CONCLUSÃO
No decorrer deste trabalho, verificamos claramente a falta de identidade entre as peculiaridades da personalidade psicopática e o conceito jurídico de semi-imputabilidade, bem como, a ineficácia da aplicação de pena a um indivíduo que, justamente por essas peculiaridades, tem reduzida sua possibilidade de ajuste moral com os ditames da sociedade onde vive.
Nos casos em que foi aplicada a interdição civil como forma de afastar do meio social indivíduos com alta periculosidade e probabilidade de reincidência, apesar das críticas constantes da doutrina sobre tratar-se de “prisão no juízo cível”, entendemos que atende às necessidades não apenas da sociedade, mas do próprio interditado, pois, por ter atestado através de laudo a permanência de características psicológicas que o conduziram à criminalidade, é mister que deva continuar a receber tratamento em local adequado.
Vislumbramos esta, portanto, como uma primeira solução para a questão do condenado diagnosticado psicopata que, tendo cumprido parte de sua pena ou em sua totalidade, obtenha, respectivamente, benefícios penais ou a liberdade propriamente dita, sem que, no entanto, tenha cessado sua periculosidade.
Outra solução proposta por nós seria a modificação da medida de segurança, atualmente cabível, em regra, ao inimputável e, excepcionalmente, ao semi-imputável. Nossa sugestão, é acrescentar a aplicação dessa sanção penal ao imputável diagnosticado portador de psicopatia. Vamos explicar.
É fato que a tendência médico-psiquiátrica é caracterizar o portador de psicopatia como imputável. Porém, além de nosso ordenamento jurídico atribuir à esses a semi-imputabilidade – o que leva à redução da pena - declará-los imputáveis não surti efeito melhor.
Sabemos que, em ambos – imputabilidade e semi-imputabilidade, salvo exceção quanto ao último, o qual pode ser submetido à medida de segurança – existe, por disposição do Código Penal em conformidade com a Constituição da República de 1988, a incidência de benefícios aos condenados.
Destarte mostra-se inapropriada a aplicação de punição, por mais severa que seja, ao indivíduo psicopata, pois, por deficiência moral, sequer sente necessidade de modificar seus atos e, ao obter a liberdade, não tendo recebido qualquer tratamento ou orientação adequada, pode retornar a delinquir.
Entendemos por ideal possibilitar que o condenado imputável, diagnosticado com personalidade psicopática, pudesse, desde sua condenação, receber tratamento adequado em instituição própria para estes. Embora saibamos que inexista tratamento totalmente eficaz para a recuperação – se é possível – de um portador de transtorno de personalidade antissocial, melhor é algum tratamento do que nenhum.
Ademais, a medida de segurança é por prazo indeterminado, porém, de forma alguma estaria o condenado cumprindo uma prisão perpétua, pois, precipuamente, esta recomendação deve-se por sua condição médico-psiquiátrica e, segundo, pré-existe um prazo mínimo para avaliações periódicas, onde será atestado a evolução ou não do interno quanto à cessação de sua periculosidade.
Lutar por sua imputabilidade e consequente majoração de pena, seria tentar modificar a própria Constituição da República, o que se torna um processo dificultoso e polêmico, quando não, impossível.
ANEXOS
Índice de anexos
Anexo 1 >> Tabela: transgressor organizado e transgressor desorganizado;
Anexo 2 >> Projeto de lei n. 140, de 2010;
Anexo 3 >> Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais – DSM-IV-TR – (301.7);
Anexo 4 >> Classificação Internacional de Doenças – CID-10 – (F60.2);
ANEXO 1
TRANSGRESSORES |
|
ORGANIZADOS |
DESORGANIZADOS |
Inteligência média para alta |
Inteligência abaixo da média |
Metódico e astuto |
É capturado mais rapidamente |
Não realizado profissionalmente |
Distúrbio psiquiátrico grave |
Educação esporádica |
Contato com instituições de saúde mental |
Socialmente competente, mas antissocial e de personalidade psicopata |
Socialmente inadequado – relaciona-se só com a família mais próxima ou nem isso |
Preferência por trabalho especializado e esporádico |
Trabalhos especializados, que tenham pouco ou nenhum contato com o público |
Sexualmente competente |
Sexualmente incompetente ou nunca teve experiência sexual |
Nascido em classe média-alta |
Nascido em classe baixa |
Trabalho paterno estável |
Trabalho paterno instável |
Disciplina inconsistente na infância |
Disciplina severa na infância |
Cena planejada e controlada: cordas, corrente, mordaça ou algemas na vítima |
Cena de crime desorganizada |
As torturas impostas à vítima foram exaustivamente fantasiadas |
Nenhuma ou pouca premeditação |
Temperamento controlado durante o crime |
Temperamento ansioso durante o crime |
Locomove-se com carro em boas condições; viaja muito |
Em geral, não tem carro, mas tem acesso a um |
Traz sua arma e seus instrumentos |
Utiliza arma de oportunidade, a que tem na mão |
Leva embora sua arma e instrumentos após o crime |
Com frequência deixa a arma do crime no local |
A vítima é estranha, em geral mulher, com algum traço particular |
Vítima selecionada ao acaso |
Vítima é torturada e tem uma morte dolorosa e lenta |
Vítima rapidamente dominada e morta – emboscada |
O corpo é levado e muitas vezes esquartejado para dificultar a identificação pela polícia |
Frequentemente o corpo é deixado na cena do crime. Quando é levado, é por lembrança. |
Uso de álcool pelo agressor |
Mínimo uso de álcool pelo agressor |
TRANSGRESSORES |
|
---|---|
ORGANIZADOS |
DESORGANIZADOS |
Estresse precipitador de situações |
Quando em estresse, age por impulso |
Vive com o parceiro ou é casado. |
Vive sozinho ou com os pais. |
Realiza seus crimes fora da área de sua residência ou do trabalho |
Mora ou trabalha perto da cena dos crimes |
Acompanha os acontecimentos relacionados ao crime pela mídia |
Mínimo interesse na novidades da mídia |
Em geral, da mesma raça que a vítima, mas a etnia local deve ser considerada |
Em geral, da mesma raça que a vítima, mas a etnia local deve ser considerada |
Provavelmente foi um aluno-problema |
Saiu cedo da escola. Estudante marginal |
Bem-apessoado |
Magro, com acne ou outra marca física que faz com que se considere diferente da população em geral. |
Tem aproximadamente a idade da vítima; a média etária fica entre 18 e 45 anos, em geral 35. |
Idade entre 16 e 19 anos. Em geral, age entre 17 e 25 anos. |
Pode trocar de emprego ou deixar a cidade |
Mudança de comportamento significativa, como álcool e drogas. |
Frequentemente a vítima é estuprada e dominada através de ameaças ou instrumentos |
Se a vítima foi atacada sexualmente, com frequência o ataque foi post-mortem. |
Ainda, a tabela apresentada por Ilana Casoy em seu livro “Serial killer: louco ou cruel?” (pp. 65-66), traz as seguintes características para o transgressor desorganizado:
→ crimes brutais, com extrema violência e overkill (ferimentos maiores que os necessários para simplesmente matar);
→ rosto da vítima espancado de forma severa, numa tentativa de desfigurá-la e desumanizá-la, ou uso pela vítima de máscara / venda;
→ mutilações no rosto, nos genitais e nos seios são comuns.
ANEXO 2
SENADO FEDERAL
PROJETO DE LEI DO SENADO
Nº 140, DE 2010
Acrescenta o §§ 6º, 7º, 8º e 9º, ao artigo 121 do Código Penal brasileiro (Decreto-Lei nº 2.848, de 07 de dezembro de 1940) com o objetivo de estabelecer o conceito penal de assassino em série.
O CONGRESSO NACIONAL decreta:
Art. 1º. O artigo 121, do Decreto-Lei nº 2.848, de 07 de dezembro de 1940 (Código Penal brasileiro) passa a vigorar acrescido dos §§ 6º, 7º, 8º e 9º, tendo a seguinte redação:
"Art. Art. 121. Matar alguém:
...
Assassino em série
§ 6º Considera-se assassino em série o agente que comete 03 (três) homicídios dolosos, no mínimo, em determinado intervalo de tempo, sendo que a conduta social e a personalidade do agente, o perfil idêntico das vítimas e as circunstâncias dos homicídios indicam que o modo de operação do homicida implica em uma maneira de agir, operar ou executar os assassinatos sempre obedecendo a um padrão pré-estabelecido, a um procedimento criminoso idêntico.
§ 7º Além dos requisitos estabelecidos no parágrafo anterior, para a caracterização da figura do assassino em série é necessário a elaboração de laudo pericial, unânime, de uma junta profissional integrada por 05 (cinco) profissionais:
I – 02 (dois) psicólogos;
II – 02 (dois) psiquiatras; e
III – 01 (um) especialista, com comprovada experiência no assunto.
§ 8º O agente considerado assassino em série sujeitar-se-á a uma expiação mínima de 30 (trinta) anos de reclusão, em regime integralmente fechado, ou submetido à medida de segurança, por igual período, em hospital psiquiátrico ou estabelecimento do gênero.
§ 9º É vedado a concessão de anistia, graça, indulto, progressão de regime ou qualquer tipo de benefício penal ao assassino em série.
Art. 2º. Esta lei entra em vigor 90 (noventa) dias após sua publicação.
Sala das Sessões, de maio de 2010.
Senador ROMEU TUMA
JUSTIFICAÇÃO
Não existe no Código Penal brasileiro (CPB) ou em qualquer outra lei penal especial o conceito jurídico-penal de “assassino em série”.
Apresento esta proposição em repúdio às ações criminosas perpetradas pelo suicida ADMAR DE JESUS, assassino em série, que entre o final do ano passado e o início deste ano, no município de LUZIÂNIA/GO, matou 06 (seis) jovens com idade entre 13 a 19 anos.
Ele era um homem discreto e gentil com vizinhos, de hábitos insuspeitos, que trucidava suas vítimas sem piedade.
O assassino em série é um tipo especial de criminoso, que comete os seus assassinatos de forma metódica, estudada, criteriosa. Normalmente, suas ações são extremamente violentas e as vítimas são eliminadas com requintes sofisticados de crueldade.
Não há por parte do assassino em série nenhum senso de compaixão ou misericórdia pelas vítimas e ele, em liberdade, continuará a matar de maneira sórdida. Daí a necessidade de se adotar medidas extremas contra tais indivíduos.
As ações criminosas do assassino em série são repugnantes, imundas, nojentas e causam na sociedade brasileira um sentimento de imensa aversão e revolta, daí a necessidade de uma lei bastante rigorosa para esse tipo de assassino.
É fundamental também para a caracterização do assassino em série que a comprovação seja respaldada por laudo pericial rigoroso, elaborado por uma junta de profissionais da área, com conhecimentos profundos da matéria, a fim de evitar injustiças perpetradas na fase policial (administrativa) que possam induzir as autoridades judiciárias.
Referida junta profissional além de ser integrada por profissionais da saúde mental, psiquiatras e psicólogos forenses, deverá ter em sua composição 01 (um) especialista na matéria, de outra área de conhecimento, com comprovada atuação profissional no ramo.
Por fim, a apresentação deste projeto de lei tem o objetivo de promover o debate e a boa discussão do tema na sociedade brasileira, e, também, entre os membros do Congresso Nacional, sendo que a proposição ora apresentada não esgota a matéria e traz a possibilidade de aperfeiçoamento durante a tramitação.
Esperando merecer o acolhimento de meus eminentes pares do Senado da República e da Câmara dos Deputados, submeto a presente proposição ao conhecimento do Congresso Nacional.
(À Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, em decisão terminativa)
Publicado no DSF, em 19/05/2010.
Secretaria Especial de Editoração e Publicações do Senado Federal – Brasília-DF
OS: 12537/2010
ANEXO 3
Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais DSM-IV-TR – (301.7)
Critérios Diagnósticos para Transtorno da Personalidade Antissocial
A. Um padrão global de desrespeito e violação dos direitos dos outros, que ocorre desde os 15 anos, como indicado por pelo menos três dos seguintes critérios:
(1) incapacidade de adequar-se às normas sociais com relação a comportamentos lícitos, indicada pela execução repetida de atos que constituem motivo de detenção
(2) propensão para enganar, indicada por mentir repetidamente, usar nomes falsos o ludibriar os outros para obter vantagens pessoais ou prazer
(3) impulsividade ou fracasso em fazer planos para o futuro
(4) irritabilidade e agressividade, indicadas por repetidas lutas corporais ou agressões físicas
(5) desrespeito irresponsável pela segurança própria ou alheia
(6) irresponsabilidade consistente, indicada por um repetido fracasso em manter um comportamento laboral consistente ou de honrar obrigações financeiras
(7) ausência de remorso, indicada por indiferença ou racionalização por ter ferido, maltratado ou roubado alguém
B. O indivíduo tem no mínimo 18 anos de idade.
C. Existem evidências de Transtorno da Conduta com início antes dos 15 anos de idade.
D. A ocorrência do comportamento antissocial não se dá exclusivamente durante o curso de Esquizofrenia ou Episódio Maníaco.
ANEXO 4
Classificação Internacional de Doenças
CID-10 – (F60.2)
Transtorno de Personalidade Dissocial
Transtorno de personalidade caracterizado por um desprezo das obrigações sociais, falta de empatia para com os outros. Há um desvio considerável entre o comportamento e as normas sociais estabelecidas. O comportamento não é facilmente modificado pelas experiências adversas, inclusive pelas punições. Existe uma baixa tolerância à frustração e um baixo limiar de descarga da agressividade, inclusive da violência. Existe uma tendência a culpar os outros ou a fornecer racionalizações plausíveis para explicar um comportamento que leva o sujeito a entrar em conflito com a sociedade.
Personalidade (transtorno da):
· amoral
· antissocial
· associal
· psicopática
· sociopática
Exclui: transtorno (de) (da)
· conduta (F91.-)
· personalidade do tipo instabilidade emocional (F60.3)