Resumo: O presente artigo tem por escopo o estudo da Proposta de Emenda Constitucional nº 287/16, de origem do Poder Executivo, que suprime da Constituição Federal o direito do Idoso e da Pessoa com deficiência em situação de vulnerabilidade social de receber o valor mensal de um salário mínimo. Neste contexto, a fim avaliar o grau de retrocesso constitucional em sede de direitos humanos e direitos fundamentais sociais, analisa a atual redação do artigo 203, inciso V, em comparação com a proposta governamental, bem como a profícua legislação infraconstitucional que trata da matéria, que se soma à apreciação da doutrina e da jurisprudência pátria e comparada que fundamenta os pontos elencados.
Retrocesso Constitucional. Assistência Social. Benefício de Prestação Continuada. Idoso. Pessoa com deficiência.
Sumário: Introdução. 1. Dignidade da Pessoa Humana e Direitos Fundamentais. 2. A Proposta do Poder Executivo. 2.1. A Garantia Constitucional de um Salário Mínimo Mensal. 2.2 O Retrocesso Constitucional 2.3. A Necessidade de Legislação Infraconstitucional. 2.4. Idade de 70 anos para o Idoso. Considerações Finais. Referências.
“As conquistas relativas aos direitos fundamentais não podem ser destruídas, anuladas ou combalidas, por se cuidarem de avanços da humanidade, e não de dádivas estatais que pudessem ser retiradas segundo opiniões de momento ou eventuais maiorias parlamentares”.
Carmem Lúcia Antunes da Rocha[1]
INTRODUÇÃO
O objeto de estudo do presente artigo está relacionado às garantias fundamentais sociais previstas na Constituição Federal ao portador de deficiência e ao idoso em situação de vulnerabilidade social, bem como, prospectar, em sede de violação de direitos fundamentais e tratados internacionais em que o Brasil é signatário, as mudanças advindas da Proposta de Emenda Constitucional nº 287/16.
A matéria em estudo surge no capítulo da Seguridade Social como Beneficio de Prestação Continuada, tem por razão acolher aos que não tem condições econômicas de contribuir ao sistema previdenciário e, portanto, apontam estado de miserabilidade evidente.
Neste contexto, nos valemos do texto de Emenda Constitucional, anteriormente citada, apresentada à Câmara dos Deputados que versa sobre a reformulação das normas de concessão de aposentadorias e, também, disciplinam a Assistência Social.
A referida emenda constitucional, em apenas um dia, recebeu parecer favorável pela sua admissão e tramitação a partir da Comissão de Constituição e Justiça, na Câmara dos Deputados.[ii]
A proposta do Governo Federal traz, entre tantas outras modificações, o aumento do tempo de contribuição e estipula a idade mínima de 65 anos para que o contribuinte torne-se apto à requisição de aposentadoria. A PEC 287/16 é considerada por muitos como a mais dura da história, uma emenda com forte essência draconiana.
O dispositivo a ser analisado surge com a nova redação dada ao inciso V, do artigo 203 da Constituição Federal em que resta suprimida a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso com mais de 65 anos, ao último, eleva a idade para 70 anos.
A redação proposta, em seu § 1º, prevê que deverá ser editada lei a fim de estipular o valor e os requisitos para concessão, bem como, regras de definição de grupo familiar e o “grau” de deficiência a fim a consubstanciar o direito de acesso ao benefício.[iii]
Insta ilustrar que se admite o controle de constitucionalidade de emendas constitucionais por atuação do Poder constituinte derivado, principalmente, quando a proposta de emenda afronta cláusulas pétreas explícitas ou implícitas do texto constitucional originário.
Neste quadro, mesmo que formalmente a emenda constitucional comporte todos os requisitos procedimentais, materialmente é necessário que a proposta reformadora não afronte o previsto no art. 60 § 4º de nossa Carta Federal, o que a fim de consubstanciar nosso estudo, se dá, especialmente, no inciso IV, que não permite a apreciação de proposta que viole os direitos e garantias individuais.[iv]
Assim, é cediço que a validez e a eficácia da norma apresentada pelo Poder reformador está inteiramente ligada à legitimação que recebe da ordem constitucional originária e, sem dúvida, se faz necessário compreender que, em um Estado de Direito a segurança jurídica, direito previsto no rol de garantias fundamentais de nossa Constituição, compõe, substancialmente, o nível de confiança que o cidadão deposita na proteção contra o retrocesso em sede de direitos fundamentais.
1- DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E DIREITOS FUNDAMENTAIS
Num primeiro momento, convém gizar que a assistência social surge como suporte legal de nossa Carta Constitucional, sendo dever do Estado e direito do cidadão.
Por meio deste instituto é que o Estado atende ao cidadão em situação de vulnerabilidade social, ou seja, aquele que, devido a sua condição de hipossuficiência, necessita de apoio permanente, ou algumas vezes circunstancial, a fim de prover as suas necessidades mínimas de existência em conformidade com um dos objetivos fundamentais da República Brasileira que é construir uma sociedade livre, justa e solidária.
Percebe-se que em nosso ordenamento constitucional temos como preceito axiológico que “a dignidade da pessoa humana, como princípio fundamental se consubstancia em valor-guia não apenas dos direitos fundamentais, mas de toda a ordem jurídica, razão pela qual, para muitos, se justifica plenamente sua caracterização como princípio constitucional de maior hierarquia axiológica-valorativa" (SARLET, 2001, p.60-61).
Não é diferente o entendimento de nossa Corte Suprema que em seus muitos julgados imprime a razão da dignidade como valor fonte da ordem jurídica. Nesse sentido, no magistério do Ministro Cezar Peluso, tem-se que a dignidade da pessoa humana constitui “verdadeiro valor-fonte que conforma e inspira todo o ordenamento constitucional vigente em nosso País e que traduz de modo expressivo um dos fundamentos em que se assenta, entre nós, a ordem republicana e democrática consagrada pelo sistema de direito constitucional positivo" (SALDANHA apud SARLET, 2001, p. 61).
O jurista Marcus Aguiar (AGUIAR, 2016, p. 495) ilustra que
“Direitos humanos, com fundamento na dignidade da pessoa humana, têm os princípios essenciais à consideração igualitária e realização dos mais diversos projetos de vida, além de valores éticos fundamentais para ultrapassar as divisões sociais discriminatórias e/ou divergentes, por meio também da promoção de um novo pacto social com base na harmonia existencial de todos os seres existentes”.
O constitucionalista Ingo Salert (SALERT, 2001, p. 103-104) é taxativo ao afirmar que
“A relação entre a dignidade e os direitos fundamentais é uma relação sui generis, visto que a dignidade da pessoa assume simultaneamente a função de elemento e medida dos direitos fundamentais, de tal sorte que, em regra, uma violação de um direito fundamental estará sempre vinculada com uma ofensa à dignidade da pessoa.”(grifei).
Com efeito, o eminente doutrinador define dignidade da pessoa humana como sendo:
“A qualidade intrínseca e distintiva de cada ser humano que o faz merecedor do mesmo respeito e consideração por parte do Estado e da comunidade, implicando, neste sentido, um complexo de direitos e deveres fundamentais que assegurem a pessoa tanto contra todo e qualquer ato de cunho degradante e desumano, como venham a lhe garantir as condições existenciais mínimas para uma vida saudável, além de propiciar e promover sua participação ativa e co-responsável nos destinos da própria existência e da vida em comunhão com os demais seres humanos. (SARLET, 2002, p. 62)”.
Dentre a abrangência do referido instituto temos “a proteção do deficiente como consequência do desdobramento dos direitos humanos. Estes, importando em verdadeira superação do modelo egoístico, onde predominava o indivíduo (...) (FARIAS, 2016, p. 18)”.
A referida proteção decorre, principalmente, da consolidação dos termos da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, realizada em Nova York, no ano de 2007 e que, posteriormente, restou promulgada pelo Decreto Presidencial nº 6949, único tratado internacional em que o Brasil é signatário e que é acolhido com status de norma constitucional.[v]
2- A PROPOSTA DO PODER EXECUTIVO
Neste ponto, vamos traçar um comparativo da atual redação do inciso V, do artigo 203 dada pelo constituinte originário e a proposta da PEC 287/16, a saber:
“Art. 203 A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente da contribuição à seguridade social, e tem por objetivos: V- a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei”. (grifei e sublinhei)
E a proposta da PEC nº 287/16:
“Art. 203 ........................... V- a concessão de benefício assistencial mensal, a título de transferência de renda, à pessoa com deficiência ou àquela com setenta anos ou mais de idade, que possua renda mensal familiar integral per capita inferior ao valor previsto em lei.
§ 1º Em relação ao benefício de que trata o inciso V, a lei disporá ainda sobre: I - o valor e os requisitos de concessão e manutenção; II - a definição do grupo familiar; e III - o grau de deficiência para fins de definição do acesso ao benefício e do seu valor.
§ 2º Para definição da renda mensal familiar integral per capita prevista no inciso V será considerada a renda integral de cada membro do grupo familiar.
§ 3º A idade referida no inciso V deverá observar a forma de revisão prevista no §15 do art. 201”. (grifei).
2.1 A GARANTIA CONSTITUCIONAL DE UM SALÁRIO MÍNIMO MENSAL
Neste tópico trataremos do inciso V e a posteriori, analisaremos os parágrafos, quando abordaremos também a questão do idoso.
Como é de fácil constatação a redação atual do inciso V do artigo 203 da Constituição originária traz em seu núcleo a garantia do recebimento de um salário mínimo mensal, o que na PEC 287/16 é subtraído ao ser proclamado somente o recebimento de “beneficio assistencial mensal, a título de transferência de renda”, onde o valor será disposto por lei.
Quanto a este ponto, o deputado relator da proposta na Comissão de Constituição e Justiça arguiu que: “desvinculou-se o benefício do valor do salário mínimo”.
Em uma leitura muito simples é de se concluir que: Não mais será direito da pessoa com deficiência ou do idoso, o recebimento do valor integral de um salário mínimo e sim um valor ainda a ser definido.
A proposta, ao nosso entendimento, lesa direito fundamental social, pois sem dúvida causa um retrocesso no dever do Estado de amparar aqueles que vivem sob o fardo da miserabilidade e ainda enfrentam no seu dia a dia as dificuldades postas aos que apresentam uma deficiência física ou mental.
2.2 O RETROCESSO CONSTITUCIONAL
A Constituição brasileira consagra a ideia de que somos parte de um Estado social e democrático de Direito, o que resta constatado no capítulo de direitos e garantias fundamentais.
Nesta letra, o Título II, em seu capítulo II, que trata “Dos Direitos Sociais”, é taxativo ao preceituar que são direitos sociais, entre outros, “a assistência aos desamparados, na forma da Constituição”.
No âmago da proposta em estudo há uma alteração do texto constitucional em sede de direito fundamental social que se dá, paradoxalmente, com efeitos prospectivos e, indevidamente, retroativos no sentido que irá atingir quem já dispõe do benefício, aqueles que alcançaram posições jurídicas já consolidadas em seu patrimônio, no seu dia a dia.
A atmosfera jurídica em prol do princípio do não retrocesso culmina por encontrar situações em que o núcleo essencial do direito não pode ser atingido. Por esse viés, o mesmo poder constituinte reformador encontra, primeiro, limites materiais à reforma, e segundo, o dever de manutenção de determinados conteúdos da Carta Política, máxima que, por vezes, pode ser vista, v.g., com a expressa garantia constitucional dos direitos adquiridos, dos atos jurídicos perfeitos e da coisa julgada.
O constitucionalista José Gomes Canotilho, com maestria, afirma que os ataques à Constituição contra os direitos sociais faz com que o legislador tenha, antes, que se ater ao princípio do não retrocesso na matéria em questão, princípio este que advém da necessária segurança jurídica[vi] assegurada no Estado de Direito, in verbis,
“(...) quer dizer-se que os direitos sociais e econômicos (ex.: direito dos trabalhadores, direito à assistência, direito à educação), uma vez obtido um determinado grau de realização, passam a constituir, simultaneamente, uma garantia institucional e um direito subjetivo. A “proibição de retrocesso social” nada pode fazer contra as recessões e crises econômicas (reversibilidade fática), mas o princípio em análise limita a reversibilidade dos direitos adquiridos (ex.: segurança social, subsídio de desemprego, prestações de saúde), em clara violação do princípio da proteção da confiança e da segurança dos cidadãos no âmbito económico, social e cultural, e do núcleo essencial da existência mínima inerente ao respeito pela dignidade da pessoa humana”. ( CANOTILHO, 2012, pg. 338-339). (sublinhei).
Com efeito, ao agravar o texto constitucional, o Poder Executivo prospecta uma diminuição da eficácia e efeitos de direito fundamental social e, não menos importante, atinge a dignidade da pessoa humana portadora de deficiência e do idoso que já usufrui o direito, o que culmina por também ferir direito adquirido.
De fato, a segurança jurídica também está ligada ao princípio da confiança, ou seja, o Estado, por meio de suas leis, assegura determinados direitos ao cidadão, que por vez, confia na sua aplicação.
Ao considerar que os titulares de direitos não devem ser transformados em simples instrumentos da vontade estatal, é imperioso que legislador infraconstitucional deva considerar a ordem jurídica e os princípios que a norteiam a fim de consubstanciar sua atividade legiferante e, neste ponto, a segurança jurídica, prima facie, deve ocupar o topo da hierarquia na formulação de leis.
2.3 A NECESSIDADE DE LEGISLAÇÃO INFRACONSTITUCIONAL
A proposta em debate também surpreende por dispor que nova lei deverá tratar do valor e dos requisitos de concessão do beneficio, entre outros, também do grupo familiar, grau de deficiência e define a renda integral de cada membro do grupo familiar a fim de consubstanciar renda mensal familiar per capita.
É importante registrar que a disposição dos incisos I, II e III apontados no § 1º já tem previsão em sede de legislação infraconstitucional, por meio da Lei Federal nº 8.742/1993 – LOAS, que também acolhe o disposto no § 2º.
O valor, requisitos e grupo familiar são todos previstos na lei supramencionada, portanto, em uma interpretação teleológica da norma proposta, haverá uma alteração na atual redação da legislação federal, o que certamente não encontrará o caminho da ampliação do direito, provavelmente, limitará ainda mais o acesso ao beneficio.
Em relação ao grau de deficiência, a Lei Federal nº 7.853/1989, regulamentada pelo Decreto Lei nº 3.298/1999, é o fundamento para a conceituação da pessoa com deficiência que surge no artigo 2º da Lei Federal nº 13.146/15, a saber:
“Artigo 2º Considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas”.
Não menos importante é o que nos diz os artigos 3º e 4º do referido Decreto-Lei que apura o conceito de deficiência como sendo “toda perda ou anormalidade de uma estrutura ou função psicológica, fisiológica ou anatômica que gere incapacidade para o desempenho de atividade, dentro do padrão considerado normal para o ser humano e avança dos aspectos puramente biológicos para encontrar também os aspectos psicológicos”.
Em mesmo contexto o artigo 3º trata sobre conceito de deficiência, como permanente e de incapacidade e no artigo 4º o tipo de deficiência a ser considerado como a física, a auditiva, a visual e a mental.
Ainda, a LOAS foi alterada pela Lei Federal nº 12.435/2011 que especificou exatamente o que deve ser considerado nos impedimentos da pessoa com deficiência a fim de se credenciar ao beneficio e, assim, alterou o artigo 20 em seu paragrafo 2º.
No item renda per capita familiar, fator determinante para recebimento do beneficio, que na LOAS tem previsão de ¼ do salário mínimo, é consenso pela jurisprudência de nossos Tribunais que a mesma deve ser de ½ salário mínimo.
Assim, mesmo que o legislador não se digne a aperfeiçoar a referida lei com base na real hipossuficiência do beneficiário e nas circunstâncias sociais atuais em que a própria legislação federal em programas sociais já propõe renda maior, o Poder Judiciário socorre aos que dele se valem para garantir o referido direito ao benefício. [vii]
Ao fim, em nosso entendimento, há que se observar com prioridade o grau de vulnerabilidade social, o quanto essa pessoa humana está à margem da sociedade ou sua família está em processo de exclusão social, principalmente devido a fatores econômicos.
2.4 IDADE DE 70 ANOS PARA O IDOSO
Em relação ao idoso, é de fácil observação que a Constituição, no artigo 203, V, não traz a idade de 65 anos, o que, atualmente, se dá em sede de legislação infraconstitucional.
Mas nem por esse motivo a ampliação em cinco anos, somado ao fato de prever aumento gradual da idade conforme expectativa de vida do brasileiro, nos faz concordar com a referida anomalia do texto da PEC 287/16, principalmente, quando temos na Lei Federal nº 10.741/03 que “Dispõe sobre o Estatuto do Idoso”, o artigo 1º que estabelece idoso “a pessoa com 60 anos ou mais”.
A assertiva se dá por uma obviedade que se torna gritante quando o espírito da lei de assistência social é principalmente acudir aos que mais precisam da presença do Estado a fim de lhe propiciar a oportunidade de viver com o mínimo de dignidade.
O Estado, a família e a sociedade em geral devem assegurar ao idoso, entre outras garantias, a efetivação do direito à alimentação, à saúde, à cidadania, à dignidade.
Ora, em um raciocínio muito simples, se a pessoa com 65 anos não encontra condições de prover por si próprio ou pelos seus o mínimo existencial, se já vive em situação de miserabilidade, o que certamente lhe afeta a saúde e as suas condições físicas, ao propor que somente passará a ter direito ao beneficio com 70 anos o Poder Executivo, diretamente, joga esses mesmos cidadãos, que deveria proteger, na condição de desassistidos, na periferia da sociedade, na marginalidade social.
Uma especial atenção ao fato de que o idoso faz jus a todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana é também o entendimento de Alexandre Moraes, em sua letra,
“Mais do que reconhecimento formal e obrigação do Estado para com os cidadãos da terceira idade, que contribuíram para seu crescimento e desenvolvimento, o absoluto respeito aos direitos humanos fundamentais dos idosos, tanto em seu aspecto individual como comunitário, espiritual e social, relaciona-se diretamente com a previsão constitucional de consagração da dignidade da pessoa humana. O reconhecimento àqueles que construíram com amor, trabalho e esperança a história de nosso país tem efeito multiplicador de cidadania, ensinando às novas gerações a importância de respeito permanente aos direitos fundamentais, desde o nascimento até a terceira idade”. (MORAES, 2007, p.85).
Pelo viés doutrinário e jurisprudencial, nacional e estrangeiro, de modo geral, tendo Gomes Canotilho como um dos principais defensores do não retrocesso, a concretização de determinado nível de direito fundamental, em nível infraconstitucional, assume a condição de direito subjetivo a determinadas prestações estatais e de uma garantia institucional, a saber:
“Esta proibição de retrocesso, pode ser considerada uma das consequências da perspectiva jurídico-subjetiva dos direitos fundamentais sociais na sua dimensão prestacional, que, neste contexto, assumem a condição de verdadeiros direitos de defesa contra medidas de cunho retrocessivo, que tenham por objeto a sua destruição ou redução”. (CANOTILHO, 1982, apud, SARLET, 2012, p. 16).
O doutrinador ilustra sua convicção ao apresentar o Acórdão nº 509, de 2002, proferido pelo Tribunal Constitucional de Portugal “ao reconhecer a inconstitucionalidade de exclusão, por meio de lei, das pessoas com idade entre 18 e 25 anos (mesmo com ressalva dos direitos adquiridos) do benefício do rendimento mínimo de inserção, que havia substituído o rendimento mínimo garantido”.
Conclui ao afirmar, “Neste contexto, impõe-se uma referência ao fato de que uma declaração de inconstitucionalidade no âmbito da proibição do retrocesso social, não se faz necessária tão somente quando se cuida da revogação, mas também quando estamos diante de uma afronta legislativa ao conteúdo do direito fundamental social concretizado pelo legislador”. (SARLET, 2012, p.18).
Como é de se notar, não há justificativa que se firme a fim de consubstanciar tamanha lesão a direito, desrespeito ao cidadão na idade em que mais precisa da solidariedade social.