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Da constitucionalidade do fim da contribuição sindical (Lei n.13.467/2017)

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UMA VISÃO CONSTITUCIONAL DA CONTRIBUIÇÃO SINDICAL

Sabe-se que a CR/1988 é a fonte primária do direito sindical brasileiro. Os parlamentares, ao se reunirem em assembleia constituinte asseguraram que os sindicatos fossem munidos de vários poderes: proclamaram o princípio da liberdade sindical e asseguram a plena autonomia sindical; estabeleceram parâmetros para a negociação coletiva e firmaram parâmetros para o direito de greve; mantiveram o poder normativo da justiça do trabalho e estabeleceram a possibilidade da contribuição confederativa. Também asseguraram o imposto sindical que já era previsto na CLT.

 Destarte, faz-se necessária uma interpretação literal dos dispositivos constitucionais que tratam da contribuição sindical com fins de explicar uma possível inconstitucionalidade da supressão da contribuição sindical obrigatória à luz do novo texto celetista.

 O art. 8º, inc. IV da CR/1988 dispõe sobre a contribuição sindical, veja-se, in verbis:

“[...] IV - a assembleia geral fixará a contribuição que, em se tratando de categoria profissional, será descontada em folha, para custeio do sistema confederativo da representação sindical respectiva, independentemente da contribuição prevista em lei [...]”; (BRASIL, 1988).

 Nota-se que o texto constitucional não traz expressamente a previsão do imposto sindical também no art. 149 da Constituição:

“[...] Art. 149. Compete exclusivamente à União instituir contribuições sociais, de intervenção no domínio econômico e de interesse das categorias profissionais ou econômicas, como instrumento de sua atuação nas respectivas áreas, observado o disposto nos arts. 146, III, e 150, I e III, e sem prejuízo do previsto no art. 195, § 6º, relativamente às contribuições a que alude o dispositivo [...]”. (BRASIL,1988).

 Portanto, é de se observar que não existe previsão para a obrigatoriedade da contribuição sindical. O STF validava a obrigatoriedade do imposto sindical devido à recepção dos dispositivos do art. 578 da CLT pela Constituição, observe-se:

Sindicato: contribuição sindical da categoria: recepção. A recepção pela ordem constitucional vigente da contribuição sindical compulsória, prevista no art. 578 CLT e exigível de todos os integrantes da categoria, independentemente de sua filiação ao sindicato resulta do art. 8º, IV, in fine, da Constituição; não obsta à recepção a proclamação, no caput do art. 8º, do princípio da liberdade sindical, que há de ser compreendido a partir dos termos em que a Lei Fundamental a positivou, nos quais a unicidade (art. 8º, II) e a própria contribuição sindical de natureza tributária (art. 8º, IV) - marcas características do modelo corporativista resistente -, dão a medida da sua relatividade (cf. MI 144, Pertence, RTJ 147/868, 874); nem impede a recepção questionada a falta da lei complementar prevista no art. 146, III, CF, à qual alude o art. 149, à vista do disposto no art. 34, §§ 3º e 4º, das Disposições Transitórias (cf. RE 146733, Moreira Alves, RTJ 146/684, 694)[9]. (BRASIL ,1998).

Portanto, tratava-se de uma interpretação constitucional, histórica-evolutiva e teleológica, quando o STF entedia ser obrigatória a contribuição sindical anterior à Reforma Trabalhista. Salienta-se que a contribuição sindical foi recepcionada como tributo devido a uma previsão contida no art. 34, § 4º dos Ato das Disposições Constitucionais transitórias e não de uma previsão contida no art. 8º da Constituição da República.

O art. 8º, inc. V da CR/1988 também orienta sobre a livre associação sindical, “[...] ninguém será obrigado a filiar-se ou a manter-se filiado a sindicato [...]”. Deste modo, deriva-se do princípio da livre associação sindical a opção do filiado com fins de contribuir com o sistema sindical.

As teses em desfavor do novel texto da CLT, que limita a contribuição sindical, apontam censuras para a extinção da natureza tributária da contribuição sindical. O comportamento dos desfavorecidos pela lei é compreensível, pois, manter o sistema sem conquistar o cliente (filiação) é mais fácil. Todavia, como citado alhures, tal condição fere o princípio da liberdade sindical.


CONSTITUCIONALIDADE DA CONTRIBUIÇÃO SINDICAL

Parte da comunidade jurídica entende que a implementação das alterações realizadas pela Reforma Trabalhista nos dispositivos que tratam da contribuição sindical por lei ordinária seriam inconstitucionais por violação do art. 146 inc. III, alíena a e art. 149 da Constituição da República. Também se alega sob o ponto de vista formal que a Reforma Trabalhista teria violado a norma de reserva de iniciativa prevista no art. 61 da CR/1988.

O STF já arrimou entendimento sobre a recepção dos dispositivos celetistas pela CR/1988. Todavia, também já esclareceu que as contribuições de interesses de categorias esculpidas no art. 149 da CR/1988 não necessitam de lei complementar para sua criação. Tal conclusão pode ser observada no Recurso Extraordinário (RE n. 389016):

“[...] Contribuição em favor do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas - SEBRAE: constitucionalidade reconhecida pelo plenário do STF, ao julgar o RE 396.266, Velloso, DJ 27.2.2004, quando se afastou a necessidade de lei complementar para a sua instituição e, ainda - tendo em vista tratar-se de contribuição social de intervenção no domínio econômico -, entendeu-se ser inexigível a vinculação direta do contribuinte ou a possibilidade de que ele se beneficie com a aplicação dos recursos por ela arrecadados, mas sim a observância dos princípios gerais da atividade econômica [...]”[10]. (BRASIL, 2004).

 No tema n. 227, em incidente de repercussão geral, o STF, o tribunal constitucional definiu que é dispensável lei complementar para fixar sujeito passivo, base de cálculo e fato gerador. Por óbvio, não é demais salientar que se foi a CLT a responsável por instituir a contribuição sindical é possível que o mesmo instrumento jurídico seja utilizado para suprimir cobrança do antigo tributo.

 Outrossim, o STF já definiu que a reserva de lei de iniciativa do chefe do Executivo, prevista no art. 61, § 1º, inc II, alínea b, da Constituição, apenas se aplica a territórios federais, observe-se:

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. CRIAÇÃO DO FUNDO ROTATIVO DE EMERGÊNCIA DA AGRICULTURA FAMILIAR. ISENÇÃO DE PAGAMENTO CONCEDIDA AOS PRODUTORES RURAIS BENEFICIADOS PELO PROGRAMA EMERGENCIAL DE MANUTENÇÃO E APOIO A PEQUENOS PROPRIETÁRIOS RURAIS. LEI GAÚCHA N. 11.367/1999. 1. Perda de objeto da presente ação e do interesse de agir do Autor quanto aos arts. 3º e 4º da Lei gaúcha n. 11.367/1999, pela revogação parcial da lei impugnada pela Lei gaúcha n. 11.774/2002. 2. Ausência de contrariedade ao art. 22, inc. I, da Constituição da República: normas de direito administrativo e financeiro. 3. O art. 1º da Lei n. 11.367/1999 não contraria o art. 61, § 1º, inc. II, alínea e, da Constituição da República porque não criou ou extinguiu secretarias ou órgãos da administração pública. 4. O Supremo Tribunal Federal assentou que a reserva de lei de iniciativa do chefe do Executivo, prevista no art. 61, § 1º, inc. II, al. b, da Constituição, somente se aplica aos territórios federais. Precedentes. 5. Não comprovação de ter sido excedido o limite da dívida mobiliária do Estado ou de prejuízo no desenvolvimento de políticas públicas estaduais. Matéria de fato. Ofensa constitucional indireta. Precedentes. Inexistência de contrariedade ao art. 52, inc. IX, da Constituição da República. 6. A opção política do legislador estadual de isentar de pagamento os produtores rurais beneficiados pelo programa emergencial de manutenção e apoio a pequenos proprietários rurais não contraria o princípio da moralidade (art. 37, caput, da Constituição da República), nem equivale à tentativa de fraudar o pagamento da dívida contraída com a União. A isenção dos devedores primitivos foi conjugada com a assunção, pelo Estado do Rio Grande do Sul, da condição de devedor principal, sem prejudicar o adimplemento das obrigações assumidas. 7. A vedação do art. 63, inc. I, da Constituição da República não abrange a Lei gaúcha n. 11.367/1999. 8. O art. 167, inc. II, da Constituição da República dirige-se ao administrador público, a quem cabe executar os programas contemplados na lei, com a utilização de créditos orçamentários. 9. Ação direta de inconstitucionalidade julgada parcialmente procedente para declarar a inconstitucionalidade do art. 2º da Lei gaúcha n. 11.367/1999. [11](BRASIL, 2015).

É importante notar que a CR/1988 permitiu a criação do Cadastro Nacional de Entidades Sindicais do Brasil. Reitera-se que o texto constitucional, pelo princípio da não intervenção do Estado na organização sindical (art. 8º, inc I, da CR/1988), zela por não ingerências, tornando os sindicatos livres para atuar em suas bases territoriais[12].

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Sabbag (2016, p. 994) ressalta que sobre o tema existe o Precedente Normativo n. 119 do TST, que explica que as cláusulas de acordos, convenções coletivas ou sentenças normativas que obrigam trabalhadores não sindicalizados ao recolhimento da contribuição confederativa ofendem o direito de livre associação e sindicalização garantido pela Constituição da República. Sabbag (2016, p. 994) ainda leciona que determinados sindicatos têm sido acionados nos tribunais para restituir valores descontados a este título.

Portanto, entende-se pela constitucionalidade da contribuição sindical, qual seja, pela possibilidade de supressão pela Nova CLT da cobrança obrigatória deste tributo diante da inexistência de compulsoriedade para o antigo tributo na atual CLT.


CONCLUSÃO

Em consonância com a Reforma Trabalhista que trouxe para o ordenamento jurídico a novidade da extinção da contribuição sindical obrigatória e também de acordo com o atual entendimento do Supremo Tribunal Federal que em recente decisão considerou constitucional a mudança da CLT por lei ordinária conclui-se que a extinção deste tributo está de acordo com a Constituição da República e com o ordenamento jurídico infraconstitucional.

Viu-se que este antigo tributo, qual seja, o imposto sindical que possuía natureza tributária deixou de ser compulsório. Dada a perda desta característica, em conformidade com o CTN, este tipo de receita deixou de possuir as características de tributo para ser considerado uma contribuição confederativa ou assistencial.

À luz dos princípios informadores do Direito Coletivo do Trabalho, com uma análise constitucional destes vetores normativos, pôde-se constatar que impor ao sindicalizado a obrigação de quitar um tributo que está ligado à atividade sindical, o mesmo afronta a liberdade de associação e a liberdade sindical. Com os ensinamentos de Maurício Godinho Delgado verificou-se que a autonomia sindical também pode ser lesada ao se vincular o orçamento dos sindicados – associações civis privadas, ao financiamento estatal.

Portanto, ao suprimir da lei celetista os dispositivos que tratavam da contribuição sindical obrigatória, os legisladores corrigiram um erro histórico do ordenamento jurídico que proporcionava distorções e lesões ao princípio da liberdade sindical. Não obstante, verifica-se também que a mudança legislativa proporcionará aos sindicatos revisarem suas formas de funcionamento com objetivo de melhorar a assistência aos sindicalizados.

Neste contexto, não é demais salientar que o sistema sindical sofrerá com a falta de recursos. Todavia, não é uma interpretação constitucional que deve obstar a aplicação do novel texto celetista que está de acordo com os modernos paradigmas do Estado Democrático de Direito.

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Sobre o autor
Francisco de Paula Antunes Pereira

Advogado, Administrador, Contador, pós-graduado em Contabilidade Empresarial e Auditoria, pós-graduado em Gestão de Pessoas, pós-graduado em Direito Constitucional. Mestre em Direito pela Fumec com ênfase em Esfera Pública e Controle, Doutorando.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PEREIRA, Francisco Paula Antunes. Da constitucionalidade do fim da contribuição sindical (Lei n.13.467/2017). Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 23, n. 5531, 23 ago. 2018. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/68441. Acesso em: 18 abr. 2024.

Mais informações

Artigo apresentado ao programa de Mestrado em Direito Público da Universidade Fumec - BH.

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