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Ativismo judicial no Brasil e a importância da experiência norte-americana em hermenêutica constitucional

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06/05/2013 às 14:42
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O estudo do ativismo judicial passa necessariamente pelo estudo da hermenêutica no controle jurisdicional de constitucionalidade, justamente o judicial review tão bem aprofundado no sistema norte-americano.

Resumo: Este artigo tem com objetivo fomentar o debate sobre o fenômeno do ativismo judicial no Brasil e a colaboração da teoria constitucional norte-americana moderna, como paradigma de interpretação jurídica para o aperfeiçoamento do sistema de freios e contrapesos na democracia brasileira.

Palavras-chave: ativismo judicial, autocontenção, controle de constitucionalidade, hermenêutica constitucional, direito norte-americano

Sumário: Introdução. 1. Interpretação constitucional íntegra na visão de Ronald Dworkin. 2. A colaboração de John Hart Ely e sua teoria procedimentalista no controle de constitucionalidade. 3. A crítica de Jeremy Waldron ao controle jurisdicional de constitucionalidade.Considerações finais


Introdução

Há um antigo debate em voga nos últimos dez anos no âmbito do Poder Judiciário do Brasil. É que de lá para cá, os juízes e especialmente o Supremo Tribunal Federal passaram a ser mais ativos, suprimindo lacunas deixadas pelo Poder Legislativo ou mesmo criando novos direitos a partir da base constitucional.

Seja em temas de alta relevância política, como a instituição da fidelidade partidária e a criação de normas para demarcação de reservas indígenas, até na implementação de direitos sociais como saúde e previdência social, o Judiciário tem inovado a ordem jurídica exercendo poder normativo, substituindo o papel constitucionalmente reservado ao Poder Legislativo. Trata-se da já conhecida prática do ativismo judicial.

Pretende-se nestas sucintas linhas estabelecer conexões iniciais entre o ativismo judicial, tido aqui como fenômeno hermenêutico, e as lições do constitucionalismo norte-americano para compatibilizar o sistema de checks and balances com o controle jurisdicional de constitucionalidade, o judicial review of legislation.

A análise do tema perpassa a dicotomia entre ativismo e autocontenção, e nesse aspecto o desenvolvimento do constitucionalismo norte-americano tem muito a contribuir para o aperfeiçoamento da democracia brasileira no que toca ao harmônico funcionamento do sistema de separação de poderes.

É exatamente na preocupação com a desarmonia entre os poderes que se ampara a crítica ao ativismo judicial atualmente praticado no Brasil, especialmente pelo Supremo Tribunal Federal, mas não menos pelos demais juízes e tribunais.

Se por um lado se reconhece que em determinadas situações o ativismo pode ter resultados bons, por outro há fortes argumentos no sentido de sua prejudicialidade, pois violaria a separação entre os Poderes e consequentemente prejudicaria o sistema democrático. O Judiciário estaria substituindo o Congresso e subtraindo a atribuição dos responsáveis pelas escolhas substantivas do povo brasileiro.

Vê-se aí as estreitas ligações com as questões que inquietaram os juízes e estudiosos nos Estados Unidos desde a origem do controle de constitucionalidade em 1803, no famoso caso Marbury vs. Madison.

É que as origens do ativismo judicial remontam à jurisprudência norte-americana. Em um primeiro momento o ativismo mostrou-se conservador na democracia estadunidense. Foi justamente na atuação proativa da Suprema Corte que os setores mais reacionários e conservadores encontraram amparo para a segregação racial (Dred Scott X Sanford, 1857) e para a invalidação das leis sociais em geral (Era Lochner, 1905-1937), culminando no confronto entre o presidente Roosevelt e a Corte, com a mudança da orientação jurisprudencial contrária ao intervencionismo estatal (West Coast X Parrish, 1937).

A mudança de pensamento se inverteu a partir da década de 50, quando a Suprema Corte presidida por Warren (1953-1969) e nos primeiros anos da Corte Burger (até 1973), se produziu jurisprudência progressista em matéria de direitos fundamentais envolvendo negros (Brown X Board of Education, 1954), acusados em processo penal (Miranda X Arizona, 1966), direitos das mulheres (Richardson X Frontiero, 1973), direito à privacidade (Griswold X Connecticut, 1965) e interrupção da gestação (Roe X Wade, 1973).

Percebe-se que muitos destes temas estão ou estiveram na pauta do Supremo Tribunal Federal no Brasil nos últimos anos, tanto pela via do controle concentrado como no difuso. Por essas razões tem sido cada vez mais recorrente a referência ao direito estrangeiro, especificamente o direito constitucional. É que por conta da proteção conferida pelas normas constitucionais aos direitos fundamentais, encontrada em número cada vez maior de países e com conteúdo substancial parecido, já se debate a formação do constitucionalismo global. E nesse ramo é fundamental reconhecer a experiência norte-americana.

A criação e aperfeiçoamento do controle de constitucionalidade das leis permitiu amplo debate sobre interpretação constitucional, cujas raízes remontam à antiga disputa na teoria constitucional entre os partidários do interpretacionismo e os adeptos do não interpretacionismo, como acentua John Hart Ely.

No Brasil, onde o Congresso Nacional se vê muitas vezes paralisado por inação ou pressão do Poder Executivo, o Judiciário acaba criando regras típicas de lei pela via judicial, experiência na qual os Estados Unidos são pioneiros, inclusive se fazendo referência a uma longa era de verdadeiro império dos juízes.

Os exemplos citados acima são claros casos de ativismo judicial, e é importante salientar que no Brasil, a interpretação – e seu alargamento – acaba produzindo efeitos concretos que não estão expressos na legislação em razão do vácuo deixado pelo Congresso Nacional em determinados temas. Assim, pode-se dizer que o exercício deste anômalo poder normativo na democracia brasileira já é resultado da desarmonia no sistema. Como consequência previsível o ativismo tem se dado tanto pela criação de normas como também de novas hipóteses de incidência para as previsões constitucionais. Sempre com bases teóricas  fundadas na hermenêutica.

Trata-se de tema fascinante e instigante, notadamente numa democracia jovem e diante da nova ordem erigida com a Constitucional Federal de 1988. O Poder Judiciário, desde então, vêm se desprendendo das antigas amarras sociológicas decorrentes de um regime mais fechado para exercitar um papel mais protagonista.

Essa postura coloca em evidência toda a carga axiológica da Constituição, exigindo do intérprete maior preparo acerca das melhores técnicas hermenêuticas. Nesse contexto é que a experiência constitucional norte-americana pode colaborar para a interpretação destes fenômenos que literalmente balançam o sistema de freios e contrapesos.

Os passos iniciais para a empreitada podem começar observando o diálogo entre os filósofos Ronald Dworkin e Jürgen Habermas para uma teoria íntegra do direito, hábil à resolução dos casos mais difíceis e que se norteie pelo conteúdo dos princípios.

Dworkin refuta a teoria da discricionariedade do juiz e defende a interpretação construtiva como forma de dar continuidade a um conceito interpretativo de direito, fazendo uma alusão do direito à literatura, um romance em série ou romance em cadeia, e não uma elaboração de um novo direito.

Seguindo nessa linha, importante trazer à baila o pensamento de John Hart Ely, autor de um clássico da literatura jurídica norte-americana, a obra Democracy and Distrust, a theory of judicial review, em que expõe sua teoria procedimentalista para o controle jurisdicional de constitucionalidade. O autor entende que o controle abstrato das normas deve funcionar como garantidor da origem verdadeiramente democrática das leis, sendo que tal processo se dá ouvindo as vozes das minorias e mantendo os canais de comunicações dessas vozes acessíveis de inclusão na elaboração das leis. Aceita-se e conforma-se, assim, à inevitável lacuna do Poder Legislativo quando elabora leis destoantes com a vontade geral, muitas vezes por defender exclusivamente interesses de minorias, e/ou por motivos lobísticos, perdendo sua função originária de representante do povo, e não raro abusando do poder.

Por fim, e para fomentar em definitivo o estudo do constitucionalismo norte-americano, assinala-se o trabalho do professor neozeolandês Jeremy Waldron, autor de crítica construtiva ao controle jurisdicional de constitucionalidade, com questionamentos e propostas concretas. Sua preocupação é demonstrar que o Judiciário nem sempre será a instância mais adequada para resolver matérias controvertidas acerca de direitos fundamentais. Negando a tese da única resposta correta delineada exemplarmente por Ronald Dworkin, o autor prefere que o desacordo sobre tais questões seja resolvido pelas instâncias democráticas de representação, especialmente nas democracias desenvolvidas.

Não se pretende nestas linhas elaborar um estudo da profícua obra dos autores e tampouco dos casos em que o ativismo judicial é praticado no Brasil. A ideia é demonstrar como o direito constitucional norte-americano pode contribuir para o aperfeiçoamento da democracia brasileira e o melhor aproveitamento possível dos checks and balances.


1. Interpretação constitucional íntegra na visão de Ronald Dworkin

Partindo do pressuposto de que a judicialização é fato sistêmico, decorrente da evolução de nossa democracia, e o ativismo judicial uma resposta para esse fato neste momento histórico, passa-se a questionar se a adoção dessa postura mais arrojada tem fundamento de validade na interpretação constitucional moderna.

Valendo-nos das lições do constitucionalismo norte-americano em diálogo com a filosofia alemã constata-se que há teorias a embasar esse proceder.

O pós-positivismo de Ronald Dworkin e Habermas traz ínsita a ideia de Estado interpretador e executor dos princípios e fundamentos constitucionais.

Na obra Império do Direito[1], Dworkin conclama os juristas a refletir a respeito da interação existente entre o objeto da interpretação e a finalidade com a qual ela é realizada. O autor destaca que o intérprete tenta tornar um objeto o melhor possível e que o direito, como uma prática social, requer uma forma peculiar de interpretação que se assemelha a interpretação artística. A esta interpretação atribui a designação de interpretação criativa. Nesse sentido, afirma que a interpretação centra-se não nas causas, mas nos propósitos do intérprete.

Trazendo a proposta do autor como critério de ativismo ou autocontenção por parte do Judiciário, reputa-se que a apreciação de qualquer pedido demanda interpretação constitucional concreta e individualizada, mas o estudo do caso deve ser muito maior se se tratar de controle de constitucionalidade em qualquer de suas formas.

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Já o objeto ganha relevo em matéria de direitos fundamentais, tanto para criação, restrição ou extinção.

Nesse sentido, e exemplificando com uma das maiores causas de litígios individuais no Brasil atualmente, que é a demanda por saúde e previdência, o que se deve buscar nos três poderes é exatamente esse grau de aprofundamento e interpretação, com garantia de acessos democráticos para a população se manifestar, mas sempre com cautela para evitar um movimento de judicialização em massa, tendente a criar uma espécie de estado de exceção judicial. Afinal, não somente o Legislativo pode favorecer minorias ou interesse lobísticos indevidamente. Aqui se verifica um ponto em que o pensamento de Dworkin se aproxima de John Hart Ely.

Como nosso constitucionalismo verdadeiramente democrático é jovem, crê-se que a evolução qualitativa na prestação do serviço público em todos os poderes certamente permitirá análises muito mais aprofundadas, casuísticas e finalísticas com os objetivos constitucionais.

Aliás, essa parece ser a tônica para a formação da “comunidade aberta de intérpretes da Constituição” como preconiza Peter Habërle[2]. Cabe não só aos juízes, como a todos os operadores do Estado na condição de intérpretes primeiros da legislação e da Constituição  estarem preparados para exercer seu múnus público com segurança e independência, a fim de atingir a finalidade específica do texto constitucional.

Consequentemente, ganha relevo um excelente referencial interpretativo de Ronald Dworkin, que é a teoria do direito como integridade, na busca da única resposta possível para um não aparente hard case. Não aparente porque um dos grandes problemas na implementação dos direitos, seja pela via administrativa ou judicial, é a massificação na análise dos casos, decorrente também da falta de estrutura. Isso prejudica sobejamente a interpretação das normas aplicáveis, levando muitas vezes à tão só subsunção da norma no suporte fático. O que vai de encontro ao que ora se busca, que é a interpretação.

A teoria de Dworkin é pertinente pois está calcada fortemente no argumento judicial e na necessidade de propor aos operadores do direito o desafio de encontrar uma resposta correta mesmo para os casos complexos. Lembra-se que muitas vezes está-se diante de um hard case não aparente, mas ainda que não o fosse, cabe salientar que não é apenas nos casos difíceis que o juiz interpreta as normas. Qualificar um caso como fácil ou difícil, ou uma norma como clara ou obscura, já é uma atividade de interpretação.

O autor desenvolve seu método hermenêutico afastando a teoria da discricionariedade do juiz e propondo a interpretação construtiva como forma de dar continuidade a um conceito interpretativo de direito, fazendo uma alusão do direito à literatura, um romance em série.

Dworkin aborda a semelhança do direito com a literatura quando apresenta essa parábola do romance em cadeia, em que se afirma que decidir casos controversos é semelhante ao ato de escrever um romance. Neste exercício literário um grupo de escritores é contratado para escrever um romance, sendo que cada capítulo tem um autor diferente. Para que o livro conserve a coerência, a partir do segundo capítulo cada romancista deve interpretar o texto já escrito para produzir a melhor continuação possível.[3]

Há inequívoca semelhança com o processo interpretativo operado na jurisprudência. Cada operador do direito se depara com um sistema pré-constituído por normas e por interpretações jurisprudenciais, os paradigmas, tidos como consensos condicionadores do debate e da interpretação.

A jurisprudência consolidada em diferentes momentos e proveniente de diferentes juízos e tribunais incorpora-se ao sistema jurídico, produzindo na comunidade a expectativa de que, em casos semelhantes, a decisão será guiada pelas mesmas razões de decidir.

Assim, refutar os paradigmas jurídicos consensuais provoca fortes suspeitas sobre a adequação da interpretação e o proponente corre o risco de ser considerado arbitrário, alternativista ou ignorante, ao menos que a divergência seja apontada e adequadamente fundamentada.

Aqui reside um possível campo de aplicabilidade para o melhor ativismo judicial, que é justamente o reconhecimento destes paradigmas, e principalmente o respeito aos princípios que os compõe, como o pacto democrático, o sistema de separação dos poderes, a autodeterminação, e o reconhecimento e proteção de direitos fundamentais e sociais.

Dada a disseminação e o avanço do constitucionalismo global já é possível se dizer o quê a comunidade espera das cláusulas constitucionais, fato que vem sendo bem demonstrado pela imprensa no Brasil, mesmo sabedor que este veículo também é dirigido.

A proposta de Dworkin contempla este movimento hermenêutico cíclico e se compatibiliza com a dinâmica entre ativismo e autocontenção. Seus métodos e sua teoria construtivista constituem inequívoco avanço para a teoria constitucional norte-americana contemporânea.

A precisa distinção entre princípios, políticas e regras, conhecendo as peculiaridades de cada um desses padrões para integrá-los em uma teoria da decisão jurídica, bem como a reconstrução do direito a partir das próprias práticas da sociedade personificada são as pedras de toque da obra.

Curiosamente, Dworkin insiste em negar que sua concepção de direito como integridade conduza ao ativismo judiciário, por pretendê-la mais inflexivelmente interpretativa do que o convencionalismo (positivismo) ou o pragmatismo. No dizer do autor, o ativismo é uma forma virulenta de pragmatismo jurídico.


2. A colaboração de John Hart Ely e sua teoria procedimentalista no controle de constitucionalidade

Em Democracy and Distrust, John Hart Ely prefacia explicando os equívocos tanto dos interpretacionistas quanto dos que defendem uma hermenêutica mais substancial, os não interpretacionistas. O autor formula sua crítica afirmando que os primeiros subordinam séculos de gerações à vontade de quem aprovou a Constituição, ao adotarem uma posição de estrito cumprimento das normas explícitas ou claramente implícitas da Carta. Assim, ao invés da Constituição ser um patrimônio dos vivos, acabaria sendo uma armadilha, posto que representaria as vontades substantivas de antepassados. Afora essa aspecto, o interpretacionismo não contempla uma explicação satisfatória para a leitura das cláusulas abertas, especialmente os princípios fundamentais.

Por outro lado os não interpretacionistas – sendo que um dos expoentes é Ronald Dworkin – ao estabelecerem valores substanciais muito fortes no texto constitucional, autorizando os tribunais a fazer cumprir normas que não se encontram claramente indicadas na linguagem do documento, terminam por exercer função de natureza legislativa, com caráter profundamente antidemocrático, já que substituem a vontade do povo através de órgão não eleito.

Segundo o autor, todavia, qualquer que seja a postura interpretativa das normas constitucionais que se adote (valores do juiz, direito natural, razão, tradição, consenso, princípios neutros, etc) não há qualquer motivo para supor que os juízes possam por si só alcançar tais verdades ou que o Parlamento não seja mais legítimo.

Não há porque continuar a aceitar a tese da relativa inofensividade do Judiciário quando se constata a progressiva ingerência nas esferas dos demais poderes e a ausência de qualquer espécie de controle.

No entender de Ely, a produção ativista da Suprema Corte norte-americana a partir do Tribunal Warren adquiriu seu padrão de excelência justamente por não se pautar por valores substantivos, mas sim na garantia de dois enfoques: que todas os pontos de vista tenham sido levados em conta no processo de elaboração das leis e que o direito das minorias sofresse uma análise estrita do porquê estava sendo negado.

Observa-se aqui um método de interpretação válido na dicotomia entre ativismo e autocontenção, já que se reforça um esquema de atuação mais processualista em detrimento de uma concepção paternalista de controle de constitucionalidade, em que o jurista supostamente protege o povo da irracionalidade do legislador ou dos interesses lobísticos, ou ainda de minorias que supostamente foram contemplados pelo Poder Legislativo subtraindo a vontade popular.

O autor é categórico ao afirmar que se o Parlamento não é suficientemente democrático, então o que se deve fazer é reforçar a democracia do Parlamento e não colocar os juízes acima deles por considerá-los mais capazes de interpretar o sentimento popular. Essa é uma ideia central na reflexão proposta, qual seja, o reforço da democracia.

Ely enxerga na Constituição americana uma série de mecanismos que fizeram possível a participação, em condição de igualdade, de todos os interessados na tomada de decisões que lhes afetem. A única tarefa jurisdicional adequada à separação de poderes é garantir que estes canais funcionem adequadamente. Então duas grandes qualidades dos juízes reforçam sua predisposição para esta tarefa: a familiaridade com processos e procedimentos e a imparcialidade frente ao sistema político. O controle abstrato das normas dá-se em atenção à gênese das leis, para evitar que a vontade das maiorias tirânicas influencie o processo democrático.

A não concorrência dos poderes pode ser evitada pela teoria do procedimentalismo, baseada em uma compreensão democrática de que a função do tribunal constitucional é a de proteger os sistemas de direito que possibilitam a autonomia privada e pública dos cidadãos.

Para se manter harmônico o Estado Democrático de Direito, a Constituição não pode ser entendida somente como uma ordem substantiva que regula Estado e cidadão; também não pode ser entendida como uma ordem jurídica global e concreta destinada a impor uma determinada forma de vida sobre a sociedade. Assim, a função da Constituição é determinar procedimentos políticos segundo os quais, os cidadãos, assumindo seu direito de autodeterminação, possam perseguir cooperativamente o projeto de produzir condições justas de vida.

A concepção procedimentalista da Constituição se caracteriza pelo enfoque democrático do problema da legitimidade do controle jurisdicional de constitucionalidade, com base no fato de que o tribunal constitucional deve examinar as normas controvertidas no contexto dos pressupostos comunicativos e condições procedimentais do processo  legislativo. Em outras palavras, cabe à Corte Constitucional verificar se o processo legislativo realmente garantiu a oitiva de todos os pontos de vista e se os direitos das minorias foi de alguma forma limitado, e nesse caso, por quais justificativas.

Nesta concepção o Tribunal Constitucional deve proteger o sistema de direitos que proporciona a autonomia privada e pública dos cidadãos, pois esta autonomia é a base dos procedimentos democráticos.

Dessa forma, a Suprema Corte atua como garantidor da eficácia legitimativa do processo democrático, mantendo o processo inclusivo de formação da opinião e da vontade por meio de uma comunidade livre e organizada.

Como se observa, John Hart Ely se posiciona como um dos mais ferrenhos críticos do ativismo judicial, na medida em que sua teoria não dá margem à interpretação criativa, emergindo como uma terceira via às teses de Dworkin e Habermas.

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Sobre o autor
Rafael Machado de Oliveira

Procurador Federal, atualmente Procurador Regional do INSS na 2ª Região, graduado na UFSM e especialista pela UNB. Professor de direito previdenciário e do trabalho.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

OLIVEIRA, Rafael Machado. Ativismo judicial no Brasil e a importância da experiência norte-americana em hermenêutica constitucional. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3596, 6 mai. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/24367. Acesso em: 21 nov. 2024.

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