CAPÍTULO III
MOVIMENTO DE LEI E ORDEM NA ATUAL SOCIEDADE BRASILEIRA
Para a harmoniosa introdução deste capítulo, faz-se necessário os ensinamentos do professor Clóvis Alberto Volpe Filho (2004), ao dizer que os habitantes de determinado território delegam ao Estado, por meio de um acordo, as garantias de uma convivência harmoniosa. Estando essa harmonia ameaçada, o Estado, portanto, pode agir para coibir e punir. É neste ponto que encontramos os nossos maiores problemas.
O Estado, todavia, não está ilimitado em tal poder de agir, é existente uma Constituição que enumeram direitos e garantias fundamentais dos indivíduos que devem ser respeitados. Mas será que é mesmo assim quando falamos do nosso Sistema Penal? Vejamos:
Para a análise de como anda o Sistema Penal Brasileiro, nos valeremos dos esclarecimentos do professor Augusto Thompson (2007). Para ele, o atual Sistema Penal está eivado de uma discriminação na produção das leis, uma vez que a feitura destas não se revela a partir de um poder sobrenatural, e sim de um poder humano esculpido de interesses das classes dominantes.
Sendo assim, normas são criadas para atingir, em sua maioria, indivíduos pobres, caracterizando-os como criminosos, enquanto aos ricos é dada a chancela de esperto, desonesto, duro homem de negócios e etc; quando, porventura, venham a praticar algum “ilícito civil”.
Exemplo disso ocorre na tipicidade dos crimes no campo patrimonial. Ao invés de o legislador preferir utilizar-se da abrangência de que o crime patrimonial “seja qualquer ação ou omissão que vise adquirir vantagem econômica de terceiro sem o consentimento deste”, repartiu tal visão em inúmeras condutas, escudado pelo princípio da reserva legal. Criou-se o roubo, furto e apropriação indébita.
Conforme exemplo dado pelo referido autor acima, se o “cobrador” de ônibus se apossa de valores do seu empregador, tal será crime, em contra partida, a empresa que utiliza propaganda, para dizer que seu produto é o mais barato no mercado e, assim, não o sendo, auferir vantagem econômica do terceiro consumidor, além do devido, não praticará crime por não ter tipificação penal que preveja tal prática.
Com isso, exclui-se a figura do delito penal e transforma-o em delito civil, para que, assim, o cometidor desse delito não fique sob o risco de ser considerado criminoso. Em outras palavras: dar suporte a classe economicamente favorecida.
Continuando, a discriminação pode ocorrer na fase policial e na judicial. Na primeira, a fase policial, pode ser percebida pelo fato de que a polícia tem acesso facilitado em logradouros, locais públicos, praças, parques, escolas públicas, e etc. E outros em que ela não pode transitar de forma livre, salvo consentimento das pessoas como em locais privados, empresas privadas, casas residenciais, etc.
Tomando por base tal ilustração será bem mais fácil notar que o delito cometido num bar por certo indivíduo de classe inferior será, de longe, mais visível por parte da polícia do que àquele cometido dentro de um clube particular por um cidadão mais abastardo.
Compartilhamos, também, com o entendimento de Augusto Thompson (2007) quando o mesmo alega que a sociedade aprendeu a caracterizar o criminoso conforme suas afeições pessoais, ou seja, é aquele indivíduo mal vestido, com ausência de dentes, sujo, entre outras características; batendo palmas para a teoria do etiquetamento de Lombroso.
Um policial prefere abordar na rua para averiguação o indivíduo mais carente, “com traços de criminoso” ao invés de incomodar a pessoa bem vestida e limpa que esteja transitando. As operações nas favelas, por parte da polícia, e não em condomínios da zona sul são, também, provas do que foi dito anteriormente.
Outro ponto de discriminação é o fato dos policiais utilizarem certa força aos indiciados, para que, então, estes venham a expor fatos que elucidem a ocorrência do crime. Assim, por exemplo, através de tortura, poderá o investigador obter uma confissão de um delito e, por conseguinte, leva-lo a elementos probatórios capazes de instruir feitura condenação.
“A inevitável seletividade operacional da criminalização secundária e sua preferente orientação burocrática (sobre pessoas sem poder e por fatos grosseiros e até insignificantes) provocam uma distribuição seletiva em forma de epidemia, que atinge aqueles que têm baixas defesas perante o poder punitivo, aqueles que se tornam mais vulneráveis à criminalizalção secundária porque: a) suas características pessoais se enquadraram nos esteriótipo criminais; b)sua educação só lhes permite realizar ações ilícitas toscas e, por conseguinte, de fácil detecção e; c) porque a etiquetagem suscita a assunção do papel correspondente ao esteriótipo com o qual seu comportamento acaba correspondendo ao mesmo (a profecia que auto realiza). Em suma, as agências acabam selecionando aqueles que circulam pelos espaços públicos com o figurino social dos delinqüentes, prestando-se à criminalização – mediante suas obras toscas – como seu inesgotável combustível” (BATISTA; ZAFFARONI; SLOKAR (2003) apud GRECO, 2009, p.138).
Na fase judicial a discriminação ocorre por conta dos juízes. Após a triagem dos indivíduos que devem receber os holofotes do judiciário, pela polícia, cabe ao juiz, agora analisando as provas, decidir sobre a culpabilidade do ser.
Ocorre que tais provas nem sempre são verdades reais e, assim, o juiz acaba por antes mesmo de se preocupar com o que foi feito, da maior importância ao que o indivíduo é. A simples presença de o indiciado conter antecedentes criminais (não sentença anterior condenatória) já pode ser o suficiente para que o magistrado, sob a égide do livre convencimento motivado, o condene. Rasga-se, assim, o princípio do devido processo legal.
Como se percebe, a realidade brasileira está longe de seu Estado Democrático de Direito. Com essa onda de crimes bárbaros que a mídia se utiliza como meio de promoção, somente traz sentimentos de revolta para a sociedade a qual acredita num Estado penalmente fortalecido quando este se vale de uma amplitude de condutas proibidas e que sejam severamente punidas. Como aludimos em capítulo anterior, estamos diante de um Direito Penal Máximo, ou melhor, é um movimento de lei e ordem dirigido para quem dele não tem condições de escapar: direito penal do inimigo.
Mas porque tal movimento é direcionado somente para as pessoas menos favorecidas? O autor Rogério Greco nos responde:
“Com esse inchaço de tipificações penais existente no ordenamento jurídico, o estado não tem opção senão escolher quem punir, caso contrário, o sistema penitenciário não teria vagas suficiente para prender todos aqueles que tivessem cometido uma infração penal. Se fôssemos levar a ferro e fogo a aplicação de todos os tipos penais existentes, não haveriam pessoas disponíveis nem para apurar os fatos criminosos, tampouco julgar os autores dos delitos, pois todos estaríamos presos” (GRECO, 2009).
Daqui, faz-se outro questionamento: Será mesmo que é prendendo o indivíduo que se resolverá o problema da criminalidade no Brasil?
Fazendo-se uma leitura atenta ao art. 1º da Lei de Execução Penal, fácil a conclusão de que a pena, no Brasil, tem seu caráter ressocializador, ou seja, a pena é aplicada no Intuito de garantir ao condenado a sua adequada reinserção no seio social.
Art. 1º da Lei 7.210/84:
“A execução penal tem por objetivo efetivar as disposições de sentença ou decisão criminal e proporcionar as condições para a harmônica integração social do condenado e do internado”.
Sendo assim e nas lições de Augusto Thompson (2007), a pena de encarceramento se faz presente para que tal finalidade seja atingida.
Na prisão, o criminoso deveria receber medidas que o faça apto a ser merecedor do retorno ao convívio livre em comunidade. Pura ilusão.
O criminoso em seu convívio intramuro é carecedor de quaisquer estímulos que o faça livre e no seu pensamento. Na penitenciária, o indivíduo sofre não com a sua individualidade e sim com o convívio em massa. Lá, ao adentrar, já aprende uma etapa de tarefas a serem, obrigatoriamente, seguidas; todas já preestabelecidas: aprende quem tem o poder dentro do presídio, a comer o que tem ou “dar um jeito” para conseguir o que não tem, a manter diferentes tipos de relações sexuais e etc. Ou seja, por mais que se busque a reeducação do criminoso, o que se conseguirá é justamente o inverso.
Como se pode querer a ressocialização da pessoa para seu retorno na livre sociedade o trancando na prisão se, assim, aprende as normas de uma sociedade intramuros?
Conclui-se, ainda, segundo o autor acima mencionado, que, na maioria das vezes, tal indivíduo volta a praticar outro delito e, por isso, retorna a penitenciária, pois já se tornou refém/consumidor dos pensamentos ali aprendidos.
Por evidente, não se pode generalizar tal acontecimento. Existem sim muitos condenados após terem cumprido suas penas que querem ingressar de forma renovada na sociedade, se reintegrando. Ocorre que a própria sociedade não os aceita. Quantos trabalhos não foram negados sob o argumento de o indivíduo conter o árduo de já ter sido presidiário? Rogério Greco (2009) nos empresta um ótimo exemplo do episódio de uma condenada pelo homicídio de uma atriz da Rede Globo que havia se matriculado numa faculdade do Rio de Janeiro e os alunos, que com ela estudariam, abandonaram a sala de aula.
Por esses motivos, de nada adianta uma política criminal baseada na criação variada e desenfreada de tipos penais. Não adianta aceitar como solução de todos os problemas da criminalidade a colocação dos indivíduos em cárceres, seja qual tenha sido as suas condutas. O resultado disso nós já vimos e vemos todos os dias: um Direito Penal baseado no simbolismo, onde todas as leis são aplicadas para alguns e outros não, e a sociedade caminhando como se tudo estivesse bem. Por que não o Estado intervir de forma mínima, quando estritamente necessário para resolver ou tentar a problemática da criminalidade social?
CAPÍTULO IV
DIREITO PENAL MÍNIMO NA ATUAL SOCIEDADE BRASILEIRA
Doutrinadores mais modernos apontam a necessidade de mudança dessa atual realidade em que vivemos, tendo o direito penal como a prima ratio de todos os conflitos. Ao contrário, com a adoção de um direito penal mais equilibrado como nos propõe Rogério Greco (2009), talvez não alcancemos a solução para tudo, entretanto, boa parte do que é hoje visto erroneamente no Sistema Penal, não mais o será.
“É curioso perceber como no final do século, quando se acreditava no incremente do movimento despenalizado mediante a utilização de técnicas alternativas de controle social, cresce o anseio por penas mais elevadas e, de um modo geral, por uma atuação mais draconiana do sistema punitivo como um todo, com prisões provisórias decretadas amiúde, supressão da progressão do regime prisional, etc. Afora isto, e por mais paradoxal que possa parecer, é exatamente sob o égide do sistema democrático que se está aumentando o espectro de incidência do Direito Penal” (TOROU apud VOLPE FILHO, 2005).
Estando a sociedade brasileira disposta a se enquadrar no movimento de Intervenção Mínima do Direito Penal, podemos enumerar alguns possíveis avanços:
a) Não se teria os incontáveis tipos penais, pois o legislador faria uma análise dos princípios já existentes no ordenamento jurídico e verificaria, segundo a adequação social, princípio da insignificância, princípio da intervenção mínima e lesividade, a desnecessidade de alguns delitos prescritos em lei e os revogaria. Em contrapartida, criaria tipos penais que dessem maior importância a bens mais relevantes para serem tutelados;
b)A pena de privação de liberdade permaneceria apenas para os delitos considerados mais graves, deixando que os demais conflitos sociais possam ser resolvidos por outros ramos do direito que não o penal, criando-se, assim, outras espécies de punição ou prevenção; Este seria subsidiário: ultima ratio.
c) A discriminação, em tese (pois a corrupção não desapareceria de imediato), iria diminuir, uma vez que, com o enxutamento do ordenamento jurídico penal, o Direito não teria que escolher os seus “consumidores”. A classe rica e a pobre ficariam sob a incidência do Direito Penal Mínimo; tendo lugar para a ressocialização de todos;
d) As sanções penais, por respeito do legislador ao princípio da individualização da pena e proporcionalidade, seriam mais justas. Assim, talvez terminasse o fato de um furto ter a pena maior do que a conduta de lesionar a integridade corporal de outrem;
e) As garantias fundamentais do ser humano como a dignidade da pessoa humana teria maior respeitabilidade. Os cidadãos retomariam as suas liberdades individuais, tão perdida por muitos nos dias atuais.
Finalizo este trabalho afirmando, junto com Rogério Greco (2009), que apesar de o Direito Penal Mínimo ser a melhor e mais razoável posição que um Estado Democrático de Direito deva assumir, sabemos, também, que a utilização do Direito Penal não deverá ser realizada em substituição ao Estado Social. O Direito Penal não pode ter a pretensão de tentar resolver todos os problemas, até os mais graves, que aflingem a sociedade.
E, mesmo que o Estado se esforce para cumprir suas funções sociais, ainda teríamos o cometimento de delitos, pois que estes, por muitas vezes, não têm qualquer ligação com necessidades básicas do ser humano, eis que no mundo existe a inveja, o egoísmo, a vingança, etc.
CAPÍTULO V
JURISPRUDÊNCIAS
Tendo este trabalho o propósito de alertar a comunidade jurídica acerca de um debate sobre o atual “Estado Penal” brasileiro, não poderíamos partir para sua conclusão sem antes transcrever alguns julgados dos Tribunais Estaduais e Superiores sobre o tema e, assim, ver o quão aceito está pela jurisprudência.
TJSC – APELAÇÃO CRIMINAL Nº. 2008.065.862-3
Relator(a): Min. Newton Varella Júnior
Julgamento: 07/01/2010
Ementa
APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME CONTRA AS RELACOES DE CONSUMO (ART. 7º, IX, DA LEI N. 8.137/90). SENTENÇA ABSOLUTÓRIA POR FALTA DE TIPICIDADE. DIREITO PENAL MÍNIMO. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA LESIVIDADE DA CONDUTA. APELO MINISTERIAL. EXPOSIÇÃO À VENDA DE MERCADORIA IMPRÓPRIA AO CONSUMO. AGENTES QUE, NA ÉPOCA DOS FATOS, COMERCIALIZAVAM CARNES BOVINA E OVINA SEM COMPROVAÇÃO DE INSPEÇÃO SANITÁRIA. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS. CRIME FORMAL. DELITO DE PERIGO ABSTRATO. ABSOLVIÇÃO INVIÁVEL. CONDENAÇÃO DECRETADA. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.
VOTO
“... Assiste razão ao representante do Ministério Público, não merecendo prosperar a sentença que, em aplicação do princípio da intervenção mínima, absolveu os apelados ao entender que a conduta que lhes foi atribuída é atípica, uma vez que o simples de ato de expor à venda carne sem comprovação de procedência não configura fato delituoso, notadamente porque não tem o condão de lesar ou expor à risco de lesão bem jurídico relevante...”
STF - HABEAS CORPUS: HC 101074 SP
Relator(a): Min. CELSO DE MELLO
Julgamento: 06/04/2010
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PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA - IDENTIFICAÇÃO DOS VETORES CUJA PRESENÇA LEGITIMA O RECONHECIMENTO DESSE POSTULADO DE POLÍTICA CRIMINAL - CONSEQÜENTE DESCARACTERIZAÇÃO DA TIPICIDADE PENAL EM SEU ASPECTO MATERIAL - DELITO DE DESCAMINHO (CP, ART. 334,"CAPUT", SEGUNDA PARTE)- TRIBUTOS ADUANEIROS SUPOSTAMENTE DEVIDOS NO VALOR DE R$ 4.541,33 - DOUTRINA - CONSIDERAÇÕES EM TORNO DA JURISPRUDÊNCIA DO STF - PEDIDO DEFERIDO. O PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA QUALIFICA-SE COMO FATOR DE DESCARACTERIZAÇÃO MATERIAL DA TIPICIDADE PENAL
. - O princípio da insignificância - que deve ser analisado em conexão com os postulados da fragmentariedade e da intervenção mínima do Estado em matéria penal - tem o sentido de excluir ou de afastar a própria tipicidade penal, examinada na perspectiva de seu caráter material. Doutrina. Tal postulado - que considera necessária, na aferição do relevo material da tipicidade penal, a presença de certos vetores, tais como (a) a mínima ofensividade da conduta do agente, (b) a nenhuma periculosidade social da ação, (c) o reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento e (d) a inexpressividade da lesão jurídica provocada - apoiou-se, em seu processo de formulação teórica, no reconhecimento de que o caráter subsidiário do sistema penal reclama e impõe, em função dos próprios objetivos por ele visados, a intervenção mínima do Poder Público. O POSTULADO DA INSIGNIFICÂNCIA E A FUNÇÃO DO DIREITO PENAL: "DE MINIMIS, NON CURAT PRAETOR"
. - O sistema jurídico há de considerar a relevantíssima circunstância de que a privação da liberdade e a restrição de direitos do indivíduo somente se justificam quando estritamente necessárias à própria proteção das pessoas, da sociedade e de outros bens jurídicos que lhes sejam essenciais, notadamente naqueles casos em que os valores penalmente tutelados se exponham a dano, efetivo ou potencial, impregnado de significativa lesividade. APLICABILIDADE DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA AO DELITO DE DESCAMINHO
. - O direito penal não se deve ocupar de condutas que produzam resultado, cujo desvalor - por não importar em lesão significativa a bens jurídicos relevantes - não represente, por isso mesmo, prejuízo importante, seja ao titular do bem jurídico tutelado, seja à integridade da própria ordem social. Aplicabilidade do postulado da insignificância ao delito de descaminho (CP, art. 334), considerado, para tanto, o inexpressivo valor do tributo sobre comércio exterior supostamente não recolhido. Precedentes.
STJ - AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL: AgRg no REsp 998993 RS 2007/0246305-1
Relator(a): Ministro PAULO GALLOTTI
Julgamento: 05/03/2009
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PENAL. PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL. HABEAS CORPUS. PORTE DE ARMA DE FOGO. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. ATIPICIDADE. NULIDADE DA PERÍCIA. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA POTENCIALIDADE.
1. Tratando-se de crime de porte de arma de fogo, faz-se necessária a comprovação da potencialidade do instrumento, já que o princípio da ofensividade em direito penal exige um mínimo de perigo concreto ao bem jurídico tutelado pela norma, não bastando a simples indicação de perigo abstrato.
2. Com isso, uma vez anulado o exame balístico, resta atípica a conduta do porte de arma.
3. Agravo provido para o fim de desprover o recurso especial, que visava reformar o trancamento da ação penal
STF - HABEAS CORPUS: HC 100366 PR
Relator(a): Min. EROS GRAU
Julgamento: 01/12/2009
HABEAS CORPUS. CRIME DE DESCAMINHO. DÉBITO TRIBUTÁRIO INFERIOR AO VALOR PREVISTO NO ART. 20 DA LEI Nº 10.522/02. ARQUIVAMENTO. CONDUTA IRRELEVANTE PARA A ADMINISTRAÇÃO. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA.
1. O arquivamento das execuções fiscais cujo valor seja igual ou inferior ao previsto no artigo 20 da Lei n. 10.522/02 é dever-poder do Procurador da Fazenda Nacional, independentemente de qualquer juízo de conveniência e oportunidade.
2. É inadmissível que a conduta seja irrelevante para a Administração Fazendária e não para o direito penal. O Estado, vinculado pelo princípio de sua intervenção mínima em direito penal, somente deve ocupar-se das condutas que impliquem grave violação ao bem juridicamente tutelado. Aplicação do princípio da insignificância. Ordem concedida.
TJDF - RSE: RSE 174579520088070001 DF 0017457-95.2008.807.0001
Relator(a): SANDRA DE SANTIS
Julgamento: 29/04/2010
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RECURSO EM SENTIDO ESTRITO - CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA - PROCESSO ADMINISTRATIVO NÃO EXAURIDO - AUSÊNCIA DE TIPICIDADE PENAL - PRINCÍPIO DA INTERVENÇÃO MÍNIMA DO DIREITO PENAL - DENÚNCIA REJEITADA.
I. A PERSECUÇÃO PENAL, PELA GRAVIDADE E ESTIGMA SOCIAL QUE A ACOMPANHA, DEVE SER SEMPRE O ÚLTIMO RECURSO DO ESTADO.
II. A TIPICIDADE PENAL DO CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA EXIGE O EXAURIMENTO DO PROCESSO ADMINISTRATIVO. EM ESPECIAL QUANDO O RÉU DEMONSTRA INTENÇÃO DE QUITAR A DÍVIDA. SÚMULA VINCULANTE 24/2009.
III. RECURSO IMPROVIDO.
STJ - HABEAS CORPUS: HC 82093 SP 2007/0096128-3
Relator(a): Ministro HAMILTON CARVALHIDO
Julgamento: 27/05/2008
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HABEAS CORPUS. FURTO TENTADO. DIREITO PENAL. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. ATIPICIDADE MATERIAL. INOCORRÊNCIA. PERICULOSIDADE SOCIAL DA AÇÃO, REPROVABILIDADE DO COMPORTAMENTO DO AGENTE E EXPRESSIVIDADE DA LESÃO JURÍDICA PROVOCADA. ORDEM DENEGADA.
1. O poder de resposta penal, positivado na Constituição da República e nas leis, por força do princípio da intervenção mínima do Estado, de que deve ser expressão, "(...) só vai até onde seja necessário para a proteção do bem jurídico. Não se deve ocupar de bagatelas" (Francisco de Assis Toledo, in Princípios Básicos de Direito Penal).
2. O princípio da insignificância é, na palavra do Excelso Supremo Tribunal Federal, expressão do caráter subsidiário do Direito Penal, e requisita, para sua aplicação, a presença de certas circunstâncias objetivas, como: (a) a mínima ofensividade da conduta do agente, (b) a nenhuma periculosidade social da ação, (c) o reduzido grau de reprovabilidade do comportamento e (d) a inexpressividade da lesão jurídica provocada.
3. Ordem denegada
STF - HC 97129 / RS - RIO GRANDE DO SUL
HABEAS CORPUS
Relator(a): Min. EROS GRAU
Julgamento: 11/05/2010
Ementa
EMENTA: HABEAS CORPUS. PENAL E PROCESSUAL PENAL. TENTATIVA DE FURTO. CRIME IMPOSSÍVEL, FACE AO SISTEMA DE VIGILÂNCIA DO ESTABELECIMENTO COMERCIAL. INOCORRÊNCIA. MERCADORIAS DE VALOR INEXPRESSIVO. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. APLICABILIDADE. 1. O pleito de absolvição fundado em que o sistema de vigilância do estabelecimento comercial tornou impossível a subtração da coisa não pode vingar. As pacientes poderiam, em tese, lograr êxito no intento delituoso. Daí que o meio para a consecução do crime não era absolutamente ineficaz. 2. A aplicação do princípio da insignificância há de ser criteriosa e casuística, tendo-se em conta critérios objetivos. 3. A tentativa de subtração de mercadorias cujos valores são inexpressivos não justifica a persecução penal. O Direito Penal, considerada a intervenção mínima do Estado, não deve ser acionado para reprimir condutas que não causem lesões significativas aos bens juridicamente tutelados. 4. Aplicação do princípio da insignificância justificada no caso. Ordem deferida a fim de declarar a atipicidade da conduta imputada às pacientes, por aplicação do princípio da insignificância.