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Uma análise acerca da controvérsia envolvendo o protesto de certidões de dívida ativa (CDA)

02/12/2014 às 10:16
Leia nesta página:

É legítima a utilização de protesto de CDA pela Fazenda Pública, até mesmo porque expressamente autorizada pela legislação vigente, sendo certo que tal procedimento traz consigo maior eficiência na cobrança dos créditos e obtenção do pagamento.

A Lei Federal nº 12.767, de 27 de dezembro de 2012, trouxe em seu art. 25 relevante alteração na sistemática das execuções fiscais.

O dispositivo legal em questão alterou a redação original do art. 1º da Lei Federal nº 9.492, de 10 de setembro de 1.997, incluindo um parágrafo único no mencionado artigo, e passando a permitir expressamente o protesto de certidões de dívida ativa da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e das respectivas autarquias e fundações públicas in verbis:

Art. 1º Protesto é o ato formal e solene pelo qual se prova a inadimplência e o descumprimento de obrigação originada em títulos e outros documentos de dívida.

Parágrafo único. Incluem-se entre os títulos sujeitos a protesto as certidões de dívida ativa da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e das respectivas autarquias e fundações públicas. (Incluído pela Lei nº 12.767, de 2012)

Antes de adentramos nos efeitos e nas controvérsias geradas pela citada alteração legislativa, devemos tecer breves considerações acerca de alguns conceitos relacionados à questão.

Em primeiro lugar, nos valendo da definição constante no sítio eletrônico do Ministério da Previdência Social, podemos definir a Dívida Ativa como sendo “débitos contraídos pelos contribuintes junto ao governo e aptos à cobrança judicial ou à execução fiscal.”[1] Importante ressaltarmos que os mencionados créditos podem ser de origem tributária ou não.

Nos termos da Lei 6.830/80:

“Art. 2º - Constitui Dívida Ativa da Fazenda Pública aquela definida como tributária ou não tributária na Lei nº 4.320, de 17 de março de 1964, com as alterações posteriores, que estatui normas gerais de direito financeiro para elaboração e controle dos orçamentos e balanços da União, dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal.

§ 1º - Qualquer valor, cuja cobrança seja atribuída por lei às entidades de que trata o artigo 1º, será considerado Dívida Ativa da Fazenda Pública.

§ 2º - A Dívida Ativa da Fazenda Pública, compreendendo a tributária e a não tributária, abrange atualização monetária, juros e multa de mora e demais encargos previstos em lei ou contrato.

§ 3º - A inscrição, que se constitui no ato de controle administrativo da legalidade, será feita pelo órgão competente para apurar a liquidez e certeza do crédito e suspenderá a prescrição, para todos os efeitos de direito, por 180 dias, ou até a distribuição da execução fiscal, se esta ocorrer antes de findo aquele prazo.

§ 4º - A Dívida Ativa da União será apurada e inscrita na Procuradoria da Fazenda Nacional.

OMISSIS”

Ainda fazendo uso das informações fornecidas pelo MPAS, devemos salientar que “um crédito só pode ser considerado dívida ativa se foi constituído junto ao governo, não foi pago de forma espontânea na data do vencimento e, posteriormente, foi alvo de um processo administrativo, no qual o contribuinte teve ampla chance de defesa”.

Em outras palavras, a simples existência de um crédito em favor da Fazenda Pública não representa, por si só, que tal valor já integra a dívida ativa. Américo Luis Martins da Silva ensina que: “A nosso ver... para ser considerada dívida ativa, exige-se que, no mínimo, o crédito a favor da Fazenda Pública esteja regularmente inscrito na repartição administrativa e esgotado o prazo para pagamento. Daí conclui-se que a expressão ‘crédito’ não pode ser considerada sinônima da expressão ‘dívida ativa[2]’”.

O lançamento do crédito na dívida ativa se dá por meio de um documento denominado Certidão de Dívida Ativa (CDA), no qual constam as principais informações do procedimento administrativo que identificou o crédito em questão, nos termos da Lei nº 6.830/80:

Art. 2º

OMISSIS

§ 5º - O Termo de Inscrição de Dívida Ativa deverá conter:

I - o nome do devedor, dos co-responsáveis e, sempre que conhecido, o domicílio ou residência de um e de outros;

II - o valor originário da dívida, bem como o termo inicial e a forma de calcular os juros de mora e demais encargos previstos em lei ou contrato;

III - a origem, a natureza e o fundamento legal ou contratual da dívida;

IV - a indicação, se for o caso, de estar a dívida sujeita à atualização monetária, bem como o respectivo fundamento legal e o termo inicial para o cálculo;

V - a data e o número da inscrição, no Registro de Dívida Ativa; e

VI - o número do processo administrativo ou do auto de infração, se neles estiver apurado o valor da dívida.

§ 6º - A Certidão de Dívida Ativa conterá os mesmos elementos do Termo de Inscrição e será autenticada pela autoridade competente.

§ 7º - O Termo de Inscrição e a Certidão de Dívida Ativa poderão ser preparados e numerados por processo manual, mecânico ou eletrônico.

§ 8º - Até a decisão de primeira instância, a Certidão de Dívida Ativa poderá ser emendada ou substituída, assegurada ao executado a devolução do prazo para embargos.

§ 9º - O prazo para a cobrança das contribuições previdenciárias continua a ser o estabelecido no artigo 144 da Lei nº 3.807, de 26 de agosto de 1960.

Após a inscrição do crédito na dívida, esse passa a gozar de presunção relativa de certeza e liquidez, sendo franqueada à Fazenda Pública sua execução judicial.

O procedimento de cobrança judicial da Dívida Ativa da Fazenda Pública é disposto na Lei nº 6.830, de 22 de setembro de 1980, popularmente conhecida com a “Lei de Execução Fiscal”, com aplicação subsidiária do Código de Processo Civil.

Em que pese a riqueza do procedimento de execução fiscal constante na mencionada Lei nº 6.830/80, o presente trabalho não pretende se alongar sobre o tema, sobretudo considerando que o objeto do estudo, o protesto de Certidões de Dívida Ativa, constitui uma fase pré-judicial. 

Superadas tais questões iniciais, devemos voltar a analisar a Lei 9.492/97, a qual tem por principal escopo definir competência e regulamentar os serviços concernentes ao protesto de títulos e outros documentos de dívida.

Como dito anteriormente, o Protesto nada mais é que o ato formal e solene pelo qual se prova a inadimplência e o descumprimento de obrigação originada em títulos e outros documentos de dívida.

Nos termos do artigo 14 e ss. da Lei nº 9.492/97, protocolizado o título ou documento de dívida no cartório competente, o Tabelião de Protesto expedirá a intimação ao devedor, no endereço fornecido pelo apresentante do título, considerando-se cumprida quando comprovada sua entrega no mesmo endereço.

A mencionada intimação deverá conter nome e endereço do devedor, elementos de identificação do título ou documento de dívida, e prazo limite para cumprimento da obrigação no Tabelionato, bem como número do protocolo e valor a ser pago.

Caso o devedor concorde em saldar seu débito após o recebimento da intimação, o pagamento do título ou do documento de dívida apresentado para protesto será feito diretamente no Tabelionato competente, no valor igual ao declarado pelo apresentante, acrescido dos emolumentos e demais despesas.

Não havendo o pagamento da dívida no prazo determinado, e ausentes quaisquer causas aptas a interromperem o procedimento – desistência ou sustação do Protesto, decisão judicial, etc. – o Tabelião lavrará e registrará o protesto, sendo o respectivo instrumento entregue ao apresentante.

Nos termos do artigo 29 da Lei nº 9.492/97, os cartórios fornecerão às entidades representativas da indústria e do comércio ou àquelas vinculadas à proteção do crédito, quando solicitada, certidão diária, em forma de relação, dos protestos tirados e dos cancelamentos efetuados, com a nota de se cuidar de informação reservada, da qual não se poderá dar publicidade pela imprensa, nem mesmo parcialmente.

Dos cadastros ou bancos de dados das entidades representativas da indústria e do comércio ou àquelas vinculadas à proteção do crédito (SPC , SERASA), somente serão prestadas informações restritivas de crédito oriundas de títulos ou documentos de dívidas regularmente protestados cujos registros não foram cancelados.

É justamente neste ponto que a questão envolvendo o Protesto de CDAs se torna extremamente controversa.

Em primeiro lugar, devemos relembrar que a Fazenda Pública, antes mesmo do advento da Lei 12.767/2012, já fazia, de forma tímida, uso do Protesto de Certidões da Dívida Ativa.

Entretanto, àquela época a discussão se dava em torno da possibilidade legal do ato e da existência ou não de interesse jurídico no mesmo. Instado a se manifestar naquele momento, o Superior Tribunal de Justiça se firmou no sentido de que não haveria interesse jurídico em se realizar o protesto das Certidões da Dívida Ativa, sob o argumento que, por serem títulos executivos, seria possível, de pronto, o ajuizamento da execução fiscal, nos moldes da LEF -  Lei 6.830/80.

Nesse sentido:

TRIBUTÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DEINSTRUMENTO. CERTIDÃO DA DÍVIDA ATIVA - CDA. PROTESTO.DESNECESSIDADE. AGRAVO NÃO PROVIDO. 1. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça tem afirmado a ausência de interesse em levar a protesto a Certidão da Dívida Ativa, título que já goza de presunção de certeza e liquidez e confere publicidade à inscrição do débito na divida ativa. 2. Agravo regimental não provido.

(STJ - AgRg no Ag: 1316190 PR 2010/0101917-5, Relator: Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, Data de Julgamento: 17/05/2011, T1 - PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 25/05/2011)

Entretanto, com a publicação da Lei 12.767/2012 e a consequente inclusão do parágrafo único no art. 1º da Lei nº 9.492/97, tal debate sofreu considerável reviravolta no âmbito dos Tribunais.

Instado a se manifestar novamente sobre o tema em 2013, o Superior Tribunal de Justiça, alterando seu posicionamento anterior, passou a adotar a tese sobre a possibilidade do protesto de Certidão de Dívida Ativa (CDA). Confira:

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. PROTESTO DE CDA. LEI 9.492/1997. INTERPRETAÇÃO CONTEXTUAL COM A DINÂMICA MODERNA DAS RELAÇÕES SOCIAIS E O "II PACTO REPUBLICANO DE ESTADO POR UM SISTEMA DE JUSTIÇA MAIS ACESSÍVEL, ÁGIL E EFETIVO". SUPERAÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA DO STJ. 1. Trata-se de Recurso Especial que discute, à luz do art. 1º da Lei 9.492/1997, a possibilidade de protesto da Certidão de Dívida Ativa (CDA), título executivo extrajudicial (art. 586, VIII, do CPC) que aparelha a Execução Fiscal, regida pela Lei 6.830/1980. 2. Merece destaque a publicação da Lei 12.767/2012, que promoveu a inclusão do parágrafo único no art. 1º da Lei 9.492/1997, para expressamente consignar que estão incluídas "entre os títulos sujeitos a protesto as certidões de dívida ativa da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e das respectivas autarquias e fundações públicas". 3. Não bastasse isso, mostra-se imperiosa a superação da orientação jurisprudencial do STJ a respeito da questão. 4. No regime instituído pelo art. 1º da Lei 9.492/1997, o protesto, instituto bifronte que representa, de um lado, instrumento para constituir o devedor em mora e provar a inadimplência, e, de outro, modalidade alternativa para cobrança de dívida, foi ampliado, desvinculando-se dos títulos estritamente cambiariformes para abranger todos e quaisquer "títulos ou documentos de dívida". Ao contrário do afirmado pelo Tribunal de origem, portanto, o atual regime jurídico do protesto não é vinculado exclusivamente aos títulos cambiais. 5. Nesse sentido, tanto o STJ (RESP 750805/RS) como a Justiça do Trabalho possuem precedentes que autorizam o protesto, por exemplo, de decisões judiciais condenatórias, líquidas e certas, transitadas em julgado. 6. Dada a natureza bifronte do protesto, não é dado ao Poder Judiciário substituir-se à Administração para eleger, sob o enfoque da necessidade (utilidade ou conveniência), as políticas públicas para recuperação, no âmbito extrajudicial, da dívida ativa da Fazenda Pública. 7. Cabe ao Judiciário, isto sim, examinar o tema controvertido sob espectro jurídico, ou seja, quanto à sua constitucionalidade e legalidade, nada mais. A manifestação sobre essa relevante matéria, com base na valoração da necessidade e pertinência desse instrumento extrajudicial de cobrança de dívida, carece de legitimação, por romper com os princípios da independência dos poderes (art. 2º da CF/1988) e da imparcialidade. 8. São falaciosos os argumentos de que o ordenamento jurídico (Lei 6.830/1980) já instituiu mecanismo para a recuperação do crédito fiscal e de que o sujeito passivo não participou da constituição do crédito. 9. A Lei das Execuções Fiscais disciplina exclusivamente a cobrança judicial da dívida ativa, e não autoriza, por si, a insustentável conclusão de que veda, em caráter permanente, a instituição, ou utilização, de mecanismos de cobrança extrajudicial. 10. A defesa da tese de impossibilidade do protesto seria razoável apenas se versasse sobre o "Auto de Lançamento", esse sim procedimento unilateral dotado de eficácia para imputar débito ao sujeito passivo. 11. A inscrição em dívida ativa, de onde se origina a posterior extração da Certidão que poderá ser levada a protesto, decorre ou do exaurimento da instância administrativa (onde foi possível impugnar o lançamento e interpor recursos administrativos) ou de documento de confissão de dívida, apresentado pelo próprio devedor (e.g., DCTF, GIA, Termo de Confissão para adesão ao parcelamento, etc.). 12. O sujeito passivo, portanto, não pode alegar que houve "surpresa" ou "abuso de poder" na extração da CDA, uma vez que esta pressupõe sua participação na apuração do débito. Note-se, aliás, que o preenchimento e entrega da DCTF ou GIA (documentos de confissão de dívida) corresponde integralmente ao ato do emitente de cheque, nota promissória ou letra de câmbio. 13. A possibilidade do protesto da CDA não implica ofensa aos princípios do contraditório e do devido processo legal, pois subsiste, para todo e qualquer efeito, o controle jurisdicional, mediante provocação da parte interessada, em relação à higidez do título levado a protesto. 14. A Lei 9.492/1997 deve ser interpretada em conjunto com o contexto histórico e social. De acordo com o "II Pacto Republicano de Estado por um sistema de Justiça mais acessível, ágil e efetivo", definiu-se como meta específica para dar agilidade e efetividade à prestação jurisdicional a "revisão da legislação referente à cobrança da dívida ativa da Fazenda Pública, com vistas à racionalização dos procedimentos em âmbito judicial e administrativo". 15. Nesse sentido, o CNJ considerou que estão conformes com o princípio da legalidade normas expedidas pelas Corregedorias de Justiça dos Estados do Rio de Janeiro e de Goiás que, respectivamente, orientam seus órgãos a providenciar e admitir o protesto de CDA e de sentenças condenatórias transitadas em julgado, relacionadas às obrigações alimentares. 16. A interpretação contextualizada da Lei 9.492/1997 representa medida que corrobora a tendência moderna de intersecção dos regimes jurídicos próprios do Direito Público e Privado. A todo instante vem crescendo a publicização do Direito Privado (iniciada, exemplificativamente, com a limitação do direito de propriedade, outrora valor absoluto, ao cumprimento de sua função social) e, por outro lado, a privatização do Direito Público (por exemplo, com a incorporação - naturalmente adaptada às peculiaridades existentes - de conceitos e institutos jurídicos e extrajurídicos aplicados outrora apenas aos sujeitos de Direito Privado, como, e.g., a utilização de sistemas de gerenciamento e controle de eficiência na prestação de serviços). 17. Recurso Especial provido, com superação da jurisprudência do STJ.

(STJ - REsp: 1126515 PR 2009/0042064-8, Relator: Ministro HERMAN BENJAMIN, Data de Julgamento: 03/12/2013, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 16/12/2013)

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De forma magistral, o STJ reviu seu posicionamento anterior e trouxe no bojo do acórdão valiosas lições acerca da possibilidade e viabilidade do Protesto da CDA.

Sobre o tema, cabe trazer a baila trecho do voto condutor do Acórdão proferido no REsp 1126515/PR, da lavra do Exmo. Sr. Ministro Herman Benjamin, que por sua clareza e didática se amolda perfeitamente ao presente estudo:

Os poderes constituídos estão implementando estudos e medidas destinadas a racionalizar o acesso ao Judiciário, incentivando o recurso às atividades de composição extrajudicial entre as partes litigantes. Nesse sentido, o legislador instituiu outras modalidades que visam conferir solução extrajudicial, ou simples medidas de ampliação de meios, para a arrecadação dos créditos públicos, tais como transferência de sigilo bancário (LC 105⁄2011), arrolamento de bens e parcelamento da Dívida Ativa (Lei 10522⁄2002 e Lei 11.941⁄2009);

Os princípios do contraditório e do devido processo legal são garantidos, pois subsistirá o controle judicial quanto à higidez do protesto da CDA.

O reconhecimento da legalidade de tal medida combate a inversão de valores: o crédito fiscal recupera, ao menos, igualdade de condições com as medidas de cobrança postas à disposição do credor privado.

Finalmente, a interpretação contextualizada da Lei 9.492⁄1997 representa medida que corrobora a tendência moderna de intersecção dos regimes jurídicos próprios do Direito Público e Privado. Como se sabe, a todo instante vem crescendo a publicização do Direito Privado (iniciada, exemplificativamente, com a limitação do direito de propriedade, outrora valor absoluto, ao cumprimento de sua função social) e, por outro lado, a privatização do Direito Público (por exemplo, com a incorporação – naturalmente adaptada às peculiaridades existentes – de conceitos e institutos jurídicos e extrajurídicos aplicados tradicionalmente apenas aos sujeitos de Direito Privado, como, e.g., a utilização de sistemas de gerenciamento e controle de eficiência na prestação de serviços).

Não vemos, portanto, sombra de inconstitucionalidade ou de ilegalidade na realização do protesto da CDA.

Ainda no sentido de demonstrar os avanços obtidos com a utilização do Protesto de CDA, pedimos vênia para transcrever trecho da autora Renata Espíndola Virgílio, que traz relevantes argumentos sobre o tema:

“Assim, a medida serve como mais uma atuação sobre a pessoa do devedor, na tentativa de se chegar a um consenso com este, em especial nos casos de dívidas não muito altas, que ensejariam execuções fiscais antieconômicas, prestigiando o princípio da economia processual, pois a propositura de demandas judiciais desse tipo muitas vezes tem um custo maior que o próprio débito original e, em vista do devido processo legal, devem ser processadas pelo Judiciário, o que contribui, ainda mais, para o inchaço de sua estrutura.

Nesse esteio, com fulcro em parte da Exposição de Motivos do Projeto de Lei nº 5.080, de 2009, conhecido como a Nova Lei de Execuções Fiscais, a qual ressalta que pela alta dose de formalidade de que se reveste o atual processo judicial de execução, este se apresenta como um sistema altamente moroso, caro e de baixa eficiência, uma vez que para cada R$ 1.000,00 (um mil reais) cobrados por essa sistemática, apenas R$ 10,00 (dez reais) são efetivamente arrecadados, segundo levantamento feito no âmbito das autarquias e fundações públicas, demonstrando-se, assim, que esse modelo executivo tradicional é avesso aos princípios da eficiência e da economia processual.

Resta claro, pois, que a CDA não serve exclusivamente para aparelhar a execução fiscal, que, por sua vez, não é o único meio de a Fazenda Pública arrecadar seus créditos. A CDA é, sim, um título executivo que formaliza um crédito e, como tal, passível de ser protestado quando esta forma se mostrar mais eficiente que o ajuizamento de um processo executivo moroso e antieconômico.

Ressalte-se, ainda, que a execução deve ser útil ao credor, como princípio informador desse processo, o que se depreende em diversos dispositivos do CPC, como o art. 659, § 2º [06], e art. 692 [07]. Nas palavras de Humberto Theodoro Júnior, "é intolerável o uso do processo de execução apenas para causar prejuízo ao devedor, sem qualquer vantagem para o credor" [08].

Nesse sentido, o protesto das CDAs em diversos casos é muito mais viável e útil à credora Fazenda Pública, assim como ao próprio Poder Judiciário, do que o ajuizamento de diversas execuções fiscais de baixo valor, com grandes chances de serem infrutíferas.

Outrossim, não se pode olvidar que na execução o princípio do menor sacrifício possível do executado, nos termos do art. 620, do CPC [09], ou seja, deve existir um equilíbrio entre os interesses do credor e do devedor, satisfazendo-se o direito do primeiro da forma menos prejudicial para o segundo, sendo, assim, "econômica".

Desta feita, diante da existência do encargo legal, exação criada pelo Decreto-lei nº 1.025, de 1969, correspondente a um acréscimo [10] de 10% (dez por cento) – quando o pagamento for efetuado antes do ajuizamento da execução fiscal pertinente – ou de 20% (vinte por cento) – quando a quitação ocorrer após a propositura da ação – sobre o valor consolidado do débito inscrito em Dívida Ativa, bem como alterações na Lei nº 10.522/2002 pela Lei nº 11.941/2009 [11], é visível que o pagamento feito pelo devedor após o protesto da CDA, ocasião em que se cobra 10% de encargo legal, é muito menos oneroso ao devedor do que o valor que seria cobrado após o ajuizamento da execução fiscal, que viria acrescido de20% de encargo legal.” [3] (com destaques no original)

Em que pese os relevantes argumentos expostos acima e a importante posição assentada pelo Superior Tribunal de Justiça, as discussões acerca do Protesto da CDA permanecem ativas em nosso meio jurídico, com inúmeros adeptos à tese da impossibilidade de utilização desse meio pela Fazenda Pública.

Os defensores de tal posicionamento fincam seus argumentos basicamente em duas linhas de raciocínio. A primeira caminha na insistência da tese pela qual a execução fiscal deve se dar estritamente em observância aos termos da Lei 6.830/80, não sendo necessário, e cabível, a utilização de outro meio para o mesmo fim.

A segunda linha se volta à defesa de teses relacionadas à violação do princípio da legalidade e desvio de finalidade, uma vez que, na ótica dos adeptos a essa teoria, a Administração Pública, ao efetivar o Protesto da CDA, está na verdade constrangendo o particular/devedor, com a utilização de mais um meio para coagir o pagamento. Há ainda questionamento sobre o ponto de vista formal da inclusão do parágrafo único no art. 1º da Lei de Protestos.

Nesse sentido, podemos ressaltar o recente ajuizamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 5135, protocolada junto ao Supremo Tribunal Federal em 07/06/2014, na qual a Confederação Nacional da Indústria (CNI) sustenta que o artigo 25 da Lei 12.767/2012, o qual incluiu o parágrafo único no art. 1º da Lei 9.492/97 é manifestamente constitucional.

Conforme exposto na decisão monocrática proferida pelo Relator da ADI 5135, Ministro Luís Roberto Barroso, a CNI sustenta sua pretensão nas alegações de que: “(i) o dispositivo seria formalmente inválido, porque inserido por emenda em medida provisória (MP nº 577/2012, convertida na Lei nº 12.767/2012) com a qual não guardaria pertinência; (ii) não haveria justificativa ética ou jurídica para o manejo do protesto pelo Fisco, já que sua única finalidade seria pressionar o protestado ao pagamento – tratar-se-ia, portanto, de sanção política, meio indireto de execução que contrariaria o devido processo legal; (iii) o protesto da certidão de dívida ativa (CDA) seria meio inadequado e desnecessário, afrontando a livre iniciativa e a liberdade profissional (CF/88, arts. 5º, XIII, e 170) e inviabilizando a concessão de créditos necessários à atividade empresarial”.[4]

A Ação Direta de Inconstitucionalidade encontra-se pendente de julgamento e certamente será marcada por calorosos e profícuos debates.

Em vista de todo o exposto, e certo que o tema ainda será alvo de inúmeras discussões, concluímos no sentido de que é totalmente legítima a utilização de Protesto de CDA pela Fazenda Pública, até mesmo porque expressamente autorizado pela legislação vigente, sendo certo que tal procedimento traz consigo uma maior eficácia e eficiência na cobrança dos créditos, bem como celeridade na obtenção do pagamento.

Não há como utilizar/flexibilizar eventuais princípios constitucionais a fim de que os mesmos sirvam como esteio para a sonegação e a inadimplência. Se o Estado se vê obrigado a se valer de novos meios legais para a cobrança de seus créditos, certamente só o faz porque anteriormente houve uma falta por parte daqueles que não cumpriram com suas obrigações, não podendo a Administração Pública se manter inerte diante da mora de seus devedores, sob pena de grave prejuízo a toda a sociedade.


REFERÊNCIAS:

 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. DOU 05.10.1988.

BRASIL. Lei nº 6.830, de 22 de setembro de 1980. Dispõe sobre a cobrança judicial da Dívida Ativa da Fazenda Pública, e dá outras providências. DOU 24.9.1980.

BRASIL. Lei nº 9.492, de 10 de setembro de 1997. Define competência, regulamenta os serviços concernentes ao protesto de títulos e outros documentos de dívida, e dá outras providências. DOU 11.09.1997

BRASIL. Lei nº 12.767, de 27 de dezembro de 2012. DOU 28.12.2012.

MISTÉRIO DA PREVIDÊNCIA SOCIAL, disponível em http://www.previdencia.gov.br/perguntas-frequentes-sobre-a-dvida-ativa/, acesso em 26/10.2014.

SILVA, Américo Luís Martins da. Execução da dívida ativa da fazenda pública. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2001

SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA, disponível em www.stj.jus.br, acesso em 27/10/2014.

SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, disponível em www.stf.jus.br, acesso em 27/10/2014.

TURMA NACIONAL DE UNIFORMIZACAO DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS, disponível em https://www2.jf.jus.br/phpdoc/virtus/ , acessado em 30/10/2014.

VIRGÍLIO, Renata Espíndola. Possibilidade de protesto da Certidão de Dívida Ativa (CDA) pela Fazenda Pública, por falta de pagamento do crédito exeqüendo. Jus Navigandi, Teresina, ano 15, n. 2525, 31maio 2010. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/14946>. Acesso em: 30 out. 2014.


Notas

[1] http://www.previdencia.gov.br/perguntas-frequentes-sobre-a-dvida-ativa/

[2] SILVA, Américo Luís Martins da. Execução da dívida ativa da fazenda pública. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2001

[3] VIRGÍLIO, Renata Espíndola. Possibilidade de protesto da Certidão de Dívida Ativa (CDA) pela Fazenda Pública, por falta de pagamento do crédito exeqüendo. Jus Navigandi, Teresina, ano 15, n. 2525, 31maio 2010. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/14946>. Acesso em: 30 out. 2014.

[4] http://www.stf.jus.br/portal/processo/verProcessoAndamento.asp?numero=5135&classe=ADI&origem=AP&recurso=0&tipoJulgamento=M

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Sobre o autor
Gustavo Rosa da Silva

Procurador Federal, lotado na Procuradoria Federal no Estado de Minas Gerais. Ex-Procurador-Chefe da Procuradoria Federal no Estado de Rondônia. Ex-Procurador-Chefe da Procuradoria Federal junto ao Instituto Federal de Rondônia - IFRO

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SILVA, Gustavo Rosa. Uma análise acerca da controvérsia envolvendo o protesto de certidões de dívida ativa (CDA) . Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 4171, 2 dez. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/34519. Acesso em: 22 nov. 2024.

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