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O protesto da certidão de dívida ativa:

um breve olhar sobre a ótica da desjudicialização da execução fiscal

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22/05/2015 às 12:23
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Urge que se encontrem alternativas para uma maior efetividade nas execuções fiscais, bem como para a diminuição dos processos judiciais. O protesto das CDAs parece preencher tais quesitos.

RESUMO - O presente trabalho trata do protesto das Certidões de Dívida Ativa sob o enfoque da desjudicialização da execução fiscal. Num primeiro momento, será analisado o cenário forense nacional e as possíveis soluções para congestionamento de processos no Poder Judiciário. Num segundo, a possibilidade de protesto das certidões de dívida ativa, como meio alternativo de cobrança dos créditos tributários.

PALAVRAS-CHAVE: execução fiscal, desjudicialização da execução fiscal e protesto da Certidão de Dívida Ativa (CDA).


INTRODUÇÃO

As execuções fiscais são responsáveis por 1/3 de todos os processos que tramitam no Judiciário brasileiro, tendo duração média de oito anos e dois meses.

O represamento por tal período ocorre, principalmente, pela demora em localizar o devedor para a citação e a localização de bens para satisfação da dívida, tornando o modelo atual de execução fiscal defasado e ineficiente. Preocupado com tais números, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) tem alavancado discussões acerca da desjudicialização da execução fiscal, como meio de descongestionar o Poder Judiciário. Para desalento, o Projeto de Lei que cria a nova Lei de Execuções Fiscais está tramitando no Congresso desde 2009 e não há previsão de que haja mudanças em um curto espaço de tempo.

Neste cenário, amparada por decisões judiciais do Superior Tribunal de Justiça (STJ), desponta o protesto das Certidões de Dívidas Ativas (CDAs) como meio alternativo à cobrança dos créditos da Fazenda Pública.

Nessa toada, o presente trabalho propõe estudar a aplicabilidade do protesto da CDA sob o enfoque da desjudicialização da execução fiscal, sem perder de vista o cenário forense.


1.DESJUDICIALIZAÇÃO DA COBRANÇA DOS EXECUTIVOS FISCAIS

1.1.INEFICIÊNCIA DO MODELO ATUAL NA REALIZAÇÃO DO CRÉDITO FISCAL

Para a exata compreensão dos objetivos deste trabalho é necessário traçar em linhas gerais o cenário forense nacional. Consoante notícia veiculada pelo CNJ[1] estão em tramitação no Poder Judiciário 92,2 milhões de ações, das quais 25,6 milhões (32%) são execuções fiscais. De acordo com o estudo, na Justiça Estadual tramitam 25,6 milhões de executivos fiscais, enquanto que a Justiça Federal é responsável por 3,5 milhões (Souza, 2014).

Ao seu turno, o estudo realizado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) aponta que somente a citação do devedor nas execuções fiscais leva em média cinco anos para ser realizada, ao passo que a penhora de algum bem, em torno seis anos. No geral, uma execução fiscal tem duração média de oito anos dois meses (Souza, 2014).

Nessa ordem conjuntural, Norat (2014) salienta:

“A realidade forense nos tem mostrado elevado grau de morosidade do procedimento da execução fiscal e o que é pior, com baixo aproveitamento em termos de retorno financeiro. Diversas execuções esbarram em problemas citatórios e de falta de bens e outras milhares são resolvidas em âmbito administrativo (parcelamento) com a suspensão da execução”.

Freitas (2013, p. 36) exemplifica:

“A situação, na verdade, equivale à de uma Unidade de Terapia Intensiva onde não há vagas para todos os doentes. Cumpre, pois, ao médico a árdua tarefa de escolher quais doentes têm mais chance de sobreviver. A omissão, nesse caso, implicará em deixar a escolha ao acaso, o que trará resultados piores do que uma criteriosa escolha por probabilidade de sobreviver.

No âmbito da execução fiscal não é diferente. Não há possibilidade de  atuação a contento em todos os executivos fiscais. É necessário, portanto, priorizar a atuação naqueles processos em que há maior potencialidade de recuperação do crédito. Não fazê-lo implicará em deixar essa escolha ao acaso, uma vez que, repita-se, é impossível que se dê prosseguimento a todos.

Nesse contexto, é que surge a necessidade de adoção de medidas eficientes no trato da recuperação de créditos públicos por meio da execução fiscal”.

Dispõe o artigo 5º, LXXVIII, da Constituição Federal de 1988, “a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação”.

No mesmo prisma, há de ser considerado o “princípio constitucional da eficiência”, por meio do qual a Administração Pública encontra-se obrigada a agir de forma a obter resultados satisfatórios na prestação de serviços à sociedade (Freitas, 2012, p. 38).

Sob este ângulo, não restam dúvidas que as execuções fiscais são responsáveis, em grande parte, pelo congestionamento de processo no Poder Judiciário. No mais, o modelo de execução fiscal, delineado pela Lei nº 6.830/1980, é defasado e ineficiente, fato que, explica, por exemplo, que transcorra-se, em média, 05 (cinco) anos para que ocorra o ato citatório.

Neste contexto, a mudança na Lei de Execuções Fiscais (LEF) e o protesto de dívidas fiscais em cartório surgem como medidas para alterar o caos forense atual, este último, como via alternativa de aplicação imediata, enquanto tramita o projeto que visa reformular a Lei de Execuções Fiscais.

1.2.DESJUDICIALIZAÇÃO NA COBRANÇA DE TRIBUTOS: EXECUÇÃO FISCAL ADMINISTRATIVA

A desjudicialização da cobrança da dívida ativa é o tema mais frequente quando se trata do congestionamento do Poder Judiciário. Segundo “Estudo Sobre Execuções Fiscais no Brasil” (2007, p. 63) por desjudicialização da cobrança da dívida ativa entenda-se desviar a cobrança forçada de seu eixo atual, centrado no Poder Judiciário, para a esfera administrativa, dotando esta última de definitividade, em caso de a parte executada não apresentar resistência.

Em outras palavras, a desjudicialização da execução fiscal visa, precipuamente, retirar da esfera do magistrado a prática de atos, eminentemente, burocráticos e executórios.

Tal sistema foi adotado em vários países europeus, sendo fonte de estudo para vários outros povos, diante da universal necessidade de otimização dos processos e procedimentos judiciais. (Paiva, 2014).

Na França, por exemplo, a execução está baseada na figura dos huissiers de justice, mistos de profissionais liberais e auxiliares da justiça, que possuem o monopólio da execução forçada e apreensão de bens para a  conservação (Paiva apud Resende, 2014, p. 35).

Em Portugal, a reforma da ação executiva ocorreu em 2003 e buscou reduzir a atuação do juiz e da administração pública criando a figura do solicitador de execução, sistema semelhante ao aplicado na França (Alemão, 2007).

Em audiência pública, cujo tema era a “Eficiência do 1º Grau de Jurisdição e Aperfeiçoamento Legislativo Voltado ao Poder Judiciário”, realizada pelo CNJ, advogado-geral da União, o Ministro Luís Inácio Adams defendeu transferir para a administração pública a responsabilidade por atos burocráticos de cobrança, atualmente realizados pelos juízes. Segundo Adams. “É dado ao juiz hoje tarefas meramente burocráticas. O juiz deve garantir, mediante provocação, o devido processo legal e conter abusos da administração” (Pombo, 2014).

O Juiz Eduardo José de Carvalho, titular da 2ª Vara de Executivos Fiscais de João Pessoa que participou do grupo de estudos do CNJ afirma que:

 “O correto é que a própria Fazenda faça sua cobrança, localize o seu devedor, localize seus bens que podem ser penhorados, faça o protesto da dívida em cartório, averbe nos órgãos de registro de bens imóveis, móveis e de capital a dívida. Se o cidadão, ou a empresa, sentir-se prejudicada, aí sim ingresse na Justiça para proteger ou resguardar os seus direitos, este é o caminho que vem sendo adotado em grande parte do mundo”

Nessa linha de raciocínio, o “Estudo Sobre Execuções Fiscais no Brasil” realizado pela Secretaria de Reforma do Poder Judiciário do Ministério da Justiça (2007, p. 63/76), aponta as medidas para concretizar a desjudicialização:

- tornar a certidão da dívida ativa já suficiente para interromper a prescrição;

- autorizar as procuradorias, depois de cientificar o devedor acerca da existência do débito, a proceder a penhoras administrativamente;

- tornar a venda pública do bem penhorado como negócio no interesse da parte exequente;

- autonomia dos Procuradores no estabelecimento de prioridades na cobrança;

- autonomia dos Procuradores para negociar e celebrar acordos com os devedores;

- treinamento dos Procuradores;

-baixa das ações inviáveis e prescritas, assim como levantamento do real valor passível de cobrança;

- manutenção da obrigatoriedade de cobrar todo e qualquer crédito;

- criação de um órgão específico do Poder Executivo encarregado da cobrança;

- criação de juizados especiais e adoção de métodos alternativos de resolução de controvérsias;

- maior utilização de meios que induzam os devedores a cumprir suas obrigações fiscais;

- uniformização dos dados a respeito dos custos da cobrança da dívida ativa;

- melhoria no cadastro e no fluxo de informações;

- informatização e processo digital;

- desnecessidade de penhora para a discussão do crédito;

- penhora administrativa;

- Oficiais de Justiça ad hoc;

- obrigatoriedade de indicação de bens passíveis de penhora na petição inicial;

- simplificação na forma de quitar os débitos ajuizados;

-manutenção da atual lei e modificações pontuais.

Nessa perspectiva, foi encaminhado ao Congresso Nacional o Projeto de Lei nº 5.080/09 (apensado ao Projeto de Lei nº 2.412/07)[2] que pretende alterar a Lei de Execuções Fiscais atual.

Feito estes comentários e, enquanto se aguarda o advento da nova Lei de Execuções Fiscais, é necessário fazer uso de outros instrumentos que possam desafogar o Judiciário. Assim é que o protesto das certidões de dívida ativa surge como uma via alternativa de cobrança dos créditos da Fazenda Pública e, consequentemente, é um meio para reduzir o ajuizamento de demandas fiscais pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios, bem como das suas entidades descentralizadas.


2.PROTESTO DAS CERTIDÕES DE DÍVIDA ATIVA COMO MEIO ALTERNATIVO DE COBRANÇA DOS EXECUTIVOS FISCAIS

2.1 PROTESTO DE TÍTULOS: CONCEITO E DISCIPLINA JURÍDICA

O protesto é o ato formal e solene, cujo objetivo inicial é a comprovação da inadimplência ou descumprimento da obrigação constante em um título. Encontra regulamentação nos artigos 1º e seguintes da Lei nº 9.492/97, in verbis:

Art. 1º. O protesto é ato formal e solene pelo qual se prova a inadimplência e o descumprimento de obrigação originada em título e outros documentos de dívida.

Art. 2º. Os serviços concernentes ao protesto, garantidores da autenticidade, publicidade, segurança e eficácia dos atos jurídicos, ficam sujeitos ao regime estabelecido nesta Lei.

O protesto é competência privativa do Tabelião de Protesto de Títulos, conforme definição do artigo 3º da lei supra mencionada, “tem competência privativa na tutela dos interesses públicos e privados”. O mesmo dispositivo legal define a competência do Tabelião da seguinte forma:

Art. 3º Compete privativamente ao Tabelião de Protesto de Títulos, na tutela dos interesses públicos e privados, a protocolização, a intimação, o acolhimento da devolução ou aceite, o recebimento do pagamento, do título e de outros documentos de dívida, bem como lavrar e registrar o protesto ou acatar a desistência do credor em relação ao mesmo, proceder às averbações, prestar informações e fornecer certidões relativas a todos os atos praticados, na forma desta Lei.

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Na lição de Amadei (2004, p. 69):

“No caso dos Tabeliães de Protesto, estes exercem função de natureza híbrida. Têm autuação notarial, pois recepcionam a vontade de registrar o protesto, averiguam se esta vontade é juridicamente válida e, sendo este o caso, testificam com fé pública esta vontade, instrumentalizando o protesto. Por outro lado, têm função registral, pois cabe ao Tabelião não apenas recepcionar a vontade, como proclamar publicamente o protesto, dotando o ato de diversos efeitos decorrentes do registro de do protesto e de publicidade”.

Observa-se, nesse diapasão, que o advento da Lei nº 9.492/97 ampliou os instrumentos suscetíveis de protesto, possibilitando o protesto de título e documentos que contenham obrigações que não foram satisfeitas pelo devedor, além do já usual protesto de títulos de natureza cambial.

Posteriormente, a Lei nº 12.767/12 acresceu o parágrafo único ao artigo 1º da Lei nº 9.492/97, admitindo, expressamente, o protesto das certidões de dívida ativa, conforme segue: “(...) Incluem-se entre os títulos sujeitos a protesto das certidões de dívida ativa da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e das respectivas autarquias e fundações públicas”.

Sob este ângulo, a inclusão do parágrafo único ao artigo 1º da Lei nº 9.492/97 prevendo expressamente o protesto das certidões de dívida ativa pela Fazenda Pública, com a decorrente satisfação do crédito por iniciativa do devedor, colocou termo aos conflitos que certamente seriam submetidos ao Judiciário (Buzanello, 2014).

2.2 PROTESTO DA CERTIDÃO DE DÍVIDA ATIVA: ASPECTOS RELEVANTES

A possibilidade de protesto das CDAs surge como uma via alternativa de cobrança dos créditos da Fazenda Pública, dentro da premissa de desjudicialização da cobrança de tributos e, consequentemente, dota de maior eficiência a cobrança dos créditos fazendários.

Segundo Caminha (2013), com a ampliação dos instrumentos suscetíveis de protesto, realizado pelo legislador ordinário com a edição das Leis nº 9.492/97 e 12.767/12, abriu-se a possibilidade manejo do protesto não apenas em face aos títulos de natureza cambial, mas também de outros títulos e de documentos que contenham em seu bojo obrigações que não foram satisfeitas pelo devedor.

Sob o mesmo ângulo, Freitas (2013, p. 55) dispõe que o protesto da CDA é um meio legítimo de cobrança indireta; equivale à restrição de emissão de certidão de regularidade fiscal.

De início, o advento da Lei nº 9.492/97 trouxe muita controvérsia acerca de legitimidade do protesto da CDA, eis que as correntes contrárias sustentavam que a CDA já desfruta dos atributos da certeza e liquidez, sendo prescindível o protesto do título.

Nem mesmo com o acréscimo do parágrafo único ao artigo 1º da Lei nº 9.492/97 pela Lei nº 12.767/12, admitindo expressamente o protesto da CDA, pacificou a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça.

O divisor de águas na questão do protesto da CDA foi o acórdão proferido no Recurso Especial nº 1.126.515/PR pelo Relator Ministro Herman Beijamin, que tem a seguinte ementa:

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. PROTESTO DE CDA. LEI 9.492/1997. INTERPRETAÇÃO CONTEXTUAL COM A DINÂMICA MODERNA DAS RELAÇÕES SOCIAIS E O "II PACTO REPUBLICANO DE ESTADO POR UM SISTEMA DE JUSTIÇA MAIS ACESSÍVEL, ÁGIL E EFETIVO". SUPERAÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA DO STJ.

1. Trata-se de Recurso Especial que discute, à luz do art. 1º da Lei 9.492/1997, a possibilidade de protesto da Certidão de Dívida Ativa (CDA), título executivo extrajudicial (art. 586, VIII, do CPC) que aparelha a Execução Fiscal, regida pela Lei 6.830/1980.

2. Merece destaque a publicação da Lei 12.767/2012, que promoveu a inclusão do parágrafo único no art. 1º da Lei 9.492/1997, para expressamente consignar que estão incluídas "entre os títulos sujeitos a protesto as certidões de dívida ativa da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e das respectivas autarquias e fundações públicas".

3. Não bastasse isso, mostra-se imperiosa a superação da orientação jurisprudencial do STJ a respeito da questão.

4. No regime instituído pelo art. 1º da Lei 9.492/1997, o protesto, instituto bifronte que representa, de um lado, instrumento para constituir o devedor em mora e provar a inadimplência, e, de outro, modalidade alternativa para cobrança de dívida, foi ampliado, desvinculando-se dos títulos estritamente cambiariformes para abranger todos e quaisquer "títulos ou documentos de dívida". Ao contrário do afirmado pelo Tribunal de origem, portanto, o atual regime jurídico do protesto não é vinculado exclusivamente aos títulos cambiais.

5. Nesse sentido, tanto o STJ (RESP 750805/RS) como a Justiça do Trabalho possuem precedentes que autorizam o protesto, por exemplo, de decisões judiciais condenatórias, líquidas e certas, transitadas em julgado.

6. Dada a natureza bifronte do protesto, não é dado ao Poder Judiciário substituir-se à Administração para eleger, sob o enfoque da necessidade (utilidade ou conveniência), as políticas públicas para recuperação, no âmbito extrajudicial, da dívida ativa da Fazenda Pública.

7. Cabe ao Judiciário, isto sim, examinar o tema controvertido sob espectro jurídico, ou seja, quanto à sua constitucionalidade e legalidade, nada mais. A manifestação sobre essa relevante matéria, com base na valoração da necessidade e pertinência desse instrumento extrajudicial de cobrança de dívida, carece de legitimação, por romper com os princípios da independência dos poderes (art. 2º da CF/1988) e da imparcialidade .

8. São falaciosos os argumentos de que o ordenamento jurídico (Lei 6.830/1980) já instituiu mecanismo para a recuperação do crédito fiscal e de que o sujeito passivo não participou da constituição do crédito.

9. A Lei das Execuções Fiscais disciplina exclusivamente a cobrança judicial da dívida ativa, e não autoriza, por si, a insustentável conclusão de que veda, em caráter permanente, a instituição, ou utilização, de mecanismos de cobrança extrajudicial.

10. A defesa da tese de impossibilidade do protesto seria razoável apenas se versasse sobre o "Auto de Lançamento", esse sim procedimento unilateral dotado de eficácia para imputar débito ao sujeito passivo.

11. A inscrição em dívida ativa, de onde se origina a posterior extração da Certidão que poderá ser levada a protesto, decorre ou do exaurimento da instância administrativa (onde foi possível impugnar o lançamento e interpor recursos administrativos) ou de documento de confissão de dívida, apresentado pelo próprio devedor (e.g., DCTF, GIA, Termo de Confissão para adesão ao parcelamento, etc.).

12. O sujeito passivo, portanto, não pode alegar que houve "surpresa" ou "abuso de poder" na extração da CDA, uma vez que esta pressupõe sua participação na apuração do débito. Note-se, aliás, que o preenchimento e entrega da DCTF ou GIA (documentos de confissão de dívida) corresponde integralmente ao ato do emitente de cheque, nota promissória ou letra de câmbio.

13. A possibilidade do protesto da CDA não implica ofensa aos princípios do contraditório e do devido processo legal, pois subsiste, para todo e qualquer efeito, o controle jurisdicional, mediante provocação da parte interessada, em relação à higidez do título levado a protesto.

14. A Lei 9.492/1997 deve ser interpretada em conjunto com o contexto histórico e social. De acordo com o "II Pacto Republicano de Estado por um sistema de Justiça mais acessível, ágil e efetivo", definiu-se como meta específica para dar agilidade e efetividade à prestação jurisdicional a "revisão da legislação referente à cobrança da dívida ativa da Fazenda Pública, com vistas à racionalização dos procedimentos em âmbito judicial e administrativo".

15. Nesse sentido, o CNJ considerou que estão conformes com o princípio da legalidade normas expedidas pelas Corregedorias de Justiça dos Estados do Rio de Janeiro e de Goiás que, respectivamente, orientam seus órgãos a providenciar e admitir o protesto de CDA e de sentenças condenatórias transitadas em julgado, relacionadas às obrigações alimentares.

16. A interpretação contextualizada da Lei 9.492/1997 representa medida que corrobora a tendência moderna de intersecção dos regimes jurídicos próprios do Direito Público e Privado. A todo instante vem crescendo a publicização do Direito Privado (iniciada, exemplificativamente, com a limitação do direito de propriedade, outrora valor absoluto, ao cumprimento de sua função social) e, por outro lado, a privatização do Direito Público (por exemplo, com a incorporação – naturalmente adaptada às peculiaridades existentes – de conceitos e institutos jurídicos e extrajurídicos aplicados outrora apenas aos sujeitos de Direito Privado, como, e.g., a utilização de sistemas de gerenciamento e controle de eficiência na prestação de serviços).

17. Recurso Especial provido, com superação da jurisprudência do STJ.

Da leitura do voto, depreende que a Lei nº 9.492/1997 não se aplica apenas as relações privadas, mas sim a quaisquer documentos que contenham em seu bojo obrigações que não foram satisfeitas pelos devedores.

Aduz que o protesto é meio alternativo de cobrança, além de ser instrumento de constituir em mora devedor, o que configura a sua natureza bifronte.

Por fim, disserta que admitir o protesto da CDA vem ao encontro do “II Pacto Republicano de Estado por um Sistema de Justiça mais Acessível, Ágil e Efetivo".

A eficiência do protesto das CDAs pode ser medido pelo resultado obtido pelos órgãos da administração que optaram por essa modalidade de cobrança, como a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional. Segundo dados fornecidos pela própria instituição, em 2013 cerca de 30% dos créditos protestados são quitados em até três dias após a notificação, resultando numa economia de R$ 51,42 bilhões com a atuação dos procuradores da fazenda em processos de defesa do crédito fiscal da União (Cruz, 2014)[3].

  Nessa perspectiva, Virgílio (2010), dispõe que o “protesto das CDAs em diversos casos é muito mais viável e útil à credora Fazenda Pública, assim como o próprio Poder Judiciário, do que o ajuizamento de diversas execuções fiscais de baixo valor com grande chance de serem infrutíferas”

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Sobre o autor
Leandro Brescovit

Graduado pela Universidade Federal de Pelotas - UFPel. Analista Jurídico da Procuradoria-Geral do Estado do Rio Grande do Sul, lotado na Procuradoria Regional de Caxias do Sul/RS, Pós graduado em Direito Tributário.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

BRESCOVIT, Leandro. O protesto da certidão de dívida ativa:: um breve olhar sobre a ótica da desjudicialização da execução fiscal. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 20, n. 4342, 22 mai. 2015. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/33187. Acesso em: 19 mar. 2024.

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