5 CONCLUSÃO
Expressão de origem colombiana, o ECI corresponde, ao mesmo tempo: a) à constatação de um cenário insustentável de lesões imensuráveis e generalizadas a direitos fundamentais de um considerável número de pessoas, decorrente de atos omissivos e comissivos de um conjunto de organismos públicos que conforma um sistema não apenas insuficiente, mas completamente arruinado e inócuo; e b) a uma nova ferramenta processual na jurisdição exercida no âmbito de Cortes Constitucionais no afã de suplantar as ruínas desse sistema aviltante.
No caso do sistema penitenciário brasileiro, as falhas estruturais saltavam aos olhos e, por essa razão, o STF reconheceu a vigência do ECI em 2015, após provocação do tema pelo PSOL. Por interferir em assuntos de natureza administrativa, orçamentária e eminentemente políticos, a decisão do Supremo foi reputada ilegítima e ativista.
Em última análise, a ideia dos críticos perpassa pela noção de que agentes públicos não eleitos e não submetidos ao crivo do voto popular estariam fazendo as vezes da política representativa, o que, para estes, colocaria em xeque os pilares da democracia brasileira. Ocorre que, em um Estado de Democracia Constitucional ou Estado Democrático de Direito, também ao Poder Judiciário deve ser outorgado um traço de representatividade, pois, segundo o parágrafo único do artigo 2º da Carta Magna, todo o poder do Estado emana do povo. Não havendo que se falar em prejuízo à democracia quando da utilização deste moderno modelo decisório, pois este acaba por reforçar os pilares de uma democracia incipiente e problemática.
Isso porque o ativismo judicial decorrente do reconhecimento do ECI promove a harmonização entre os poderes públicos em prol de algumas minorias deliberadamente ignoradas. Notadamente, isso exige uma remodelação do princípio da separação de poderes, sob pena de esvaziamento de direitos fundamentais. É dizer, este princípio não deve ser visto sob uma ótica rígida e meramente organicista. Aliás, atualmente, fala-se até em ativismo constitucional, pois, em nome da Carta Federativa, todo poder público deve adotar um perfil ativista na proteção dos direitos fundamentais.
Assim, em uma concepção dinâmica da separação de poderes, o ativismo judicial estrutural finca suas bases de legitimação democrática, máxime em razão do atual panorama político-representativo brasileiro, que é assaz defeituoso e seletivo. Esse ativismo estrutural consequente do ECI, portanto, assenta-se em ambientes de democracias atrofiadas. Dessa forma, na qualidade de guardião da dimensão constitucional da democracia, cabe ao STF reajustar os poderes públicos no caminho do respeito à dignidade humana, como última trincheira da cidadania.
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