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Greve de policiais, anistia e memória

08/02/2012 às 10:33
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Com as anistias periódicas outorgadas por leis federais a policiais e bombeiros militares que participam de movimentos reivindicatórios, tudo o que podemos concluir é que a greve de policiais na Bahia não será a última a sacudir o país.

A Bahia está em choque com uma greve de policiais. Assassinatos, saques e violência generalizada. Manifestantes encapuzados e armados (violando a vedação da Constituição Federal de 1.988 ao anonimato e às reuniões armadas, conforme seu art. 5˚, incisos IV e XVI), quebrando a hierarquia à qual devem obediência, num movimento de discutível constitucionalidade e legalidade.

Já vimos esse filme. Do ano de 1997 para cá tivemos anteriormente greves de policiais e bombeiros militares nos Estados do Ceará, de Alagoas, de Minas Gerais, de Rondônia, de Mato Grosso, de Pernambuco, do Rio Grande do Norte, de Roraima, de Santa Catarina, do Tocantins, do Distrito Federal, do Rio de Janeiro e de Sergipe e, pasmem, da própria Bahia, num triste dejà vu. É muita agitação para um país que se gaba de ser tão cordato e pacífico.

Nem precisei pesquisar muito para arrolar este histórico de greves absurdas. Estão todas documentadas no texto da Lei Federal n˚ 12.905, de 11 de outubro de 2011, aprovada pelo Congresso Nacional e sancionada pela Presidente Dilma Roussef, que concedeu anistia aos policiais e bombeiros militares dos Estados acima mencionados que participaram de movimentos reivindicatórios específicos.

Essa anistia não é inédita. Outra Lei Federal, a de n˚ 12.191, de 13 de janeiro de 2010, concedeu anistia similar para outras paralisações (sancionada pelo Presidente Lula). A lei de 2.011 veio em verdade complementar a lei de 2.010, acrescentando outros Estados ao rol de unidades da federação cujos policiais foram contemplados pela anistia, e ampliando o período da anistia dos movimentos anteriores.

A greve do Rio é bem recente (tomada do quartel central dos Bombeiros), foi em 2.010. Foi seguida de um movimento político para anistiar os revoltosos. Será que os bombeiros e policiais revoltosos mereciam mesmo essa deferência? E a população, merecia o protesto? Viaturas dos Bombeiros foram depredadas e impedidas de deixar os quartéis, deixando ocorrências sem atendimento.

O policial de fato ganha mal, uma paga incompatível com o risco e a responsabilidade que possui. Mas o melhor método reivindicatório é esse, prejudicar a população que deveriam proteger?

Os grevistas, nestes casos, enveredaram por caminhos perigosos, paralisando atividades essenciais, reunindo-se armados e anônimos, alguns cometendo até mesmo crimes que, por alguma razão obscura, restaram impunes, em razão de atos completamente irresponsáveis do Congresso Nacional, que aprovou as leis de anistia, e dos Presidentes que sancionaram as leis.

O correto seria que os policiais fizessem suas reivindicações dentro da legalidade. Fora da legalidade não há porque ampará-los. Qual diálogo é possível com um servidor público amotinado, anônimo, armado e em quebra de hierarquia?

Mas, com essas anistias periódicas outorgadas por leis federais, tudo o que podemos concluir é que a greve de policiais na Bahia não será a última a sacudir o país.

Será que essas anistias atenderam ao seu propósito, que seria permitir o sepultamento de um conflito, ante a passagem do tempo? Temo dizer que não.

Anistia, segundo o Aurélio, vem do grego amnestía, e significa esquecimento. Para fins de Direito Penal o jurista Guilherme de Souza Nucci a define como causa extintiva de punibilidade, uma declaração pelo Poder Público de que determinados fatos se tornaram impuníveis por motivo de utilidade social (grifo nosso). Segundo Nucci: "O instituto da anistia volta-se a fatos, e não a pessoas (grifo do Autor). (...) Tem a força de extinguir a ação e a condenação."

Um bom exemplo se sobressai dos textos legais mencionados. A Polícia Militar do Estado de São Paulo pode computar como um verdadeiro galardão, como mais um distintivo ou medalha nas fardas de seus homens e mulheres, o fato de seus valorosos integrantes não terem sido incluídos nesse rol de anistias vergonhosas. Que continue assim.

Sinceramente, não consigo vislumbrar utilidade social nas anistias determinadas pelas citadas leis federais. Tampouco motivo para esquecer. O intento era pacificar, mas o resultado é o contrário. Como esquecemos rápido, veremos essas greves violentas e irresponsáveis acontecerem de novo, e de novo... Mas os feridos, os mutilados, os não-socorridos, os mortos e seus parentes não vão esquecer nunca.


BIBLIOGRAFIA

Nucci, Guilherme de Souza. Código Penal Comentado. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2000.

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Sobre o autor
Luiz Augusto Módolo de Paula

Procurador do Município de São Paulo, ex-procurador federal, advogado, bacharel e mestre em Direito Internacional pela USP

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PAULA, Luiz Augusto Módolo. Greve de policiais, anistia e memória. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3143, 8 fev. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/21041. Acesso em: 23 nov. 2024.

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