Medo, violência e silenciamento fazem parte do cotidiano das mulheres desde o seu nascimento até a sua morte. Esses sentimentos e ação humana são frutos desta sociedade patriarcal, reproduzidos e perpetuados não somente pelos indivíduos detentores do caráter masculino, mas também pela mídia, indústria da moda, redes sociais, convívio social e familiar.
Devido a gama de inúmeros fatores perpetuados historicamente, as mulheres são condicionadas a pensá-los como um fator “natural”. É somente no início do séc. XIX, que as mulheres perceberam a necessidade de um reconhecimento político, social e até mesmo humano, tendo isso, deram o insight para a legitimação do “ser” feminino dentro da sociedade ocidental. Este insight é conhecido como “movimento feminista”.
Atualmente, o movimento feminista é reconhecido pela sua pluralidade, e até mesmo posicionamentos sociopolíticos divergentes, mas continuam tendo o mesmo ideal principal, que é uma sociedade de igualdade de gênero.
Como fruto desses fatores, vê-se na sociedade diversos tipos de violência contra a mulher, desde a agressão física até a agressão moral. É de conhecimento público que já faz alguns anos que o estado do Espírito Santo lidera esse ranking. Várias medidas foram adotadas não somente no estado, mas também a nível nacional como as que são amparadas pela lei Maria da Penha (BRASIL, 2006). Exemplo disso são as medidas protetivas, amparo psicológico e a implantação do botão do pânico (que teve o pioneirismo no estado do Espírito Santo) para as vítimas. Ainda dentro da lei Maria da Penha, encontram-se medidas que visam conter os agressores, que são a patrulha Maria da Penha, a tornozeleira elétrica e o acompanhamento psicológico feito pela Polícia Civil, denominado “Homem que é homem”, este realizado apenas no Espírito Santo (ESPÍRITO SANTO, 2015).
A partir dessa breve discussão, pode-se inferir que o problema da violência contra mulher ainda é uma constante longe de ser excluída da nossa sociedade. No entanto, o caminho para a diminuição dessa violência já começou a ser trilhado. Dentro disso, devido à amplitude desta temática, optou-se por realizar um recorte de trabalho, no caso, limitando-se à aplicação das medidas protetivas. Para isso, este trabalho partirá da indagação acerca da efetividade das medidas protetivas no combate a violência contra mulher, utilizando-se do recorte temporal de 2012 a 2015, e geográfico circunscrito à região metropolitana da Grande Vitória do Estado do Espírito Santo.
1. CONTEXTUALIZAÇÃO HISTÓRICA DA CONDIÇÃO FEMININA
Historicamente, a vida das mulheres brasileiras esteve associada a uma tutela masculina, a partir de um caráter expressivo, como no Brasil Colonial, quando as mulheres eram percebidas como propriedades, e tendo as suas funções delegadas apenas à gestão do lar. No entanto, de acordo com Del Priore (2013), após a conquista de direitos e a emancipação feminina, ainda se observa a perpetuação desse comportamento em todos os estratos sociais, e o principal deles é a violência doméstica. Na última década, têm-se buscado realizar um combate mais expressivo para implantação de medidas que visam salvaguardar as vítimas. No que tange à realidade capixaba, entende-se que
O Espírito Santo encabeça o ranking de estados mais violentos para a mulher há mais de uma década. Isso exprime a necessidade de iniciativas integradas de governo e entidades públicas a fim não só de combate ostensivo e punição aos culpados, mas também de oferecer ajuda com instrução jurídica, apoio psicológico, entre outras iniciativas. (OLIVEIRA, Campos Wéverton).
A partir desse posicionamento, percebe-se que essas medidas acabam por se tornar paliativas, pois se limitam a esfera judicial, sendo que para pensar em uma medida, realmente, preventiva, deve-se repensar toda a estrutura educacional e de meios vinculados a ela, para que possa contemplar as políticas de gênero. Entretanto, esse posicionamento estatal ainda é uma utopia.
Ademais, compreende-se que, dentro dessa situação emergencial, o enfrentamento da violência é extremamente necessário. Com isso, as implantações de políticas públicas de proteção à mulher devem ser estudadas de forma a contribuir para o entendimento das mesmas, e até mesmo compreender a sua real aplicabilidade e funcionalidade na esfera sociopolítica capixaba. Logo, ao entrarmos em contato com os dados e informações acerca de tais medidas, poder-se-á debruçar em uma análise abrangente, que visa compreender a vivência e realidade social da maioria das vítimas.
2. ESTRUTURAS DE PODER: O TRATO DA VIOLÊNCIA DOMÉSTICA DENTRO DAS POLÍTICAS PÚBLICAS CAPIXABAS
Entende-se que a violência contra a mulher está amparada na relação de hierarquia estabelecida entre os gêneros. Assim, segundo Del Priori (2011) ao longo da história, percebemos que papéis são criados de forma a contemplar homens e mulheres de maneira desigual, e isso é uma criação de uma educação pautada na diferenciação.
O patriarcado é algo inerente à sociedade, ainda nos tempos atuais. Esse sistema se encontra intrínseco ao coletivo, que sempre conviveu com a hierarquia firmada entre homens e mulheres, sendo sempre o homem o sujeito superior na relação hierárquica. Deste modo, Simone de de Beauvoir (1970) alude que desde os registros históricos mais antigos, o homem surgia como responsável pelas tarefas mais pesadas e em contrapartida, a mulher, sempre posta como inferior, visto que, se houvesse alguma tarefa que exigisse um pouco mais da mulher e ela não conseguisse realizar, era imediatamente classificada como impotente.
Assim, esse processo de formação se dará na família, na escola, na igreja e mídia. Sendo assim, no Brasil, a educação masculina é pautada no domínio, austeridade e agressividade. Enquanto que, as mulheres, ainda são identificadas como “sexo frágil”, pelo fato de terem a afeição e sensibilidade como características relevantes. Estas características, por sua vez, se contrapõem de maneira inferior as masculinas, e isso justifica a desvalorização das mulheres na sociedade.
A Lei nº 11340/06 (BRASIL, 2006), mais conhecida como “Lei Maria da Penha” afirma em seu artigo 6º que a violência contra mulher no seio familiar constitui uma das formas de transgressão dos direitos humanos. Dessa forma, a “Lei Maria da Penha” surge para amparar as mulheres que sofrem com agressões e/ou ameaças, de forma a coibir seus agressores. É a partir dessa Lei, que constituirá o objeto deste estudo, visto que as “medidas protetivas”, já supracitadas, atuam de modo amplo, mas ainda pouco eficaz dentro da situação capixaba.
Por fim, deve-se procurar entender os elevados índices não somente a partir da perspectiva capixaba, mas também no âmbito nacional. De forma, a questionar se as campanhas de denúncia são uma constante em todo o território nacional, principalmente, naqueles que são conhecidos pela sua formação política e cultural centralizadas nas figuras masculinas, como é o caso do Nordeste, por exemplo. Afinal, a divulgação dos casos de denúncias por meio das mídias, fomentam mais denúncias, pois as vítimas se percebem um pouco “amparadas”.
REFERÊNCIAS:
BEAUVOIR, Simonade De. O segundo sexo: fatos e mitos. Difusão Europeia do livro, Saraiva, 1949.
DEL PRIORE, Mary. Histórias Íntimas: sexualidade e erotismo na história do Brasil. São Paulo: Editora Planeta do Brasil, 2011.
_______. Conversas e histórias de mulher. São Paulo: Planeta, 2013.
ESPÍRITO SANTO. PC realiza primeira reunião do projeto “homem que é homem”. 10 mar. 2015. Disponível em:. Acesso em: 12 jun. 2016.
NADER, Maria Beatriz. Mulher: do destino biológico ao destino social. Vitória: EDUFES, 2001.