7 ...... CONSIDERAÇÕES FINAIS
Do quanto foi exposto, depreende-se que o problema da invasão de espécies exóticas e/ou patogênicas provocada pelo uso da água de lastro nas embarcações se tornou insustentável, após a segunda metade do século XX com a intensificação do comércio internacional, o qual tem como principal meio de transporte o modal aquaviário. No Brasil, este modal respondeu por cerca de noventa e seis e oitenta e nove por cento, respectivamente, das exportações e importações no ano de 2012.
Dessa maneira, é imprescindível que haja uma vigorosa legislação, norteada pelos princípios da prevenção, da precaução, do poluidor-pagador e da cooperação internacional, tanto no âmbito internacional quanto no plano interno de cada país, tendo em vista que, se todos não agirem cooperativa e preventivamente, os esforços terão resultados mínimos. Daí a urgência do envolvimento dos Estados no enfrentamento do assunto, incluindo até mesmo os países desprovidos de costa marítima, a exemplo do Paraguai, bastante prejudicado pela invasão do mexilhão dourado.
A bioinvasão via água de lastro, ao trazer em seu bojo prejuízos ambientais, sociais e econômicos enormes e quase sempre irreversíveis, apesar de sutis em um primeiro momento, é suficiente para elucidar o quanto o ordenamento jurídico e a doutrina devem priorizar o tema, o que evidencia a necessidade de o Poder Legislativo aprovar um marco institucional mais direcionado, de intensa fiscalização e controle do Poder Executivo e, no âmbito do Poder Judiciário, de decisões qualificadas que contemplem adequadamente a proteção do meio ambiente aquático.
Nesse contexto, são imprescindíveis os estudos relativos ao tema, inclusive no âmbito jurídico, vez que, além de advertir a sociedade e os poderes públicos do problema, fomentam subsídios e fundamentos teóricos para aprimorar as ações estatais e das organizações privadas envolvidas nos transportes aquaviários e para acelerar a entrada em vigor da Convenção Internacional para o Controle e Gestão da Água de Lastro e Sedimentos de Navios, BWM 2004. Conforme ficou evidenciado, os próprios programas GloBallast e o GloBallast Partnerships foram iniciativas institucionais destinadas a realizar e alavancar tais estudos e preparar os Estados-membros da IMO para a adesão e cumprimento deste Documento.
No momento, enquanto essa Convenção não estiver em vigor, a legislação internacional concernente a qualquer forma de poluição dos ambientes aquáticos é aplicável, no que couber, à bioinvasão provocada pela água de lastro das embarcações. As suas disposições, nesta situação, tornam-se recomendações aos Estados Partes, a orientar seus ordenamentos internos. Vigendo a BWM 2004, a mencionada legislação será aplicada subsidiariamente.
No Brasil, de modo similar, os Documentos internalizados e a legislação ambiental pertinente aplicam-se ao problema da bioinvasão via água de lastro. O legislador, por meio da Lei de Segurança do Tráfego Aquaviário (LESTA), outorgou ao Executivo o estabelecimento de requisitos com o propósito de prevenir a poluição ambiental por parte de embarcações, o que foi realizado pela Autoridade Marítima quando elaborou a NORMAM 20.
De fato, como restou comprovado, essa norma foi orientada pela BWM 2004. Porém, pode-se questionar se houve extrapolação da delegação de competência por parte do Poder Executivo, uma vez que a NORMAM 20 antecipa parcialmente a matéria desta Convenção, que será internalizada em caráter supralegal, uma vez que se trata de Direito Ambiental – embora com viés Marítimo –, o que constitui um direito humano fundamental difuso de terceira dimensão.
Há necessidade, portanto, de maior aprofundamento e aperfeiçoamento da legislação interna no campo em tela, que pode inclusive ir além do que preceitua a BWM 2004. Para exemplificar, consideram-se: que maior enfoque deva ser dado à proteção das bacias hidrográficas em face da bioinvasão, mesmo que o tráfego entre elas não se dê por via marítima; que não se deva prescindir da teoria do risco integral no âmbito da responsabilidade civil, o que não acontece na NORMAM 20, que se baseia no risco da atividade; que se devam diminuir os casos de isenções e concessões feitas à possibilidade de troca da água de lastro. Assim, resta patente que apenas o Congresso Nacional possui legitimidade para tanto, delimitando para o Executivo tão somente a regulamentação específica.
Por outro lado, no que se refere ao gerenciamento da água de lastro, a legislação permite e incentiva, com acerto, a busca de novos métodos, em consonância com os avanços tecnológicos, desde que devidamente aprovados e certificados pela IMO. Por enquanto, os métodos de troca de água de lastro ainda são amplamente utilizados, alcançando uma renovação média de noventa e cinco por cento do conteúdo dos tanques das embarcações. Todavia, após 2016, todas elas deverão realizar o gerenciamento da água de lastro por meio do tratamento a bordo, se até esta data a Convenção já estiver vigendo.
Constata-se, ainda, que a responsabilidade civil pelos prejuízos da bioinvasão, decorrentes do mau gerenciamento da água de lastro das embarcações, insere-se nos preceitos da responsabilidade objetiva, aplicada solidariamente a todos os agentes que, em suas condutas comissivas ou omissivas, contribuíram para a ocorrência do dano. O agente escolhido, por solidariedade, pode requerer o seu direito de regresso e cobrar dos demais a parte que lhes cabe, considerando-se, nesta situação, a responsabilidade subjetiva.
Por fim, mostra-se que também é objetiva e solidária a responsabilidade civil do Estado pelos danos ambientais ocasionados por atos omissivos das atividades de vistoria, inspeção, controle e fiscalização do gerenciamento da água de lastro das embarcações e dos portos organizados. No entanto, em relação à fase de execução, a responsabilidade do Estado é considerada subsidiária, como devedor reserva.
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