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Lavagem de dinheiro: uma análise crítica sobre a atuação processual do Juiz Sergio Moro na Operação Lava Jato

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Agenda 09/11/2015 às 18:23

Essa pesquisa teve como temática uma análise jurídica sobre a atuação processual do Juiz Sergio Moro na Operação Lava Jato. Procurou-se estudar a origem do crime lavagem de dinheiro e se fazer uma analogia com as ordenações jurídicas estrangeiras.

RESUMO

Essa pesquisa teve como temática uma análise jurídica e processual sobre a Operação Lava Jato, procurou-se estudar a origem do crime lavagem de dinheiro, suas formas de combate no ordenamento jurídico brasileiro e se fez uma analogia no direito comparado, sob a ótica das ordenações estrangeiras e suas ramificações como: narcotráfico, crimes organizados e suas infiltrações na Administração Pública sobre a forma de corrupção e formação de quadrilha envolvendo a estatal Petrobrás. Também se abordou a atuação do Juiz Sergio Moro, responsável pelo julgamento do processo, sendo alvo de pesadas críticas por vários processualistas.

PALAVRAS – CHAVE: Penal, Processo penal, Lavagem de dinheiro, Operação Lava Jato, Ramificações.

ABSTRACT

This research was thematic a legal and procedural analysis on the Lava jato Operation, sought to study the origin of the money laundering crime, their ways of fighting the Brazilian legal system and made an analogy in comparative law from the perspective of foreign ordinations and it´s ramifications as drug trafficking, organized crime and it´s infiltration in Public Administration on how corruption and conspiracy involving the state-owned Petrobras. Also addressed the actions of Judge Sergio Moro, responsible for the judgment of the case, the target of heavy criticism by several procedural experts.

KEY WORDS: Criminal, Criminal proceedings, Money laundering, Lava Jato Operation, Ramifications.

SUMÁRIO

  1. Origem do crime de lavagem de dinheiro 2. Lavagem de dinheiro no direito comparado e suas formas de combate 2.1.Alemanha 2.2.França 2.3.Itália 2.4.Suíça 2.5.Estados Unidos 3. Tipificação no ordenamento jurídico brasileiro e suas ramificações 3.1.Paraísos fiscais 3.2.Narcotráfico 3.3.Bancos internacionais 3.4.Sigilo bancário 3.5.Cooperação internacional 3.6.Crime organizado 3.7.O advogado na defesa de seu cliente e a correlação com a lavagem 4.Operação Lava Jato 4.1.Fases da investigação 4.2.Análise crítica 4.2.2.Delação premiada 4.2.3.Prisões cautelares 5. Considerações finais 6.Referências

INTRODUÇÃO

Com o presente trabalho, buscou-se analisar sobre a ótica jurídica e processual uma das maiores investigações sobre corrupção conduzidas até hoje no Brasil, iniciada desde 2009, movimentou bilhões de reais no País e no exterior usando empresas de fachada, contas em paraísos fiscais e contratos de importação fictícios.

A partir daí, descobriu-se a existência de um vasto esquema de corrupção na Petrobras, envolvendo políticos de vários partidos e as maiores empreiteiras do País, suspeitos de subornar agentes públicos com verbas desviadas e com seu esquema de fraude nos certames ocasionando a ausência de concorrência, gerando um prejuízo de quase 10% do PIB aos cofres públicos.

Diante do atual cenário instável que a economia do País passa com a possibilidade de se instaurar um colapso como ocorreu nos anos 90 com a inflação nas alturas, somados a uma iminente crise política e a consequente perda da credibilidade das instituições.

O tema em estudo tem bastante impacto no âmbito nacional, político, econômico e internacional, pois a imagem do Brasil foi ofuscada com o escândalo envolvendo a estatal por suas atuações em mercados estrangeiros e pelo seu capital aberto na bolsa de valores com a presença de milhares de acionistas.

A operação foi precursora no levantamento de fraudes à licitação, formação de cartel, superfaturamento de empreiteiras e atos de corrupção e formação de quadrilha. Esses ilícitos foram objeto de contratações espúrias de obras e serviços púbicos com os Poderes federal, estaduais e municiais, em todo País, estando o juiz Sergio Moro a frente do processo, alvo de pesadas críticas por processualistas e advogados a respeito de suas decisões por falhas processuais e ofensa a princípios que serão abordados nesse trabalho.

A pesquisa foi feita no modelo teórico, com base na doutrina, no ordenamento positivo e em reportagens sobre a Operação Lava Jato. A pesquisa contou também com a nova posição jurisprudencial a respeito do tema dos tribunais superiores e suas súmulas.

  1. ORIGEM DO CRIME DE LAVAGEM DE DINHEIRO

Etimologicamente o termo “lavagem” se origina do latim lavare com o significado de tornar puro, enquanto o dinheiro vem do latim pecuniam ou do popular denarius, representando a moeda de maior circulação no sistema monetário romano.

Segundo o dicionário, a lavagem de dinheiro teria o significado de encobrir a origem ou a natureza de dinheiro proveniente de atividades ilícitas mediante sua incorporação no sistema econômico formal.

Os vanguardistas na criminalização da lavagem de capitais foram os Estados Unidos e a Itália, tendo a nomenclatura “lavagem de dinheiro” se originado nos Estados Unidos a partir de 1920, quando lavanderias de fachada foram utilizadas por criminosos, para ludibriar a origem ilícita do capital, ou seja, era através de um comércio legalizado que se pretendia motivar a fonte criminosa dos recursos arrecadados com a venda ilegal de drogas e bebidas.

Isso se deu no período de proibição que vigorava no país a chamada Lei Seca[1] que vetava a fabricação e comercialização de bebidas alcoólicas, ocasionando um mercado ilegal de fornecimento destas que lucrava bastante com a exploração de diversas organizações criminosas.

Com a revogação da Lei Seca, o crime se concentrou na exploração do jogo e do tráfico de substâncias entorpecentes a fim de buscar novas alternativas de negócio. Com o crescente lucro dos jogos e do tráfico de drogas, o uso das lavanderias ou lavagem de automóveis, negócios baseados no uso do dinheiro em espécie, já não era o bastante para rotatividade do dinheiro ilícito ganho.

Os mafiosos descobriram um melhor meio de camuflar os ativos ilegais colocando o dinheiro fora do alcance das autoridades do país, buscando uma jurisdição com mais benefícios fiscais para se evitar o confisco e a restituição, sendo a Suíça o primeiro país escolhido, o que deu origem à criação dos offshore.[2]

Conforme Raúl Cervini[3], a primeira tipificação legal do crime de lavagem de dinheiro aparece na Itália, a partir de 1978, nos “anos de chumbo”. Na época, as Brigadas Vermelhas, Brigate Ross, o maior e mais importante grupo armado italiano com  ideologias ligadas ao marxismo-leninismo praticaram uma série de ações para desarticular o poder político estatal.

Após uma onda de sequestros realizados por grupos mafiosos com finalidade econômica, as Brigadas Vermelhas sequestraram o democrata cristão Aldo Moro, político influente na época - considerado o próximo presidente da Itália. Este fato tomou repercussão internacional. Em maio do mesmo ano, Moro foi assassinado e, em resposta à comoção social gerada no país em razão deste e outros sequestros, o governo italiano, que havia editado o Decreto-lei  nº 59 em 21 de março de 1978, introduzindo o art. 648 bis no Código Penal Italiano, converteu o referido decreto na Lei nº 191 de 18 de maio de 1978, incriminando a substituição de dinheiro ou de valores provenientes de roubo qualificado, extorsão qualificada ou extorsão mediante sequestro por outros valores ou dinheiro.

A origem da lei tipificando o crime reporta-se ao final dos anos 80 na cidade de Viena, onde foi realizado a Convenção das Nações Unidas a respeito do tráfico ilícito de entorpecentes e substâncias psicotrópicas entrando em vigor internacional em novembro de 1990.

A primeira causa que motivou a reunião foi a preocupação dos Estados signatários com a forte tendência da produção, da demanda e do tráfico ilícito de entorpecentes e de substâncias psicotrópicas, que representam uma séria ameaça a saúde e ao bem-estar do homem e que têm efeitos nefastos sobre as bases econômicas, culturais e políticas da sociedade.

A segunda causa foi o reconhecimento da relação existente entre o tráfico ilícito e outras atividades criminosas organizadas, a eles ligadas, que minam as economias lícitas e ameaçam a estabilidade, a segurança e a soberania dos Estados.

Conscientes que do tráfico ilícito consideráveis recursos financeiros são gerados e grandes fortunas são formadas permitindo às milícias criminosas internacionais invadirem, contaminarem e corromperem as estruturas da Administração Pública, as atividades comerciais e financeiras lícitas e a sociedade em todos os seus patamares, decidiu-se tolher os agentes dedicados ao tráfico de drogas do produto de suas atividades criminosas e eliminar, dessa forma, o principal incentivo a essa atividade.

Diante da infrutífera tentativa em coibir a atividade primária do tráfico de drogas, a criminalização da lavagem de dinheiro surge como importante meio de controlar os fluxos financeiros derivados daquela atividade ilícita.

Uma vez que, para o crime organizado o dinheiro em espécie significa grave embaraço, por causa do espaço físico que ocupa, além dos indícios que desperta em operações de valor elevado. Origina-se daí a necessidade de lavagem desse montante, surgindo para o Estado à oportunidade de identificar a origem ilícita desses valores, adotando meios de modo a impedir seu beneficiamento pelo crime organizado ou mesmo inserção na economia legal, com disfarce de licitude.

De acordo com Victor Manuel Nando Lefort[4], os cinco fatores como justificativas para o aparecimento e o incremento da lavagem de dinheiro são: o narcotráfico, o surgimento dos bancos internacionais, o crime organizado, a globalização do mercado financeiro internacional e o desenvolvimento tecnológico que possibilitou a ampliação dos meios de comunicação. Sendo que, Edson Pinto ainda acrescenta um sexto elemento: os paraísos fiscais.

2. LAVAGEM DE DINHEIRO NO DIREITO COMPARADO E SUAS FORMAS DE COMBATE

Devido ao famoso processo de aparência de licitude do capital que nasce de forma criminosa e vem a se tornar “limpo”, muitos países adotaram a nomenclatura de limpeza em suas tipificações legais, por exemplo: em Portugal  branqueamento de capitais, na Espanha blanqueo de capitales, na França blanchiment d´argent, nos Estados Unidos Money laundering, na Argentina lavado de dinero, na Colômbia Del lavado de ativos, na Alemanha geldwache, na Itália riciclaggio di denaro, no México encubrimento y operaciones con recursos de procedencia ilícita.

O crime de lavagem de capitais é abordado em vários ordenamentos jurídicos mundiais devido à necessidade que se tem de regulamentar e fiscalizar os ativos financeiros que se encontram em suas economias.

Diante de cenário internacional, alguns países optaram pela tipificação em seus Códigos Penais, como exemplo a França, Itália, Suíça, enquanto outros preferiram dispor do tema em leis especiais como é o caso do Brasil com a Lei n° 9.613/98, Argentina, Equador, Chile e um caso isolado como o México que adotou o crime em seu Código Fiscal da Federação numa parte especial.

Para enfrentar o conteúdo de forma mais ampla e didática a respeito do crime, se dividirá o tema conforme os diferentes critérios de tipificacção em múltiplos países.

2.1. ALEMANHA

De acordo com Cervini[5], o crime foi tipificado no Código Penal alemão através da Ley contra el Tráfico ilícito de Estupefacientes y otras Modalidades de la Criminalidad oganizada de 15 de Julio de 1992.

A pena mínima é de 5 (cinco) anos e a máxima alcançada é de 10 (dez) anos de reclusão a depender de circunstâncias gravíssimas do cometimento do fato típico, sendo a conduta típica:

Ocultar o encubrir, impedir o dificultar el descubrimiento o la investigación de la procedencia de un bien o su detención o confiscación, siempre que dicho bien proceda de la comisión de un delito relativo al tráfico de drogas o de un delito cometido por un miembro de una asociación criminal.[6]

Fazendo-se uma análise sistemática da norma, pode-se perceber que o crime foi inserido no rol de infrações contra o Estado Democrático de Direito, que cuida da receptação e do favorecimento real.

Em analogia com o direito brasileiro, a legislação alemã também permite a delação premiada e a punição da tentativa, prevendo, inclusive, o confisco dos bens envolvidos enquanto no Brasil se faz a apreensão e sequestro pela via judicial.

2.2. FRANÇA

O crime de lavagem de dinheiro na França é tipificado no Código Penal em seus artigos 324 e seguintes. Qualquer forma de falsificar a justificativa da origem dos bens ou rendimentos do autor de um crime ou delito que tenha tentado se beneficiar direta ou indiretamente é punida, como também o fato de ajudar em uma operação de encobrimento ou conversão do produto direto ou indireto de um crime.

O Código Penal francês apenas simplifica as condutas incriminadoras e estipula a pena máxima em até 9 (nove) anos, porém se o crime for realizado de forma habitual facilitada pelo exercício profissional ou quando for concretizado por organizações criminosas pode chegar a uma pena de 10 (dez) anos.

De forma diferente do que afirma a legislação brasileira, na francesa existe previsão de penas adicionais para as pessoas naturais. Como exemplos pode-se citar a proibição de ter escritório aberto ao público, proibição esta que poderá ser temporária, de até cinco anos, ou até mesmo permanente; suspensão de atividades profissionais; cancelamento da licença para dirigir veículos; proibição de sair do país por até cinco anos.

2.3. ITÁLIA

A conduta de substituir dinheiro, bens ou quaisquer outros proveitos econômicos que provenham de um crime não culposo ou que se execute operações em relação aos mesmos de forma a impedir ou dificultar a identificação de sua origem delituosa, será punido com pena de 4 (quatro) a 12 (doze) anos de reclusão com multa de 2 (dois) a 3 (três) milhões de Euros, sem se falar nos casos de concurso de delitos, sendo que a pena será agravada se o crime for cometido no exercício de alguma atividade profissional.

O legislador italiano ainda traz a novidade de punir tanto aquele que pratica a lavagem de dinheiro quanto aquele que é receptador dos bens provenientes da lavagem de dinheiro de acordo com Cervini[7]:

la regulación penal italiana concerniente al lavado de capitales es que este precepto se ubica junto a la receptación y que se castigue no sólo el hecho de convertir y transferir los bienes ilícitamente obtenidos, sino también el empleo de los mismos en una actividad económica o financiera. El hecho de que también se castigue esta conducta nos hace pensar que se está sancionando penalmente la tercera de las fases aludidas a la hora de describir el proceso de legitimación de capitales.

Existe também um caso de atenuação da pena quando o delito que originou o capital “sujo” não seja cominado uma pena superior a 5 (cinco) anos.

O Decreto Lei 625/79 modificou o tratamento dado a lavagem de dinheiro e criou a obrigação do registro e a devida manutenção de arquivos que contenham as transações bancárias realizadas pelas entidades financeiras com montante maior que 20 (vinte) milhões de libras.

2.4. SUÍÇA

Berço de grandes bancos mundiais e famoso pelas excelentes benesses fiscais, o país se tornou a principal referência quando o tema é lavagem de dinheiro, uma vez que muitos transferem seus ativos financeiros com o objetivo de burlar a fiscalização e a jurisdição de seus países de origem, achando erroneamente que na Suíça não é combatido esse tipo de crime.

O país adotou uma postura de tipificação mais genérica, abarcando todo e qualquer delito grave de modo a ser uma das mais rígidas leis no combate à lavagem de capitais, previsto em seu Código Pena nos artigos 305 bis e 305 ter[8]:

Art 305 bis: El que haya cometido un acto idóneo para dificultar la identificación del origen, el descubrimiento o la confiscación de valores patrimoniales de los cuales él sabía o debía presumir que provenían de delito.

Art 305 ter: El que profesionalmente haya aceptado, observado, ayudado a colocaros a transferir valores patrimoniales de un tercero y que haya omitido verificar conforme a la vigilancia requerida por las circunstancias, la identidad del titular del derecho económico.

Uma curiosidade a respeito do Código Penal suíço é a da não estipulação do quantum da pena, afirmando apenas a existência de ser punido com detenção ou reclusão e multa, com possibilidade de agravamento da pena nos caos do agente ser integrante de organização criminosa ou envolver um valor muito elevado.

Ademais, o Código ainda prevê a possibilidade do sistema de colaboração internacional entre as autoridades suíças e estrangeiras.

2.5. ESTADOS UNIDOS

O primeiro capítulo dessa pesquisa procurou mostrar as raízes do delito, sendo os Estados Unidos um dos vanguardistas na criminalização da lavagem de capitais junto com a Itália.

A lei que regula o crime é a USA PATRIOT ACT, criada em 04 de outubro de 2001 para identificar e penalizar o laundering Money, praticada por agentes e instituições financeiras americanas. A lei concede mais discricionariedade ao Secretário do Tesouro e ao Secretário de Justiça para acabar com a lavagem e por consequência o financiamento de grupos terroristas.[9]

A lavagem de capitais está intimamente relacionada a crimes antecedentes de narcotráficos operadas por grupos criminosos que financiam o terrorismo em caráter internacional e após o atentado de 11 de setembro de 2001, a política de segurança do país foi alterada para reduzir e se possível extinguir as ameaças grupos extremistas contra a humanidade.

Para consecução desses objetivos, a experiência americana demonstra suas regras no combate à lavagem: tornar a lavagem de dinheiro um crime; estabelecer obrigações sobre as instituições financeiras ou outros facilitadores potenciais de lavagem de dinheiro; desenvolver o conhecimento pericial governamental; criar uma unidade de informação financeira; analisar abordagens governamentais distribuídas por categorias; desenvolver sistemas que garantam a troca de informações imediatas e acuradas; criar leis e procedimentos que permitam o congelamento, apreensão e confisco de bens de origem criminal; reconhecer que um mínimo de prevenção vale um máximo de repressão; estar disposto a aprender com as experiências dos outros; e adaptar, ajustar e examinar.

As principais disposições de proteção contra a lavagem pela USA PATRIOT ACT são:

3. TIPIFICAÇÃO NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO E SUAS RAMIFICAÇÕES

O crime é regido pela lei 9.613/98 que possui como bem jurídico tutelado a ordem econômico-financeira e o bem atingido pelo crime antecedente ao processo de branqueamento.

Segundo Alberto Silva Franco[10]:

O Estado não pode permitir a convivência entre o produto do ilícito e o resultado de atividades lícitas, mas não porque essa convivência repercuta no funcionamento dos mecanismos econômicos. A bem da verdade, as diferenças são a mola propulsora do capitalismo. O que ocorre é que, se se permitir que os recursos resultantes, por exemplo, do tráfico de entorpecentes, possam ser aproveitados, como se fosse dinheiro lícito, mina-se o próprio sistema democrático, invertem-se os padrões de justiça, passando a se regular o quer lucrativo. Ao se analisarem os bens jurídicos acima citados, poderemos ver afetada a ordem socioeconômica através da circulação de bens de mercado. Assim como na receptação, faz necessário, para se configurar o crime de lavagem de capitais, a existência de um crime prévio e é esse que se pretende, em última análise, evitar.

O artigo 2° da referida lei expressamente afirma:

Art. 2° O processo e julgamento dos crimes previstos nessa Lei:

II – independem do processo e julgamento das infrações penais antecedentes, ainda que praticados em outro país, cabendo ao juiz competente para os crimes previstos nessa Lei a decisão sobre a unidade de processo e julgamento.

Com a extinção do rol taxativo de crimes antecedentes previstos no art. 1° da Lei 9.613/98, alterado pela Lei 12.683/12 que admitiu qualquer infração penal como crime antecedente da lavagem de dinheiro, as condutas antecedentes de: tráfico de drogas, de armas, terrorismo e seu financiamento, contrabando, extorsão mediante sequestro, contra a Administração Pública, sistema financeiro, derivado de organização criminosa ou de crime do particular contra a administração pública estrangeira, foram extensivamente ampliadas.

Conforme André Luís Callegari:[11]

O legislador adotou para os delitos de lavagem de capitais o princípio da acessoriedade limitada, ou seja, há necessidade de que o delito prévio seja ao menos típico e antijurídico, o que torna impossível a prática da lavagem se o fato antecedente previsto na lei não puder ser considerado crime. Assim, é necessário que fique provada a existência da tipicidade e da antijuridicidade do crime antecedente, pois o reconhecimento de uma justificante ou a ausência de uma dos elementos do tipo leva necessariamente, à ausência do crime antecedente e, por isso, não haveria a subsunção típica às figuras de lavagem que exige a comissão daquele.

O antigo entendimento foi superado com base nas alterações da Lei 12.683/12, ou seja, qualquer crime ou contravenção penal podem resultar no cometimento de lavagem de dinheiro.

Como é um crime comum, pode ser praticado por qualquer pessoa, sem necessidade de possuir o agente condições especiais. Nas hipóteses em que o autor da lavagem é o mesmo do crime antecedente, responde em concurso material com aplicação cumulada das penas, artigo 69 do CP, a não ser que seja em uma mesma ação, caso de concurso formal impróprio, artigo 70 do CP.

Não é necessária a participação no crime antecedente para ser sujeito ativo no crime de lavagem, apenas que tenha consciência da origem ilícita dos ativos financeiros, nesse sentido segue a jurisprudência do Colendo STJ:

A participação no crime antecedente não é indispensável à adequação da conduta de quem oculta ou dissimula a natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou propriedade de bens, direitos ou valores provenientes, direta ou indiretamente, de crime, ao tipo do art. 1°, da Lei 9.613/98. (RMS 16.813/SP, 5ª Turma, j.23/06/2004, rel. Ministro Gilson Dipp, DJ 02/08/2004, p.433)

Subsiste o crime de lavagem de dinheiro, ainda que o autor do crime antecedente seja absolvido em virtude de uma suposta coação moral irresistível, circunstância que isenta o réu de pena, causa extintiva de punibilidade.

Com relação à responsabilidade penal das pessoas jurídicas envolvidas por se tratar de crime contra a ordem econômico-financeira, artigo 173 da Constituição Federal de 1988, a lei de lavagem somente prevê a responsabilidade penal para pessoa física.

Apesar de ser recomendada pelo Grupo de Ação Financeira contra a Lavagem de Dinheiro e o Financiamento do Terrorismo - GAFI/FATF[12], uma organização intergovernamental criada em 1989 cujo propósito é desenvolver e promover políticas nacionais e internacionais de combate à lavagem de dinheiro e ao financiamento do terrorismo, o Brasil adotou sanções administrativas como: advertência, multa pecuniária, inabilitação temporária das atividades por até 10 (dez) anos e cassação da autorização para o funcionamento, disciplinado no art. 12 da Lei 9.613/98.

Em 1990, o GAFI publicou um documento com as 40 recomendações de combate à lavagem de dinheiro, que se amplia em 1996 com a primeira revisão. Apenas em 1998 o Brasil cria sua legislação a respeito, dez anos após a criação do GAFI, a Lei 9.613.

O Conselho de Controle de Atividades Financeiras – COAF é o órgão administrativo brasileiro ligado ao Ministério da Fazenda, responsável pela prevenção dos crimes de lavagem de dinheiro, com a finalidade de disciplinar, aplicar penas administrativas, receber, examinar e identificar as ocorrências suspeitas de atividades ilícitas previstas na Lei 9.613 de março de 1998, exercendo a vigilância sobre todo o sistema financeiro brasileiro e atividades supervisionadas pelo Banco Central do Brasil: bancos, corretoras de valores, distribuidoras, casas de câmbio, administradoras de consórcios, que foi criado durante a reforma econômica feito no governo de Fernando Henrique Cardoso.

A punição na lavagem de dinheiro só é aplicada quando não for um mero desdobramento natural consequente da conduta anterior, uma vez que a sanção apenas se legitima ao se verificar um modo peculiar e eficiente de dificultar a penalidade pelo Estado. A ação tem de ser com a finalidade específica de inserir recursos financeiros ilícitos no mercado com o intuito de branquear para dissimular a origem criminosa, evitando assim um bis in idem.

Haverá somente a prática do crime precedente quando a conduta de lavagem for considerada uma utilização ou um aproveitamento normal das vantagens ilicitamente obtidas, por exemplo, será tipificado como crime de favorecimento real[13] e não lavagem de dinheiro se o agente não tiver como finalidade e a posterior, introdução do bem no sistema financeiro, mas a simples ocultação para terceiro; haverá receptação[14] caso o agente oculte o bem que sabe ser de origem espúria em proveito próprio ou alheio.

Trata-se de um crime permanente cuja consumação se perdura ao longo do tempo, punível em sua forma tentada e requer o dolo, animus de lavar, como elemento subjetivo do tipo, não se punindo a modalidade culposa.

A lei n° 9.613/98 não exige explicitamente o conhecimento específico acerca dos elementos e circunstâncias do crime antecedente pelo agente do crime de lavagem, pois teria um impacto significativo na eficácia da lei. O dolo deve abarcar apenas a noção de que os bens, direitos ou valores objeto da lavagem são provenientes, direta ou indiretamente de algum ilícito penal.

No artigo 1°, §2º, II da Lei em estudo afirma que incorre na mesma pena quem participa da associação tendo conhecimento de que sua atividade principal ou secundária é dirigida à prática de crimes, dessa forma, mesmo que não faça parte diretamente da atividade ilícita um faxineiro que trabalha no escritório que é o centro de comando da lavagem e não faz nada que finalize ou contribua para lavagem em si, mas de alguma forma saiba ou desconfie, responde pelo crime.

Pode-se fazer uma analogia com o barman da casa de rufianismo, que é uma atividade lícita, mesmo ele sabendo o que acontece no estabelecimento, ele não responde pelo crime por não cooperar diretamente.

A Lei 9.613/98 inova quanto à possibilidade de delação premiada, pois no geral a “premiação’ é a diminuição da pena de 1 (um) a 2/3 (dois terços), dessa forma o delator continuava a cumprir a pena com possibilidade de ser no mesmo presídio de seus comparsas, que acabavam matando-o por considerar traição uma pena punida com a morte.

Dessa forma, como não havia estímulo para o delator, a lei de lavagem cria três possibilidades distintas de premiação: causa de diminuição de pena e fixação do regime inicial aberto; causa de substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direito; perdão judicial como causa extintiva da punibilidade, porém, há a necessidade que seja voluntária e que colabore efetivamente com as investigações, possuindo o instituto uma natureza híbrida.

A doutrina costuma dividir em fases o processo de branqueamento que no Brasil foi o adotado o modelo feito pelo GAFI[15]: colocação, ocultação e integração.

Smurfing, commingling, doleiros, contrabando de dinheiro, subfaturamento de bens imóveis, superfaturamento de bens imóveis, aquisição de bens imóveis, exploração de jogos de azar, aquisição de obras de arte e antiguidades, aquisições de ações em conluio com a corretora de valores, subfaturamento de notas fiscais de produtos, lavagem de dinheiro através da compra e venda de jogadores de futebol, utilização de documentos falsos para a lavagem de dinheiro.

3.1. PARAÍSOS FISCAIS

Trata-se de um território autônomo ou um ente internacional que possui uma legislação simplificada para atração de capitais estrangeiros, uma espécie de dumping fiscal, praxe comercial de empresas venderem mercadorias ou serviços por preços abaixo do valor de mercado por um tempo determinado, visando eliminar a concorrência e impor seus valores.

Além de seduzir os investidores pelos valores reduzidos dos impostos ou até mesmo inexistentes, existe a garantia do sigilo bancário de forma absoluta que protege a identidade dos proprietários com a não vinculação das contas, o que incentiva empresas a querer pagar menos impostos e instiga os criminosos a realizarem transferências bancárias com o intuito de lavar o dinheiro e ocultar a origem ilícita.

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Segundo Geoffrey Colin Powell, ex conselheiro econômico da Ilha de Jersey, “O que… identifica uma área como sendo 'refúgio fiscal' é a existência de um conjunto de medidas estruturais tributárias criadas deliberadamente para tirar vantagem de, e explorar a demanda mundial de oportunidades para se envolver em evasão tributária

Segundo a Receita Federal do Brasil[18], consideram-se paraísos fiscais os países que tributam a renda com alíquota inferior a 20% ou trabalham com sigilo societário, registradas na categoria de offshore.

Offshore é um negócio criado em paraísos fiscais, inscrito no cartório para ter a exterioridade de legalidade, atuando no mundo todo, com exceção do país que está registrada. Sua escrituração contábil e seus resultados financeiros, em geral, são controlados clandestinamente por outros países, por agentes que os utilizam com a finalidade de sonegar impostos e lavar dinheiro obtido por meios ilícitos.

A entidade internacional Tax Justice Network divulgou um levantamento com os dez principais paraísos fiscais do mundo, sendo o ranking baseado no volume de dinheiro depositado nesses locais, ficando a Suíça com o primeiro lugar, seguida por: Ilhas Cayman, Luxemburgo, Hong Kong, Estados Unidos, Cingapura, Ilha de Jersey, Japão, Alemanha e Bahrein.

Existem empresas que são apenas controladoras, possuem investimentos em subsidiárias e geralmente limitam suas atividades à administração e ao controle de outras empresas, chamadas de holdings. Podem ser constituídas com capital irrisório para transformar investimento estrangeiro de risco em empréstimos, transformando dividendos em juros para evitar a tributação e assim promover o total reembolso do investimento inicial, além disso, podem ser utilizadas para administrar bens que necessitam de ocultação, sem revelar a identidade dos proprietários.

3.2. NARCOTRÁFICO

A expansão do capitalismo só aumentou a distância entre os países desenvolvidos e os em desenvolvimento, acentuando ainda mais a marginalidade, pobreza e desocupação. O capitalismo só consegue oferecer as drogas aos jovens que não emprega, aos emigrantes que expulsa, às minorias que discrimina ou aos trabalhadores que destrói.

O tráfico de drogas no cenário internacional cresceu significativamente na década de 80, auferindo uma quantia superior a US$ 500 bilhões, superando a renda do petróleo, só perdendo para o comércio de armas.

O narcotráfico sempre foi considerado uma prática capitalista, por ser organizada sob a forma de empresa, objetivando lucros. Seu produto representa a autodestruição humana, o consumo demonstra a desmoralização de setores inteiros da sociedade, a juventude condenada ao desemprego crônico e à falta de esperanças e, no outro exemplo, os filhos das classes abastadas que sentem a decomposição social e moral.

Por mais perigoso e violento que seja, o narcotráfico atrai milhões de jovens que almejam uma ascensão na vida, devido a alta demanda e lucratividade, por exemplo, na Bolívia cerca de 75% do PIB é representado pela exportação da pasta base da cocaína, o que gera um grande poder econômico por parte dos traficantes, detendo o controle das principais empresas e corrompendo todos os níveis do governo.

O valor bruto com as drogas na Bolívia chega a incrível marca de US$ 16 bilhões, ficando aproximadamente US$ 2 bilhões retidos no país, o restante é destinado ao mercado internacional e transferido para os grandes offshores para posterior lavagem de dinheiro.

A principal importância da renda auferida com o mercado negro das drogas no modelo capitalista atual é o volume que alcança com o branqueamento de capitais no sistema financeiro. Pela soma envolvida, o procedimento jamais poderia ser feito sem a ajuda dos banqueiros que agem como intermediadores para legalização da quantia ilícita em ativos, empresas ou imóveis com operações entre US$ 160 a 400 milhões diários, sempre apoiada no sigilo bancário absoluto.

3.3. BANCOS INTERNACIONAIS

A lavagem de dinheiro se tornou uma ameaça global e as medidas para prevenir o problema ficaram de âmbito internacional. Há cerca de uma década, várias organizações se empenharam na guerra contra o branqueamento de capitais, promovendo a cooperação para garantir que as instituições financeiras tomem as medidas necessárias com o intuito de reduzir os efeitos danosos dessa prática.

Com a globalização e as conquistas tecnológicas, a lavagem de capitais pode desestabilizar financeiramente os países. É necessária uma vigilância constante por parte de reguladores, bancos, centros financeiros e outras instituições vulneráveis para evitar que o problema se agrave.

Se um banco for alvo de publicidade negativa por estar envolvido em alguma situação de lavagem de dinheiro, ele sofrerá consequências em relação à perda da base de clientes, despesas judiciais, o seu rating[19] será reduzido pelos analistas, as suas ações na bolsa de valores, tanto no Brasil como no exterior. O ativo mais valioso de uma instituição financeira é a sua reputação, sua credibilidade no cenário local ou internacional, chamado de “Risco de Imagem”.

A lei n° 9.613 foi promulgada em 1988 e no ano seguinte entrou em vigor um pacote do Banco Central do Brasil sobre prevenção à lavagem de dinheiro, cabendo ao Departamento de Combate a Ilícitos Cambiais e Financeiros – DECIF, constituído no âmbito do Banco Centra do Brasil em 1999, cuidar, primordialmente, da prevenção deste crime.

No Brasil, as instituições financeiras, as empresas de leasing e as empresas de cartão de crédito são controladas pelo Banco Central – BACEN, compondo um dos setores mais visados pelas organizações criminosas para branquear os ativos. O motivo principal dessa atração é a rapidez e facilidade com que o dinheiro é “purificado”, sendo os motivos secundários, a busca por taxas de juros mais sedutoras, compra e venda de divisas, operações internacionais de empréstimo e financiamento que se misturam numa ardilosa e complexa transação.

As entidades no Brasil que não estão no âmbito da regulamentação do BACEN, da CVM, da SUSEP, ou da SPC, estão sob a competência residual do Conselho de Controle de Atividades Financeiras – COAF, que é um braço do Ministério da Fazenda.

Os recursos ilícitos dessas transações se misturam com as consideráveis quantias que são diariamente movimentadas por esses bancos, o que auxilia o processo de dissimulação da origem ilegal.

A internet favorece esse mecanismo de lavagem, multiplicando a possibilidades de movimentação do capital, conferindo maior celeridade, além de garantir o anonimato, sigilo bancário, das operações ilegais.

O setor bancário é o mais afetado e preferido nos processos de lavagem, uma vez que agem como verdadeiros intermediadores fazendo o dinheiro transitar até a chegada ao mercado, ocorrendo assim à integração, última fase do processo de lavagem.

Com base na Circular nº 3.461/09[20] do BACEN e na Instrução n° 301[21], deve-se manter o controle dos registros internos consolidados que permitam verificar, além da adequada identificação do cliente, a compatibilidade entre as correspondentes movimentações de recursos, atividade econômica e capacidade financeira.

A ideia intrínseca da lei de lavagem é fazer o banco detectar e analisar as movimentações financeiras que possam indicar a suspeita de crime, em razão de suas características, valores, formas de realização e instrumentos utilizados, ou que não apresentem fundamento econômico ou legal, bem como aquelas com indícios de financiamento ao terrorismo, deve ser comunicado à Controladoria que após análise técnica, se confirmados os indícios, decidirá sobre a informação e procederá na comunicação ao Conselho de Controle de Atividades Financeiras (COAF).

São exemplos de operações suspeitas que os bancos tenham obrigação de comunicar às autoridades competentes:

Existem políticas e diretrizes que norteiam as ações previstas na política de prevenção e combate à lavagem de dinheiro que de acordo com a recomendação do Comitê de Basiléia[22], os bancos devem adotar políticas do tipo “conheça seus clientes e suas atividades”, conhecida como Due Diligence[23], devendo estabelecer um conjunto de regras e procedimentos bem definidos com objetivo principal de identificar e conhecer a origem dos recursos financeiros de seus clientes, suas atividades, bem como a potencialidade dos seus negócios, protegendo sua reputação e reduzindo os riscos de seus produtos e serviços serem utilizados para legitimar recursos provenientes de atividades ilícitas.

É de responsabilidade da instituição conhecer seus colaboradores, por meio de um acompanhamento acerca dos aspectos comportamentais, padrões de vida e respectivos resultados operacionais, atentando para alterações inusitadas e significativas nestas variáveis, conforme previsto na Carta-circular 3.542/12[24], do BACEN.

Segue a Lista dos itens que integram o programa de prevenção à lavagem de dinheiro das instituições financeiras brasileiras:

A lei 9.613/98 abarca não só apenas o mercado bancário, como também os outros segmentos, tais como: o mercado de capitais; de derivativos; o de ouro; o segurador; o previdenciário; o de capitalização; o imobiliário; o de cartão de crédito; o de leasing; o de factoring; o de sorteio e promoções; o de objetos de arte e antiguidades; o de joias, pedras e metais preciosos; e demais atividades cujo funcionamento dependa do órgão regulador dos mercados financeiros, de câmbio, de capitais e de seguros.

O Brasil até pouco tempo não integrava a rota do dinheiro sujo, mas a partir da estabilidade relativa dos preços advindos do Plano Real e a abertura econômica do governo Collor, aliada a alta taxa de juros praticada no Brasil, a imensidão das fronteiras desguarnecidas que, em vez de ser o apanágio/vantagem da soberania nacional, é o grande instrumento facilitador da atuação das associações criminosas.

Os serviços financeiros e bancários no Brasil se equiparam a um Supermercado de oferta de produtos financeiros. Essa oferta de serviços múltiplos e sofisticados gera uma dificuldade na fiscalização e na regulamentação, com isso, o Banco Central e a Receita Federal têm dificuldades nessa operação de fiscalização, aliados a outros facilitadores da lavagem de dinheiro como o câmbio paralelo altamente desenvolvido, o câmbio negro, o doleiro, que talvez seja o canal mais costumeiro no processo de branqueamento de capitais.

Outro exemplo de facilitador é uma economia informal, também altamente desenvolvida e tolerada. Tolerada porque não se tem empregos para toda população, não se gerando recursos suficientes para conquistar toda essa mão de obra e absorvê-la ao mercado formal. Uma questão, sobretudo, de reflexão e de política social, uma vez que seria melhor possuir a figura do camelô, instrumento do crime organizado da pirataria, em vez de um meliante cometendo assassinatos e crimes de roubo.

3.4. SIGILO BANCÁRIO

Tendo em vista o acesso a informações de caráter estritamente sigilosas, reguladas pela Lei Complementar nº 105/2001, relacionadas à movimentação em conta-corrente, transações, negócios ou outras operações realizadas pelos clientes, muitas agências bancárias adotam termos de confidencialidade com os empregados.

O problema da lavagem de dinheiro conjuntamente com a preservação do sigilo bancário não possui soluções fáceis uma vez que, por um lado tem-se a preservação dos direitos individuais previstos na Constituição Federal de 1988, em especial o direito ao sigilo de correspondências e informações do indivíduo e de outro lado, prevalece o interesse do poder público face ao poder inquisitivo do Estado visando a apuração de crimes, em especial os previstos na Lei n.º 9613 /98.

A lei de sigilo bancário estabelece algumas exceções tendo em vista o princípio do interesse público que se sobrepõe aos interesses dos particulares, não constituindo assim, uma violação ao dever de sigilo:

 Art. 1o As instituições financeiras conservarão sigilo em suas operações ativas e passivas e serviços prestados. (...)

§ 3o Não constitui violação do dever de sigilo:

        I – a troca de informações entre instituições financeiras, para fins cadastrais, inclusive por intermédio de centrais de risco, observadas as normas baixadas pelo Conselho Monetário Nacional e pelo Banco Central do Brasil;

        II - o fornecimento de informações constantes de cadastro de emitentes de cheques sem provisão de fundos e de devedores inadimplentes, a entidades de proteção ao crédito, observadas as normas baixadas pelo Conselho Monetário Nacional e pelo Banco Central do Brasil;

        III – o fornecimento das informações de que trata o § 2o do art. 11 da Lei no 9.311, de 24 de outubro de 1996;

        IV – a comunicação, às autoridades competentes, da prática de ilícitos penais ou administrativos, abrangendo o fornecimento de informações sobre operações que envolvam recursos provenientes de qualquer prática criminosa;

        V – a revelação de informações sigilosas com o consentimento expresso dos interessados;

        VI – a prestação de informações nos termos e condições estabelecidos nos artigos 2o, 3o, 4o, 5o, 6o, 7o e 9 desta Lei Complementar.

A troca de informações entre bancos para fins cadastrais ou entre as autoridades competentes para fins de investigação em processo administrativo ou judicial foi criada com o intuito de disciplinar a formação e consulta a bancos de dados com informações de adimplemento, de pessoas naturais ou de pessoas jurídicas para formação de histórico de crédito, o chamado cadastro positivo, regido pela Lei n° 12.414/11.

O cadastro positivo é reforçado na lei de lavagem em seu artigo 10-A, afirmando que o Banco Central manterá registro centralizado de dados formando o cadastro geral de correntistas e clientes de instituições financeiras, bem como de seus procuradores.

O Cadastro de clientes do Sistema Financeiro Nacional – CCS permite o armazenamento de dados em uma base centralizada e a consulta detalhada por autoridades competentes, acerca de contas de depósitos e também de ativos financeiros sob a forma de bens, direitos e valores mantidos ou administrados em instituições financeiras, sempre se observando as garantias de privacidade, por isso não contém informações sobre saldos, valores relativos aos bens mantidos nos bancos por correntistas e clientes.

Em um primeiro momento, o sigilo bancário no Brasil só pode ser quebrado por ordem judicial emanada do Poder Judiciário ou das Comissões Parlamentares de Inquérito – CPI, que terão poderes de investigação próprios das autoridades judiciais, conforme artigo 58, §3, da Constituição Federal,

Porém, com o advento da Lei Complementar n° 105/2001, foi autorizado a solicitação dos dados bancários dos contribuintes pelas autoridades do Poder Legislativo, Judiciário e Executivo, em especial da Administração Tributária, diretamente às instituições financeiras, sem a necessidade de prévia análise de indício de crime e das circunstâncias que deram origem à solicitação, apenas mediante a instauração de processo administrativo ou procedimento fiscal em curso, conforme artigo 6° da referida Lei.

Existe uma discussão doutrinária a respeito da constitucionalidade desse artigo 6° da LC 105/2001, que alguns autores defendem ser inconstitucional por violar o art. 5°, X (intimidade), XII (somente pode quebrar o sigilo bancário o Poder Judiciário), LVII (presunção de inocência), art. 60, §4°, IV (cláusula pétrea os direitos individuais), todos da Constituição Federal.

Essa pesquisa se posiciona no sentindo de ser permitida ao Fisco a possibilidade de quebra de sigilo bancário, desde que atendido os requisitos do artigo 6º da LC 105/2001 com a permanência da confidencialidade das informações obtidas, funcionando como mais um privilégio dado ao crédito tributário e mais um mecanismo para dificultar o processo de ocultação de capitais.

No mesmo sentido segue a jurisprudência da 1° turma do TRF-3 e a 2° turma do TRF-4, segundo os desembargadores da 4° região, não haveria uma quebra propriamente dita, mas sim uma transferência do sigilo para outra autoridade.[26]

Para quebra do sigilo bancário de instituições financeiras localizadas em países estrangeiros, é necessário o pedido de cooperação internacional por parte da via diplomática ou com base em tratados.

3.5. COOPERAÇÃO INTERNACIONAL

Devido à necessidade de convivência entre Estados soberanos, a cooperação internacional surge como uma relação que os Estados estabelecem entre si para cumprirem medidas processuais extraterritoriais de países diversos, sendo a solicitação de colaboração jurídica feita pela autoridade judiciária ou outro órgão de um determinado país, adquirindo uma natureza vinculada, onde o seu descumprimento implica de forma indireta a perda de credibilidade no cenário internacional.

No novo código de processo civil, Lei n° 13.105/15, é estipulada em um capítulo a cooperação internacional a partir do artigo 26, regida por tratados que o Brasil faça parte e na ausência de tratado, a cooperação jurídica internacional poderá ser realizada com base na reciprocidade, manifestada por via diplomática, pelos institutos do auxílio direto ou carta rogatória.

Cabe auxílio direto quando a medida não decorrer diretamente de decisão de autoridade jurisdicional estrangeira a ser submetida a juízo de delibação[27] no Brasil, diferente do procedimento de exequatur e da carta rogatória, permitindo o cumprimento mais célere das medidas, sem que haja a intervenção do STJ, sendo a troca de informação conduzida mediante atuação da autoridade central brasileira, que se comunica diretamente com suas congêneres e demais órgãos no exterior.

No mesmo sentido, bem observa Nádia de Araújo[28]:

Para garantir a rapidez e a eficiência do trânsito de atos processuais e jurisdicionais são necessárias normas especiais, que permitam o cumprimento dessas medidas. Essa obrigação dos Estados resulta de um dever de cooperação mútua para assegurar o pleno funcionamento da Justiça. Ao mesmo tempo, deve-se também assegurar os direitos fundamentais protegidos no âmbito da Constituição e dos Tratados internacionais de direitos humanos. Esses direitos fazem parte de um catálogo dos direitos do cidadão e não mais apenas uma obrigação entre nações soberanas, por força da cortesia internacional.

Nesse contexto, surge a cooperação jurídica internacional com o objetivo primordial de facilitar o intercâmbio de soluções de problemas estatais, viabilizando as pretensões dos Estados no exterior, entendendo-se, pois, necessária e premente a inserção do Brasil nesse cenário de colaboração mútua, de forma a contribuir efetivamente para a solução dos litígios transnacionais, em observância, contudo, aos dos direitos humanos fundamentais.

Por mais que o novo Código de Processo Civil tenha prestigiado o auxílio direto na cooperação internacional, sua inclusão se deu de forma muito suave e genérica. Poderia ter regulado de forma mais detalhada a simplificação para obtenção de informações armazenadas por sociedades empresárias estrangeiras com base na Lei 12.965/2014, chamada de Marco Civil da Internet.

Art. 11.  Em qualquer operação de coleta, armazenamento, guarda e tratamento de registros, de dados pessoais ou de comunicações por provedores de conexão e de aplicações de internet em que pelo menos um desses atos ocorra em território nacional, deverão ser obrigatoriamente respeitados a legislação brasileira e os direitos à privacidade, à proteção dos dados pessoais e ao sigilo das comunicações privadas e dos registros.

§ 1o O disposto no caput aplica-se aos dados coletados em território nacional e ao conteúdo das comunicações, desde que pelo menos um dos terminais esteja localizado no Brasil.

§ 2o O disposto no caput aplica-se mesmo que as atividades sejam realizadas por pessoa jurídica sediada no exterior, desde que oferte serviço ao público brasileiro ou pelo menos uma integrante do mesmo grupo econômico possua estabelecimento no Brasil.

§ 3o Os provedores de conexão e de aplicações de internet deverão prestar, na forma da regulamentação, informações que permitam a verificação quanto ao cumprimento da legislação brasileira referente à coleta, à guarda, ao armazenamento ou ao tratamento de dados, bem como quanto ao respeito à privacidade e ao sigilo de comunicações.

§ 4o Decreto regulamentará o procedimento para apuração de infrações ao disposto neste artigo.

Art. 22.  A parte interessada poderá, com o propósito de formar conjunto probatório em processo judicial cível ou penal, em caráter incidental ou autônomo, requerer ao juiz que ordene ao responsável pela guarda o fornecimento de registros de conexão ou de registros de acesso a aplicações de internet.

Parágrafo único.  Sem prejuízo dos demais requisitos legais, o requerimento deverá conter, sob pena de inadmissibilidade:

I - fundados indícios da ocorrência do ilícito;

II - justificativa motivada da utilidade dos registros solicitados para fins de investigação ou instrução probatória; e

III - período ao qual se referem os registros

Outro procedimento que poderia ter sido regulado era o auxílio judiciário mútuo, que é previsto na Convenção de Auxílio Judicial Mútuo da União Europeia, nos arts. 3°, 1 e art. 4°, 1 e 2:

Art. 3º.

1. O auxílio mútuo também é concedido em processos instaurados pelas autoridades administrativas para fatos puníveis nos termos do direito do Estado-Membro requerente ou do Estado-Membro requerido, ou de ambos, como infrações a disposições regulamentares e, quando da decisão caiba recurso para um órgão jurisdicional competente, nomeadamente em matéria penal.

Art. 4º.

1. Nos casos em que for concedido auxílio judiciário mútuo, o Estado membro requerido respeitará as formalidades e procedimentos expressamente indicados pelo Estado membro requerente, salvo disposição em contrário da presente Convenção e desde que as formalidades e procedimentos indicados não sejam contrários aos princípios fundamentais de direito do Estado membro requerido.

2. O Estado membro requerido dará execução ao pedido de auxílio judiciário mútuo com a maior brevidade, tendo em conta, tanto quanto possível, os prazos processuais e outros prazos indicados pelo Estado membro requerente. Este exporá as razões que o levaram a fixar esses prazos.

A adoção do auxílio direto mútuo seria muito proveitosa como regra de solução de litígios envolvendo os Estados soberanos, encontrando respaldo no CPC para oficiar ao Ministério da Justiça quanto à necessidade de prova ou informação contida por empresa no exterior, constatando a inviabilidade na solicitação à autoridade central para obtenção de dados, o magistrado adotaria as medidas cabíveis judiciais que entender  para produção do resultado pretendido, o auxílio direto mútuo.

É o Ministério da Justiça o responsável pelo planejamento e execução de políticas públicas que propiciam o combate à lavagem de dinheiro, destacando-se a coordenação do processo de recuperação de ativos enviados para o exterior por intermédio da Cooperação Jurídica Internacional; a gestão da Estratégia Nacional de Combate à Corrupção e à Lavagem de Dinheiro (ENCCLA); a coordenação da Rede de Laboratórios de Tecnologia contra a Lavagem de Dinheiro (LAB-LD); e o Programa Nacional de Capacitação e Treinamento para o Combate à Corrupção e à Lavagem de Dinheiro (PNLD).

O Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional da Secretaria Nacional de Justiça (DRCI/SNJ) tem por competência, estabelecida pelo Decreto nº 6.061, de 15 de março de 2007, promover a articulação dos órgãos dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, inclusive dos Ministérios Públicos Federal e Estaduais, no que se refere ao combate à lavagem de dinheiro e ao crime organizado transnacional. Além disso, deve promover a difusão de informações sobre recuperação de ativos e cooperação jurídica internacional, prevenção e combate à lavagem de dinheiro e ao crime organizado transnacional no País.

O problema da demora anormal do trânsito em julgado age como obstáculo nos processos de cooperação internacional, pois enquanto no exterior o procedimento dura em média uns 5 anos, no Brasil perduram por mais de 10 anos, sem qualquer perspectiva de terem uma decisão final.

A morosidade é contraproducente com a cooperação jurídica internacional, principalmente quando envolve o bloqueio de bens no exterior. Os entes demandados, aqueles em que os bens foram bloqueados por solicitação das autoridades brasileiras, pedem uma decisão transitada em julgado para repatriar ao Brasil o dinheiro. Em muitas oportunidades, esses países demandados, percebendo a inércia do processo no Brasil, determinam o desbloqueio dos recursos.

3.6. CRIME ORGANIZADO

A lei 12.850/2013, popularmente chamada de lei das organizações criminosas, define em seu artigo 1°, §1° o que seria uma organização criminosa para os fins legais:

Art. 1o  Esta Lei define organização criminosa e dispõe sobre a investigação criminal, os meios de obtenção da prova, infrações penais correlatas e o procedimento criminal a ser aplicado.

§ 1o  Considera-se organização criminosa a associação de 4 (quatro) ou mais pessoas estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas, ainda que informalmente, com objetivo de obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer natureza, mediante a prática de infrações penais cujas penas máximas sejam superiores a 4 (quatro) anos, ou que sejam de caráter transnacional.

São características dessas organizações: a hierarquia estrutural; planejamento empresarial com intuitos lucrativos; uso de meios tecnológicos avançados; recrutamento de pessoas; divisão funcional das atividades, acompanhada da diversificação de atividades, de forma a impossibilitar o rastreamento do ato ilícito; conexão estrutural ou funcional com o poder público ou com agentes do poder púbico por meio de suborno e corrupção; oferta de prestações sociais; alto poder de intimidação; armamento pesado; alta capacidade para prática de fraude; conexão local, regional, nacional ou internacional com outras organizações criminosas.

Pode-se fazer uma analogia com a Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional, Protocolo de Palermo, promulgada pelo Decreto n° 5.015/2004, estipulando em seu artigo 2° a definição de grupo criminoso organizado como o “grupo estruturado de três ou mais pessoas, existente há algum tempo e atuando concertadamente com o propósito de cometer uma ou mais infrações graves ou enunciadas na presente Convenção, com a intenção de obter, direta ou indiretamente, um benefício econômico ou outro benefício material.”

De acordo com os casos recentes no País, os delitos que envolvem a ordem econômico-financeira são executados por organizações criminosas altamente planejadas que abordam de forma elaborada e consequentemente captando consideráveis quantias em dinheiro, seja por desvios de verbas, o famoso caixa 2, seja por corrupção dos agentes públicos nos processos licitatórios milionários e contratos de um modo geral com a Administração Pública e seu superfaturamento surreal, sonegação fiscal e o ardiloso e obscuro processo de lavagem de capitais, tema de estudo da presente pesquisa.

No modelo atual o funcionamento em rede confere uma maior liberdade organizacional/gerencial, dificultando a identificação dos líderes por causa do compartilhamento das operações, de forma difusa. Cada agente age em um processo em cadeia, do qual participa toda a rede criminosa, reduzindo a penetração e fornecendo uma maior eficiência das execuções, na medida que dificulta o rastreamento dos delitos investigados, diferentemente da antiga estrutura da máfia que possuía o alto comando de forma bem heterogênea do grupo.

Na prática, utilizam empresas de fachada com perfis comerciais que vão das aparentemente ilegais a franquias locais. Devido a alta concorrência no mercado negro dos ilícitos, as próprias organizações estabelecem certos “padrões” de venda, fazendo com que os grupos trabalhem em atividades únicas como, por exemplo, narcotráfico, comércio de armas, tráfico de imigrantes, contrabando, distintamente, que com a globalização, as negociações locais ficaram de âmbito internacionais.

Isso demonstra a necessidade de se estabelecer um planejamento estratégico mútuo com a cooperação internacional, para responder com o devido grau e gerar uma eficácia perceptível.

Por mais que a polícia tente se infiltrar nas camadas mais “baixas” das organizações, as suas ramificações estão em quase sobre todos os níveis do governo, seja no Executivo e seus gestores como no Legislativo com a presença de deputados e senadores, tendo em vista as doações feitas em campanhas por empresas que servem como um sistema de favores, garantindo a permanência do cargo do político e a consequente criação de leis ou contratos favoráveis ou veto quando desfavoráveis.

Contra esta situação deve se insurgir o Estado brasileiro, em cooperação com a comunidade internacional, adotando posturas, criando ou modificando leis e procedimentos que, por meio da eliminação destas causas, permitam desmantelar as organizações criminosas.

3.7. O ADVOGADO NA DEFESA DE SEU CLIENTE E A CORRELAÇÃO COM A LAVAGEM

O advogado que exerce sua atividade profissional na defesa judicial de seu cliente, e que cobra honorários por ela desde que sua atuação não tenha uma finalidade ocultadora ou dissimuladora, não realiza o tipo penal em debate.

O pagamento de um advogado com dinheiro procedente de um delito prévio é um ato mediante o qual uma parte da capacidade econômica obtida com o dito delito se transforma em uma prestação de serviços profissionais que, em princípio, não gera um efeito de ocultação da origem nem tampouco de consolidação daqueles bens.

Em tese, quando se presta uma consultoria e o cliente paga o valor correto, mesmo que seja produto proveniente de lavagem de dinheiro, caso o advogado pague os tributos e declare com o devido cruzamento de dados batendo com o cliente em sua declaração, tudo é lícito, pois o advogado terá de declarar a Receita Federal o custo de seu serviço perante uma média estipulada pela OAB, por exemplo. Caso o cliente não declare, haverá um choque de informações, sendo este chamado para prestar esclarecimentos.

Se por exemplo, o serviço custa X e ele paga 10X, há uma presunção, e depois o advogado faz um “empréstimo” de 9X ao cliente, nesse caso se vê o animus de lavar dinheiro e a contraprestação do valor branqueado, lícito, limpo. Não precisa nem o serviço ser prestado, pode-se fazer uma simulação da atuação, apenas para fins de declaração para Receita Federal.

Mesmo em se tratando de valores de origem espúria de que tenha consciência o advogado, não se deve olvidar que um dos efeitos da condenação é a perda em favor da União dos bens, direitos e valores do objeto de crime previsto nessa lei, ressalvado o direito do lesado ou terceiro de boa-fé.

4. OPERAÇÃO LAVA JATO

A Operação Lava Jato, deflagrada em março de 2014 pela Polícia Federal, apura um gigantesco processo sobre lavagem de dinheiro e desvios envolvendo a Petrobras, construtoras e políticos.

A perda é estimável em R$ 19 bilhões de reais de prejuízo para a estatal, pois segundo o Ministério Público Federal – MPF, as empreiteiras elaboravam um cartel para combinar preços de obras para Petrobras, fazendo os contratos serem superfaturados, sendo uma parte para pagar a propina de gerentes e diretores da estatal e outros agentes públicos para conseguir fechar contratos e transações.

A operação recebeu esse nome devido ao uso de uma rede de lavanderias e postos de combustíveis pela quadrilha para movimentar os valores de origem ilícita, supostamente, desde 1997. 

A denúncia inicial partiu do empresário Hermes Magnus, em 2008, quando o grupo de acusados tentou lavar dinheiro na sua empresa Dunel Indústria e Comércio, fabricante de máquinas e equipamentos para certificação. A partir da denúncia inicial, foram empreendidas diligências investigativas que culminaram com a identificação de quatro grandes grupos criminosos, chefiados por Carlos Habib Chater, Alberto Youssef, Nelma Mitsue Penasso Kodama e Raul Henrique Srour.

As primeiras prisões foram do doleiro Alberto Youssef, com antecedentes criminais no caso do Banestado, maior escândalo já investigado no Brasil sobre remessas ilegais de dinheiro e logo em seguida do Paulo Roberto Costa, ex diretor do abastecimento da Petrobras, investigado pela Polícia Federal por receber um automóvel de luxo por Youseff em 2013.

Depois da ouvida dos depoimentos dos condenados, as investigações conseguem captar uma rede de relacionamento entre Youseff, Petrobras, empreiteiras e políticos. O primeiro político a ser investigado é o deputado André Vargas, do partido do PT por São Paulo, que pegou carona no jatinho de Youseff.

Paulo Roberto Costa e Youseff realizaram junto ao MPF acordos de delação premiada para prestarem esclarecimentos que conduzam à apuração das infrações penais em troca da atenuação da pena.

Em uma dessas delações foi constada a existência de um esquema de pagamento de propina em obras da estatal por parte de construtoras e que o dinheiro abastecia os caixas de partidos como o PT, PMDB e PP.

São alvos de ações de investigação as empreiteiras: Odebrecht, Andrade Gutierrez, Camargo Corrêa, UTC, Mendes Júnior, Engevix, OAS e Galvão Engenharia. Respondem a ações civis públicas a Galvão Engenharia, Galvão Participações, Sanko Sider, Coesa Engenharia, Jackson Empreendimentos, Mendes Júnior Participações, Mendes Júnior Trading e Engenharia e OAS.

O crime é da competência federal por envolver interesse da União, a estatal nacional Petrobras e por se tratar de infração penal contra o sistema financeiro e a ordem econômico-financeira, como bem salienta os artigos 109, I, da Constituição Federal e art. 2, III, a, da Lei n° 9.613/98, sendo o magistrado federal responsável o juiz Sergio Moro, referência no julgamento de crimes financeiros.

Os membros do Congresso Nacional, deputados e senadores, serão julgados pelo Supremo Tribunal Federal - STF nas infrações penais comuns, como bem salienta o artigo 102, I, b, da CF, por se tratar de agentes com foro privilegiado por prerrogativa de função.

O Procurador Geral da República - PGR, Rodrigo Janot, requereu ao STF uma lista com 28 pedidos de inquéritos políticos envolvidos com o esquema de corrupção na Petrobras.

O Ministro Teori Zavascki, relator do processo relativo à Operação Lava Jato, autorizou a abertura de todas as investigações, envolvendo ao todo mais de 50 políticos de seis partidos: PT, PSDB, PMDB, PP, SD e PTB.

Com o regular processamento do feito, é preso o ex-diretor da Petrobras Nestor Cerveró, uma vez que o MPF solicitou sua prisão preventiva tendo em vista as fortes suspeitas que o mesmo continua a praticar crimes ocultação de produtos provenientes de crimes no exterior e transferência de bens para familiares.

Em nova fase, começa a se expedir ordem de prisões contra os políticos: André Vargas; ex-deputado Luiz Argôlo, ex-PP; ex deputado Pedro Correa, PP-PE; João Vaccari Neto, ex tesoureiro do PT; se expandindo a investigação para crimes na Caixa Econômica Federal – CEF e no Ministério da Saúde.

4.1. FASES DA INVESTIGAÇÃO

Na primeira fase da operação, em 17 de março de 2014, a Polícia Federal cumpriu mandados de prisão temporária e preventiva de várias pessoas em 7 Estados, entre eles, Alberto Youssef. Foram apreendidos R$5 milhões em dinheiro e 25 carros de luxo, joias, quadros e armas.[29]

Na segunda fase, se descobre a ligação do ex-diretor de Refino e Abastecimento da Petrobras, Paulo Roberto Costa, com o doleiro Youssef. O ex-diretor chegou a destruir documentos que poderiam servir como provas no inquérito o que fez com que a investigação sobre suspeitas de fraudes em contratos da Petrobras fosse o foco principal da operação.[30]

Na terceira fase, em 11 de abril de 2014, a Polícia Federal cumpre 16 mandatos de busca, 3 de prisões temporárias e 6 de conduções coercitivas. O candidato Luiz Argôlo é acusado de manter relacionamento de promiscuidade financeira com Youssef.[31]

Na quarta fase, é realizada uma nova prisão preventiva de Paulo Roberto Costa, que se encontrava em liberdade, posteriormente, graças ao acordo de delação premiada é liberado e cumpre regime de prisão domiciliar no Rio de Janeiro.[32]

Na quinta fase, a Polícia Federal executa 7 mandatos de busca, 1 mandato de prisão temporária e 1 de condução coercitiva. O preso foi um sócio de Youssef, o executivo João Procópio Junqueira Pacheco de Almeida Prado, por gerenciar na Suíça contas do doleiro. Através de pedido de cooperação internacional, foi bloqueado R$ 5 milhões em contas na Suíça.[33]

Na sexta fase, a Polícia Federal cumpre no Rio de Janeiro 11 mandados de busca e apreensão e um de condução coercitiva. Essas mandados visaram empresas e pessoas próximas ao ex-diretor da Petrobras, Paulo Roberto Costa.[34]

Na sétima fase, novembro de 2014, foram presos os executivos ligados a empreiteiras que firmaram contratos com a Petrobras considerados irregulares, presidentes e diretores de grandes empresas do Brasil como: OAS, IESA Óleo & Gás, CAMARGO Corrêa Construções, UTC Engenharia, Engevix e Construtora Queiroz Galvão.[35]

De acordo com as investigações, o esquema de corrupção na Petrobras funcionava de forma organizada. As empreiteiras organizadas em cartel, conhecido como “clube”, fraudavam licitações, escolhendo qual delas venceria determinada concorrência, para isso, pagavam propina aos dirigentes.

Na oitava fase, 14 de janeiro de 2015, a Polícia Federal cumpriu um mandado de prisão preventiva contra o ex-diretor da área internacional da Petrobras, Nestor Cerveró, acusado de estar se desfazendo de patrimônio com origem ilícita.[36]

Na nona fase, 5 de fevereiro de 2015, batizada de My Way, referência ao modo como o ex-gerente da Petrobras, Pedro Barusco, investigado, chamava o ex-diretor da estatal Renato Duque. A polícia Federal cumpriu 62 mandados de busca e apreensão, prisões temporárias e preventivas e conduções coercitivas em busca de operadores que atuaram na intermediação no pagamento de vantagens ilícitas no âmbito da Petrobras.[37]

Durante essa fase foram apreendidas na casa de Zwi Skornicki quarenta e oito obras de arte que foram levadas para o Museu Oscar Niemeyer. Zwi Skornicki é apontado como um dos operadores do esquema de corrupção.

O tesoureiro do PT, João Vaccari Neto, foi alvo de um mandado de condução coercitiva. Gilson Pereira, sócio proprietário da empresa Arxo, João Gualberto Pereira, um dos proprietários e Sérgio Marçaneiro, diretor financeiro da empresa, foram presos nessa etapa. Mário Goes, suspeito de ser um dos operadores do esquema de pagamento de propina, também foi preso.

Na décima fase, 16 de março de 2015, denominada de “Que País é Este?”, em razão da frase dita por Renato Duque ao seu advogado ao ser preso pela Polícia Federal em novembro de 2014, por possuir contas secretas na Suíça no valor de 20 milhões de euros, esvaziados posteriormente, e transferidas para o Principado de Mônaco. Foram apreendias 131 obras de arte na casa do ex-diretor.[38]

A Polícia Federal prendeu em São Paulo, o empresário Dário Queiroz Galvão, sócio da Galvão Engenharia. No Rio de Janeiro foi preso o operador Guilherme Esteves de Jesus, um dos operadores investigados na My Way, por pagar propina a mando do estaleiro Jurong. Os dois foram alvos de mandados de prisão preventiva, sem prazo para expirar e foram levados para a sede da Policia Federal em Curitiba.

No dia 8 de abril de 2015, a justiça sequestrou R$163,5 milhões da empresa Queiroz Galvão, valor referente ao crédito de precatórios da empreiteira junto ao estado de Alagoas.

Na décima primeira fase, 10 de abril de 2015, se iniciou a fase chamada de “A Origem”cumprindo 32 mandados, sendo 7 de prisão, 16 de busca e apreensão e 9 de condução coercitiva. Foram presos preventivamente os ex-deputados: André Vargas, Luiz Argôlo e Pedro Corrêa.[39]

Na décima segunda fase, 15 de abril de 2015, A Polícia Federal deu início a uma nova fase com dois mandados de prisão, um de condução coercitiva e um de busca e apreensão em São Paulo. João Vaccari Neto, tesoureiro do PT foi preso. Os investigadores detectaram vários depósitos suspeitos nas contas da esposa, Gisela Lima, e da cunhada, Marice Correa de Lima, que, segundo o procurador Carlos Fernando dos Santos Lima, são indícios de lavagem de dinheiro.[40]

Na décima terceira fase, 21 de maio de 2015, Milton Pascowitch, apontado como operador do esquema foi preso em São Paulo. De acordo com o ex-gerente da Petrobras, Pedro Barusco, Pascowitch está envolvido como operador de pagamento de propina oriunda de contratos da estatal. De acordo com o Ministério Público Federal – MPF, a empresa JD Consultoria, de José Dirceu, recebu mais de R$ 1,4 milhões em pagamento da Jamp Engenheiros Associados Ltda, empresa que pertence a Milton Pascowitch.[41]

Na décima quarta fase, 19 de junho de 2015, apelidada de Erga Omnes, expressão em latin equivalente a “vale para todos”. A Polícia Federal prendeu nesta fase os presidentes da Odebrecht, Marcelo Odebrecht, e Otávio Azevedo, da Andrade Gutierrez. Os diretores da Odebrecht, Marcio Faria, Rogério Araújo e Alexandrino Alencar e da Andrade Gutierrez, Paulo Dalmaso e Elton Negrão, também foram presos.[42]

Na décima quinta fase, 2 de julho de 2015, chamada de “Conexão Mônaco”investigou crimes de corrupção, fraude de licitações, desvio de verbas públicas, evasão de divisas e lavagem de dinheiro. O ex-diretor internacional da Petrobras, Jorge Zelada, sucessor de Nestor Cerveró entre 2008 e 2012 na área internacional da Petrobras, foi preso em Niterói, Rio de Janeiro, em razão da movimentação no Principado de Mônaco de mais de 10 milhões de euros, equivalente a R$ 34, 5 milhões de reais, em recursos obtidos com a origem ilícita de propinas nos negócios da empresa.[43]

Em 14 de julho de 2015, a Polícia Federal realizou a “Operação Politeia”, em referência ao livro “A República de Platão”, que descreve uma cidade perfeita onde a ética prevalece sobre a corrupção. Envolveram 53 mandados de busca e apreensão em casa de políticos envolvidos no esquema de corrupção da estatal, entre eles os senadores: Fernando Collor, PTB-AL, que teve três carros de luxo apreendidos: uma Ferrari, um Porsche e uma Lamborghini; Fernando Bezerra Coelho, PSB-PE; e Ciro Nogueira, PP-PI; o deputado federa Eduardo da Fonte, PP-PE; além do ex-ministro das Cidades, Mário Negromonte, PP-BA e o ex-deputado federal João Pizzolatti, PP-SC.

Na décima sexta fase, 28 de julho de 2015, denominada de “Radioatividade”, cumpriu 30 mandados judiciais em 5 cidades, sendo objeto de apuração a formação de cartel e o prévio ajustamento de licitações nas obras de Angra 3 e o pagamento de vantagens financeiras indevidas a empregados da Eletronuclear, por isso o nome referente a radioativo. Foi decretado a prisão de Othon Luiz Pinheiro da Silva, ex-diretor presidente da Eletronuclear e Flávio David Barra, presidente da global AG energia.[44]

Na décima sétima fase, 03 de agosto de 2015, batizada de “Pixuleco”, por ser este o termo que o ex-tesoureiro do PT, João Vaccari Neto usava quando se referia à propina. A Polícia Federal cumpriu 40 mandados judiciais, sendo 3 de prisão preventiva 5 de prisão temporária, 26 de busca e apreensão e 6 de condução coercitiva.

O ex-ministro da Casa Civil, José Dirceu, juntamente com seu irmão, Luiz Eduardo de Oliveira e Silva, o ex-assessor de Dirceu, Roberto Marques e o dono da empresa de informática Consist, Pablo Kipersmit, foram presos na operação.[45]

Na décima oitava fase, 13 de agosto de 2015, chamada de “Operação Pixuleco II”, cerca de 70 policiais federais cumpriram mandados de busca e apreensão em Brasília, São Paulo, Porto Alegre e Curitiba. O ex-vereador do PT de Americana, interior de São Paulo, Alexandre Correa de Oliveira Romano foi preso, suspeito de operar no esquema de corrupção para arrecadar vantagens indevidas superiores a R$ 50 milhões, sendo os pagamentos realizados por empresas de fachada.[46]

Na décima nona fase, 21 de setembro de 2015, batizada de Nessum Dorma, ninguém dorme, foram cumpridos 11 mandados judiciais, sendo um de prisão temporária, um de preventiva, sete de busca e apreensão e dois de condução coercitiva em Florianópolis, São Paulo e Rio de Janeiro. A fase revelou João Augusto Rezende Henrique como um novo operador supostamente ligado ao PMDB e foi realizada a prisão preventiva do executivo José Antunes Sobrinho, sócio-diretor da Engevix, por suspeita de ter pagado propina em cima de contratos da empreiteira com a Eletronuclear que somavam R$140.000.000,00 (cento e quarenta milhões de reais).

Na vigésima fase, o procurador geral da república, Rodrigo Janot, oficializa o processo por suspeita de corrupção ativa e lavagem de dinheiro contra o presidente da Câmara dos Deputados Eduardo Cunha e o senador Fernando Collor. Em delação premiada, o ex-gerente da Petrobras Eduardo Musa afirmou que Cunha tinha o poder de decisão ma escolha da diretoria da área Internacional da estatal. Denunciado ao Conselho de Ética por mentir ao dizer que não possuía contas na Suíça no vaor de U$ 2,4 milhões de dólares, cerca de R$ 9 milhões de reais, em sessão da CPI da Petrobras, Cunha pode perder o mandato em um eventual processo de cassação.

4.2. ANÁLISE CRÍTICA

Para uma melhor compreensão do tema, se preferiu por dividir em subtópicos as principais críticas da atuação do Juiz Sergio Moro na condução do processo sobre a Operação Lava Jato.

4.2.1. COMPETÊNCIA

O Juiz Federal Sergio Moro, especialista em crimes financeiros e no combate à lavagem de dinheiro, atua exclusivamente na condução dos processos ligados ao maior esquema de corrupção descoberto no Brasil, já julgou diversos casos com a respeito de crimes contra o colarinho branco como, por exemplo, o caso do Banestado e a Operação Farol da Colina.

Um dos principais questionamentos que o Juiz Sergio Moro recebe é com relação a sua competência referente à Operação Lava Jato, pois se alega que a competência para julgar o caso não é da Justiça Federal de Curitiba, por se tratar de crimes que ocorreram no âmbito da Petrobras que tem sede no Rio de Janeiro.

Segundo o criminalista Antônio Carlos de Almeida Castro[47]:

Boa parte dos autos que estão em Curitiba (base da Lava Jato) não tem que estar lá. O Código de Processo Penal é nacional, não existe um Código de Processo Penal do Paraná. O ministro Dias Toffoli (STF) foi muito feliz ao dizer que a concentração de todas as investigações na Justiça Federal do Paraná significa dizer que os juízes federais do Brasil inteiro não têm crédito. É óbvio que muita coisa não deveria estar no Paraná.

Segundo Luiz Flávio Borges D´Urso[48] que sustenta a incompetência do Juiz Sergio Moro desde o início das investigações:

A competência, fundamentalmente, tem que ser territorial, pelo que vemos a Lava Jato tem uma série de situações no Rio, outras em São Paulo. Não há razão para que tudo fique concentrado no Paraná. Até agora nossa tese não teve sucesso, mas com a decisão do Supremo abre-se um caminho.

Segundo o Desembargador Federal aposentado do TRF da 4° região, Vladimir Passos de Freitas, o motivo para todos os fatos estarem sendo processados na Justiça Federal em Curitiba/PR seria o fato da investigação que começou em 2013 ter se originado de uma acusação de crimes praticados contra a administração pública e lavagem de dinheiro, na cidade de Londrina/PR, na qual foram denunciados Carlos Habib Chater, Alberto Youseff e outros.

A partir desta investigação, através de interceptações telefônicas, começaram a aparecer outros fatos, de igual ou maior gravidade. E, entre as pessoas envolvidas, surgiu Paulo Roberto Costa, então ocupando o elevado cargo de Diretor da Petrobrás.

Sendo os fatos conexos, acabaram, por prevenção, sendo denunciados  sempre para a mesma Vara, conforme artigos 76, 78, “c” e 79 do Código de Processo Penal. Prevenção nada mais é do que uma regra de bom senso, significa que se os fatos são conexos, relacionados entre si, devem ser julgados por um só juiz, evitando-se decisões conflitantes.

Quando ocorre a conexão, a Justiça Federal tem poder de atração para julgar todos, assim é o entendimento pacificado pelo antigo TFR e STJ:

Súmula 52 do antigo Tribunal Federal de Recursos – Compete à Justiça Federal o processo e julgamento unificado dos crimes conexos de competência federal e estadual, não se aplicando a regra do art. 78, II, a, do Código de Processo Penal.

Súmula 122 do Superior Tribunal de Justiça – Compete à Justiça Federal o processo e julgamento unificado dos crimes conexos de competência federal e estadual, não se aplicando a regra do art. 78, II a do Código de Processo Penal.

Quando surge algum agente suspeito na investigação com prerrogativa de função, ratione personae, a competência é originária de certos órgãos superiores de jurisdição como o STF ou STJ nos casos de crimes comuns e do Senado Federal ou da assembleia legislativa de cada Estado nos casos de crimes de responsabilidade:

Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe:

I - processar e julgar, originariamente:

b) nas infrações penais comuns, o Presidente da República, o Vice-Presidente, os membros do Congresso Nacional, seus próprios Ministros e o Procurador-Geral da República;

c) nas infrações penais comuns e nos crimes de responsabilidade, os Ministros de Estado e os Comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica, ressalvado o disposto no art. 52, I, os membros dos Tribunais Superiores, os do Tribunal de Contas da União e os chefes de missão diplomática de caráter permanente;(Redação dada pela Emenda Constitucional nº 23, de 1999)

d) o habeas corpus, sendo paciente qualquer das pessoas referidas nas alíneas anteriores; o mandado de segurança e o habeas data contra atos do Presidente da República, das Mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, do Tribunal de Contas da União, do Procurador-Geral da República e do próprio Supremo Tribunal Federal;

Art. 105. Compete ao Superior Tribunal de Justiça:

I - processar e julgar, originariamente:

a) nos crimes comuns, os Governadores dos Estados e do Distrito Federal, e, nestes e nos de responsabilidade, os desembargadores dos Tribunais de Justiça dos Estados e do Distrito Federal, os membros dos Tribunais de Contas dos Estados e do Distrito Federal, os dos Tribunais Regionais Federais, dos Tribunais Regionais Eleitorais e do Trabalho, os membros dos Conselhos ou Tribunais de Contas dos Municípios e os do Ministério Público da União que oficiem perante tribunais;

c) os habeas corpus, quando o coator ou paciente for qualquer das pessoas mencionadas na alínea "a", ou quando o coator for tribunal sujeito à sua jurisdição, Ministro de Estado ou Comandante da Marinha, do Exército ou da Aeronáutica, ressalvada a competência da Justiça Eleitoral;(Redação dada pela Emenda Constitucional nº 23, de 1999)

Art. 52. Compete privativamente ao Senado Federal:

I - processar e julgar o Presidente e o Vice-Presidente da República nos crimes de responsabilidade, bem como os Ministros de Estado e os Comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica nos crimes da mesma natureza conexos com aqueles; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 23, de 02/09/99)

II processar e julgar os Ministros do Supremo Tribunal Federal, os membros do Conselho Nacional de Justiça e do Conselho Nacional do Ministério Público, o Procurador-Geral da República e o Advogado-Geral da União nos crimes de responsabilidade; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004)

Tendo em vista a prerrogativa de função ou foro privilegiado, o Supremo Tribunal Federal preferiu separar um dos desdobramentos da Operação Lava Jato na qual foi encontrado indícios de participação da senadora Gleisi Hoffmann, PT/PR, em fraude no Ministério do Planejamento.

Segundo Fernando da Costa Tourinho Filho[49], a prerrogativa de função não se trata de um privilégio, mas de uma garantia, de elementar cautela, para amparar, a um só tempo, o responsável e a justiça, evitando, por exemplo, a subversão da hierarquia, e para cercar o seu processo e julgamento de especiais garantias, protegendo-os contra eventuais pressões que os supostos responsáveis pudessem exercer sobre os órgãos jurisdicionais inferiores.

A decisão do STF abre um precedente para todos os casos apurados pelo Juiz Sergio Moro na Operação Lava Jato que não estejam diretamente relacionado à Petrobras sejam desmembrados.

Segundo Rodrigo Janot, Procurador Geral da República, que defende a manutenção da investigação da senadora Gleisi e das fraudes no Planejamento com Zavascki e com Moro:

A Procuradoria analisa uma organização com vários ramos, o que exige a concentração das ações com um mesmo magistrado. Existe uma operação de mesma maneira, mesmo atores, mesmos operadores econômicos... Não estamos investigando empresas nem delações mas uma enorme organização criminosa que se espraiou para os braços do setor público.

Devido ao fato que o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, ter sido citado em delação premiada no esquema de corrupção envolvendo a Petrobras, sua defesa elaborou uma Reclamação[50], solicitando a avocação do processo para o STF e a anulação de todos os atos que nele já foram praticados pelo Juiz Sergio Moro.

Pois, quando um parlamentar é acusado da prática de crime comum, a competência para julgamento de todos os envolvidos no processo, mesmo que alguns não tenham a garantia do foro por prerrogativa de função, passa a ser exclusiva do STF, pois é o chamado princípio da atração, a presença do maior, parlamentar que possui o foro privilegiado, atrai os menores.

O fato de alguns dos réus não possuírem tal foro não afasta a legalidade da decisão conjunta no Supremo, esse entendimento já é pacificado e materializado na Súmula 704do STF que afirma que não viola as garantias do Juiz Natural, da ampla defesa e do devido processo legal a atração por continência ou conexão do processo do corréu ao foro por prerrogativa de função de um dos denunciados.

O termo da declaração pelo delator é suficiente para deslocar a competência da 13ª Vara Federal do Paraná para o STF? Existe precedente no processo da Lava Jato que a competência do Juiz Sergio Moro não foi deslocada para outra instância, por exemplo, no caso do ex-diretor de abastecimento da Petrobras, Paulo Roberto Costa, quando prestou depoimento e afirmou ter arrecadado R$ 30 milhões para o “caixa 2 ou dinheiro não contabilizado” da campanha de Cabral e Pezão ao governo no Rio em 2010.

A procuradoria Geral da República protocolou 2 pedidos de abertura de inquérito no STJ, foro competente para processar e julgar governadores, no caso, Luiz Fernando Pezão, atual governador do Estado do Rio de Janeiro. Com a instauração do inquérito, Pezão e Cabral estão sendo investigados pelo STJ sob a relatoria do Ministro Luis Felipe Salomão, sendo esse um precedente análogo à situação de Eduardo Cunha, sem se deslocar a competência de Sergio Moro com o regular processamento do feito no tocante aos demais réus.

O juiz Sergio Moro manifestou a seguinte opinião sobre o tema:

Não vislumbro com facilidade que o Supremo Tribunal Federal seria competente para a presente ação penal, pois o deputado federal Eduardo Cunha não foi denunciado no presente processo, que tem seu objeto restrito ao pagamento de propina a Nestor Cerveró, ex-diretor da Petrobrás, e que não tem foro privilegiado. Não se cogita, no objeto da denúncia, em propina a qualquer parlamentar.

 Esta ação penal não tem por objeto crime de corrupção passiva de parlamentar, mas sim do ex-diretor da Petrobrás Nestor Cerveró, e o eventual envolvimento do deputado federal Eduardo Cunha no recebimento de valores já é objeto de inquérito perante o Supremo Tribunal Federal e que não se confunde com essa ação penal.

Apenas supervenientemente veio a este Juízo conhecimento do depoimento de Alberto Youssef no qual ele cita o deputado federal Eduardo Cunha, cópia deste mesmo depoimento foi encaminhado a este juízo após cisão processual.

Esta pesquisa se posiciona no sentindo de ser competente o Juiz Sergio Moro, tendo em vista que a investigação se iniciou em 2013 com uma denúncia de crime praticado contra a Administração Pública na cidade Londrina/PR e a partir daí surgiram novos fatos, como o envolvimento de Paulo Roberto Costa, diretor da Petrobras, vindo a se descobrir posteriormente todo o esquema de corrupção ligado a estatal que pelo instituto da conexão foi feito a união dos processos.

4.2.2. DELAÇÃO PREMIADA

Uma das maiores objeções por parte dos defensores é a utilização do instituto da delação premiada, instrumento que garante benefícios aos colaboradores em troca de informações. Os advogados afirmam que prisões e sentenças foram baseadas apenas em depoimentos. O MPF e Moro sustentam que os atos ilícitos apontados estão fundamentados, também, em provas documentais.

A origem histórica do instituto remonta ao assassinato do juiz Giovanni Falcone pela máfia, em 1992, em Palermo, Itália. O ocorrido ocasionou a Convenção de Palermo em 2000 com o objetivo de combater o crime organizado transnacional. A delação premiada veio logo em seguida, 2003, com a Convenção de Mérida.

Só foi introduzida no ordenamento jurídico brasileiro com a lei 12.850/2013, a partir do artigo 4°, com o nome de colaboração premiada.

Como já anteriormente afirmado, a lei de lavagem de dinheiro inova quanto à possibilidade de delação premiada, pois no geral a ‘premiação’ é a diminuição da pena de 1 (um) a 2/3 (dois terços), dessa forma o delator continuava a cumprir a pena com possibilidade de ser no mesmo presídio de seus comparsas, que acabavam matando-o por considerar traição uma pena punida com a morte.

Dessa forma, como não havia estímulo para o delator, o legislador estipula três possibilidades distintas de premiação: causa de diminuição de pena e fixação do regime inicial aberto; causa de substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direito; perdão judicial como causa extintiva da punibilidade, porém, há a necessidade que seja voluntária e que colabore efetivamente com as investigações, possuindo o instituto uma natureza híbrida.

Lenio Luiz Streck[51] e outros críticos sustentam que a forma de condução processual é questionável na forma de obtenção das delações premiadas, pois a ferramenta não possui nenhum valor se não for comprovada por outros meios de provas, art. 4, §16 da Lei 12.850/2013.

Segundo Sergio Moro:

Não se prende com o objetivo de alcançar confissões. Prende-se quando estão presentes os pressupostos de decretação de uma prisão antes do julgamento. Caso isso ocorra, não há qualquer óbice moral em tentar-se obter do investigado ou do acusado uma confissão ou delação premiada, evidentemente sem a utilização de qualquer método interrogatório repudiado pelo Direito. O próprio isolamento do investigado faz-se apenas na medida em que permitido pela lei. O interrogatório em separado, por sua vez, é técnica de investigação que encontra amparo inclusive na legislação pátria (art. 189, Código de Processo Penal).

Você utilizar um criminoso contra os seus pares é uma técnica de investigação. Existem problemas, sim, mas é uma técnica de investigação que segue um critério puramente pragmático.

Muitas vezes, a única pessoa que pode revelar os crimes são os próprios criminosos. Os crimes, normalmente, não são cometidos em conventos, você não pode chamar a freira para depor como testemunha, e nem são cometidos no céu, você não pode chamar os anjos. Então, vocês vão chamar criminosos para testemunhar contra seus pares. Se esse é o meio necessário para se pegar o grande chefe, se é necessário fazer um acordo, então esse é um caminho possível de ser percorrido.

Paulo Roberto Costa foi o primeiro a confessar e se beneficiar com o sistema da delação premiada, fornecendo dados sobre a participação de todos os envolvidos nas operações fraudulentas, em troca da prisão domiciliar e pena reduzida, após ele se seguiram 22 delações até o presente momento dessa pesquisa, tornando as tramas visíveis e possíveis de ser apuradas através de outras provas.

Esta pesquisa não teve acesso ao mérito das delações premiadas, apenas pode se expor as críticas com relação à atuação do magistrado e seus argumentos de defesa apoiados pelo Ministério Público Federal que afirma que foram inteiramente preenchidos os requisitos.

4.2.3. PRISÕES CAUTELARES

Os críticos alegam que há uma verdadeira antecipação da pena, já que alguns réus ficaram mais de 5 meses atrás das grades antes de qualquer sentença transitada em julgado, sendo o magistrado acusado por advogados de manter executivos em prisão preventiva como forma de forçar acordos de delação premiada, como uma forma de resposta à sociedade que cobra o Judiciário e almeja punições.

A 2° Turma do STF já considerou irregular a prisão preventiva do ex-diretor da Petrobras Renato Duque e enviou para regime domiciliar nove acusados por falta de fundamentação das prisões.

O próprio TRF 4º derrubou prisões decretadas por Moro com base em notícias de jornais sobre o encontro de advogados de empresas investigadas com o Ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo.

Segundo o Ministro Rogério Schietti que integra a 6º turma do STJ:

Não pode mais prender alguém cautelarmente antes da sentença, simplesmente pela gravidade abstrata do crime. Essa é uma orientação básica que todos deveriam seguir.

A prisão é uma exceção à regra. A regra é a liberdade. Entretanto, a regra tem sido contrariar a orientação do Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal. Se os tribunais e juízes passassem a dar um pouco mais de atenção a cada caso, de modo a que não desse margem a tantos recursos, a situação estaria muito melhor, é uma resistência irracional, pouco explicável.

A utilização de forma inadequada da prisão provisória, além de ferir as garantias constitucionais dos acusados, agrava a situação delicada do sistema carcerário brasileiro, aumentando a superlotação, que financia facções criminosas, deteriora as condições dos detentos, entre outras.

Discute-se também a aplicabilidade das medidas cautelares diversas da prisão, art. 319 do Código de Processo Penal, com o objetivo de se evitar ao máximo as penas de prisão antes do trânsito em julgado da sentença.

Em entendimento contrário, a Associação dos Juízes Federais – AJUFE manifestou em nota pública total apoio a Moro, afirmando que não admite alegações genéricas e infundadas que as prisões decretadas na Operação Lava Jato violariam direitos e garantias fundamentais dos cidadãos, pois as decisões do magistrado a quo são tomadas com a devida fundamentação, em consonância com o ordenamento jurídico vigente e com base no devido processo legal.

Ademais, a AJUFE salienta que as medidas cautelares aplicadas antes do trânsito em julgado do processo criminal, estão sendo tomadas quando presentes os pressupostos e requisitos legais, sendo ínfima a quantidade de decisões reformadas pelas instâncias superiores.

Seguindo o mesmo entendimento da AJUFE, os procuradores da república que atuam na força tarefa da Operação Lava Jato também manifestaram apoio ao magistrado em nota à imprensa:

Ao contrário do que sugere a advogada, os acordos de colaboração premiada são de responsabilidade do Ministério Público Federal, não do juiz. O número de colaborações no presente caso decorre de vários fatores, sobretudo da robustez das provas em relação aos investigados, da experiência prévia dos procuradores com essa técnica de investigação e estratégia de defesa, desenvolvida no caso Banestado; mas principalmente do interesse público envolvido em seu emprego, dadas as peculiaridades do crime de corrupção e a sofisticação das técnicas de lavagem empregadas. O argumento de que prisões foram usadas para obter colaborações não tem qualquer base na realidade, pois mais de dois terços das colaborações foram feitas com réus soltos, fato que a advogada que atua no feito não deve desconhecer.

Diante do exposto, a procuradoria defende que as prisões não foram utilizadas de forma forçada para se obter as delações premiadas, pois mais de 2/3 das colaborações foram feitas com réus soltos.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A origem do crime de lavagem remonta aos Estados Unidos em 1920 com as lavanderias de fachada mantidas pelos criminosos e à Itália em 1978.

Essa pesquisa procurou estudar as formas de tipificação e punição nos ordenamentos jurídicos estrangeiros para uma melhor compreensão do ilícito e suas formas de combate pelo mundo.

No Brasil, o ilícito é tipificado pela Lei n° 9.613/98 que passou por profundas alterações com a vigência da Lei n° 12.683/12, que extinguiu o rol taxativo dos crimes antecedentes passando a ser enquadrado qualquer infração penal como crime antecedente no delito de lavagem de dinheiro.

Trata-se de um crime comum, punido somente quando não for considerado um mero desdobramento natural consequente da conduta anterior, classificado como crime permanente cuja consumação se perdura ao longo do tempo, necessitando do elemento específico dolo, animus de lavar, conduta de inserir no mercado ativos financeiros provenientes do meio ilícito para dar a aparência de licitude.

A pesquisa optou por detalhar as ramificações que auxiliam o delito de lavagem, como os chamados paraísos fiscais, países que tributam a renda com alíquota inferior a 20% na categoria de offshores, segundo classificação da Receita Federal do Brasil; a alta lucratividade do narcotráfico e a necessidade de branquear o volumoso ativo financeiro.

O papel fundamental dos bancos internacionais como intermediadores das operações transnacionais, fazendo o capital transitar até a chegada ao mercado; a questão do sigilo bancário absoluto que protege a identidade dos proprietários com a não vinculação das contas.

Sobre a constitucionalidade do art. 6° da Lei Complementar 105/2001, a pesquisa se posiciona no sentido de ser permitida ao fisco a possibilidade de quebra do sigilo bancário sem a necessidade do Poder Judiciário, uma vez que não haveria uma quebra propriamente dita, mas sim uma transferência do sigilo para outra autoridade.

Detalhou-se a figura da cooperação internacional já na concepção do novo Código de Processo Civil como forma de resolução dos litígios no âmbito internacional e o papel das organizações criminosas como financiadoras do terrorismo.

Estudaram-se os primórdios da Operação Lava Jato, uma das maiores investigações sobre corrupção conduzidas até hoje no Brasil que movimentou bilhões de reais, que para um melhor entendimento preferiu-se dividir o procedimento em fases.

Analisou-se as principais críticas enfrentadas pelo Juiz Sergio Moro, magistrado responsável pela condução processual da Operação Lava Jato, como a questão da competência, delação premiada e as prisões cautelares. A pesquisa defende o Juiz Sergio Moro como juiz natural competente para o caso que se originou de uma acusação em Londrina/PR, sendo os demais unidos em razão da conexão dos processos.

Quanto à questão da delação premiada, não se pode debruçar com relação ao mérito por carência de informações e necessidade de vista dos autos, apenas pode-se expor os questionamentos por parte de criminalistas e as posições defendidas por Moro sob o apoio do Ministério Púbico Federal – MPF.

Quanto à questão das prisões cautelares, a pesquisa segue a linha de entendimento de preferir a utilização das demais medidas cautelares diversas da prisão, tendo em vista o agravamento da superlotação do sistema carcerário e a redução de gastos pelo Estado com os custos dos detentos, servindo a pena privativa de liberdade como ultima ratio.

Não se pode apreciar o mérito da fundamentação e dos requisitos das prisões preventivas e provisórias por ausência de maiores informações e dos autos do Processo. É importante salientar que a Associação dos Juízes Federais – AJUFE e os Procuradores da República apoiam o Juiz Sergio Moro no tocante ao inteiro preenchimento dos requisitos para sua decretação.

Diante de todo exposto, pode-se concluir que a corrupção é inerente ao ser humano. Sempre existiu e sempre existirá. O objetivo primordial a ser alcançando é a sua restrição ao mínimo possível. Nesse ínterim, ações penais como a Operação Lava Jato trazem em seu bojo uma significativa contribuição pelo poder intimidatório que causa aos políticos e empresários, com a possibilidade, inclusive, de serem punidos com penas privativas de liberdade.

A Operação Lava Jato está no seu início, ainda há muito a ser apurado. Pode-se presenciar uma ruptura da cultura de aceitação e tolerância com a corrupção, gestão política e administrativa fundamentada em acordos ilícitos com a falsa aparência de licitude e momento de criação de uma nova cultura no país de boa-fé e justiça.

Infelizmente, trata-se de um fenômeno cultural, sociológico e político, que representa a sociedade do “jeitinho brasileiro”, marcada pela ardilosa arte do agir de maneira corrupta, da má-fé e de sempre querer se beneficiar em situações adversas.

6. REFERÊNCIAS

  1. Anais do Seminário, Aspectos Jurídicos e econômicos da Sonegação Fiscal, Instituto dos Magistrados dos Tribunais Superiores - IMTS, Escola de Magistratura Federal da 1º Região - ESMAF, Escola de Magistratura Regional Federal da 2° Região - EMARF, Escola de Magistrados da Justiça Federal da 3° Região - EMAG, Escola de Magistratura do Tribunal Regional Federal da 4° Região - EMAGIS, Escola de Magistratura Federal da 5° Região - ESMAFE, Editora Vozes, Rio de Janeiro, 2005.

2. Anuário da justiça federal, Consultor jurídico, São Paulo, 2016.

3. Assaf Neto, Alexandre, Mercado financeiro, 9. Ed. 2 reimpressão, São Paulo, Atlas, 2010.

4. Banco Central do Brasil, Cadastro de clientes, disponível em: < http://www.bcb.gov.br/pre/portalCidadao/cadsis/ccs.asp?idpai=PORTALBCB> acessado em: 31/08/2015.

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108. Wikipédia, Conselho de Controle de Atividades Financeiras, disponível em: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Conselho_de_Controle_de_Atividades_Financeiras> acessado em 23/08/2015.

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111. Wikipédia, Narcotráfico, disponível em: < https://pt.wikipedia.org/wiki/Narcotr%C3%A1fico> acessado em 27/08/2015.

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Sobre o autor
Filipe Reis Caldas

Advogado Tributarista. Bacharel em Direito pela Faculdade Marista. Pós-graduado em Direito Público pela Faculdade de Ciências Humanas e Exatas do Sertão do São Francisco - FACESF. Pós-graduando em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Estudos Tributários - IBET. Membro da Comissão de Assuntos Tributários da OAB/PE.

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Monografia apresentada à Faculdade Marista do Recife como parte das exigências para a obtenção do título de graduação. Orientador Prof.ª: Susana Araújo.

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