prestigiar os direitos fundamentais é dar concretude ao princípio da dignidade da pessoa humana. Por isso, é defeso ao Estado omitir-se desse mister. Daí porque o princípio da proibição da proteção deficiente também alcança as condutas omissivas ou insuficientes do Estado à tutela desses direitos. Nas palavras de Ingo Wolfgang Sarlet:

O Estado - também na esfera penal - poderá frustrar o seu dever de proteção atuando de modo insuficiente (isto é, ficando aquém dos níveis mínimos de proteção constitucionalmente exigidos) ou mesmo deixando de atuar, hipótese por sua vez, vinculada (pelo menos em boa parte) à problemática das omissões inconstitucionais. É nesse sentido que como contraponto à assim designada proibição de excesso expressiva doutrina e inclusive jurisprudência têm admitido a existência daquilo que se convencionou batizar de proibição de insuficiência (no sentido de insuficiente implementação dos deveres de proteção do Estado e como tradução livre do alemão Untermassverbot). Neste sentido, o princípio da proibição de insuficiência atua como critério para aferição da violação de deveres estatais de proteção e dos correspondentes direitos à proteção.[26]

Em sentido muito semelhante, Alexandre Moreira Van Der Broocke assevera que:

(...) conclui-se que o dever de proteção, já consagrado pela jurisprudência e pela doutrina em relação aos direitos fundamentais, deve ser levado em consideração, também, em relação aos demais direitos constitucionais, posto que não há espaço de discricionariedade para a atuação do legislador em relação à efetivação do direito previsto na Lei Maior. Ou seja, se existe previsão constitucional que respalde um direito qualquer, fundamental ou não, é imperativo que o Estado-Legislador desempenhe seu mister, conferindo-lhe o regramento normativo infraconstitucional que possibilite sua plena efetivação. Agindo de forma diversa, seja pela sua postura omissiva (untermassverbot) ou comissiva (übermassverbot), o legislador incide em antinomia inconstitucional.

Ao que parece, a corrente garantista se mostra mais condizente com os desafios que se colocam diante do Estado Democrático de Direito, uma vez que nela a Constituição da República se reveste de maior coercibilidade em relação não só ao Estado-Legislador, como também em face dos demais poderes. Sendo assim, partindo-se da premissa de que o dever de proteção (schutzpflicht) é condição de possibilidade da incidência da proibição da proteção deficiente (untermassverbot), e que, segundo o viés garantista, pode-se afirmar que o dever de proteção se estende para além dos direitos fundamentais, a proibição da proteção deficiente abrange os direitos constitucionais em geral.[27]

Logo, a proibição de proteção deficiente pode ser definida, segundo Carlos Bernal Pulido, como um critério estrutural para a determinação dos direitos fundamentais, a partir do qual poderá ser constatado se um ato estatal viola ou não um direito fundamental de proteção. Trata-se de compreender, assim, o duplo viés do princípio da proporcionalidade: de proteção positiva ou de proteção de omissões estatais. Em outras palavras, tem-se que a inconstitucionalidade pode advir de um ato excessivo do Estado, ou pode advir de uma proteção insuficiente de um direito fundamental por parte deste (e. g., quando o Estado abre mão de determinadas sanções cujo objetivo é a proteção de direitos fundamentais). Esta dupla face do princípio da proporcionalidade decorre da necessária vinculação de todos os atos do poder público à Constituição, e tem como consequência a redução do espaço de conformação do legislador[28].

Dos conceitos e definições fixadas, pode-se concluir pela existência de uma relação simbiótica entre o princípio da proibição da proteção deficiente e o ato de legislar. Ainda que caiba ao legislador, por excelência, o dever constitucional de estabelecer a forma como a proteção e promoção dos direitos fundamentais irá ocorrer (o que se dá, via de regra, por meio de leis), esse exercício terá que ser realizado dentro das balizas constitucionais, funcionando o princípio da proibição de proteção deficiente como um limite mínimo a ser atentado por aquele. Juarez Freitas, equaciona bem a questão: Guardando parcial simetria com o princípio da proibição de excesso (Übermassverbotes), a medida implementada pelo Poder Público precisa se evidenciar não apenas conforme os fins almejados (Ziekonformität), mas, também, apta a realizá-los (Zwecktauglichkeit). Igualmente se mostra inadequada a insuficiência ou a omissão antijurídica causadora de danos.[29]

Aduza-se que sequer há cogitar de interferência indevida na atividade legislativa. O legislador, embora investido pelo povo, não goza de liberdade absoluta para o exercício do seu mister. Deve irrestrita atenção aos preceitos constitucionais no desenvolvimento de sua atividade, a qual, como já exaustivamente exarado, consiste na busca pela promoção e proteção dos direitos fundamentais.

Outrossim, é assente que a democracia não se expressa somente por meio do princípio majoritário, esse considerado a maioria necessária no Congresso Nacional para a aprovação de atos legislativos. A mesma Constituição Federal que garante o direito das maiorias põe a salvo e em igualdade de relevância e importância os direitos das minorais. E, havendo sobreposição indevida e/ou ilegítima de um sobre outro, é inerente à função do Poder Judiciário reequilibrar a balança dando voz àqueles que a tiveram subtraída de forma irregular. Nesse sentido, é a ponderação realizada pelo Ministro Luís Roberto Barroso ao assentar que é da competência do Poder Judiciário promover os valores constitucionais, superando o déficit de legitimidade dos demais Poderes, quando seja o caso. Nas suas palavras:

O déficit democrático do Judiciário, decorrente da dificuldade contramajoritária, não é necessariamente maior que o do Legislativo, cuja composição pode estar afetada por disfunções diversas, dentre as quais o uso da máquina administrativa nas campanhas, o abuso do poder econômico, a manipulação dos meios de comunicação.

O papel do Judiciário, e, especialmente, das cortes constitucionais e supremos tribunais, deve ser resguardar o processo democrático e promover os valores constitucionais, superando o déficit de legitimidade dos demais Poderes, quando seja o caso; sem, contudo, desqualificar sua própria atuação, exercendo preferências políticas de modo voluntarista, em lugar de realizar os princípios constitucionais. Além disso, em países de tradição democrática menos enraizada, cabe ao tribunal constitucional funcionar como garantidor da estabilidade institucional, arbitrando conflitos entre Poderes ou entre estes e a sociedade civil. Estes os seus grandes papéis: resguardar os valores fundamentais e os procedimentos democráticos, assim como assegurar a estabilidade institucional.[30]

Aduza-se que utilização do princípio da proibição da proteção deficiente não se trata de novidade no âmbito nacional. O Supremo Tribunal Federal, em diversas oportunidades, já fez uso expresso dessa ferramenta de controle de constitucionalidade para afastar invalidar normas em descompasso com os preceitos da Carta Maior. Exemplificativamente, cito o RE 418.376, as ADIs 3.510, 6.031 e 5.874, e o HC 104.410.

Dessa feita, não transparece dificuldade alguma em se valer do princípio da proibição da proteção deficiente para fins de realizar controle de constitucionalidade sobre normas editadas pelo legislador que não observam os fins almejados, como também não se apresentam aptas a realizá-los.


3. Da inconstitucionalidade dos §§ 2º e 3º do art. 23 da Lei n. 8.429/92.

Segundo dispõem os dispositivos em comento, o Ministério Público passará a contar com o prazo exíguo de 1 ano (estendido motivadamente por mais 1 ano desde que confirmada pelo órgão superior) para iniciar e encerrar a investigação envolvendo ato de improbidade administrativa.

Contudo, a previsão não supera os juízos da adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito.

Primeiro, é de se observar que, se nos voltarmos para o processo criminal uma vez que o legislador, quando conveio, dele fez uso por analogia inexiste prazo decadencial ou prescricional próprio para encerramento da investigação criminal. O Código de Processo Penal estabelece os prazos de 10 dias (se o investigado estiver preso), ou de 30 dias, se solto (art. 10), para o encerramento do inquérito policial. Porém, no §3º do art. 10 do CPP deixa claro que, sendo o fato de difícil elucidação, e o indiciado estiver solto, a autoridade poderá requerer ao juiz a devolução dos autos, para ulteriores diligências, que serão realizadas no prazo marcado pelo juiz. Ou seja, é admitida, desde que de forma fundamentada, sucessivas e ilimitadas prorrogações de prazos na investigação até que se colham os elementos necessários para a formação do convencimento. O que barra o prosseguimento dessas investigações é, apenas, eventual prescrição da pretensão punitiva do Estado, dimensionada de acordo com a pena in abstrato de crime apurado, ou falta de motivação idôneo na realização de outras diligências.

No âmbito do processo administrativo disciplinador, há também previsão para o término do processo, prevendo a Lei n. 8.112/90 o lapso de 60 dias, admitida uma prorrogação pelo mesmo prazo (art. 152). Todavia, como consabido, é assente na doutrina e jurisprudência que inobservância desses prazos não impede o processamento da apuração administrativa disciplinar, ou mesmo gera qualquer tipo de nulidade do procedimento, a menos que demonstrado que o excesso de prazo trouxe prejuízos à defesa do investigado[31] (o que é de dificílima ocorrência). Ou seja, a investigação no âmbito administrativo também não se submete a prazo rígido para encerramento, sendo obstaculizada apenas pela prescrição da pretensão disciplinar.

Mesmo diante desses paradigmas, o legislador resolveu inovar em se tratando de investigação por atos de improbidade. Aqui, o legislador não só não levou em consideração a enorme complexidade dos casos envolvendo a prática de atos de improbidade (seja pela sua sofisticação, seja pelo fato de a burocracia dificultar a obtenção de dados para a comprovação dos fatos), como estipulou a possibilidade de se realizar apenas uma prorrogação, limitando a investigação ao período de apenas dois anos. Não há razoabilidade na disposição.

O legislador estabeleceu como prazo prescricional para a apuração dos atos de improbidade o lapso temporal de 08 anos. Então, indaga-se: por que a investigação apenas poderá se valer do prazo máximo de 2 anos para a apuração do fato? Não há lógica (a não ser a da impunidade) em se limitar o poder investigativo do Ministério Público a uma fração do prazo prescricional para o exercício da pretensão sancionadora. Mesmo que o agente público esteja em condições de ser responsabilizado judicialmente pela prática de conduta ímproba (porque ainda não prescrita a pretensão), caso o Ministério Público não logre êxito de obter provas consistentes de sua responsabilidade provas essas que deverão ser ainda mais robusta considerando as condicionantes impostas pelo legislador por meio da Lei n. 14.230/21 , restará ele impune.

Ora, ao legislador deveria caber a função de, por meio da edição de leis, promover alterações sociais sensíveis, defendendo, promovendo, implementando e incrementado o exercício dos direitos fundamentais. Ao editar alteração legislativa que breca a apuração de condutas cujos resultados sociais são absolutamente graves para a comunidade, faz justamente o contrário: promove o ilícito; desprestigia o homem de bem; favorece o oportunista; incentiva os atos de improbidade; eleva a degradação dos menos favorecidos. Muito oportuna é a correlação entre corrupção administrativa e o comprometimento dos direitos fundamentais do indivíduo realizada por Emerson Garcia:

Esse ciclo [redução de receitas-corrupção-injustiça social] conduz ao estabelecimento de uma relação simbiótica entre corrupção e comprometimento dos direitos fundamentais do indivíduo. Quanto maiores os índices de corrupção, menores serão as políticas públicas de implementação dos direitos sociais. Se os recursos estatais são reconhecidamente limitados, o que torna constante a invocação da reserva do possível ao se tentar compelir o Poder Público a concretizar determinados direitos consagrados no sistema, essa precariedade aumentará na medida em que os referidos recursos, além de limitados, tiverem redução de ingresso ou forem utilizados para fins ilícitos.

(...).

A corrupção, assim, gera um elevado custo social, sendo os seus malefícios sensivelmente superiores aos possíveis benefícios individuais que venha a gerar.[32]

É isso. O custo social que a corrupção administrativa traz consigo é tão nefasto para a sociedade que sequer é possível dimensionar adequadamente os reflexos patrimoniais e sociais. O dano ao erário e eventual enriquecimento ilícitos apurados no processo retratam apenas uma pequena fração das mazelas causadas pela imoralidade. E, ao invés de combater esses malefícios de forma contundente assim como a comunidade internacional vem fazendo cada vez mais, o Brasil, que já fora protagonista no tema, se diminuiu, criando amarras, embaraços, empecilhos para a investigação e penalização daqueles que se mostram indiferentes com o plural, com o coletivo.

Ao assim agir, o Poder Legislativo, que editou a lei, e o Poder Executivo, que a promulgou, atuaram com manifesto déficit de legitimidade constitucional, priorizando interesses próprios e escusos em detrimento de valores de envergadura social e moral que deveriam, por si sós, garantir à sociedade a proibição de condutas dessa natureza. A moralidade administrativa é vetor do Estado Democrático de Direito. A desatenção para com ele coloca em xeque a própria democracia que é fundamento do Estado. Como bem observam Emerson Garcia e Rogério Pacheco Alves:

Numa perspectiva mais teórica, é possível construir a ideia de que os Poderes Legislativos e Executivo, no Brasil, teimam em não aceitar aquilo que o nosso texto constitucional tem de mais contemporâneo, vale dizer, o seu forte conteúdo normativo, a sua vocação para criar direitos fundamentais de plena e imediata fruição no caso, o direito fundamental à probidade e a consagração, fruto da experiência constitucional norte-americana, de ampla possibilidade de intervenção do Poder Judiciário na garantia de tais direitos fundamentais.[33]

Aduza-se que sequer há como interpretar que as normas contidas no § 2º do art. 23 versam sobre um prazo impróprio, isto é, aqueles prazos fixados na lei apenas como parâmetro para a prática do ato, sem consequências processuais ou materiais. É que o legislador, no § 3º do art. 23, impôs que, encerrado o prazo, competirá ao membro do Parquet ajuizar a ação, no prazo de 30 dias, sem qualquer outra possibilidade de prorrogação de prazo. Tal previsão tem justamente o escopo de inviabilizar interpretação dessa natureza.

Logo, o que se afere é que a limitação ao poder investigativo do Ministério Público dentro do próprio prazo para o exercício da pretensão sancionadora pelo Estado engendra a proteção deficiente da moralidade administrativa. Houve, claramente, uma omissão intencional do legislador na tutela de um direito fundamental na sua órbita objetiva uma vez que a drástica redução do prazo para a investigação de fatos ímprobos impedirá a exigibilidade e gozo otimizado do direito fundamental à moralidade administrativa. Como bem pondera Juliana Venturella Nahas Gavião:

Desse modo, em não havendo uma proteção normativa ao direito fundamental, no que tange à sua dimensão objetiva (ou seja, como imperativo de tutela), verifica-se ato de omissão estatal flagrantemente inconstitucional, porquanto impedirá a realização e o desfrute do direito fundamental por seu titular.

Em outras palavras, não existe liberdade absoluta de conformação legislativa, ainda que deva ser reconhecido o espaço que é conferido ao legislador para adaptar os mandamentos constitucionais. E isso exsurge da própria interpretação sistemática do direito, que ensina que os atos estatais devem ser permanentemente pautados pelas diretrizes constitucionais, notadamente na quadra da história e da evolução dos direitos fundamentais que se encontra a humanidade.[34]

Não bastasse a inconstitucionalidade por falta de adequação, necessidade e proteção ineficiente da moralidade administrativa, a norma também padece de inconstitucional por interferir ilegitimamente na atuação do Ministério Público, quer por restringir o poder investigativa no tempo, quer por exigir que eventual prorrogação do inquérito civil deva passar pelo crivo de um órgão de controle.

A Constituição Federal prevê, no art. 127, § 1º, a independência funcional como princípio institucional do Ministério Público. Essa garantia, inerente ao Estado Democrático de Direito, é reproduzida pela Lei Orgânica do Ministério Público (art. 1º, parágrafo único, da Lei n. 8.625/93). Ela tem por desiderato conferir aos membros do Ministério Público o exercício livre e desimpedido das suas atividades-fim, podendo formar sua convicção com base na interpretação razoável da Constituição, das leis e dos fatos jurídicos que estão sendo apurados.

Logo, condicionar a atuação do Ministério Público a uma fração do tempo previsto para o exercício da pretensão sancionadora estipulada para o Estado acaba por, justamente, limitar o exercício livre e desimpedido da função ministerial, afrontando a norma-princípio prevista no art. 127, § 1º, CF.

Ademais, não se pode perder de vista que as alterações promovidas pela Lei n. 14.230/21 conferiram exclusividade ao Ministério Público para o manejo das ações de improbidade administrativa. Disso decorre que o Ministério Público, além de substituto processual de toda a coletividade (no tocante à proteção ao erário), também passou a figurar como único representante do próprio Estado sob o viés punitivo. Isto é, no momento em que o legislador fixou o prazo de oito anos para o exercício da ação de improbidade conferiu esse prazo ao próprio Ministério Público, titular da ação, sendo, no mínimo, incoerente previsão que estipule outro prazo, como se entes distintos fossem.

Também se revela inconstitucional a previsão que condiciona eventual prorrogação do inquérito civil à anuência do Conselho Superior (ou órgão equivalente). Tal exigência acaba por macular a independência funcional que é própria dos membros do Ministério Público. Não há razoabilidade na medida, tampouco há precedente no ordenamento jurídico interno. É nítida a intenção de se criar empecilhos para a apuração de atos tão gravosos para a sociedade. Exigir que haja uma revisão da promoção pela prorrogação das investigações interfere na própria atividade-fim do membro do Ministério Público que, dentre outras, jaz na defesa da moralidade e do patrimônio público (art. 129, III, da CF).

Veja-se que a presente situação ora tratada não possui paralelo com a hipótese de arquivamento do inquérito civil, em ação civil pública, quando há necessidade de reexame necessário pelo Conselho Superior (§ 3º do art. 9º da Lei n. 7.347/85[35]). Isso porque, quando há a opinio pelo arquivamento nas ações civis públicas, há uma potencial lesão ao patrimônio público, uma vez que dado fato supostamente violador do patrimônio público deixará de ser investigado.

Daí porque se exige o reexame da questão por órgão colegiado para averiguar se, realmente, aquele fato que deflagrou a abertura do inquérito civil é atípico ou, ao contrário, revela indícios de lesividade, quando, então, será designado outro promotor para continuar as investigações. Nessa hipótese (de arquivamento), a previsão de reexame necessário, antes de mitigar a tutela do coletivo, coloca-a em destaque. Aí reside a diferença do tratamento despendido pelo legislador: enquanto, na hipótese do arquivamento de ação cível pública, impôs o reexame necessário para salvaguardar direitos fundamentais, na ação de improbidade impôs o reexame necessário para obstar o prosseguimento das investigações, relegando os direitos fundamentais a um segundo plano.

Por todas essas razões, restam caracterizadas as inconstitucionalidades integrais dos §§ 2º e 3º do art. 23.


4. Dos tratados e convenções internacionais que versam sobre a tutela da moralidade. Dos efeitos vinculantes e paralisantes das convenções ratificadas pelo Brasil.

Além das inconstitucionalidades já apontadas, as normas inseridas nos §§ 2º e 3º do art. 23 da Lei n. 8.429/91 também padecem de ilegalidade quando confrontadas com os documentos internacionais celebrados pelo Brasil.

Embora haja farta doutrina[36] acerca da natureza constitucional dos tratados internacionais que versam sobre direitos humanos das quais o Brasil seja signatário, uma vez que integrariam o que se denomina bloco de constitucionalidade (previsto no § 2º do art. 5º da Constituição Federal), a posição que prevalece junto ao Supremo Tribunal Federal é diversa. A Corte Suprema, quando do julgamento do RE 349.703, entendeu que, para que os tratados sobre direitos humanos ingressassem no ordenamento jurídico interno como equivalente às emendas constitucionais, se faz necessário a aprovação qualificada do Congresso Nacional, nos termos do § 3º do art. 5º da CF. Quanto aos tratados internacionais sobre direitos humanos que não observaram ou não observarem essa regra, o status a eles atribuídos é de supralegalidade.

Realizado esse esclarecimento, já fixada a premissa nesse estudo de que a moralidade administrativa se cuida de um direito natural e fundamental do homem, não há dúvidas de que os tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário, e que versem sobre o tema, ingressam no ordenamento interno com status infraconstitucional, porém supralegal. E, em razão dessa natureza peculiar, eles têm o condão de (i) revogar a legislação anterior se com eles incompatíveis, (ii) vinculam o legislador de forma permanente (ou até que ocorra a denúncia do tratado), (iii) condicionam a atuação da administração pública, além de (iv) servirem de parâmetro interpretativo da lei.

O Brasil, por sua vez, é signatário de pelo menos três documentos absolutamente relevantes no tocante à tutela da moralidade administrativa: (i) Convenção sobre o Combate da Corrupção de Funcionários Públicos Estrangeiros em Transações Comerciais Internacionais, promulgada pelo Decreto nº 3.678/00; (ii) Convenção Interamericana contra a Corrupção, promulgada pelo Decreto nº 4.410/02; e (iii) Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção[37], promulgada pelo Decreto nº 5.687/06.

Como se vê, embora o Brasil tenha vanguardismo no tema, uma vez que possuía, até 1988, um dos poucos textos constitucionais que fazia alusão expressa à moralidade, a corrupção administrativa ganhou contornos tão dramáticos e de grande repercussão social que passou a integrar rotineiramente os acordos, convenções e tratados internacionais. Como bem observa Roberto Lima Santos, citando o professor André de Carvalho Ramos, a tutela da probidade administrativa não é mais um imperativo meramente nacional, mas sim internacional, baseado na análise de diplomas normativos internacionais, explicitando o fundamento atual dessa internacionalização do combate a práticas de corrupção, que é a implementação de direitos humanos. (...). Todas essas convenções anticorrupção estão em pleno vigor no ordenamento jurídico pátrio, e o cumprimento de seus objetivos vem sendo monitorado por organismos internacionais, cuja avaliação insatisfatória pode acarretar sanções econômicas, além de exposição negativa perante a comunidade internacional.[38]

Em que pese haja certa discussão acerca da aplicação desses documentos internacionais nas ações de improbidade administrativa no âmbito interno[39], é certo que referido debate não se sustenta no tocante à Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção (Convenção de Mérida). Isso porque, diversamente do que fazem os demais documentos, seu alcance não se limita à prática de delitos criminais. O uso do termo delito pelo documento é no sentido amplo e envolve quaisquer condutas que importem em corrupção. Não por menos, o texto prevê, no art. 43[40], que trata justamente da cooperação internacional, mecanismo de assistência mútua entre os signatários para cooperarem em investigações criminais, civis e administrativas relacionadas à corrupção.

Emerson Garcia e Rogério Pacheco Alves, ao tratarem do tema, corroboram as presentes conclusões ao afirmarem que a

Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção, que utiliza em vários momentos, de forma preponderante, o termo delito, que tem sentido amplo, o que permite alcançar delitos administrativos, criminais e civis. Além disso, referida convenção estabelece em seu art. 43, de forma bastante clara, a possibilidade de cooperação internação ...nas investigações e procedimentos correspondentes a questões civis e administrativas relacionadas com a corrupção. O mesmo dispositivo esclarece que quando a dupla incriminação for um requisito em questões de cooperação internacional, tal requisito se considerará cumprido ...se a conduta constitutiva do delito relativo ao qual se solicita assistência é um delito de acordo com a legislação de ambos os Estados Partes, independentemente se as leis do Estado Parte requerido incluem o delito na mesma categoria ou o denominam com a mesma terminologia que o Estado Parte requerente. Além disso, o art. 46 estatui que os Estados Partes deverão prestar a mais ampla assistência judicial recíproca relativa à investigações, processo e ações judiciais relacionados com os delitos compreendidos na Convenção. Por fim, o art. 53 estabelece que os Estados deverão adotar medidas necessárias a fim de facultar a outros Estados Partes para entabular ante seus tribunais uma ação civil com o objetivo e determinar a titularidade ou propriedade de bens adquiridos mediante a prática de um delito qualificado de acordo com a presente Convenção. Por tudo isso, parece-nos plenamente possível a cooperação em matéria de improbidade administrativa com fundamento na Convenção da ONU, inclusive no diz respeito a medidas cautelares (arts. 52, 53, 54 e 55, dentre outros).[41]

Assim, não restam dúvidas acerca da aplicabilidade dos diplomas internacionais e sua eficácia paralisante em desfavor do Poder Legislativo particularmente no desiderato de se evitar o retrocesso social no implemento da proteção da moralidade administrativa.

Contudo, para tais regras não atentou o legislador quando da edição da Lei n. 14.230/21.

Com efeito, a Convenção de Mérida, diante do seu status supralegal, exerce função vinculante ao legislador de forma permanente (ou até que ocorra a denúncia do documento internacional) e se presta como parâmetro interpretativo da lei, seja na aplicação ou na criação dela.

Em seu art. 29[42], o documento trata especificamente da prescrição dos processos destinados à apuração da corrupção e de outros bens jurídicos protegidos pela Convenção. E, ao fixar as diretrizes dessa prescrição, determina que os Estados Partes deverão estabelecer um prazo amplo para iniciar os processos e um prazo ainda maior ou mesmo a interrupção da prescrição caso haja evasão da Justiça. Ou seja, o Brasil aderiu a uma norma cogente por meio da qual os Estados Partes se comprometeram a fixar prazos amplos para fins de apuração de atos corruptos.

Entretanto, tal norma cogente foi descumprida pelo legislador. A fixação de um prazo máximo de dois anos para a investigação de delitos absolutamente complexos, sofisticados e que, muitas vezes, envolvem um número considerável de pessoas (físicas e jurídicas), não se revela adequada, razoável, proporcional ou compatível com o compromisso do combate à corrupção firmado pelo Brasil no âmbito internacional. Aliás, basta atentar que, antes das alterações promovidas pela Lei n. 14.230/21, o inquérito civil tinha como prazo, como regra, o lapso temporal de 05 anos. Isto é, o legislador, ao invés de alargar os prazos para fins de investigação, cuidou de diminuí-los para menos da metade do tempo antes previsto para a apuração desses delitos.

Outrossim, inexiste lógica jurídico-processual para desvincular o prazo prescricional da investigação do prazo máximo previsto para a responsabilização do agente por determinada conduta. A finalidade única da fixação de um prazo máximo para persecução sancionadora do agente jaz em limitar o exercício do poder punitivo do Estado. Se a lei impõe um prazo para esse exercício, por óbvio que não há impeditivo que sejam realizadas todas as diligências necessárias para se apurar a conduta ilegal ao longo de todo esse prazo. Importa verdadeiro retrocesso social o ato do legislador que reduz a possibilidade de apuração de condutas que atentem contra um direito fundamental a uma diminuta fração do próprio prazo fixado para a responsabilização do agente.

Por todas essas razões, resta ilegal a norma prevista no § 2º do art. 23 por violação ao art. 29 da Convenção das Nações Unidas de Combate à Corrupção.


Conclusão

As alterações realizadas na Lei n. 8.429/92 por meio da Lei n. 14.230/21, em sua maioria, enfraquecem o combate à corrupção administrativa enquanto prestigiam o agente infrator. Esse equívoco na adoção de uma premissa imoral pelo legislador acaba por violar os princípios da proibição do retrocesso social e da proibição da proteção deficiente da moralidade administrativa, afora incentivar a prática de atos de improbidade.

A intenção antidemocrática do legislador e, portanto, ilegítima constitucionalmente, bem se evidencia nas alterações promovidas no art. 23. Segundo a norma agora vigente, o Ministério Público passará a contar com um prazo exíguo de 01 ano para investigar condutas ímprobas. Referido prazo poderá ser prorrogado apenas uma vez por igual prazo e desde que haja anuência do Conselho Superior.

Tais providências têm a clara intenção de blindar os agentes ímprobos, dificultando, sobremaneira, a responsabilização daqueles que se mostram indiferentes com o coletivo. Ao invés de prestigiar a proteção do direito fundamental à moralidade administrativa, o legislador optou por tutelar o agente ímprobo, o que engendra a conclusão pela inconstitucionalidade das alterações realizadas por violar o princípio da proibição da proteção deficiente.

Outrossim, no plano internacional, o Brasil já assumira o compromisso de fixar prazos absolutamente amplos para a apuração de condutas de corrupção administrativa. Tal compromisso possui força vinculante no âmbito interno, sendo defeso ao legislador desatender normas de natureza cogente e que possuem status supralegal.

Assim, pelo que se evidencia por tudo o que foi exposto no presente artigo, as alterações promovidas pela Lei n. 14.230/21, particularmente nos §§ 2 º e 3º do art. 23 da Lei n. 8.429/92, padecem de inconstitucionalidade por afronta ao princípio da proibição da proteção deficiente da moralidade administrativa, ao princípio da proporcionalidade e à independência funcional do Ministério Público, bem como incorrem em ilegalidade, por desrespeito à Convenção de Mérida, que possui caráter supralegal.


  1. Para fins do presente estudo, moralidade e probidade serão tidos como expressões equivalentes, na linha do defendido pelos professores José dos Santos Carvalho Filho (Manual de Direito Administrativo. 27. ed. São Paulo: Atlas, 2014, p. 1.088-1089) e Maria Zanella Di Pietro (Direito Administrativo. 27. ed. São Paulo: Atlas, 2014 p. 901). 
  2. HAURIOU, Maurice, Précis de droit administratif et de droit public10ª ed. Paris: Sirey, 1921, p. 424, Apud. MEIRELES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro, 28ª ed. São Paulo: Malheiros Editores Ltda., 2003, p. 87. 
  3. Moralidade administrativa, um conceito obscuro. Revista Jurídica do Ministério Público Catarinense, Florianópolis, v. 16, n. 34, p. 30-64, jun.-nov. 2021, p. 33, acessado em 30/10/21, às 09h49min, no endereço eletrônico https://seer.mpsc.mp.br/index.php/atuacao/article/view/150/73
  4. Art. 2º São nulos os atos lesivos ao patrimônio das entidades mencionadas no artigo anterior, nos casos de: (...); d) inexistência dos motivos; e) desvio de finalidade. 
  5. Ob. cit., p. 87-88. 
  6. Lei de improbidade administrativa comentada. 3ª ed. Jurídico Atlas, 2000, p. 28. 
  7. Curso de direito administrativo. 29. ed. São Paulo: Malheiros, 2012, p. 123. 
  8. Curso de Direito Constitucional Positivo. 16ª. São Paulo: Malheiros Editores Ltda., 1999, p. 648. 
  9. Porém, merece destaque o fato de que a separação entre moralidade comum e jurídica não é pacífica na doutrina. Maria Sylvia Zanella Di Pietro (Direito Administrativo, 26ª ed. p.79), Juarez Freitas (O Controle dos atos administrativos e os princípios fundamentais, 4ª ed. p. 89-90), José Guilherme Giacomuzzi (A moralidade administrativa e a boa-fé da Administração Pública: o conteúdo dogmático da moralidade administrativa, p. 167-169) dentre outros advogam que a moralidade administrativa envolve tanto a moralidade comum como a jurídica. Segundo Giacomuzzi “Daí que não vejo razão em continuar-se invocando a lição de que a ‘moralidade administrativa não se confunde com a moral comum’, ou mesmo de que a moralidade administrativa se consubstancia ‘no conjunto de regras de conduta tiradas da disciplina interior da Administração’. Dizer isso é dizer pouco, em palavras, e nada, em significado. Invocar tais ‘máximas’ é esvaziar, em conteúdo, o discurso jurídico racional, lembrando-se de que num tal discurso se apoia a legitimidade do Direito” (p. 173). 
  10. Art. 12º. A garantia dos direitos do homem e do cidadão necessita de uma força pública. Esta força é, pois, instituída para fruição por todos, e não para utilidade particular daqueles a quem é confiada. 
  11. Art. 15º. A sociedade tem o direito de pedir contas a todo agente público pela sua administração. 
  12. NOVELINO, Marcelo. Direito Constitucional. 3ª ed. São Paulo: Editora Método, 2009, p. 363-364. 
  13. No artigo “Direito Fundamental à probidade administrativa e as convenções internacionais de combate à corrupção”, publicado em 30/10/2012, acessado no endereço eletrônico https://revistadoutrina.trf4.jus.br/index.htm?https://revistadoutrina.trf4.jus.br/artigos/edicao050/Roberto_Santos.html, no dia 30/10/21, às 10h33min. 
  14. FILHO, Marino Pazzaglini; ROSA, Márcio Fernando Elias; JÚNIOR, Waldo Fazzo. Improbidade Administrativa: Aspectos Jurídicos da defesa do patrimônio Público. São Paulo: Atlas, 1999, p. 39. 
  15. GARCIA, Emerson; ALVES, Rogério Pacheco. Improbidade Administrativa. 8ª ed. São Paulo: Saraiva, 2014, p. 1.077. 
  16. O combate internacional à corrupção e a lei da improbidade. In: SAMPAIO, José Adércio Leite et al. (org.). Improbidade Administrativa: comemoração pelos 10 anos da Lei 8.429/92. Belo Horizonte: Del Rey, 2002. p. 06-07. 
  17. Moralidade administrativa como direito fundamental e consectário da cidadania no direito constitucional contemporâneo, disponível no endereço eletrônico http://www.unilago.edu.br/publicacao/edicaoatual/sumario/2018/01.pdf, acessado no dia 30/10/21, às 15h41min. 
  18. Discricionariedade administrativa e o direito fundamental à boa administração pública. 2ª Ed. São Paulo: Malheiros, 2009, p. 22. 
  19. Curso de direito administrativo: parte introdutória, parte geral e parte especial, 15ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2009, p. 119. 
  20. A Administração pública e os direitos fundamentais. Palestra proferida na Escola da Magistratura do TRF- 4ª Região. Curso Permanente: Módulo II, Direito Administrativo. Disponível em http://www.trf4.jus.br/trf4/upload/arquivos/emagis_atividades/ingowolfgangsarlet.pdf
  21. Nesse sentido, ÁVILA, Humberto Teoria dos Princípios: da definição à aplicação dos princípios jurídicos. 4ª ed. São Paulo: Malheiros Editores Ltda., 2005, p. 23-26. 
  22. CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 7. ed. Coimbra: Almeida, 2003, p. 921. 
  23. Artigo 41º - Direito a uma boa administração 1. Todas as pessoas têm direito a que os seus assuntos sejam tratados pelas instituições e órgãos da União de forma imparcial, equitativa e num prazo razoável. 2. Este direito compreende, nomeadamente: o direito de qualquer pessoa a ser ouvida antes de a seu respeito ser tomada qualquer medida individual que a afete desfavoravelmente; o direito de qualquer pessoa a ter acesso aos processos que se lhe refiram, no respeito dos legítimos interesses da confidencialidade e do segredo profissional e comercial; a obrigação, por parte da administração, de fundamentar as suas decisões. 3. Todas as pessoas têm direito à reparação, por parte da Comunidade, dos danos causados pelas suas instituições ou pelos seus agentes no exercício das respectivas funções, de acordo com os princípios gerais comuns às legislações dos Estados-Membros. 4. Todas as pessoas têm a possibilidade de se dirigir às instituições da União numa das línguas oficiais dos Tratados, devendo obter uma resposta na mesma língua. 
  24. A análise do direito de proteção sob o prisma da proibição da proteção deficiente tem origem na Alemanha, em 1975, quando foi editada lei descriminalizando o abordo. A Corte Constitucional Alemã se debruçou sobre o tema concluindo pela inconstitucionalidade da lei por não proteger adequadamente a vida intrauterina utilizando-se, pela primeira vez, o termo üntermassverbot
  25. SARLET, Ingo Wolfgang. Constituição e Proporcionalidade: o direito penal e os direitos fundamentais entre proibição de excesso e de insuficiência. In: Revista Opinião Jurídica, n. 7, 2006.1, p. 174, acessado no sítio eletrônico https://periodicos.unichristus.edu.br/opiniaojuridica/article/view/2134/655, no dia 30/10/21, às 21h56min. 
  26. Ob. cit., p. 178. 
  27. A proibição de proteção deficiente e a inconstitucionalidade do artigo 20, da lei nº 8.429/1991 in Revista da AJURIS, v. 40, n. 129, março 2013, p. 22, acessado no endereço http://ajuris.kinghost.net/OJS2/index.php/REVAJURIS/article/view/306/241, no dia 30/10/21, às 22h32min. 
  28. El princípio de proporcionalidade y derechos fundamentales. Madrid: Centro de Estúdios Políticos e Constitucionales, 2002, p. 798-799 apud GAVIÃO, Juliana Venturella Nahas, in A Proibição de proteção deficiente. Revista do Ministério Público do Rio Grande do Sul. Porto Alegre, n. 61, maio/2008 a outubro/2008, p. 101-102, acessado no endereço http://www.amprs.com.br/public/arquivos/revista_artigo/arquivo_1246460827.pdf, no dia 30/10/21, às 22h48min. 
  29. A Responsabilidade Extracontratual do Estado e o Princípio da Proporcionalidade: Vedação de Excesso e de Omissão. Revista de Direito Administrativo. Rio de Janeiro, v. 241. Jul/set de 2005, p. 27, acessado no endereço eletrônico file:///C:/Users/lmle/Downloads/admin,+A+resposabilidade+extracontratual+do+estado+e+o+princ%C3%ADpio+da+proporcionalidade.pdf, em 30/10/21, às 23h24min. 
  30. Curso de Direito Constitucional Contemporâneo. Os conceitos fundamentais e a construção do novo modelo. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 390-391. 
  31. Cita-se a seguinte jurisprudência do STF e STJ: RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. PENA DE DEMISSÃO. ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. EXCESSO DE PRAZO PARA A INSTRUÇÃO DO PAD. NÃO OCORRÊNCIA. NOVA INSTRUÇÃO PROCESSUAL APÓS O RELATÓRIO DA COMISSÃO PROCESSANTE. POSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE COISA JULGADA ADMINISTRATIVA. DESCRIÇÃO ADEQUADA DOS FATOS. AUSÊNCIA DE CERCEAMENTO DE DEFESA. AMPLA DEFESA GARANTIDA. PROPORCIONALIDADE DA PENA DE DEMISSÃO. RECURSO ORDINÁRIO A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1. Ressalvada a hipótese de prescrição, não é necessariamente, de per se, nulo o processo administrativo disciplinar por causa do decurso do prazo máximo de 140 dias para sua conclusão. Precedentes. (...). (RMS 33666, Relator (a): MARCO AURÉLIO, Relator (a) p/ Acórdão: EDSON FACHIN, Primeira Turma, julgado em 31/05/2016, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-201 DIVULG 20-09-2016 PUBLIC 21-09-2016) e PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 1973. APLICABILIDADE. PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. MAGISTRADO DO ESTADO DO AMAPÁ. CONDUTA INCOMPATÍVEL COM A DIGNIDADE, HONRA E DECORO DE SUAS FUNÇÕES. AUSÊNCIA DE PROVA DOS FATOS IMPUTADOS. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. INOBSERVÂNCIA DOS LIMITES DA ACUSAÇÃO. FUNDAMENTO SUFICIENTE DO ACÓRDÃO RECORRIDO NÃO IMPUGNADO. INCIDÊNCIA DA SÚMULA N. 283/STF. EXCESSO DE PRAZO PARA A CONCLUSÃO DO PROCESSO DISCIPLINAR. AUSÊNCIA DE PREJUÍZO À DEFESA. PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE NA APLICAÇÃO DA PENA. OBSERVÂNCIA. RECURSO IMPROVIDO. (...). V - Ausência de nulidade por excesso de prazo para o julgamento administrativo. Entendimento pacífico desta Corte no sentido de que, em processo administrativo disciplinar, somente se reconhece e declara a nulidade em face da efetiva demonstração do prejuízo suportado, sendo aplicável o princípio pas de nullité sans grief. (...). (RMS 51.856/AP, Rel. Ministra REGINA HELENA COSTA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 17/11/2020, DJe 18/12/2020). 
  32. Ob. cit. p. 72. 
  33. Ob. cit., p. 959. 
  34. Ob. cit., p. 103. 
  35. Art. 9º Se o órgão do Ministério Público, esgotadas todas as diligências, se convencer da inexistência de fundamento para a propositura da ação civil, promoverá o arquivamento dos autos do inquérito civil ou das peças informativas, fazendo-o fundamentadamente. (...). § 3º A promoção de arquivamento será submetida a exame e deliberação do Conselho Superior do Ministério Público, conforme dispuser o seu Regimento. 
  36. Cito, por exemplo, TRINTADE, Antônio Augusto Cançado, in Tratado de Direito Internacional dos Direitos Humanos, vol. I, 2ª ed., Editora Fabris, 2003, e PIOVESAN, Flávia, Direitos Humanos e o Direito Constitucional Internacional, 7ª ed. Saraiva, 2006. 
  37. Também chamada de Convenção de Mérida. 
  38. Ob. cit. 
  39. Particularmente porque os acordos multilaterais não se preocupam, como regra, da aplicação de penalidades civis aos agentes corruptos, senão da prática de crimes que, usualmente, envolvem penas de restrição de liberdade e medidas cautelares vinculadas aos delitos criminais. 
  40. Artigo 43. Cooperação internacional. 1. Os Estados Partes cooperarão em assuntos penais conforme o disposto nos Artigos 44 a 50 da presente Convenção. Quando proceda e estiver em consonância com seu ordenamento jurídico interno, os Estados Partes considerarão a possibilidade de prestar-se assistência nas investigações e procedimentos correspondentes a questões civis e administrativas relacionadas com a corrupção. 
  41. Ob. cit. p. 1.079-1.080. 
  42. Artigo 29. Prescrição. Cada Estado Parte estabelecerá, quando proceder, de acordo com sua legislação interna, um prazo de prescrição amplo para iniciar processos por quaisquer dos delitos qualificados de acordo com a presente Convenção e estabelecerá um prazo maior ou interromperá a prescrição quando o presumido delinqüente tenha evadido da administração da justiça. 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 

ÁVILA, Humberto Teoria dos Princípios: da definição à aplicação dos princípios jurídicos. 4ª ed. São Paulo: Malheiros Editores Ltda., 2005. 

BARROSO, Luís Roberto. Curso de Direito Constitucional Contemporâneo. Os conceitos fundamentais e a construção do novo modelo. São Paulo: Saraiva, 2010. 

CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 7. ed. Coimbra: Almeida, 2003. 

CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 27. ed. São Paulo: Atlas, 2014. 

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ECHE, Luís Mauro Lindenmeyer. Primeiras impressões sobre a Lei n. 14.230/21: o enfraquecimento do combate à corrupção diante da limitação do poder investigativo do Ministério Público. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 26, n. 6727, 1 dez. 2021. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/95004. Acesso em: 25 abr. 2024.