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Dos sistemas sobre a apreciação da prova.

A coleta e a valoração da prova. A prova direta e indireta

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Agenda 14/02/2013 às 09:31

XIX  – PROVA DIRETA E PROVA INDIRETA

A prova direta dirá respeito ao próprio fato probando. São exemplos: a prova testemunhal, meio de prova sobre o fato; exame do corpo de delito; a confissão do acusado.

A prova indireta é a não se dirige ao próprio fato probando, mas, por raciocínio que se desenvolve, se chega a ele. Na prova indireta há uma construção lógica através do qual se chega ao fato ou às circunstâncias que se quer provar.

Estamos, na prova indireta, no campo dos indícios e das presunções.

Indícios são certas circunstâncias que nos permitem chegar á verificação da existência de um fato.

Na lição de MAGALHÃES NORONHA[30] deve se fazer a diferença entre indício e presunção. O indício é o fato, ao passo que a presunção encontra a sua fonte na experiência; o indício é a circunstância certa e que se realizou. A presunção considera-se como realizado um fato não provado, fundando-se, entretanto, na experiência. A presunção é um processo intelectual, chamando-se a presunção o fato presumido. O fato indicativo é o indicio  e a presunção é  o fato indicado.

O indício constitui a premissa menor do silogismo que, associado a um principio empírico, ou a uma regra de experiência, vai permitir alcançar uma convicção sobre o fato a provar. O indício assim deve estar plenamente demonstrado, por prova direta(prova testemunhal, documental, por exemplo). Além disso, dir-se-á que a presunção  é a inferência que aliada ao indício permite demonstrar um fato distinto. A presunção é a conclusão do silogismo, construído sobre uma premissa maior: a lei baseada na experiência.

A presunção pode ser absoluta, que não admite uma prova em contrário e relativa, que a admite. É a presunção legal quando expressa em lei, e de fato, quando cabe ao juiz fazer o raciocínio lógico que a ela conduz a sua inteligência.

Será a presunção um argumento probatório de simples probabilidade e nunca de simples certeza?

Para MARTINS[31], a condenação decorrente de indícios constantes do processo ainda é admitida, pois resulta da formação de um verdadeiro quebra-cabeça, unindo-se dados de conhecimento de uma e outra pessoa, até que se verifique tenha sido realmente o agente o autor do fato imputado.

A questão da prova indiciária já foi objeto de estudos no direito comparado.

Assim, nos Estados Unidos, na condenação pelo crime de branqueamento de capitais, nomeadamente provenientes da droga, a prova fundamenta-se, muitas vezes, em elementos circunstanciais, ou seja, em prova indireta. Enumeremos alguns exemplos:

a) Em United States v. Abbel, 271 F3d 1286 (11 Cir. 1001), decidiu-se que a prova de que o cliente do acusado por crime de lavagem era um traficante, cujos negócios legítimos eram financiados por proventos do tráfico, era suficiente para concluir que as transações do acusado com seu cliente envolviam bens contaminados;

b) Em United States v. Calb, 69 F3d 1417 (9th Cr. 1995), entendeu-se que, quando o acusado por crime de lavagem faz declarações de que o adquirente de um avião é um traficante, e quando o avião é modificado para acomodar entorpecentes pode-se concluir que o dinheiro utilizado na aquisição era proveniente de tráfico de entorpecentes;

c) Em United States v. Reiss, 186 f. 3d 149 (2nd Cir. 1999), a utilização de subterfúgios para o pagamento de um avião envolvendo conhecido traficante foi considerada suficiente para estabelecer a procedência ilícita dos recursos empregados na compra;

d) Em casos como United States v. Hardwell, 80 F. 3d 1471 (10th Cir. 1996), e United States v. King, 169 F. ed 1035(6th Cir. 1999), quando se decidiu que a falta de prova de proveniência dos fundos empregados era prova suficiente da origem criminosa dos recursos empregados.

Da mesma forma trago à colação decisão da Corte Suprema Espanhola:

Acórdão do Tribunal Supremo de Espanha n.º 190/2006, de 1 de Março de 2006

I — 1 — Para que o juízo de inferência resulte em verdade convincente é necessário que a base indiciária, plenamente reconhecida mediante prova directa:

a) seja constituída por uma pluralidade de indícios (embora excepcionalmente possa admitir-se um só se o seu significado for determinante),

b) que não percam força creditória pela presença de outros possíveis contra indícios que neutralizem a sua eficácia probatória,

c) e que a argumentação sobre que assente a conclusão probatória resulte inteiramente razoável face a critérios lógicos do discernimento humano.

II — São indícios que permitem superar o princípio da presunção de inocência:

1 — o aumento desusado do património do acusado, traduzido na aquisição de bens (embarcação, motociclo e outros),

2 — a inexistência de negócio lícitos, devidamente justificados, que justifiquem tal aumento,

3 — as características da referida embarcação, semelhante às que são frequentemente utilizadas para o transporte de drogas através do Estreito de Gibraltar, zona em que reside,

4 — o seu relacionamento com actividades e pessoas ligadas ao tráfico de drogas,

5 — as viagens realizadas pela sua embarcação através do Estreito de Gibraltar, transportando haxixe,

6 — e a própria inverosimilhança da versão exculpatória que apresentou.

Penso que os indícios irão auxiliar de maneira importante na verificação e demonstração do que ocorreu acerca da existência do crime. Não pode substituir exames importantes e decisivos para se constatar a materialidade do crime, principalmente naqueles que deixam vestígios e que podem ser esclarecidos pelo exame pericial.

De toda, sorte, a prova indiciária para ser usada no processo e embasar uma condenação deve ser sólida, indubitável, que conduza a convicção do julgador sem a menor sombra de dúvida. Pois, do contrário, in dubio pro reo.

No momento em que os indícios analisados em seu conjunto e não resultaram em nenhuma dúvida ou incerteza sobre o fato que está sendo demonstrado, pode-se dizer que esses indícios serão suficientes para conduzir a certeza processual do julgador e sustentar a decisão condenatória.

Não se esqueça que já se entendeu que  a prova indiciária ou circunstancial tem o mesmo valor que as demais em face do princípio da livre convicção(RT, 484:278, 478:301).

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A prova indiciária pode conduzir a uma condenação, porém, somente quando veemente,  sólida e induvidosa.


Notas

[1] Será o caso das provas obtidas por violação de domicílio(artigo 5º, XI, da Constituição); ao do sigilo das comunicações telefônicas, sem ordem judicial(artigo 5º, XII, da Constituição Federal) e as conseguidas mediante tortura e maus-tratos(artigo 5º, III, da Constituição Federal).

[2] RANGEL, Paulo. Direito Processual Penal, 20ª edição, São Paulo, Atlas, 2012, pág. 448.

[3] CARNELUTTI, Francesco. Lezione di diritto processuale civile, 111, pág. 315.

[4] ALVIM, ARRUDA. Manual de Direito Processual Civil, volume II, 7ª edição, São Paulo, Ed. Revista dos Tribunais, pág. 476. 

[5] BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Ônus da prova no processo penal,  São Paulo, Revista dos Tribunais, 2003, pág. 178 a 182.

[6] CANÇADO TRINDADE, Antônio Augusto. Tratado de Direito Internacional dos Direitos Humanos, Porto Alegre, Sérgio Antônio Fabris, 1997, volume I, pág. 434.

[7] ESPÍNOLA FILHO, Eduardo. Código de Processo Penal anotado, volume III, pág. 160.

[8] NUCCI, Guilherme de Souza. Código de Processo Penal comentado, São Paulo, Ed. Revista dos Tribunais, 2011, pág. 535.

[9] OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. Curso de Processo Penal, São Paulo, Atlas, 2012, pág. 428.

[10]  BENTO DE FARIA, Antônio. Código de Processo Penal, volume I, pág. 329.

[11] OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. Curso de Processo Penal, 2012, pág. 429.

[12] Tribunal Regional Federal da 5ª Região, no ACR 5.628/PB, Relator Desembargador Federal Marcelo Navarro, DJ de 26 de março de 2009.

[13] MARQUES, José Frederico , Elementos de direito processual penal, Rio de Janeiro, Forense, 1961, pág. 300.

[14]ROJAS, Nerio, Medicina Legal, 1936, tomo I, pág. 65.

[15] RT 581/426.

[16] NUCCI, Guilherme de Souza. Código de Processo Penal Comentado, 10ª edição, São Paulo, Ed. Revista dos Tribunais, pág. 415.

[17] OLIVEIRA, Eugênio Pacelli. Curso de Processo Penal, 10ª edição, Rio de Janeiro, Lumen Juris, Editora, pág. 363.

[18] RTJ 32/49, dentre outras. 

[19] NUCCI, Guilherme de Souza. Código de Processo Penal Comentado, São Paulo, Ed. RT, 2012, pág. 451.

[20] MALATESTA, Nicola Framarino Dei. A lógica das provas em matéria criminal, tradução e notas de Ricardo Rodrigues Gama, LZN editora, Campinas, São Paulo, 2003, pág. 500.

[21] MALATESTA, Nicola Framarino Dei. A lógica das provas em matéria criminal, tradução e notas de Ricardo Rodrigues Gama, LZN editora, Campinas, São Paulo, 2003, pág. 501 e 502.

[22] GRINOVER, Ada Pellegrini.Interrogatório do réu e direito ao silêncio, in Ciência Penal, I/15-31, 1976.

[23] GRINOVER, Ada Pellegrini. O processo em sua unidade, São Paulo, Saraiva, pág. 111.

[24] BULOS, Uadi Lammêgo. Constituição Federal anotada, São Paulo, Saraiva, 6ª edição, pág. 325.

[25] Informativo STF n. 122.

[26] RTJ 141/512, Relator Ministro Celso de Mello; RTJ 180/1125, Relator Ministro Marco Aurélio.

[27] NUCCI, Guilherme de Souza. Código de Processo Penal comentado, São Paulo, Ed. Revista dos Tribunais, 2011, pág. 443.

[28] OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. Curso de Processo Penal, São Paulo, Atlas, pág. 403.

[29] Observem-se as experiências bem sucedidas na Itália, Colômbia e Estados Unidos e ainda o que diz o artigo 20 da Convenção das Nações Unidas contra a criminalidade transnacional organizada e artigo 50 das Nações Unidas contra a Corrupção e ainda a Recomendação n. 27 do GAFI.

[30] MAGALHÃES NORONHA. E. Curso de Direito Processual Penal, São Paulo, Saraiva, 1978, pág. 130.

[31] MARTINS, Jorge Henrique Shaefer. Prova criminal, Curitiba, Juruá Editora, 1996, pág. 119. 

Sobre o autor
Rogério Tadeu Romano

Procurador Regional da República aposentado. Professor de Processo Penal e Direito Penal. Advogado.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ROMANO, Rogério Tadeu. Dos sistemas sobre a apreciação da prova.: A coleta e a valoração da prova. A prova direta e indireta. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3515, 14 fev. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/23713. Acesso em: 5 nov. 2024.

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