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Cassação de mandato parlamentar. Cláusula de reserva de plenário. Art. 55, § 2º, CF

13/02/2013 às 10:23
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Atualmente, a Câmara dos Deputados e o STF estão disputando a atribuição para decretar a perda dos mandatos eletivos dos condenados na Ação Penal do mensalão.

De acordo com a cláusula de reserva de plenário, esculpida no art. 55, § 2º, da Carta Magna, o parlamentar só perderá o mandato após deliberação, votação e decisão da Câmara dos Deputados (ou Senado) por meio de voto secreto e maioria absoluta. Ou seja, sequer trata-se de mera “formalidade constitucional”, como afirmou o Ministro Gilmar Mendes em entrevista a jornalistas, eis que a própria Constituição exige, inclusive, circunstâncias especiais para a tal votação (repita-se: tem que ser secreta e ter maioria absoluta). Vale dizer: ainda que uma maioria (porém não absoluta) delibere pela perda do mandato, o parlamentar condenado pelo STF (que deu a “última palavra”, porém na parte que lhe compete) continuará a exercê-lo, gostem ou não.

Vale dizer que o quórum “maioria absoluta” é o mesmo exigido pelo art. 93, VIII e X, da Constituição, que tratam de sanções contra magistrados (aposentadoria compulsória, penas disciplinares). Para a aplicação dessas sanções aos magistrados, também é exigido maioria absoluta.Portanto, é inexplicável a suposta “estupefação” ou “indignação conveniente” demonstrada pelo Ministro Joaquim Barbosa, que afirma que a perda dos mandatos é automática (Celso de Mello também afirma isso), em evidente violação à Carta Magna (art. 55, § 2º) e afronta à soberania do Poder Legislativo (esse absolutamente soberano para deliberar sobre a perda ou não dos mandatos).

Dessa forma, se a defesa da Constituição não é mera retórica, essa defesa não poderá estar subordinada a supostos anseios populares, ao calor das emoções, às vontades e opiniões particulares, até mesmo dos ministros do próprio Supremo, por melhor que sejam suas intenções. E acredito que sejam.

Nos termos da Constituição, a perda do mandato depende não apenas de decisão do STF, mas também, e tão importante quanto, da vontade soberana de outro Poder, no caso o Congresso Nacional. Tudo em consonância com o princípio do art. 2º (harmonia e independência entre os Poderes). Esse caso envolve, por analogia, o 'ato complexo' ou 'ato composto' onde, em apertada síntese, uma decisão depende, obrigatoriamente, de dois ou mais órgãos. Portanto, não existe o menor conflito normativo no caso, eis que há expressa previsão na Constituição.

Portanto, não pode haver no caso a menor duvida.O STF de fato e de direito pode decidir pela cassação do mandato (que é o primeiro ato). Porém, num segundo ato, o Congresso Nacional delibera, vota e determina a perda (ou não) do mandato parlamentar, por meio de votação secreta. Ainda assim, reiteramos, o Congresso Nacional somente poderá decidir pela perda do mandato se obtiver maioria absoluta.

Naturalmente, se o Congresso não decretar a perda do mandato, seus membros poderão assumir ônus elevados de tal decisão, nas eleições de 2014. Mas isso quem tem que decidir é o povo, e não o Supremo Tribunal Federal.

A propósito, sempre tenho dito que o Legislativo (apesar da independência dos Poderes) encontra-se num plano superior em relação aos demais poderes, por força do disposto no art. 49, XI da Carta Magna, que prevê que “é da competência exclusiva do Congresso Nacional zelar pela preservação de sua competência legislativa em face da atribuição normativa dos outros Poderes”. O problema é que o Legislativo tem se apequenado, ao longo dos anos, permitindo, passivamente, a invasão dos outros Poderes em sua seara.

Essa passividade implica em que Judiciário e Executivo passem a pretender “dar ordens” ao Legislativo, quando justamente deve ser o contrário, eis que é a esse Poder que compete o poder de fazer as leis aos quais todos os Poderes (inclusive ele próprio) devem se submeter.

Nos últimos meses muito se tem dito que 'decisão judicial não se discute, cumpre-se'. Ledo engano. Caso a decisão judicial seja fragrantemente ilegal ou inconstitucional, não deverá ser cumprida. A respeito disso, confira-se monumental decisão do próprio Supremo, no HC 73.454 (Rel. Ministro Maurício Corrêa):

'Ninguém é obrigado a cumprir ordem ilegal, ou a ela se submeter, ainda que emanada de autoridade judicial. Mais: é dever de cidadania opor-se à ordem ilegal; caso contrário, nega-se o Estado de Direito'. (HC 73.454, Rel. Min. Maurício Corrêa, julgamento em 22-4-1996, Segunda Turma, DJ de 7-6-1996)

O que está em jogo, em verdade, não é a perda (ou não perda) de mandatos parlamentares por conta de condenação. Está em jogo algo maior: a defesa da Constituição, que não poderá ser violada, nunca, por melhores que sejam as intenções daqueles que, forçando e levando a interpretações exotéricas e descabidas, terminam por adulterar o texto constitucional.

Aqui, os fins não justificam os meios.

Aguardemos, pois, com serenidade, que a Câmara dos Deputados siga o rito, obrigatório, do art. 55, § 2º.
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Sobre o autor
Milton Cordova Junior

Advogado, Mestrando em Estudos Jurídicos Avançados, pós-graduado em Direito Público, com Extensão em Defesa Nacional pela Escola Superior de Defesa, extensões em Direito Constitucional e Direito Constitucional Tributário. Empregado de empresa pública federal. Recebeu Voto de Aplauso do Senado Federal por relevantes contribuições à efetivação da cidadania e dos direitos políticos (acesso in http://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2007/09/26/ccj-aprova-voto-de-aplauso-ao-advogado-milton-cordova-junior). Idealizador do fundo de subsídios habitacional denominado FAR - Fundo de Arrendamento Residencial, que sustenta o Programa Minha Casa Minha Vida, implementado por meio da Medida Provisória 1.823/99, de 29.04.1999.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CORDOVA JUNIOR, Milton. Cassação de mandato parlamentar. Cláusula de reserva de plenário. Art. 55, § 2º, CF. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3514, 13 fev. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/23569. Acesso em: 4 nov. 2024.

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