Recurso Ordinário Constitucional

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Resumo:


  • Os Pacientes estão recolhidos no Sistema Prisional de Maceió-Alagoas, após terem tido a ordem de Habeas Corpus denegada pelo TRF-5ª Região.

  • A defesa argumenta que os Pacientes são primários, possuem bons antecedentes, residências fixas e nunca deixaram de atender às convocações das autoridades, questionando a necessidade da prisão preventiva.

  • A representação da Polícia Federal e o pedido do Ministério Público Federal para a prisão dos Pacientes são baseados em alegações de desvios de recursos públicos, mas não apresentam elementos concretos que justifiquem a segregação cautelar dos acusados.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

IX - DOS REQUISITOS NECESSÁRIOS PARA A DECRETAÇÃO DE PRISÃO PREVENTIVA

 

Dado que resta claro que a decisão não aponta onde estariam os elementos colhidos que serviriam para a segregação cautelar dos Pacientes, se limitando apenas a fazer genéricas alegações, pedimos vênia para expor que os requisitos ensejadores da prisão preventiva não se fazem presentes, mormente que este Eg. TRF-5ª Região já se pronunciou acerca destes mesmos fatos, e, seguindo o entendimento da Procuradoria Regional da República, negou tanto o pedido de prisão cautelar quanto o pedido de afastamento do então prefeito de XXXXX-AL, XXXXXXXXX.

O Eg. Supremo Tribunal Federal possui sólidas decisões jurisprudenciais enfatizando, a contrário senso, situações em que a custódia cautelar, como a presente, não possui razão de ser, tendo reconhecido como ilegais as prisões preventivas decretadas, por exemplo: com base na gravidade abstrata do delito (HC 90.858/SP, 1ª Turma, rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJU de 21/06/2007; HC 90.162/RJ, 1ª Turma, rel. Min. Carlos Britto, DJU de 28/06/2007); na periculosidade presumida do agente (HC 90.471/PA, 2ª Turma, rel. Min. Cezar Peluso, DJU de 13/09/2007); no clamor social decorrente da prática da conduta delituosa (HC 84.311/SP, 2ª Turma, rel. Min. Cezar Peluso, DJU de 06/06/2007) ou, ainda, na afirmação genérica de que a prisão é necessária para acautelar o meio social (HC 86.748/RJ, 2ª Turma, rel. Min. Cezar Peluso, DJU de 06/06/2007); na falta de comprovação de residência fixa e de ocupação licita (STF, HC 80.805/SP, 1ª Turma, rel. Min. Ilmar Galvão, DJ 19/10/01).

Ressalte-se ainda que nos autos do HC 130.106/PR, sob a relatoria de Sua Excelência Ministro Teori Zavaski, em julgamento datado de 23/2/XXXX, a Colenda Segunda Turma do Egrégio Supremo Tribunal Federal – por votação unânime –, analisando a custódia cautelar de Renato Duque, vaticinou que:

A prisão preventiva supõe prova da existência do crime (materialidade) e indício suficiente de autoria; todavia, por mais grave que seja o ilícito apurado e por mais robusta que seja a prova de autoria, esses pressupostos, por si sós, são insuficientes para justificar o encarceramento preventivo. A eles deverá vir agregado, necessariamente, pelo menos mais um dos seguintes fundamentos, indicativos da razão determinante da medida cautelar: (a) a garantia da ordem pública, (b) a garantia da ordem econômica, (c) a conveniência da instrução criminal ou (d) a segurança da aplicação da lei penal.

Acontece que no caso em tela, a não ser por argumentos poderiam ser utilizados em sede de decisão de mérito, os pressupostos que ensejam a decretação preventiva dos Pacientes, não estão presentes. Os requisitos necessários para se decretar a prisão de alguém devem ser demonstrados, e jamais presumidos. Aliás, no mundo jurídico, toda presunção é perigosa, e só é cabível excepcionalmente em casos especificamente previstos em lei.

Ainda na senda jurisprudencial do Eg. Supremo Tribunal Federal:

Reafirme-se a crença no Direito; reafirme-se o entendimento de que, sendo uma ciência, o meio justifica o fim, mas não este aquele, advindo a almejada segurança jurídica da observância do ordenamento normativo. O combate ao crime não pode ocorrer com atropelo da ordem jurídica nacional, sob pena de vir a grassar regime totalitário, com prejuízo para toda a sociedade” (STF – 2ª turma – HC nº 74639- 0/RJ – rel. Min. Marco Aurélio, Diário da Justiça, 31-10-1996).

 

IX.A - DA SUBSIDIARIEDADE DAS PRISÕES CAUTELARES

 

Inicialmente deve ser dito que dentre as possiblidades de medidas cautelares penais previstas pelo ordenamento, as prisões são utilizadas apenas em último caso, ou seja, são utilizadas apenas quando as demais medidas cautelares não foram suficientes para o caso concreto.

Ou seja, é importante atentar para o fato de que, com a alteração legislativa implementada pela Lei 12.403/2011, o legislador fez surgir um novo requisito para a decretação da prisão preventiva, um requisito negativo, qual seja, o descabimento de qualquer das medidas cautelares diversas, previstas no artigo 319 do Código de Processo Penal.

Assim, conforme teor do artigo 282, incisos I e II do CPP, as medidas cautelares devem ser não apenas necessárias, mas também adequadas para o caso em espeque. O parágrafo 6º do mesmo artigo 282 é claro ao se determinar que a prisão preventiva só é cabível quando não for suficiente outra medida cautelar. A decisão atacada, porém não estampa as razões pelas quais outras medidas cautelares penais não são suficientes. Respeitosamente, de forma analógica, nenhuma decisão pode ser considerada quando não se aponta os elementos concretos, e apenas são utilizados argumentos do tipo: “Não, porque não!”.

Destarte, o Eg. Supremo Tribunal Federal, em inúmeros julgados de pedido de Habeas Corpus, pacificou o entendimento acerca da subsidiariedade da segregação cautelar:

Considerando que a prisão e a última ratio das medidas cautelares (§ 6o do art. 282 do CPP — incluído pela Lei 12.403/2011), deve o juízo competente observar aplicabilidade, ao caso concreto, das medidas cautelares diversas elencadas no art. 319 do CPP, com a alteração da Lei 12.403/2011. [HC 106.446, rel. p/ o ac. min. Dias Toffoli, j. 20-9-2011, 1a T, DJE de 11-11-2011.]

 

Paciente presa em flagrante por infração aos arts. 33 e 35 da Lei 11.343/2006. Pedido de liberdade provisória indeferido pelo juízo de primeiro grau. Decisão judicial não motivada em elementos concretos. Constrangimento ilegal caracterizado. Ordem concedida, no sentido de que o juízo de origem estabeleça a paciente medidas cautelares, nos termos da nova redação do art. 319 do CPP. [HC 108.990, rel. min. Gilmar Mendes, j. 23-8-2011, 2a T, DJE de 10-10-2011.]

 

As recentes alterações promovidas pela Lei 12.403/2011 no CPP trouxeram alterações que aditaram uma exceção a regra da prisão. Não mais subsistente a situação fática que ensejou a decretação da prisão preventiva, e o caso de concessão parcial da ordem de habeas corpus, para que o juiz de piso substitua a segregação cautelar pelas medidas cautelares diversas da prisão elencadas no art. 319, I, II III e VI, do CPP. [HC 109.709, rel. min. Dias Toffoli, j. 18-10-2011, 1a T, DJE de 20-4-2012.]

 

O art. 319 do CPP, com a redação dada pela Lei 12.403/2011, inseriu uma série de medidas cautelares diversas da prisão, dentre elas: I — Comparecimento periódico em juízo, no prazo e nas condições fixadas pelo juiz, para informar e justificar atividades; II — Proibição de acesso ou frequência a determinados lugares quando, por circunstancias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado permanecer distante desses locais para evitar o risco de novas infrações; e III — Proibição de manter contato com pessoa determinada quando, por circunstancias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado dela permanecer distante. Considerando que a prisão e a última ratio das medidas cautelares (§ 6o do art. 282 do CPP — incluído pela Lei 12.403/2011), deve o juízo competente observar aplicabilidade, ao caso concreto, das medidas cautelares diversas elencadas no art. 319 do CPP, com a alteração da Lei 12.403/2011. No caso, os argumentos do juízo de origem para vedar a paciente a possibilidade de recorrer em liberdade não demonstram que a sua liberdade poderia causar perturbações de monta, que a sociedade venha a se sentir desprovida de garantia para a sua tranquilidade, fato que, a meu ver, retoma o verdadeiro sentido de se garantir a ordem publica — acautelamento do meio social —, muito embora não desconheça a posição doutrinaria de que não há definição precisa em nosso ordenamento jurídico para esse conceito. Tal expressão e uma clausula aberta, alvo de interpretação jurisprudencial e doutrinaria, cabendo ao magistrado a tarefa hermenêutica de explicitar o conceito de ordem pública e sua amplitude. Na espécie, o objetivo que se quer levar a efeito — evitar que a paciente funcione como verdadeiro pombo-correio da organização criminosa, como o quer aquele juízo de piso — pode ser alcançado com aquelas medidas cautelares previstas nos incisos I a III do art. 319 do CPP em sua nova redação. Se levado em conta o critério da legalidade e da proporcionalidade e o fato de a paciente, ao contrário dos outros corréus, não ter sido presa em flagrante, não possuir antecedentes criminais e estar em liberdade provisória medidas cautelares diversas da prisão quando da sentença condenatória, aplicar as medidas cautelares diversas da prisão seria a providencia mais coerente para o caso. Ordem parcialmente concedida para que o juiz de origem substitua a segregacao cautelar da paciente por aquelas medidas autelares previstas nos incisos I a III do art. 319 do CPP. [HC 106.446, rel. p/ o ac. min. Dias Toffoli, j. 20-9-2011, 1a T, DJE de 11-11-2011.]

Sua Excelência o Ministro Joaquim Barbosa, Relator da Ação Penal 470, mesmo com toda a repercussão daquele caso, como foi notório nacionalmente, vaticinou de forma brilhante que:

A recente reforma por que passou a legislação processual penal brasileira teve, entre seus objetivos, o de estabelecer diversas medidas cautelares que pudessem ser aplicadas pelo juiz, no curso da ação penal, como alternativa a prisão preventiva, que e a mais gravosa de todas as cautelares processuais. [AP 470, rel. min. Joaquim Barbosa, dec. monocrática, j. 7-11-2012, DJE de 9-11-2012.]  

 

IX.B - DA DEMONSTRAÇÃO DA NECESSIDADE PARA A DECRETAÇÃO DE PRISÃO PREVENTIVA

 

Se a segregação cautelar dos Pacientes não foi necessária quando estes estavam à frente da prefeitura de XXXXX, então agora é que muito mais não existe necessidade alguma da segregação cautelar, uma vez estando eles afastados da administração pública municipal.

Não obstante a MM magistrada federal tenha dito em sua r. decisão que as medidas cautelares só podem ser decretadas quando for comprovada sua necessidade, a decisão não aponta onde estaria a necessidade de se prender cautelarmente os Pacientes, quando o inquérito policial já foi enviado ao Poder Judiciário, quando os Pacientes não mais fazem parte da administração pública municipal, nem de qualquer outra, e quando já passado mais de 01 (um) ano dos fatos alegados.

Não há testemunhas que aleguem que os Pacientes tenham lhes coagido; durante todo o transcorrer do inquérito policial o Delgado Federal jamais alegou que algum dos Pacientes tentou atrapalhar as investigações. Então como poderia os Pacientes atrapalhar as investigações, se o inquérito já foi concluído. E nem se fale em obstrução da instrução processual, posto que sequer a denúncia foi oferecida.

Com todas as vênias possíveis, a não ser por alegações genéricas, a decisão não diz onde estaria a necessidade de segregação cautelar dos Pacientes. Infelizmente, mesmo não comprovando a necessidade da prisão preventiva, a MM magistrada federal decreta a prisão dos Pacientes. 

Ressalte-se mais de uma vez que desde o fim de XXXX de XXXX os Pacientes não estão mais à frente da administração pública do Município de XXXXX. O que torna a prisão ainda mais desnecessária.

Neste sentido, diz o insigne e festejado Julio Fabbrini Mirabete[1]:

“Como, em princípio, ninguém deve ser recolhido à prisão senão após a sentença condenatória transitada em julgado, procura-se estabelecer institutos e medidas que assegurem o desenvolvimento regular do processo com a presença do acusado sem sacrifício de sua liberdade, deixando a custódia provisória apenas para as hipóteses de absoluta necessidade.” - Grifamos.

Jugando o HC 111.037, em caso análogo ao que ora se apresenta, e cuja relatoria ficou a cargo de Sua Excelência o Ministro Gilmar Mendes, onde fora decreta a prisão preventiva de ex-prefeito municipal, que já tinha sido afastado do cargo político-administrativo, ou seja, Paciente que tinha sido afastado do cargo de Prefeito e ainda assim ficou preso preventivamente, o Eg. Supremo Tribunal Federal determinou que o mesmo fosse posto em liberdade, uma vez que, afastado definitivamente do cargo, não havia mais razões concretas para sua segregação cautelar:

VOTO

O Senhor Ministro Gilmar Mendes (Relator): Conforme destacado na decisão concessiva da medida liminar, a mudança fática da condição do paciente, hoje cassado do cargo de prefeito, é condição sine qua non para o exame da necessidade da manutenção do decreto constritivo.

 Assim, não havendo essa demonstração concreta, deixa de ser razoável limitar o direito constitucional de ir e vir, e de responder ao processo em liberdade, protegido pela presunção da inocência. (HC n. 72.368, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ 09/06/2005; RHC n. 71.954, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ 03/03/1995).

Conforme se depreende dos fundamentos da decisão proferida pelo Superior Tribunal de Justiça, a manutenção do decreto baseou-se unicamente na possibilidade de o paciente interferir na instrução criminal.

Considerando o caso concreto, noto que os argumentos esboçados para a decretação da preventiva atenderam, à época, ao disposto no artigo 312 do CPP, que rege a matéria.

Contudo, não mais há como se inferirem razões concretas para a manutenção da prisão do paciente, haja vista este ter sido definitivamente cassado, não possuindo mais qualquer influência político-administrativa na municipalidade.

De um modo geral, a prisão preventiva deve indicar, de forma expressa, os seguintes fundamentos para a decretação da prisão cautelar, nos termos do art. 312 do CPP: i) garantia da ordem pública; ii) garantia da aplicação da lei penal; e iii) conveniência da instrução criminal.

Na linha da jurisprudência deste Tribunal, porém, não basta a mera explicitação textual dos requisitos previstos, sendo necessário que a alegação abstrata ceda à demonstração concreta e firme de que tais condições realizam-se na espécie.

A tarefa de interpretação constitucional para a análise de uma excepcional situação jurídica de constrição da liberdade dos cidadãos exige que a alusão a esses aspectos esteja lastreada em elementos concretos.

Da leitura dos argumentos expendidos pela Corte de origem, constato que não há mais a indicação de fatos concretos que justifiquem o alegado risco para a ordem pública, ou para a instrução criminal.

[HC 111.037, rel. min. Gilmar Mendes, j. 6-5-2014, 2a T, DJE de 3-6-2014.]

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Os nossos Tribunais, inclusive o Superior Tribunal de Justiça, são uníssonos no sentido de que a segregação cautelar só é cabível em situações excepcionais:

 

“A liberdade é a regra do Estado de Direito Democrático; a restrição à liberdade é a exceção, que deve ser excepcionalíssima, aliás. Ninguém é culpado de nada enquanto não transitar em julgado a sentença penal condenatória; ou seja, ainda que condenado por sentença judicial, o causado continuará presumidamente inocente até que se encerrem todas as possibilidades para o exercício do seu direito à ampla defesa. Assim, sem o trânsito em julgado, qualquer restrição à liberdade terá finalidade meramente cautelar. A lei define as hipóteses para essa exceção e a Constituição Federal nega validade ao que o Juiz decidir sem fundamentação. O pressuposto de toda decisão é a motivação; logo não pode haver fundamentação sem motivação. Ambas só poderão servir gerando na decisão a eficácia pretendida pelo Juiz se amalgamadas com suficientes razões”. (STJ, 5ª Turma, HC nº 3871/RS, Rel. Ministro Edson Vidigal, DJ 13/11/1995).

 

"CONSTITUCIONAL – PROCESSUAL PENAL – LIBERDADE PROVISÓRIA – INTERESSE PÚBLICO. Nenhuma sanção penal ou processual penal é aplicada sem interesse público. A liberdade provisória é compulsória quando a lei garante ao indiciado ou réu defender-se em liberdade, com ou sem fiança. A liberdade provisória, todavia, pode depender do poder discricionário (não arbitrário) do juiz. Inconstitucional, porém, vedá-la de modo absoluto. A Constituição da República impõe à lei admitir a liberdade provisória, com ou sem fiança (art. 5º, LXVI). Quando a lei maior restringe institutos, di-lo expressamente (art. 5º, XLIII), como ocorre com os crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia" (STJ – 6ª T – RHC 2556-0 – j. 08.03.1993 – Rel. Luiz Vicente Cernicchiaro apud SILVA FRANCO, Alberto [et al], Código de Processo Penal..., p. 285-6).

 

Séculos atrás, o Marquês de Beccaria já anotava que “o acusado não deve ser encarcerado senão na medida em que for necessário para impedi-lo de fugir ou de ocultar as provas do crime” [2].

O festejado autor Eugênio Pacelli de Oliveira, preleciona que:

“Assim, as privações da liberdade antes da sentença final devem ser judicialmente justificadas e somente na medida em que estiverem protegendo o adequado e regular exercício da jurisdição penal. Pode-se, pois, concluir que tais prisões devem ser cautelares, acautelatórias do processo e das funções da jurisdição. Somente aí poderá legitimar a privação da liberdade de quem é reconhecido pela ordem jurídica como ainda inocente”. [3] 

No mesmo sentido, Geraldo Prado:

"não é possível antecipar a providência de direito material que somente uma sentença de mérito, no final do processo pode prover", sendo que, somente é admitida a prisão do imputado, durante a persecução, "por conta da comprovação de duas situações fundamentais processuais: toda vez que a liberdade do imputado puser em risco o conteúdo de verdade que o processo penal terá que buscar, ou vier a inviabilizar a aplicação da lei penal, deixando em perigo a efetivação da sanção criminal." [4]

Nesta mesma linha de pensamento, o renomado doutrinador Afrânio Silva Jardim, entende que:

“Note-se, outrossim, que a provisoriedade e o princípio da necessidade da medida cautelar vêm consagrados no art. 316 do Código de Processo Penal ao possibilitar a sua revogação, a qualquer tempo, se o juiz verificar a insubsistência do motivo que a determinou”. [5]    

Com todo o respeito devido, porém a decisão que determinou a prisão dos acusados não aponta a necessidade de segregação dos mesmos, muito embora até diga que toda medida cautelar só pode ser decretada quando houver necessidade.

Ocorre que este Eg. Tribunal Regional Federal da 5ª Região, decidindo o Pedido de Prisão Preventiva - PEPRI nº 000153793XXXX405000002, com decisão de DJE - Data: 21/02/XXXX - Página: 12, cuja relatoria ficou a cargo de Sua Excelência o Desembargador Federal Cid Marconi, já julgou caso semelhante, onde determinado foi requerido a prisão preventiva de determinado prefeito municipal, sendo que entre a data do pedido de prisão preventiva e a data dos fatos imputados, já havia transpassando algum tempo (assim como no caso presente), sendo que este Eg. Tribunal Regional Federal, negou o pedido de prisão em virtude de que entre a data do fato e o pedido de prisão, já haver transpassado certo lapso temporal, e em que durante todo este tempo não haver o citado então prefeito ter cometido qualquer delito:

4. Não obstante haja indícios de autoria e prova da materialidade delitivas, com a entrada em vigor da Lei 12.403/2011, a prisão preventiva só pode ser determinada quando presentes os requisitos do art. 312, do CPP e de acordo com o disposto no art. 313, inciso I, c/c o art. 282, § 6º, ambos do Código de Processo Penal, quando será cabível houver prática de crime doloso punido com pena privativa de liberdade máxima superior a 04 (quatro) anos, e quando não for cabível a sua substituição por outra medida cautelar (art. 319 do Código de Processo Penal).

5. Desnecessidade da decretação da prisão preventiva dos acusados, tendo em vista o transcurso de longo tempo desde a data dos fatos até os dias atuais, sem que haja notícia de reiteração criminosa ou de que os acusados pretendam fugir do distrito da culpa ou que estejam de alguma forma obstando a coleta de provas, devendo ser ressaltado que a investigação já está concluída.

6. Ausência de elementos que indiquem a existência de risco concreto da prática de crimes da mesma natureza, após a deflagração de várias operações no Município e dos Denunciados tem profissão definida e residência fixa, estando presentes no distrito da culpa, tendo apresentado suas respostas preliminares à Denúncia não havendo indícios de que eles irão causar prejuízos à instrução criminal ou, em um primeiro momento, à aplicação da lei penal, configurando-se desnecessária sua custódia cautelar.

7. O afastamento do sócio de suas empresas não teve caráter punitivo, mas sim cautelar, possuindo, o escopo de impedir que ele viesse a influir na apuração dos fatos, garantindo a regularidade das investigações realizadas no procedimento investigativo do MPF, não havendo como falar, assim, em imposição de medida cautelar por prazo indeterminado.

8. Não possuindo, portanto, caráter punitivo, a suspensão preventiva não pode causar prejuízos financeiros ou prejudicar por tempo indefinido as atividades da empresa, que, segundo o Requerente, garante a sua subsistência e a de sua família com a realização de suas atividades comerciais, não há impedimento a que elas retornarem às suas atividades, garantindo-se o acesso às atividades de natureza empresarial, financeira e econômica; bem como à movimentação das contas bancárias das referidas firmas, devendo ser ressaltado que elas, não têm, no momento, vínculo com a Prefeitura de Emas.

9. Agravo regimental do MPF improvido. Agravos regimentais dos Denunciados providos, podendo eles, retornar, respectivamente, ao cargo público (o Prefeito) e à direção das empresa (o representante da AJS), salvo se por outro motivo estejam impedidos de fazê-lo.

 

Ressalte-se que no caso supra estampado, o prefeito foi reconduzido ao cargo de Prefeito, e nesse caso que ora se apresenta, os Pacientes, nem o então prefeito XXXXXXXXX, não mais fazem parte da administração pública municipal. 

Este Eg. TRF-5ª Região também já decidiu que:

 

Processual Penal. Habeas corpus. Paciente indiciado pela prática de fraude contra a Previdência Social, por meio do recrutamento de beneficiários por meio da sua atividade como presidente de entidade sindical. Substituição da prisão preventiva por medidas cautelares consistentes no afastamento da função e na proibição de frequência à sede do sindicato. Concessão parcial da ordem. (HC XXXX00000001552 Desembargador Federal Rubens de Mendonça Canuto, Quarta Turma DJE - Data: 30/09/XXXX - Página::129)

 

 

Processual Penal. Ação Penal Originária. Pedido de reconsideração conhecido como agravo interno. Desnecessidade de restabelecimento da prisão dos indiciados. Ilícitos em apuração desde XXXX, com busca e apreensão já efetuada, além de afastados agentes públicos de suas funções. Medida cautelar. Sócios de empresa de locação de veículos. Vínculo encerrado com os entes públicos sob investigação. Substituição das medidas anteriormente determinadas por proibição de comparecimento aos municípios envolvidos. Agravo interno não provido. (PEPRI 000095241XXXX405000002, Rel. Desembargador Federal Lazaro Guimarães, PLENO, DJE - Data: 30/11/XXXX - Página: 33).

 

Por tanto, analisando a decisão, não se constata onde estaria a necessidade de segregação cautelar dos pacientes.

 

IX.C -  DA ALEGAÇÃO DE GARANTIA DE MANUTENÇÃO DA ORDEM PÚBLICA E ECONÔMICA

 

A decisão que determinou a prisão preventiva dos Pacientes, ainda se funda na ordem pública e econômica. Porém, não aponta onde estaria a necessidade ordem pública e econômica.

Como dito, os fatos apontados foram supostamente praticados em XXXX de XXXX, como o próprio Delgado de Polícia Federal alega em sua representação, e desde então os Pacientes não se envolveram em absolutamente nenhum outro fato.

A chamada ordem pública “é a situação ou o estado de legalidade normal em que as autoridades exercem suas precípuas atribuições e os cidadãos as respeitam e acatam, sem constrangimento ou protesto”[6]

Por tanto, qual foi a “desordem pública” que os pacientes realizaram? Em outras palavras, onde está nos autos qualquer mero indício que aponte que os Pacientes ameaçaram a ordem pública?

A verdade é que não houve qualquer ameaça à ordem pública, de forma que os Pacientes não apresentam qualquer periculosidade. E uma vez que a decisão não aponta onde estaria a necessidade de se resguardar a ordem pública, então tal alegação não merece prosperar.

Os fatos alegados ocorreram há mais de 01 (um) anos, e desde então não existe qualquer registro de que os Pacientes tenham pervertido a ordem pública, de nenhuma forma.

O que se presume é a inocência, e não a culpabilidade, de forma que, não comprovada qualquer alegação dos órgãos de persecução criminal, então a presunção sempre militará em favor do acusado.

Assim, não podem ser admitidas expressões vagas, que denotem uma análise abstrata e genérica da medida, e sim uma análise concreta e circunstanciada da prisão preventiva sob este fundamento da manutenção da ordem pública. O juiz deve pautar sua fundamentação, utilizando-se de expressões que remetam ao caso concreto, que analisem o autor do fato e as circunstâncias subjetivas e objetivas que o rodeiam. A decisão não pode ser genérica, não bastando a mera alusão à letra da lei, não podendo basear-se em presunções, nem em preconceitos sociais ou de quaisquer espécie.

Neste sentido, é a sólida jurisprudência do Eg. Supremo Tribunal Federal:

 

“HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. PRISÃO PREVENTIVA. (i) GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA: GRAVIDADE DO DELITO E ACAUTELAMENTO DO MEIO SOCIAL. (ii) RISCO À INSTRUÇÃO CRIMINAL. EXAURIMENTO. FUNDAMENTOS INIDÔNEOS.

1. A prisão preventiva para garantia da ordem pública, fundada na gravidade do delito e na necessidade de acautelar o meio social, não encontra respaldo na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal.

2. Exaurida a instrução criminal, a prisão cautelar sob esse fundamento torna-se desnecessária. Ordem concedida” (HC n. 88.448/RJ, de minha relatoria, 2ª Turma, por empate na votação, DJ 9.3.2007).

 

“Por falta de motivação idônea, a Turma deferiu ‘habeas corpus’ para revogar a prisão preventiva decretada contra pronunciado pela suposta prática de homicídio simples, a fim de determinar a imediata expedição de alvará de soltura em seu favor, se por outro motivo não estiver preso. No caso, a custódia fundamentara-se na necessidade de resguardo da ordem pública, em razão do alegado envolvimento do paciente em homicídios anteriores, bem como na gravidade das penas cominadas aos crimes a ele imputados, a indicar a impossibilidade de sua fuga do distrito da culpa. Inicialmente, salientou-se que ao mesmo tempo em que o tribunal estadual assentara inexistir embasamento para a prisão cautelar do paciente pelo seu suposto envolvimento em outros homicídios, utilizara-se de tais fatos para justificar a sua segregação em outra ação penal (...) Asseverou-se, no ponto, que a ameaça à ordem pública só pode ser aferida no contexto dos fatos. Ademais, considerou-se que o decreto impugnado não apontara circunstâncias concretas a justificar a adoção da excepcional prisão preventiva, valendo-se, da presunção de que, em liberdade, o paciente subtrair-se-ia à aplicação da lei penal, tendo em conta a pena prevista para o delito de homicídio” (HC 90936/RS, rel. Min. Carlos Britto, 3.8.2007, 1ª Turma), cf. Roberval Rocha Ferreira Filho (org), Principais Julgamentos do STF, Podivm, 2008, Salvador, p. 289.

 

Outrossim, “ordem econômica” é uma espécie do gênero ordem pública. Conforme Guilherme de Souza Nucci:

“Nesse caso, visa-se, com a decretação da prisão preventiva, impedir que o agente, causador de seríssimo abalo à situação econômico-financeira de uma instituição financeira ou mesmo de órgão do Estado, permaneça em liberdade, demonstrando à sociedade a impunidade reinante nessa área”[7]

Ora, igualmente ao que se disse sobre a ordem pública, nada há nos autos que comprove que os Pacientes estivessem de alguma forma atrapalhando a ordem econômica

Este Eg. TRF-5ª Região já se pronunciou, em várias oportunidades, da seguinte forma:

 

PENAL E PROCESSUAL PENAL. CRIME DE CORRUPÇÃO PASSIVA. PRISÃO EM FLAGRANTE CONVERTIDA EM PRISÃO PREVENTIVA. CONCESSÃO DE LIBERDADE PROVISÓRIA. AUSÊNCIA DOS REQUISITOS PARA A CUSTÓDIA CAUTELAR. DESPROVIMENTO DO RECURSO EM SENTIDO ESTRITO.

I - A Prisão Preventiva é medida excepcional que deverá ser decretada somente quando revelar-se indispensável à Garantia da Ordem Pública, da Instrução Criminal ou para assegurar a aplicação da Lei Penal (artigo 312 do Código de Processo Penal).

II - A Decisão recorrida analisou detidamente a situação dos autos e, de maneira fundamentada, considerou ausentes os requisitos constantes do artigo 312 do Código de Processo Penal, destacando que "inexistem registros de antecedentes criminais do Recorrido, além de possuir ocupação lícita e residência fixa", para determinar a Soltura, mediante arbitramento de Fiança.

III - Desprovimento do Recurso em Sentido Estrito, para manter os termos da Decisão, por seus Fundamentos. (RSE 000012062XXXX4058303, Rel. Desembargador Federal Alexandre Costa de Luna Freire, Primeira Turma, DJE - Data: 10/01/XXXX - Página: 19, UNÂNIME).

 

IX.D - DA ALEGAÇÃO QUE A PRISÃO PREVENTIVA DOS PACIENTES SERIA NECESSÁRIA EM VIRTUDE DA CONVENIÊNCIA DA INSTRUÇÃO CRIMINAL

 

A decisão ainda aponta o cabimento da prisão preventiva dos Pacientes, em decorrência da conveniência da instrução criminal.

Ora, tal alegação é um tanto incongruente, dato que sequer há processo, posto que nem mesmo a denúncia foi oferecida. Como poder-se-ia obstruir-se a instrução criminal, quando o inquérito policial já fora remetido ao Poder Judiciário, e quando a denúncia não foi ofertada?

Segundo a doutrina e a jurisprudências dominantes, a conveniência da instrução criminal é o motivo resultante da garantia de se preservar o devido processo legal, no seu aspecto procedimental. Dessa forma, transtornos provocados pela atuação do imputado, visando à perturbação do desenvolvimento da instrução, que compreende a colheita de provas de um modo geral, tanto na fase investigativa quanto judicial, é motivo a ensejar a sua prisão.

Por conveniência da instrução criminal justifica-se quando necessária a prisão para garantir a produção das provas e o regular andamento do processo, tem finalidades “endoprocessuais”. Vale frisar que a prisão, nesta hipótese, deve estar vinculada ao processo propriamente dito. Assim, não havendo processo e nem inquérito, obviamente também não há instrução criminal, e se não há instrução criminal, não há que se tutelar a conveniência deste. 

Não se protege o que não existe!

 

IX.E - DA APLICAÇÃO DA LEI PENAL

 

Para assegurar a aplicação da lei penal: ocorre quando o réu está tentando se evadir ou se desfazer de seus bens, sendo, portanto, necessária a prisão para garantir a efetividade da lei penal. Evidentemente que, para a configuração deste requisito, também se fazem presentes os mesmos argumentos apresentados quando se tratou do requisito da “ordem pública”, na medida em que não são admissíveis meros argumentos genéricos, mas sim concretos, não sendo possível, por exemplo, admitir-se a prisão sob esta modalidade, apenas por que o réu é rico e pode se evadir do País mais facilmente ou porque reside em região de fronteira ou próximo a um aeroporto. Tais presunções, como visto, não são aceitas e ferem, a rigor, o princípio da dignidade da pessoa humana, em seu núcleo essencial, além é claro do princípio da presunção de inocência. 

garantia de aplicação da lei penal tem por finalidade a decretação da prisão preventiva, visando assegurar a finalidade útil do processo penal, isto é, proporcionar ao Estado o exercício do seu direito de punir, aplicando a devida sanção penal. Essa garantia visa impedir, principalmente, a fuga do imputado do distrito da culpa. Guilherme de Souza Nucci elenca atitudes que poderiam ensejar a sua configuração[8]:

a) sumir logo após a prática do crime, sem retornar, nem dar o seu paradeiro; b) dispor de seus bens e desligar-se de seu emprego; c) despedir-se de familiares e amigos, buscando a transferência de valores ou bens a outro Estado ou ao exterior; d) viajar a local ignorado, sem dar qualquer satisfação do seu paradeiro (...); e) ocultar sua residência e manter-se em lugar inatingível pela Justiça.

Ocorre que em nenhum momento, a decisão que determinou a segregação cautelar dos Pacientes demonstra que estes tenham praticado qualquer destes condutas, nem sequer algo parecido com elas.

 

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Sobre o autor
Agnelo Baltazar Tenório Férrer

Advogado militante. Servo de Jesus Cristo.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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