Capa da publicação Liberdade de expressão da mídia X direito à honra
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Limites à liberdade de expressão e de informação da mídia face ao direito à honra de pessoas envolvidas no processo criminal

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27/07/2013 às 16:43
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4. LIBERDADE DE IMPRENSA

A liberdade de imprensa é um dos pressupostos básicos do Estado Democrático de Direito. Essa afirmação ganha conotação de total veracidade quando se pára a tecer rápida análise a cerca dos caracteres de um Estado Autoritário, em que não se possui o arbítrio de noticiar os fatos, de divulgar amplamente as notícias e encontra-se um governo ditador sempre controlando aquilo o que será publicado de acordo aos seus interesses políticos. Sim, pois em épocas de ditadura, a exemplo do nefasto período ditatorial vivido pela população brasileira, não se tem o direito de noticiar aquilo o que se bem entender, já que os integrantes do poder só permitem que seja divulgado o que lhes interessar e lhes mantiver em suas posições de domínio.

A imprensa constitui-se em um dos instrumentos de controle contra os arbítrios dos poderes instituídos, quais sejam o Executivo, o Legislativo e o Judiciário, já que, através dela, a população tem ciência de todos os acontecimentos e medidas tomadas por seus ocupantes, podendo-se insurgir contra eventuais arbitrariedades e excessos cometidos. É nesse sentido que corriqueiramente se fala na imprensa como um “quarto poder” [37], capaz de embotar na consciência popular ideais de democracia e de necessidade de vigilância em relação aos atos de supremacia. Seguindo essa linha de raciocínio, Victor Rodriguéz elucida que “no regime democrático, em lugar de o governo censurar a imprensa, é a esta que cabe a censura aos órgãos governamentais, dentro de seus limites” [38].

Como constitucionalmente estabelecido, os órgãos da imprensa devem ser livres, não se admitindo nenhuma censura prévia ou limitação injustificada a priori. Marx afirmou brilhantemente que uma imprensa não-livre nunca pode ser considerada como tal, pois em sua ampla liberdade é que está lastreada a sua essência[39]. Disse que, em primeiro lugar, deve haver liberdade em relação às forças do governo, com o impedimento da censura característica do Estado Autoritário; em segundo lugar, deve ser independente do ponto de vista econômico, já que assim poderá publicar notícias com teor não comprometido por estes interesses.

É de fundamental importância o papel da imprensa de tornar públicas as informações de interesse público, pois é através da publicidade das informações que as pessoas conhecem e conscientizam-se dos seus direitos. Além disso, ao exercer a função investigativa, é por meio da mídia que o poder judiciário conhece de crimes  e atos delituosos, bem como de outras violações a direitos públicos, motivo pelo qual pode ela ser considerada uma fonte secundária,  "extralegal", do direito.

Para que atue com total liberdade, a imprensa deve também estar acobertada pelo manto da independência econômica. Isto porque as empresas responsáveis pela divulgação de notícias, se dependentes do poderio econômico, irão limitar-se a publicar aquilo o que atender aos interesses deste. Nesse diapasão, afirmou José Marques de Melo:

“Esta é uma colocação clássica. Nos países capitalistas a liberdade de imprensa é uma liberdade de empresa e nos países que seguem o padrão da União Soviética há uma liberdade de Estado. No entanto, a questão se apresenta de outra maneira: como conquistar uma liberdade de imprensa que esteja a serviço da população como um todo, a sociedade civil, e não das empresas ou do Estado” [40].

Inseridos no âmbito democrático e na economia de mercado, os órgãos da imprensa passam a ser, cada vez mais, influenciados pelo poderio econômico. Isso porque a notícia ganhou novos contornos e passou a ser um produto à venda[41], semelhantemente ao que ocorre com os itens estampados em uma prateleira de supermercado. Assoma-se também o fato de exercerem as grandes empresas mundiais verdadeiro monopólio em relação às de pequeno-porte, que se mantém sob o controle e influência daquelas que detém supremacia financeira. O Brasil, país que não se enquadra no grupo dos mais desenvolvidos do mundo, sofre as conseqüências do domínio das fontes de informações pelos grandes jornais internacionais, que possuem maior aparato financeiro e tecnológico para a captação de uma notícia com imediatismo.

Cumpre destacar que, em um Estado Democrático de Direito, como o brasileiro, em que direitos e garantias fundamentais são amplamente protegidos, é inegável que a imprensa, atuando com seriedade, desempenha um papel de enorme relevância, contribuindo para a sedimentação dos ideais de justiça. Dessa forma, ela não pode ter restringido, indevidamente, seu campo de atuação, possuindo o direito de atuar com veracidade e objetividade na divulgação dos fatos, informando a população dentro de limites éticos.

Ressalte-se que a liberdade de imprensa, assegurada pela Constituição e sendo expressamente vedada a censura prévia, embora se encontre em regra não contida no art. 5 º e sim no art. 220, constitui-se em um direito fundamental sob o ponto de vista material, pois é essencial ao livre exercício da democracia e da convivência em sociedade. Deve tratar das matérias abertamente e com veracidade, somente podendo ser limitada quando assim o exigir a garantia de outros direitos também fundamentais, como é o caso do direito à honra.

A mídia (tenha-se esse termo como sinônimo de imprensa) desempenha um duplo papel: hodiernamente, ela não apenas informa, como também é uma formadora de opiniões[42]. Entretanto, precisa-se de uma imprensa que atue com liberdade e imparcialidade, preservando a autenticidade das informações transmitidas e adotando um posicionamento objetivo diante dos fatos. Nessa diapasão, observe-se o posicionamento do Desembargador Nilton Macedo:

"'Ser livre é não estar sujeito a nada, a não ser às leis' (Voltaire). É totalmente livre, mas não absoluta a manifestação de pensamento, assim como da informação, pois deve ajustar-se ao poder regulamentador do Estado no que concerne à moral, aos bons costumes, à saúde mental da população, respondendo cada um pelos excessos que cometer. A liberdade pessoal há de conter-se dentro dos limites da liberdade de todos"[43].

Sob o pseudo-manto da liberdade, a imprensa não tem o direito de mentir, de distorcer os fatos a fim de chamar a atenção do público a qualquer custo. Frise-se que “a liberdade de imprensa não é um direito dos profissionais da imprensa, mas de toda sociedade e, portanto, deve ser protegido por todos nós” [44]. Nesse contexto, deve ser delimitado o conceito de imprensa, para que se tenha em mente quais são os atuais meios de comunicação abrangidos pela expressão mídia.

4.1. CONCEITO DE IMPRENSA

Não se deve deixar de ter em mente que a expressão imprensa, hodiernamente, possui significação muito maior do que no passado, quando foi criada a prensa por Gutenberg, no ano de 1436. Naquela época, eram bastante restritos os meios de se transmitir uma informação, limitando-se aos escritos ou a impressos gerados pela brilhante máquina de impressão descoberta. Como decorrência, tinha-se que o termo imprensa significava “máquinas com que se imprime ou estampa; arte de imprimir; os jornais; a instituição da publicidade tipográfica diária” [45].

Entretanto, atualmente, existem inúmeros meio de se divulgar e transmitir uma notícia que não apenas através dos escritos jornalísticos ou de revistas. Em meio ao enorme avanço tecnológico galgado pela sociedade, a televisão, o rádio e a internet, dentre outros, ganharam posição de destaque e possibilitaram que uma informação fosse globalmente difundida em milésimos de segundos. Esses meios de comunicação inseriram-se no cenário mundial de tal forma que não se concebe mais a vida em sociedade sem eles.

Assim, a palavra imprensa deve ser compreendida em sentido amplo, englobando não só os meios escritos, mas qualquer outra maneira através da qual seja possível a transmissão de uma idéia ou de um fato. Dessa forma, o mercado jornalístico passa a ser representando por enorme diversificação, evolução que partiu dos jornais de bairros para as televisões e seguiu seu rumo através dos CD-Rom's e das páginas da Internet.  Nesse contexto, o termo imprensa desvincula-se parcialmente de sua concepção inicial, abarcando todo meio de produção e de transmissão de informação, quer seja por forma escrita, pela prensa ou por radiodifusão de sons e imagens das mais variadas maneiras. Este é o sentido adotado pela Lei de Imprensa, Lei nº. 5.250/67, em seu artigo 1 º. Nas palavras de Grandinetti:

“A imprensa hoje significa informação, jornalismo, independentemente do processo que a gerou, seja a prensa, ou seja a radiodifusão de sons. Neste conceito, podemos incluir como imprensa a atividade jornalística dos jornais, revistas, periódicos, televisão e rádio. O que prepondera é a atividade e não o meio empregado para divulga-la” [46].

Do exposto, infere-se que houve grande dilatação na definição da palavra imprensa em decorrência das transformações sociais, inserindo-se nela as mais variadas formas de transmissão da informação, a ponto de terem alguns autores passado a utilizar as expressões liberdade de imprensa e liberdade de informação jornalística como sinônimas[47]. Esse é também o posicionamento adotado no bojo deste estudo, em que as referidas expressões podem aparecer como se o mesmo sentido tivessem.

4.2. LIBERDADE DE EXPRESSÃO E MANIFESTAÇÃO DE PENSAMENTO

Pensar á atávico ao ser humano. Desde o seu surgimento ou criação, o homem sempre pensou, sendo esta, inclusive, a característica que o diferencia dos outros animais irracionais, os quais, em sua grande maioria, não possuem capacidade de raciocínio. Assim, o pensamento, manifestação de caráter individual e subjetivo, que acontece no âmbito interno do indivíduo, é amplo, ilimitado. Não se tem como impor limites a algo tão íntimo como o pensar, que se passa na imaginação e no ideário das pessoas a todo instante, em suas mentes e subconsciente. Enquanto não for exteriorizado, o pensamento não se constitui em objeto de tutela do Direito.

Entretanto, a partir do momento em que ele for expresso, limites devem ser impostos e controle deve ser realizado para que não se sobreponha a outras liberdades de igual valor. O ser humano, ao viver em sociedade, tem enorme necessidade de se comunicar e de expressar aquilo que pensa, até para que seja possível a sua inserção no meio em que vive. Além disso, possui grande necessidade do conhecer o pensamento de seus semelhantes. Logo, deve-se ressaltar o fato de os termos informação e expressão estarem relacionados de forma bastante coesa. Expressar uma idéia é propagar uma informação, permitindo que ela chegue ao conhecimento de terceiros.

Se o homem é livre para pensar, também deve ser livre para manifestar suas idéias, suas opiniões.  Dessa forma, afirma-se que a liberdade de expressão nada mais é do que uma conseqüência óbvia da liberdade de pensamento, constituindo-se na exteriorização desta[48]. Quando o homem expõe aquilo o que pensa, propaga aquilo o que se passa internamente, exerce o seu direito de manifestar seu ideário.

A liberdade de manifestação de pensamento é o ponto de partida de outras liberdades, a exemplo da liberdade de informação e da liberdade de imprensa. Pode-se afirmar, consequentemente, que a liberdade de pensar se desdobra na liberdade de consciência e na liberdade de exteriorização ou manifestação do pensamento. Segundo Celso Ribeiro Bastos:

“A liberdade de pensamento, ou de opinião, é qualificada por alguns autores como simultaneamente primária e primeira, isto pelo fato de aparecer cronológica e logicamente através de outras liberdades que não são senão um consectário seu. A própria liberdade de imprensa permite, por outro lado, a comunicação de opiniões. Aqui, a liberdade secundária amplifica a primeira ao mesmo tempo em que sobre ela se funda” [49].

Nos dizeres de Rui Barbosa, “de todas as liberdades, a do pensamento é a maior e a mais alta. Sem ela todas as demais deixam mutilada a personalidade humana, asfixiada a sociedade, entregue à corrupção o governo” [50].

Escreveu Pinto Ferreira que:

“O sistema democrático e jurídico-constitucional da liberdade de pensamento é básico e desdobra-se das seguintes maneiras: a) liberdade de consciência, compreendendo a liberdade de crença (direito de professar qualquer religião ou de ser ateu) e a liberdade de opinião (ou direito de possuir convicções próprias em matéria política ou filosófica); b) liberdade de exteriorização do pensamento, abrangendo a liberdade de culto (organização de movimentos religiosos, proselitismo, edificação de igreja e templo) e, além disso, a liberdade de palavra, imprensa, cátedra, ou aprendizagem científica, artística, literária” [51].

Não cabe, porém, no bojo deste estudo, conceituar cada um dos desdobramentos da liberdade de pensamento, visto que será enfocada a liberdade de imprensa em confronto com o direito à honra no âmbito penal. Basta ter em mente que é dela que emergem as outras liberdades relacionadas. No texto constitucional brasileiro, encontra-se a liberdade de manifestação ou expressão de pensamente prevista, do ponto de vista genérico, nos incisos IV, V, IX, XII e XIV do art. 5º, combinados com os arts. 220 a 224.

Assim, ressalte-se o fato de que a liberdade de imprensa é uma decorrência da liberdade de manifestação de pensamento. Ela é um instrumento desta, um meio através qual é possível a divulgação de fatos e de idéias. Como dito, é um dos pressupostos do Estado Democrático de direito, garantia de controle dos poderes instituídos. Como bem firmou o STJ, em um de seus julgamentos:

"A Constituição considera livre a manifestação do pensamento, proíbe o anonimato, e assegura o direito de resposta, a inviolabilidade da intimidade, a vida privada, a honra e imagem das pessoas, o que não derroga a chamada Lei de Imprensa, a qual continua em vigor, naquilo em que não contraria a Carta Magna"[52].

Posteriormente, será ainda demonstrado que liberdade de expressão não se confunde com liberdade de informação, embora por diversas ocasiões sejam ambas utilizadas como se sinônimas fossem (por questões pragmáticas, isso poderá ocorrer neste estudo).

4.3. DIREITO DE INFORMAÇÃO

Não cabe aqui tecer considerações aprofundadas a cerca das distinções entre direitos e liberdades, devendo-se apenas ressaltar que há autores que diferenciam direito de informação de liberdade de informação[53], enquanto outros utilizam as duas expressões como sinônimas[54], posicionamento seguido neste trabalho, em que ambas serão indistintamente utilizadas.

É de grande importância esclarecer que liberdade de informação não se confunde com liberdade de expressão. Nas palavras de Grandinetti:

“A divulgação de um pensamento, de uma idéia, de uma opinião, é necessariamente parcial, enquanto a divulgação de fatos, dados objetivamente apurados – característica da informação -, deve ser despida de qualquer apreciação pessoal. (...) Em um jornal escrito, tanto pode haver informação ou expressão, mas, quando tratar-se da primeira, impõe-se, necessariamente, transparência. Usualmente, a opinião é divulgada em seções próprias, como o editorial para as opiniões, as charges para a expressão artística, também reveladora de opinião, etc. Mas não é o local que importa, mas a transparência. (...) é preciso não confundir as duas essências: informação e expressão. Elas quase sempre coexistem no mesmo veículo, com maior ou menor interação, mas devem ser examinadas sob pontos de vista diametralmente opostos: uma é imparcial, outra é parcial; uma tem a função social de contribuir para a elaboração do pensamento, a outra tem a função social de difundir um pensamento ou um sentimento já elaborado. São fronteiras tênues, mas existem, e que não devem ser ultrapassadas” [55]

Entretanto, embora possa ser feita a diferenciação no termos acima expostos, nem sempre é tarefa fácil discernir a comunicação de informações da expressão de idéias e opiniões, visto que, algumas vezes, elas coincidem em um mesmo instrumento e ambas podem utilizar-se da narração ou descrição de fatos indistintamente. Em tentativa de diferenciação sintetizada, pode-se dizer que a liberdade expressão está mais ligada às idéias, opiniões e pensamentos, enquanto a liberdade de informação confunde-se com a publicação ou divulgação de fatos.

Aponta-se, porém, que a liberdade de informação possui como limite ínsito a veracidade, o que não ocorre com a liberdade de expressão, que é mais ampla. Mesmo assim, essa também não é ilimitada, pois não pode haver expressão de idéias com teor injurioso. Dessa forma, não se deve confundir liberdade de expressão com liberdade de imprensa, que é um instrumento para que as informações sejam transmitidas e os pensamentos divulgados.

Em regra, o direito à informação é composto pela “liberdade de buscar ou colher, receber e difundir informações, ou seja, acesso ao fato noticiável, assegurado pelos órgãos da mídia e usuários, receber informações pluralistas e corretas” [56].  Pode-se afirmar que “a liberdade de informação, que concebemos hoje, possui o mesmo papel que a imprensa de outrora realizava em face da sociedade daquela época, ou seja, a liberdade de imprensa ou de informação consiste em propiciar informação para a população” [57].  Nesse sentido, é enorme a importância da existência de uma ampla liberdade de imprensa sem dependência econômica ou de Estado, para que esta possa agir com imparcialidade na sociedade. Uma população informada é um dos elementos básicos de um Estado que se norteie por ideais democráticos.

Ressalte-se que são integrantes do direito de informação o direito de informar, o direito de se informar e o direito de ser informado, como partes que constituem o todo. Observe-se que dispôs Francis Balle:

“O direito de informar consiste na possibilidade de veicular informações, o direito de se informar, por sua vez, é a faculdade de ter livre acesso às fontes de informação, é o direito de buscar informações, sem impedimentos ou obstáculos; o direito de ser informado é a prerrogativa que possui qualquer pessoa à receptação de informações, é o direito de todos os homens a uma igual possibilidade de acesso a todos os fatos da atualidade” [58].

Face ao exposto, pode-se afirmar com total segurança que o direito de informação pode ser entendido como direito à liberdade de imprensa, visto que esta é a principal responsável, através dos meios de comunicação em massa, por manter informada toda uma população, permitindo que ela tenha ciência de tudo que acontece na sociedade. Necessária se mostra a delimitação de alguns conceitos.

4.3.1 Conceito de Informação

Todo homem que vive em sociedade tem a necessidade de se informar, de estar ciente dos acontecimentos que o cercam e de interagir com os demais membros da comunidade. Apresentam-se como premissas da vida coletiva o conhecimento de pessoas, do que elas pensam, de suas preferências e gostos, a ciência dos acontecimentos e notícias, dentre outros, para que haja interação com o meio social.

A palavra informação vem do latim informationem, que significa “delinear, conceber a idéia, dar forma ou moldar na mente” [59].  Nesse sentido:

“Informação é o resultado do processamento, manipulação e organização de dados de tal forma que represente um acréscimo ao conhecimento da pessoa que a recebe. Informação enquanto conceito, carrega uma diversidade de significados, do uso cotidiano ao técnico. Genericamente, o conceito de informação está intimamente ligado às noções de restrição, comunicação, controle, dados, forma, instrução, conhecimento, significado, estímulo, padrão, percepção e representação de conhecimento. É comum nos dias de hoje ouvir-se falar sobre a Era da Informação, o advento da "Era do Conhecimento" ou sociedade do conhecimento. Como a sociedade da informação, a tecnologia da informação, a ciência da informação e a ciência da computação em informática são assuntos e ciências recorrentes na atualidade, a palavra "informação" é freqüentemente utilizada sem muita consideração pelos vários significados que adquiriu ao longo do tempo”[60].

Certo é que não se tem uma conceituação precisa para o termo informação. Trata-se de uma palavra vaga, cujo conceito é intuitivo. Isso porque apenas se tem uma noção do que seja informar: ao fazer uma pergunta, as pessoas estão pedindo informação; ao assistir televisão, estão absorvendo informação. Entretanto, não há palavras exatas que se mostrem suficientes a delimitar precisamente o que seja informar ou não informar.

Mesmo assim, pelo exposto pode-se inferir que informação implica em conhecer o que se passa ao redor, mantendo interação com o âmbito social. O direito à informação seria, então, a possibilidade de ter conhecimento dos fatos que dizem respeito ao interesse público e que se mostrem relevantes para a inserção do indivíduo na coletividade.  

4.3.2. Liberdade de informação como Direito Fundamental

A liberdade de informação é essencial à vida em sociedade. Sem ela, o ser humano não teria alcançado o atual patamar de desenvolvimento.  É ínsito à característica dele a necessidade de comunicação com os demais para que haja uma convivência pacífica.

Como visto, a liberdade de imprensa decorre da liberdade de pensamento e é esta a principal responsável pela veiculação de fatos e notícias. A ampla possibilidade de divulgação de uma informação tem sido o pilar dos Estados Democráticos por todo o mundo, mostrando-se essencial, inclusive, à globalização. Nesse diapasão, têm os meios de comunicação apresentado sua total importância, por proporem debates, informarem e esclarecem acontecimentos. Comunicando-se, o homem interage na sociedade, desenvolvendo-se e participando do desenvolvimento de todo o conjunto. Dessa forma, pode-se afirmar que a informação, a qual viabiliza a comunicação, integra a categoria dos conhecidos Direitos Humanos.

No século XVIII, também conhecido por “século das luzes”, intensas e contínuas foram as lutas pela consolidação de direitos e garantias. Naquele período, desenvolveram-se movimentos contra a censura prévia e em favor da liberdade de imprensa ou de informação, a qual ganhou status de direito da personalidade, intimamente ligado a todo cidadão. De acordo com Manuel da Costa, “ela é pura e simplesmente constitutiva para uma ordenação estatal estadual livre e democrática, pois só ela torna possível o permanente debate cultural, pelo confronto de opiniões que é seu elemento vital. Ela é, em certo sentido, o fundamento de toda liberdade” [61].

Dispondo que “a liberdade de imprensa é um dos grandes baluartes da liberdade e não pode ser restringida jamais, a não ser por governos despóticos”, aponta-se o art. 12 da Declaração de Direitos da Virgínia do ano de 1776 como o primeiro documento formal a expressamente contemplar o direito de informação. Nessa época, tal direito possuía uma concepção individualista, o que foi superado com o passar dos anos, visto que, hodiernamente, ele possui roupagem de um direito social, interessando não apenas no âmbito particular, mas sim à toda sociedade, como verdadeira premissa da democracia.

Importante destacar que há pouco tempo desenvolveu-se o maior interesse pela liberdade de informação, a partir do momento em que evoluíram tecnologicamente as formas de comunicação. Antes disso, não havia relevância jurídica no controle dos atos de informar, bem mais restritos do que as atuais possibilidades. 

Apresenta-se a liberdade de expressão como um direito oponível ao Estado e a qualquer pessoa, para que não sofram restrições nenhuma modalidade de transmissão e acesso à informação. Em momentos de autoritarismo político, esse direito é cerceado como garantia de tudo aquilo o que for contrário aos ideais democráticos. Frise-se que ela enquadra-se entre os direitos fundamentais de primeira geração (direito individual à informação), relacionando-se com a comunicação, entendendo-se esta como possibilidade de buscar, receber, compartilhar e tornar públicas as informações.

A Constituição Federal de 1988, numa ampla demonstração de preocupação em proteger o Estado Democrático de Direito, erigiu a liberdade de informação à condição de direito fundamental, dando amplitude às questões a ela relacionadas. Mesmo não estando explicitamente elencada na categoria destes, assim o é em sua concepção material. Logo, ela só poderá sofrer limitações dentro do necessário para resguardar outros direitos também fundamentais. Frise-se que na previsão constitucional estão compreendidos tanto os atos de informar quanto os de receber as informações, o que possui enorme relevância prática, já que se encontram protegidos os aspectos ativos e passivos da informação, como será demonstrado. 

4.3.3. Previsão no ordenamento jurídico brasileiro

A atual Constituição assegura, em diversos dispositivos, as várias vertentes da liberdade de informação e expressão de pensamento, tanto no aspecto ativo (tendo-se este como o direito de manifestar opiniões e de emitir informações) quanto no aspecto passivo (no sentido de ser informado, receber a informação). O art. 5º traz a previsão das liberdades supracitadas (incluindo-se a liberdade de imprensa) em diversos dos seus incisos, como se pode verificar:

“Art. 5º (omissis):

IV - é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato;

V - é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem;

IX - é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença;

XIII - é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer;

XIV - é assegurado a todos o acesso à informação e resguardado o sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional;”.

Além dessas previsões, essenciais também são as trazidas pelos artigos 220 a 224 da Constituição, dentre as quais se transcreve:

Art. 220. A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição.

§ 1º - Nenhuma lei conterá dispositivo que possa constituir embaraço à plena liberdade de informação jornalística em qualquer veículo de comunicação social, observado o disposto no art. 5º, IV, V, IX, XIII e XIV.

§ 2º - É vedada toda e qualquer censura de natureza política, ideológica e artística.

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Embora nada tenha previsto em relação aos meios de informação, a Magna Carta assegura a inviolabilidade da liberdade de consciência, a exteriorização de idéias, a publicação de opiniões e sua veiculação sem censuras, além do sigilo de fontes para os jornalistas como garantia ao desempenho da função profissional sem limitações.

A toda liberdade corresponde, entretanto, uma responsabilidade. Disse Ivo Dantas que “a liberdade de pensamento não poderia significar sinônimo de irresponsabilidade no gozo da liberdade de imprensa” [62]. Assim, importante ter em mente que, constitucionalmente, não se assegura uma liberdade irresponsável e sem qualquer critério para o poder de informar ou manifestar o pensamento. A liberdade de comunicação não é absoluta, havendo meios legítimos (e até mesmo previstos na Constituição) para controlá-la. Isso porque, muitas vezes, direitos de terceiros são lesados pelo equivocado exercício da liberdade de informação, como será adiante demonstrado em maiores detalhes.

Além da mencionada previsão, há ainda dispositivos infraconstitucionais que tratam da matéria. Aponta-se o Código de ética dos jornalistas, o qual vigora desde 1987 e traz previsões sobre a temática e a Lei de Imprensa, que em seu artigo 1º declara ser livre a manifestação de pensamento. Esta foi promulgada ainda na vigência da ditadura militar, permitindo a censura, a apreensão de publicações impressas, proibição de circulação destes e o fechamento das empresas de comunicação responsáveis por promover a subversão da ordem política e social, dentre outras medidas antidemocráticas[63].

Todo o teor autoritário da referida lei retrata o contexto histórico em que ela foi elaborada, sendo lamentável que, já passadas décadas de sua promulgação, o Congresso Nacional ainda não tenha aprovado lei nova que reflita a consolidação da Democracia no Brasil, matéria, inclusive, que já tramita no Poder Legislativo Federal. Não há necessidade de maiores considerações dessa lei nesse trabalho, pois a Constituição Federal traz ampla previsão sobre a matéria, o que suplanta eventuais indagações infraconstitucionais.

Deve o legislador criar nova Lei de Imprensa que atenda às atuais demandas da sociedade, encontrando-se a que está em vigor superada e inapta a atender os fins democráticos. Não pode mais continuar ao arbítrio do judiciário a fixação dos valores de indenização dentro dos limites fixados pela lei atual, os quais se mostram irrisórios e não possuem eficácia em face dos absurdos lucros aferidos com a publicação de informações ofensivas a outros direitos fundamentais.

4.4. EVOLUÇÃO TECNOLÓGICA

“À medida que o homem evolui, evoluem também as suas formas de comunicar-se” [64]. Como já afirmado, o enorme progresso tecnológico trouxe consigo suntuosas implicações, dentre as quais se pode elencar a aproximação dos mercados globais e a ampliação na abrangência do termo imprensa. Como dito, este se refere a qualquer meio de transmissão de uma informação e não apenas aos escritos ou impressos.

Numa breve regressão histórica, cumpre afirmar que, a partir do ano de 1919, teve início a “Era do Rádio”[65]. Nela as transmissões eram feitas através de ondas eletromagnéticas, o que inicialmente possibilitou a transmissão de voz, depois de imagem e hoje já permite o envio e recebimento de dados.  Com o advento da televisão, fruto de muito trabalho e investigação científica, essa “era” entrou em declínio.

Inúmeras foram as tentativas, até que em 1920 o inglês John Logie Baird conseguiu materializar verdadeiras transmissões de imagens. A partir do referido ano, em muito evoluiu a tecnologia dos televisores. Com a Segunda Guerra Mundial, ganharam forças as pesquisas para o desenvolvimento dos computadores eletrônicos, reconhecendo a população e os governos o potencial oferecido por essas máquinas. Com o tempo, elas foram sendo desenvolvidas, tornando-se cada vez menores e mais baratas, além de amplamente acessíveis a toda a população. Dessa forma, espalhou-se enormemente a quantidade de dados pelo mundo e foi facilitada a comunicação entre pessoas de todos os locais do planeta.

A Internet é uma ferramenta bastante utilizada para as comunicações pessoais e em massa, possibilitando a instantaneidade na transmissão de sons, imagens e textos. Aparelhos celulares viabilizam a realização de inúmeras tarefas, marcando assim a “Era dos Multifuncionais”, em que um único aparelho permite a realização de ligações, o envio de mensagens, fotografias, vídeos, acesso a internet, “mp3 player”, possuindo despertador, agenda telefônica e calculadora, dentre inúmeras outras funções.

Com a evolução da informação, há enorme melhoria nas transmissões das notícias e dos fatos, às quais o público tem acesso no exato momento de realização. Entretanto, caminham ao lado das inúmeras conseqüências positivas diferenciados aspectos negativos, dentre os quais cabe apontar os males do semi-analfabetismo e da falta de autenticidade (conhecida por plágio) causado pelo uso de computadores no ensino graças ao uso do famoso “Ctrl-C, Ctrl-V” (copiar e colar), além da ofensa de variados direitos fundamentais ao ser humano, a exemplo da honra.

Dispondo de enorme aparato tecnológico, os órgãos integrantes da mídia captam a notícia no exato momento em que o fato ocorreu. Essa mensagem é transmitida pelo mundo em milésimos de segundos, não mais levando dias ou horas, como no passado, em que comunicados ou pergaminhos eram lançados ao mar, para chegarem ao conhecimento de seus destinatários.

Através da Internet, acontecimentos são divulgados em tempo real. Os telespectadores assistem ao vivo a tudo o que ocorre no planeta. Pela moderna radiodifusão de sons, o que um repórter fala em países distantes é ouvido, ao mesmo tempo, em todos os lugares do mundo. Tudo isso foi propiciado pelo grande patamar e avanço de tecnologia galgado pela sociedade, o qual não encontra nenhum precedente. Nesse contexto, implicações diversas foram trazidas para a abrangência dos meios de comunicação e para o teor das notícias, sendo inegável que a Era da Tecnologia vem trazendo problemas de acentuada repercussão no mundo jurídico, como será demonstrado a seguir.

As empresas de informação adquirem um aparato tecnológico cada vez mais avançado, o que ocasiona um aumento na quantidade de destinatários das informações. “Se antes uma pessoa estava limitada a imprensa local, agora ela mesma pode se tornar parte da imprensa e observar as tendências do mundo inteiro, tendo apenas como fator de limitação a barreira lingüística”[66]. Hoje, impera a comunicação em massa, que alcança um surpreendente número de pessoas ao mesmo tempo, invadindo abruptamente os lares e a mente dos indivíduos, os quais, nem sempre, estão capacitados para discernir o real do fantástico.

4.5. COMUNICAÇÃO DE MASSA

Os processos de evolução tecnológica, social e cultural não estão encerrados, nem muito menos se aproximando de seus fins. Longe disso, as tecnologias avançam e tendem a progredir geometricamente, o que traz conseqüências notáveis no âmbito da comunicação, visto que, com o avanço tecnológico, cada vez mais são dilatadas e diversificadas as formas de comunicar existentes em uma sociedade.

Assim, evidente resta que a mídia sempre seguirá os ditames do progresso. Deve-se esclarecer que o termo mídias de massa é utilizado para fazer referência aos meios de comunicação que se destinam a atingir o maior público possível. Na linha evolutiva dessas mídias, pode-se apontar o rádio, a televisão e o computador, dentre outros, por se tratarem dos veículos mais significativos e que se comunicam com o maior espectro de público.

Como já anteriormente afirmado, as pessoas estão comunicando-se a todo instante, sendo este fato, inclusive, o sustentáculo da vida em interação com a sociedade. Seja manifestando suas opiniões, trocando informações ou mesmo recebendo notícias, os indivíduos estão sempre mantendo ativa a comunicação no meio social. E é, inclusive, através da comunicação pública que comumente se exerce o direito de liberdade de expressão de pensamento, daí a importância de tecer breve comentário sobre o que vem a ser a comunicação de massa.

À primeira vista, logo quando se ouve falar na expressão comunicação de massa, tem-se imediatamente a idéia de que a mesma se trata de uma modalidade de comunicação que atinge um enorme número de pessoas, um público cuja quantidade numérica seria até mesmo incalculável, uma verdadeira multidão de indivíduos. Entretanto, como bem afirmou John B. Thompson, “o que importa na comunicação de massa não está na quantidade de indivíduos que recebem os produtos, mas no fato de que estes produtos estão disponíveis, em princípio, para uma grande pluralidade de destinatários” [67]. Assim, em verdade, a comunicação de massa é aquela que tem o potencial de alcançar um número imenso de pessoas, mesmo que isto não venha a ocorrer, a exemplo de um livro, que pode ser por poucos lido e mesmo assim continua sendo um meio de comunicação de massa, visto que ele está à disponibilidade de um número ilimitado de pessoas.

Como dito por Ana Lúcia:

“É possível dizer que a comunicação de massa é o processo de informação que se realiza entre os comunicadores e a massa de audiência, heterogênea e anônima, por meio de instrumentos que são os canais de comunicação. E os meios de comunicação, também chamados de mass media, são os instrumentos de transmissão da mensagem, são instrumentos a serviço da informação” [68].

Através dela, são fornecidas idéias e informações que repercutem sobre os indivíduos, os quais interagem reciprocamente, ampliando, dessa forma, o entendimento e o conhecimento de todos os fatos que ocorrem no seio social, daí sua imensurável importância. Certo é que, por meio dos veículos de comunicação de massa, é possível a divulgação de mensagens em larga escala a todo tipo de público, sendo estas rapidamente absorvidas por seus destinatários, o que não era possível no passado, quando predominava a comunicação pessoal, em que o comunicador contava com a imediata e contínua resposta e opinião do receptor da mensagem, que não era transmitida a um grande número de pessoas.

É importante entender qual o nível de influência que os referidos veículos de massa podem causar em suas audiências ou público alvo, ou seja, o que poderá ocorrer quando um determinado grupo de pessoas for exposto a uma notícia, transmitida de certa maneira, através de um meio de comunicação de massa. Entretanto, trata-se de uma questão bastante ampla e complexa, na qual influem variados fatores, motivo pelo qual diversos estudos e formulações foram elaboradas com o propósito de tentar esclarecer o referido nível de repercussão.   

Desde que se observou que a sociedade seguia determinadas tendências como um todo, passou-se a falar em sociedade de massa. Inicialmente, tinha-se que essa massa era composta por indivíduos despersonalizados, sem autonomia de pensamento, seres que simplesmente engoliam uma notícia sem digeri-la[69] e que, portanto, não tinham autonomia de pensamento e aceitavam automaticamente tudo o que lhe foi noticiado. Dessa forma, através de uma simples propaganda poder-se-ia levar toda uma população a agir de determinada maneira. Esse pensamento vigorou no final do século XIX e foi bastante utilizado para que populações de diversos países participassem da Primeira Guerra Mundial. Observe-se:

“Os veículos de comunicação de massa disponíveis então se tornaram as principais ferramentas para persuadir populações, através de propagandas, a participarem da guerra. Após a guerra, diversas pessoas que haviam estado envolvidas intimamente na produção de propaganda ficaram carregadas de sentimentos de culpa acerca dos grosseiros embustes de que haviam participado. Mentiras deslavadas foram contadas por um lado acerca do outro, e, quando postas perante as populações da época através dos veículos de massa, foram frequentemente acreditadas. Tal persuasão em grande escala de populações inteiras com o emprego de veículos de massa, nunca fora vista antes, e foi conduzida de maneira habilidosa e extremamente coordenada. (...) Após a guerra, quando os ex-propagandistas publicaram um chorrilho de revelações sensacionalistas a cerca de suas burlas do tempo de guerra, o público em geral ficou mais esperto[70].

Como conseqüência do que ocorreu na época da referida guerra, nos termos do acima exposto, passou-se a pensar que a mídia era capaz de modelar a opinião pública e manipular completamente as pessoas, de forma que elas agiriam seguindo aquilo o que fosse determinado pela imprensa. Em síntese, no referido período, acreditava-se que os estímulos passados pelos meios de comunicação aos indivíduos atingiam cada pessoa da sociedade de massa, que recebia a informação da mesma forma que os demais, provocando-se, assim, uma reação mais ou menos uniforme de todos os indivíduos (Teoria do estímulo-resposta ou da Bala mágica).

Entretanto, à medida que estudos foram sendo realizados e aperfeiçoados, tornou-se cada vez mais evidente que a idéia acima referida não condiz com a realidade dos fatos. Diversas outras teorias foram elaboradas (as quais não serão citadas neste trabalho, visto que este não é o objeto de seu estudo), até que se percebeu que as pessoas reagem de formas diferenciadas quando expostas a determinada notícia e não uniformemente. Essa diversidade dos possíveis comportamentos é determinada por fatores diversos, dentre os quais se destacam o nível de educação e informação de um indivíduo, o meio em que ele vive e a sua maior ou menor facilidade de ser influenciado por opiniões alheias, dentre outros.

Dessa forma, nem todas as pessoas destinatárias de determinada mensagem são facilmente manipuláveis, visto que cada uma delas possui personalidade e história de vida próprios, não sendo, assim, indivíduos inertes e passivos diante das notícias: os indivíduos digerem os fatos e não apenas os engolem, o que significa dizer que eles possuem capacidade de refletir a respeito da informação transmitida e adotar, diante dela, o posicionamento que melhor condizer com seus ideais e sua racionalidade. Isto, é claro, a depender de variados fatores, como já explicitado.

O que não se pode negar, todavia, é que os veículos de massa constituem-se em importante fonte de expectativas sociais padronizadas a respeito da organização de determinados grupos na sociedade. Isso porque as notícias transmitem idéias, papéis, funções, comportamentos, sanções e normas de toda espécie, conteúdos poderosos e complexos que influenciam, de maneiras variadas, no pensamento e nas vidas das pessoas.

A população está acostumada a receber diariamente informações a respeito de todos os acontecimentos mundiais. Assiste anúncios, propagandas, filmes e notícias que preenchem o tempo ocioso e, às vezes, mantém pessoas isoladas da realidade. Ora, a mídia veicula um patamar de vida, felicidade e realização que deve ser alcançados por todos, os quais, mesmo que impossíveis para muitos, tornam-se ilusoriamente possíveis nas mágicas telas dos televisores. E assim os indivíduos deixam-se controlar pelos meios de comunicação, chegando até mesmo a abdicar de suas liberdades em prol de sonhos intangíveis embotados em suas mentes por uma mídia que não se importa com as mazelas de suas vidas. Sobre o assunto:

“Os meios de comunicação de massa proporcionam novas formas de se chegar à população através da produção e distribuição de informações ou entretenimento em larga escala, nivelando grupos profissionais, étnicos, sociais, regionais, desrespeitam suas individualidades. É verdade que a relação de comunicação não se reduz à comunicação massiva, há também a comunicação de pequenos grupos. Porém, resumo-se cada vez mais à comunicação eletrônica dos meios de comunicação de massa, onde as pessoas escutam e vêem mais e falam menos. Os órgãos que mais se desenvolvem são a visão e a audição. A fala vai silenciando” [71].

Destaque-se ainda que as pessoas que não possuem um bom nível de educação são as mais subalternas aos ditames da comunicação de massa. Os principais responsáveis por tudo isso são o governo e classes sócio-econômicas dominantes, tanto financeiramente como culturalmente, que se utilizam dessas mídias de modo a manipular a sociedade[72].

Em síntese, pode-se afirmar que comunicação de massa é aquela realizada de maneira industrial, equiparando-se a uma produção em série, visto que objetiva atingir o maior número possível de pessoas. Como dito por Nathalia Younes, “numa visão apocalíptica, ela é uma conversão da cultura em mercadoria, utilizada pelas classes dominantes de forma vertical para homogeneizar as massas” [73].

Mesmo tendo o indivíduo capacidade de reflexão face à informação que lhe foi passada, é evidente que a interpretação de dado acontecimento por parte da imprensa acaba por alterar, influenciar ou mesmo formar a opinião de uma pessoa acerca do que foi relatado, além de também influir em sua forma de reação. Isso porque todo indivíduo é tendente a sofrer interferências de fatores externos, os quais trazem repercussões nos mais variados aspectos de suas vidas, moldando, inclusive, suas personalidades e condutas. Assim, é de extrema importância que a mídia, por meio de seus veículos de massa, aja de forma correta e objetiva, sem deturpar os fatos ou oculta-los, para que posicionamentos e opiniões equivocados não sejam formados pelos indivíduos.

4.6. PANORAMA ATUAL

Sim, pesquisou-se, e muito, para que a sociedade galgasse o atual patamar de desenvolvimento tecnológico e científico. Poucos não foram os esforços dos cientistas e inventores para a criação de aparatos que proporcionassem à humanidade mais conforto e melhores condições de sobrevivência. Entretanto, lastimavelmente, desvirtuaram-se as finalidades dessas conquistas. Inicialmente, visava-se, através delas, ampliar a capacidade de domínio do homem sobre a natureza, para a extração de fontes aptas a garantir às pessoas melhores condições de vida, além de aprofundar o conhecimento, dissimulando e multiplicando as riquezas, descobrindo curas para doenças antes fatais. Hoje, não que as citadas finalidades tenham sido descartadas, mas a elas sobrepõem-se o ideal consumeristas vigente na sociedade moderna. Nos dizeres de Paulo José da Costa Júnior:

“Concretamente, todavia, o que se verifica é que o propósito dos inventores, cientistas, pesquisadores, sofre um desvirtuamento quando se converte de idéia beneficente em produto de consumo. A revolução tecnológica, sempre mais acentuadamente, ganha um dinamismo próprio, desprovido de diretrizes morais, conduzido por um ‘cientificismo’ ao qual são estranhas e mesmo desprezíveis quaisquer preocupações éticas, metafísicas, humanísticas. Torna-se cega e desordenada, subtraindo-se ao controle até dos mais sábios, que a desencadeiam” [74].

Incrível é que, mesmo tendo escrito sua obra nos finais da década de 60, o mencionado autor já havia conseguido descrever com precisão um dos maiores problemas que ainda afligem a sociedade aproximadamente após 40 (quarenta) anos daquela publicação. Claro que ainda há muito que se esperar da ciência, mas toda a evolução vindoura deve estar acompanhada de uma reflexão crítica, para que os valores morais não sejam mais sobrepujados do que já estão.

A mesma tecnologia que traz benefícios para o homem acaba por prejudicá-lo. É uma espécie de ambivalência: pessoas querem ficar famosas, abrindo mão de aspectos inerentes à honra e a privacidade, mas, ao mesmo tempo, questionam estarem sendo alvos de uma intromissão indevida por parte da mídia. São com problemas como estes que convivem a humanidade nos dias atuais.

A imprensa é corriqueiramente apontada como a principal responsável pela devassa na vida das pessoas, pela publicação de fatos indevidos ou por mascarar a realidade, ao passo em que os jornalistas frequentemente posicionam-se como vítimas de acusações infundadas. Mas não são através de argumentos inconsistentes que estas acusações são feitas. Se é certo que, cercadas por variados meios de divulgação de notícias, as pessoas sentem-se, de certa forma, psicologicamente induzidas a renunciar de suas intimidades (mesmo que seja para apenas aparecer alguns segundos na televisão e ficar momentaneamente famosas), com muito maior respaldo pode-se afirmar que a mídia vem sim extrapolando os limites de sua atuação, agindo de forma indevida e até mesmo vergonhosa.

Como já dito, deve haver, em todo Estado Democrático de Direito, uma imprensa livre e independente, para que a mesma cumpra a imprescindível função de informar a população e até mesmo de educá-la através de campanhas sociais.  Entretanto, não há liberdade desacompanhada de responsabilidades e nem tão pouco ilimitada. Ser livre não significa ser irresponsável. Dessa forma, todos devem responder pelos atos praticados, linha de raciocínio que se aplica, perfeitamente, à atuação da imprensa, que, hodiernamente, parece ter esquecido dos valores morais e éticos que devem permear toda a sociedade.   

Vive-se em um estágio no qual até mesmo o conceito de informação parece ter sido reformulado ou descaracterizado em função das exigências econômicas. Se antes informar era transmitir com veracidade e objetividade os fatos, hoje, este verbo, para muitos, sugere a noção de passar ao público uma notícia da forma que mais atraia a atenção, que obtenha os maiores índices de audiência e, consequentemente, gere o maior lucro possível às empresas de telecomunicação.

Variados foram os fatores que contribuíram para as mudanças apontadas. Passou-se a época em que o jornalismo sobrevivia da venda de pequenos folhetins, os quais eram emitidos em tiragem limitada e não estavam acessíveis a todos, até mesmo por possuírem elevado custo, não podendo, assim, ser adquiridos pelas pessoas que não possuíam uma boa condição econômica. Naquele contexto, os valores vigentes eram mais acentuados: as pessoas (diga-se aqui, principalmente, os jornalistas), preocupavam-se mais com as questões éticas e com as repercussões morais que a publicação de um determinado fato geraria na sociedade. Esse período está muito distante da atual realidade, a ponto de já ter caído no esquecimento de muitos.

Se o capitalismo e a globalização trouxeram conseqüências para todos os setores da sociedade, com a imprensa não poderia ter sido diferente. Para que vender poucos volumes de um jornal se ele pode ser produzido em escala e gerar um lucro muito maior? Ora, também no setor jornalístico repercutiram os ideais da economia de mercado. Agora, grandes grupos econômicos são proprietários dos principais jornais. Eles dispõem de enorme aparato tecnológico para a obtenção das notícias e visam vender seus produtos em quantidades cada vez maiores, para que obtenham a maximização de lucros. Mas não basta produzir jornais em grandes quantidades: deve-se conseguir vendê-lo a toda a população. Nesse intuito, começaram os empresários jornalísticos a criar meios de atração da curiosidade do público para que as pessoas consumissem e seus objetivos fossem alcançados.

É incrível como assuntos ligados às mazelas humanas e à violência são os que despertam o maior interesse da população. E isso não é recente, mas sim observado há séculos, quando a execução pública de penas corporais já despertava enorme interesse popular, reunindo multidões ao redor de um cadafalso para se divertir com o horror que era a punição do criminoso. Como relata Michel Foucault:

“Desde aquele tempo desenvolveu-se uma literatura do crime totalmente diferente, uma literatura em que o crime é glorificado, mas porque é uma das belas-artes, porque só pode ser obra de seres de exceção, porque revela a monstruosidade dos fortes e dos poderosos, porque a perversidade é ainda uma maneira de ser privilegiado” [75].  

Já nessa época, os jornais retratavam uma visão estereotipada do criminoso, descrevendo-o como mal, cruel e com outras características vis de personalidade de forma a atrair o interesse do povo. Hodiernamente, o crime e seu autor ainda fascinam o público, despertando a sua atenção. E, assim, a dimensão pública da justiça continua sendo principal alvo de interesse dos meios de comunicação de massa. Manipula-se o conteúdo das notícias, dando destaque aos fatos que fixam a atenção do público e deixando de lado outros considerados menos importantes, independentemente de isto gerar uma noção distorcida da realidade.

Ressalte-se que, como já afirmado, a mídia é a principal responsável pela formação da opinião pública. Isto porque é através dela que a maioria da população tem conhecimento dos acontecimentos. Além disso, os meios de comunicação, em verdade, transmitem uma notícia de maneira unilateral, não havendo um intercâmbio comunicativo, o que dificulta a formação de uma opinião individual por parte das pessoas. Nesse sentido:

“Essa característica da comunicação mediata – num só sentido, sem resposta imediata do receptor da mensagem – torna possível ao meio informativo impor seu modo de ver o fato, sua visão da vida e das coisas, sua opinião, manipulando e controlando a informação. Ora, a massa que tecnicamente não pode manter diálogo com a mídia absorve a notícia que é difundida de forma instantânea ou rápida e seus integrantes não têm tempo de formar uma opinião individual. Surgem, consequentemente, opiniões que são coletivas e, muitas vezes, estereotipadas. As imagens, as palavras, ou ainda as fotografias transmitidas pela mídia são sujeitas a interpretações. Se os indivíduos não possuem outras informações e carecem de outros canais, não formam juízo próprio sobre a mensagem recebida, e tendem a seguir a idéia sugerida pelo meio de comunicação” [76].

O trecho acima transcrito relata com exatidão o que ocorre na população brasileira, principalmente dentre aqueles que possuem menor índice de instrução. As pessoas assistem ou lêem uma notícia, tomando ciência do fato através dela. E a partir do que leu ou assistiu forma a sua opinião sobre o que aconteceu, já que não presenciou o fato e nem mesmo teve outro modo de saber, realmente, o que houve. Dessa forma, a população passou a compor-se de um exército de indivíduos cujas opiniões são embutidas em suas mentes pelos meios de comunicação.

Porém, o fator econômico não pode impulsionar os jornalistas a desvincularem-se do bom senso, da ética e da moral. Eles devem obedecer aos ditames da objetividade, atuando com a maior imparcialidade possível, para que a população não forme uma opinião equivocada a cerca dos fatos.

Sobre o assunto:

“A mídia noticiosa não se propõe deliberadamente a criar ilusões ou enganar quem quer que seja, pelo menos na maior parte das sociedades ocidentais. Pelo contrário, os códigos éticos de jornalismo ressaltam dever ser objetivo, justo, cuidadoso e factual. Mas isso é jogo perdido antes de começar a partida. Seletividade e distorções das notícias são produtos e fatores fora de controle dos repórteres, redatores, editores e diretores. As descrições do mundo lá de fora apresentadas pela imprensa são conseqüências de condições anteriores, tais como recursos limitados de que os jornais dispõem para estudar em primeira mão qualquer determinado acontecimento. São também decorrência de constrangimentos no processo de preparar as notícias para se adequarem às exigências de um determinado veículo. Espaço e tempo são caros, e todos os relatos da notícia devem ser sumários. Há uma inevitável perda de pormenores em qualquer relato que tente focalizar os fatos centrais e ignore os outros. Além disso, há o problema de captar e prender a atenção em indústrias da mídia que dependem de anúncios como sua principal fonte de renda. As estórias e fatos que tenham probabilidade de aumentar a circulação, o que conduz a dar atenção aos anúncios, que por sua vez leva a lucros, têm forçosamente forte apelo para conseguir espaço ou tempo” [77].

Cabe então tecer uma análise a cerca do atual teor das notícias, do que elas vêm transmitindo aos seus receptores, bem como a respeito do caráter sensacionalista que permeia o jornalismo, tópico essencial para a compreensão dos exageros cometidos pela mídia.

4.6.2. Responsabilidade e ética na informação

Cabe aqui tecer uma breve consideração a cerca da responsabilidade e da ética na informação. Nesse intuito, serão apontados as diretrizes e os princípios norteadores da atividade jornalística, para que, a partir desse esclarecimento, seja possível visualizar e entender, com maior facilidade, as distorções e excessos que vem sendo cometidos pela imprensa.

Se a toda liberdade corresponde uma responsabilidade, não há nem como se imaginar a existência de um jornalismo irresponsável. Assim, toda atividade jornalística deve estar sempre lastreada na independência, veracidade, objetividade, honestidade, imparcialidade, exatidão e credibilidade[78]. Seguindo esses elementos que compõem a responsabilidade do jornalismo, o profissional certamente conseguirá apurar e difundir os fatos e informações gerais com veracidade, precisão e clareza, livre de distorções ou excessos.

Ora, encontrar, hodiernamente, um meio de comunicação que reúna todos esses requisitos é praticamente impossível, seria como alcançar o sonho de viver em uma sociedade perfeita e harmônica, em que não houvesse abusos nem criminalidade. Mesmo assim, é válido esclarecer alguns dos elementos acima elencados.  

Dentre eles, cabe discorrer, ainda que brevemente, sobre a imparcialidade e a independência. Agir de forma imparcial significa atuar com neutralidade, retidão e equidade, sem manifestar tendência de favorecimento a nenhuma das partes envolvidas na situação, ou ainda, nos termos da linguagem popular, sem “tomar partido” por ninguém[79]. Importante destacar que a imprensa deve trabalhar dentro da maior imparcialidade possível, narrando os fatos com neutralidade, de forma a informar ao público objetivamente, sem contaminar a matéria com elementos que manifestem tendência a favorecer determinada parte envolvida. Em relação ao assunto, escreveu Aluízio Ferreira, citando Jean Rivero, afirma que:

“Ao discorrer sobre os problemas da liberdade de imprensa, engloba-os em duas grandes vertentes: a dependência do poder político e a vinculação ao poder econômico, da qual resulta o movimento de concentração de empresas e a sujeição ao patrocínio publicitário, em prejuízo da liberdade de expressão e da independência necessária. (...) As empresas passaram a publicar apenas o que interessava a si e a seus acionistas ou anunciantes, e a ignorar ou julgar irrelevantes o que não correspondesse a tais interesses, além de omitir, distorcer ou mesmo fabricar fatos, para beneficiar-se ou manter suas posições de privilégios, em conluio com os detentores do poder” [80].

Como já fora acima discutido, o poder econômico e político vem cerceando a liberdade de imprensa, obstacuralizando, assim, que ela atue com a devida imparcialidade, pois a necessidade de compensação financeira, de obtenção de lucros ou até mesmo de apoio do Estado e a dependência econômica fazem com que seja comprometido o teor das matérias publicadas, no intuito de prender a atenção do receptor. Além disso, face a esta dependência, manipulam-se as notícias de forma a favorecer ou não comprometer a imagem daqueles que detém o poder, apenas publicando o que lhes for conveniente. Foi nesse sentido que escreveu Juarez Bahia, ao dispor que “o jornalismo pretende ser testemunha da história a partir da publicação dos fatos. (...) A imparcialidade para o jornalismo é um ideal” [81].

Em relação ao elemento veracidade, a Declaração de Princípios para a Conduta dos Jornalistas, que é fonte internacional para o padrão de conduta desses profissionais, prescreve em seu art. 1º, in verbis: “Respeito à verdade e ao direito do público à verdade é o primeiro dever do jornalista” [82]. Nesse mesmo sentido dispõe o Código de conduta dos jornais, in verbis: “Apurar e publicar a verdade dos fatos de interesse público, não admitindo que sobre eles prevaleçam quaisquer interesses” [83].

Observa-se que todos os códigos e manuais de conduta que norteiam a atividade do profissional da imprensa estabelecem ser a veracidade um dever a ser totalmente respeitado. Atualmente, como será adiante demonstrado, a mídia nem sempre trabalha em cima da verdade dos fatos, parecendo desconhecer o estabelecido para a conduta dos profissionais, o que traz nefastas conseqüências para a formação da opinião pública.

Não se deve esquecer, ainda, da importância da honestidade, visto que uma matéria não-honesta compromete a idoneidade do meio de comunicação e a reputação do profissional que a editou. Pode-se afirmar que a má manipulação de uma notícia pela imprensa é uma atitude totalmente desonesta. Se o profissional atuar com imparcialidade, narrando veridicamente os fatos, não há de se falar no cometimento de crime algum. Assim, observe-se a seguinte decisão:

“CRIMES CONTRA A HONRA – Advogado que em peça processual tece comentários contrários à atuação de investigador de polícia – Ausência de dolo demonstrada na atuação defensiva – Não caracterização.

Os crimes contra a honra não se caracterizam na hipótese em que o Advogado em peça processual tece comentários contrários à atuação de investigador de polícia, pois as palavras, neste contexto, apresentam-se isentas da vontade livre e consciente de ofender a honra do querelante”. (TACrimSP - Recurso em Sentido Estrito nº. 1.347.631/2 – Ribeirão Preto. Relator: Euvaldo Chaib. 2ª Câmara. Data do julgamento: 15/052003. V.U. - Voto nº. 2.430).

No mesmo sentido, a seguinte ementa:

“LEI DE IMPRENSA. CRIME CONTRA A HONRA. MATÉRIA QUE NÃO FOCALIZA COM EXCLUSIVIDADE E ESPECIFICAMENTE O SUPOSTO OFENDIDO, CINGINDO-SE À VERDADE DOS ACONTECIMENTOS, COM MERA REPETIÇÃO DE FATOS DE INTERESSE NACIONAL QUE O ENVOLVERAM. RECEBIMENTO DA QUEIXA-CRIME. IMPOSSIBILIDADE: IMPOSSÍVEL O RECEBIMENTO DE QUEIXA-CRIME POR DELITO CONTRA A HONRA PREVISTO NA LEI DE IMPRENSA, NA HIPÓTESE EM QUE A MATÉRIA INCRIMINADA NÃO FOCALIZA COM EXCLUSIVIDADE E ESPECIFICAMENTE O SUPOSTO OFENDIDO, EXTRAINDO-SE DE SEU CONTEXTO, MERA REPETIÇÃO DE FATOS DE INTERESSE NACIONAL QUE O ENVOLVERAM, CINGINDO-SE O ESCRITO À VERDADE DOS ACONTECIMENTOS, IDENTIFICANDO-SE O "ANIMUS NARRANDI", EM LEGÍTIMO EXERCÍCIO DO DIREITO DE CRÍTICA INSPIRADO PELO INTERESSE PÚBLICO, SEM INTENÇÃO DE CALUNIAR, INJURIAR OU DIFAMAR, NOS LIMITES DA LIBERDADE DE MANIFESTAÇÃO DE PENSAMENTO INSCRITA NO ART. 5º, IV, DA CARTA MAGNA”. (TACrimSP – Apelação Criminal nº. 1090509/1. Relator: Roberto Montanari. 13ª Câmara. Data do julgamento: 01.9.1998).

Urge que a mídia exerça o seu papel dentro dos preceitos éticos, respeitando os valores e direitos personalíssimos dos indivíduos e da sociedade. Assim, deve ela sempre reconhecer, proteger, garantir e respeitar o direito de terceiros, pois “embora os valores éticos estejam dentro de cada indivíduo, seu resultado afeta diretamente outras pessoas. (...) A ética de um jornal é a expressão de como ele conduz seus negócios moral e profissionalmente” [84].

No Brasil, há um Código de Ética dos jornalista em vigor desde 1987[85]. Bastaria a leitura do mesmo, bem como o efetivo cumprimento de suas normas, para que tantas demandas envolvendo os excessos da mídia não abarrotassem o Poder Judiciário e não houvesse tanta colisão entre os direitos fundamentais. Parece, entretanto, que os jornalistas adotam as normas desse manual como se elas fossem uma exceção e não a regra a ser inafastavelmente seguida. 

4.6.2. O conteúdo das notícias

Notícia, oriunda do latim notitia, significa “relatório ou informação sobre um acontecimento recente; aquilo que se ouve pela primeira vez; assunto de interesse, matéria adequada para jornal e noticiários de rádio e/ou televisão” [86]. Dessa breve exposição de significado, infere-se que é ela o principal material de trabalho da mídia, visto que a imprensa, em sua acepção mais ampla, trabalha, principalmente, com a divulgações de notícias como forma de manter informada a população[87], cumprindo o seu importantíssimo papel no Estado Democrático de Direito. Pode-se conceituá-la como sendo o formato de divulgação de determinado fato pelos meios de comunicação.

Como dito, é imprescindível à sociedade uma mídia que atue com seriedade, divulgando os acontecimentos para que estes sejam por todos conhecidos. No afã de cumprir este papel informativo, auferindo, ao mesmo tempo, elevados lucros com as publicações, os proprietários de jornais e demais veículos estão sempre buscando excelência nas notícias. Para que a mesma seja alcançada, quatro fatores principais devem estar presentes em seu conteúdos, quais sejam:

Novidade: a notícia deve conter informações novas, e não repetir as já conhecidas;

Proximidade: quanto mais próximo do leitor for o local do evento, mais interesse a notícia gera, porque implica mais diretamente na vida do leitor

Tamanho: tanto o que for muito grande quanto o que for muito pequeno atrai a atenção do público

Relevância: notícia deve ser importante, ou, pelo menos, significativa. Acontecimentos banais, corriqueiros, geralmente não interessam ao público “[88].

São estes os elementos que norteiam o trabalho de todo jornalista, afinal, ninguém tem interesse em publicar assunto que não chame a atenção do público, não gere comentários posteriores e nem alimente a curiosidade popular pela vida alheia.  Nesta visão, agir de forma contrária seria total perda de tempo e de dinheiro, pois nenhum cidadão se prestaria a comprar um jornal, uma revista ou assistir um programa de televisão que não reportasse nenhuma novidade, permanecesse inerte face aos acontecimentos e nada acrescentasse ao seu conhecimento. Seria um verdadeiro retrocesso, inconcebível na dinâmica sociedade contemporânea.

Não basta apenas, entretanto, que sejam preenchidos os mencionados requisitos para que a notícia seja de boa qualidade. Não menos importante do que eles é o conteúdo a ser transmitido, bem como a atitude e postura daqueles que narram os fatos, que devem agir com a maior neutralidade e imparcialidade possível. Isso porque, correlato à liberdade de imprensa está o direito de o receptor ter acesso a uma informação dotada de veracidade e completude.

A mídia não pode veicular matérias falsas, não pode inventar fatos sob o vil pretexto de atrair o público. Isso iria de encontro aos preceitos éticos e morais vigentes na sociedade e em seu manual de conduta. Toda crônica deve sempre pautar-se em fatos verdadeiros. Assim, o jornalismo tem de nortear-se pela busca e transmissão da verdade, requisito essencial ao digno exercício da liberdade de informação. Nesse diapasão, pode-se questionar o que seria, então, a verdade de um fato, visto que nem sempre é possível saber precisamente como ele ocorreu, motivo pelo qual inúmeras investigações são instauradas.

Ora, a verdade jornalística consiste em não mentir deliberadamente, agir com a certeza de que se está transmitindo a verdade[89], até mesmo porque um fato considerado verdadeiro, depois de uma investigação mais aprofundada, pode deixar de sê-lo comprovadamente, e isso não compromete a atividade da imprensa, que narrou aquele fato ciente de que ele era verdadeiro no momento. Assim, a verdade que se exige é a real versão dos fatos e nunca uma verdade absoluta, porque esta é quase impossível de ser alcançada.

Ressalte-se, entretanto, que por mais imparcial que tente ser um jornalista, sempre haverá uma carga de subjetividade em sua atuação. Trata-se de um ser humano, com sentimentos e valores ínsitos, os quais, mesmo que de forma despercebida, acabam interferindo em sua atividade[90]. Mesmo assim, o profissional deve ater-se, ao máximo, à realidade dos fatos, transmitindo-os com objetividade. Agindo com diligência e responsabilidade, cumprirá a função de informar a sociedade, não contribuindo para a formação de uma equivocada opinião pública a cerca de determinado assunto. Nesse sentido:

“Não existe objetividade em jornalismo. Ao escolher um assunto, redigir um texto e editá-lo, o jornalista toma decisões em larga medida subjetivas, influenciadas por suas posições pessoais, hábitos e emoções. Isso não o exime, porém, da obrigação de ser o mais objetivo possível. Para relatar um fato com fidelidade, reproduzir a forma, as circunstâncias e as repercussões, o jornalista precisa encarar o fato com distanciamento e frieza, o que não significa apatia nem desinteresse” [91].

Além disso, a imprensa não pode transmitir fatos incompletos. Toda informação deve ser completa, o que é de essencial importância, pois através da supressão de aspectos atinentes a determinados fatos, pode ser criada no imaginário popular uma falsa percepção da realidade, uma noção distinta daquilo o que realmente aconteceu.

Frise-se que a narração de um fato de maneira equivocada ou incompleta pode causar prejuízos irreparáveis na vida daqueles que dele participaram, o que vem acontecendo, comumente, nas matérias policiais e judiciais, em que inocentes são acusados sem a devida investigação e expostos à revolta da população, sendo que, em muitos casos, depois resta comprovada a inocência dos mesmos, mas os prejuízos ocasionados à honra e demais bens personalíssimos são definitivos.

De igual relevância mostra-se a maneira através do qual uma notícia é divulgada. A linguagem utilizada deve ser simples, compreensível por todos, permeada por objetividade e serenidade. Não pode o jornalista narrar os fatos de forma confusa, utilizando-se de expressões tendenciosas ou agressiva. Se assim o fizer, o público poderá contaminar-se pelos artifícios empregados na divulgação da matéria e, consequentemente, formular equivocados juízos de valor.

Se todos os elementos e requisitos acima expostos fossem fielmente seguidos, problemas não haveria. Triste é que a realidade afasta-se bastante desse sonho, ou, porque não dizer, utopia. Sim, pois não parece que os profissionais do jornalismo passam anos na faculdade (quando formados) estudando os preceitos da ética jornalística e os princípios norteadores de sua atividade, e, se o fizeram, certamente esqueceram com muita facilidade tudo aquilo o que aprenderam logo quando se inseriram no mercado de trabalho. A culpa não é exclusivamente deles (claro que poderiam optar por agir de acordo com os referidos princípios, mesmo correndo o risco de permanecer desempregados), mas também dos proprietários dos meios pelos quais são transmitidas as notícias e até mesmo dos princípios capitalistas em geral.

Aqui também o dinheiro é questão de influência decisiva, ditando, inclusive, o conteúdo das notícias e influenciando na reconstrução de um fato. Como afirmado, os grandes grupos econômicos visam lucrar cada vez mais e lançam mão de qualquer artifício para o alcance desse propósito. Assim, a notícia deve ser obtida em “primeira mão” e transmitida ao público com ineditismo, no afã de atrair a atenção do maior número de pessoas.

É fato que existem aparatos tecnológicos capazes de captar um fato em tempo real, mas nem sempre é possível àquele que irá editar e transmitir a mensagem compreender imediatamente o que aconteceu, de forma a conseguir transmitir a pura verdade à população. Como não se pode perder um “furo de reportagem”, muitas vezes a realidade dos fatos é manipulada, seja em decorrência de uma interpretação equivocada do profissional, que não teve tempo para analisar o que realmente aconteceu, seja pela transmissão de uma mensagem incompleta, que leve as pessoas a terem uma noção equivocada do fato.

Assoma-se ainda a rotineira prática de manipulação dos fatos para que a notícia prenda a atenção do receptor. Nesse intuito, são utilizadas expressões pejorativas e tendentes a levar uma pessoa a acreditar naquilo o que foi dito. Nos dizeres de Ana Maria:

 “A necessidade da rapidez de sintetizar as idéias, de torná-las acessíveis ao público, a pressão que sofre o jornalista com a iminência do fechamento da edição prejudicam a verdade, a objetividade na narração dos fatos que se tornam notícias. O profissional deve fazer com que a realidade entre no mundo da fantasia, da representação. Não há tempo de analisar, refletir e investigar o fato, não há como conferir as fontes de informações. É o fast journalism impedindo o acesso à verdade substancial, impondo tanto a verdade formal como a oficial do jornal, da TV. Não havendo outros critérios de avaliação pelo receptor da ‘mensagem fugaz’, a verdade é o que a mídia noticiou como tal” [92].

Não podem perpetuar-se as práticas de divulgação de notícias a qualquer custo, sem que seja feita uma análise das repercussões que tais atitudes podem causar. Isso conflui contra os pilares do Estado Democrático de Direito.

4.6.3. Sensacionalismo na mídia

Neutralidade e imparcialidade da imprensa. Estes eram, e ainda são, ideais para o correto desempenho da função jornalística. Mas como todo ideal ou sonho, nem sempre se materializam, continuando, assim, presentes na ilusão daqueles que acreditam ser a mídia sempre fiel e verdadeira na narrativa dos fatos. Prova inconteste desta afirmação encontra-se nos meios e maneiras utilizados para a divulgação das notícias pela mídia sensacionalista. Ora, divulgam-se e exploram-se as matérias em um tom espalhafatoso, capaz de emocionar, chocar ou escandalizar o público[93], trazendo-se para o plano da realidade a concretização do significado da palavra sensacionalismo. Sim, hoje é ele que impera nos meios de comunicação, que se empenham em criar artifícios cada vez mais surpreendentes para chamar a atenção do destinatário da mensagem[94].

O sensacionalismo, como sugerido pelo próprio termo, é uma maneira diferenciada de transmissão de notícias, com o intuito de envolver e prender a atenção do maior número de pessoas possível. Nesse sentido, os jornalistas fazem uma prévia seleção e escolhem publicar ou transmitir os assuntos capazes de surpreender e chocar o público, envolvendo-o na matéria e despertando fortes sentimentos. Assim, utilizam-se das mais variadas técnicas para a manipulação das emoções do receptor da mensagem, induzindo-o a um baixa capacidade de reflexão crítica sobre os fatos narrados, com o emprego de uma linguagem facilmente compreensível por todos e da linguagem-chichê[95], para que a opinião das pessoas coincida com aquela que foi transmitida pelo profissional.

Frise-se que o sensacionalismo não se trata apenas de uma forma ou maneira de divulgação dos fatos, englobando diversos outros fatores, a exemplo da seleção dos temas mais interessantes, que gerem maior atratividade, para constarem nas pautas; do emprego de grande teor emotivo ao relatar o fato, aguçando os sentimentos do público; da exploração por demais prolongada, e até mesmo repetitiva, dos fatos escandalosos que despertaram grande atenção; além da análise do tipo de reação que se pretende gerar no público ao ter contato com a mensagem, sendo este um artifício de primordial importância para a manipulação da opinião pública.

Diz Ana Maria, sobre a linguagem sensacionalista, que:

“A linguagem sensacionalista, caracterizada por ausência de moderação, busca chocar o público, causar impacto, exigindo o seu envolvimento emocional. Assim, a imprensa e o meio televisivo de comunicações constroem um modelo informativo que torna difusos os limites do real e do imaginário. Nada do que se vê (imagem televisiva), do que se ouve (rádio) e do que se lê (imprensa jornalística) é indiferente ao consumidor da notícia sensacionalista. As emoções fortes criadas pela imagem são sentidas pelo telespectador. O sujeito não fica do lado de fora da notícia, mas a integra. A mensagem cativa o receptor, levando-o a uma fuga do cotidiano, ainda que de forma passageira. Esse mundo-imaginação é envolvente e o leitor ou telespectador se tornam inertes, incapazes de criar uma barreira contra os sentimentos, incapazes de discernir o que é real do que é sensacional” [96].

Hodiernamente, dentre os meios que compõe a mídia, é televisão que mais se utiliza das técnicas sensacionalistas, o que é favorecido pela maneira como os programas transmitem determinado fato, aliando à narrativa imagens que possuem o condão de causar forte impacto naqueles que as assistem. E assim seguem os profissionais dramatizando os fatos, divulgando imagens em ângulos que levem o telespectador a “criar” opiniões manipuladas a respeito dos personagens, estereotipando os indivíduos como portadores de má índole e de um baixo caráter, já que o que o público viu foi o retrato de uma pessoa cujos traços fisionômicos o levaria, certamente, a formar essa convicção.

É importante ter em mente que, mesmo divulgando imagens, nem sempre o que é transmitido por uma matéria televisiva condiz com a realidade dos fatos. Antes da exibição de determinada notícia, efeitos são utilizados, realizando-se montagens, seleções e dramatizações que causam verdadeiro impacto nos telespectadores. Se é certo que a televisão atrai mais o público pela imagem do que pelos discursos, não se deve esquecer que uma imagem pode perfeitamente apenas retratar parte da realidade.

E são através desses artifícios que a massa assiste diariamente a verdadeiros espetáculos de transmissões de notícias, que, manipuladas, banalizam a realidade e tratam das mazelas sociais como cenas teatrais, por meios de títulos e mensagens contundentes, fazendo com que opinião pública confunda-se com própria opinião publicada, por não conseguirem as pessoas formarem uma convicção distinta daquilo o que foi passado, até porque, muitas vezes, tenha sido aquela a única fonte pela qual tenham tomado conhecimento de certo fato, como afirmado.

Nesse contexto, a cada dia aumenta a quantidade de programas que exploram a violência, a pobreza e demais mazelas sociais, utilizando-se de chamadas impactantes, capazes de prender a atenção de pessoas que, apesar de tão sofridas, alimentam a sua necessidade de diversão com reportagens que tratam das desgraças alheias. Transforma-se a violência em entretenimento, embotando nas pessoas uma ânsia por desfechos que atendam aos clamores sociais. Cabe aqui, perfeitamente, transcrever um trecho da obra de Ana Maria, em que ela diz:

“Esse tipo de imprensa utiliza-se de formas sádicas, calunia e ridiculariza as pessoas. Explora os temas agressivos, dos submundos da sociedade hierarquizada onde o crime se integra em condições de normalidade. É o jornalismo de escândalo que tem por fim agredir com o que é proibido, obsceno, temido, criando uma ficção que seduz. Não se presta a informar, e sim a vender aparência, entretenimento barato que consiste no lado atraente dos escândalos envolvendo crimes” [97].

Aqui, é claro, encontra-se o espaço perfeito para a exploração da violência, do crime e da justiça penal por meio de um discurso de fácil compreensão, ágil e coloquial, ilustrado com imagens impactantes que transformam as mais tristes e cruéis barbaridades em espetáculos televisivos. Segue o público assistindo a todos os detalhes exibidos pela televisão, ávido por não perder nenhuma notícia ligada ao assunto, acompanhando a matéria diariamente, como se estivesse assistindo a um filme ou ficção que tratasse da violência, seduzidos pelo quotidiano de verdadeiros marginais, sem muitas vezes se dar conta de que estão diante de fatos reais, que causam grande abalo e sofrimento às partes envolvidas, e que podem vir perfeitamente a acontecer no seio de suas famílias.

Para defenderem-se das acusações de excessos e crimes, os jornalistas (incluindo-se aqui até mesmo aqueles que teoricamente condenam o sensacionalismo, defendendo a plena liberdade de imprensa com neutralidade), geralmente afirmam que a mídia jamais produz fatos, que ela apenas relata tudo o que aconteceu de forma neutra. Verifica-se, de pronto, que este argumento é falacioso e não prospera, mesmo porque nenhuma linguagem é totalmente neutra e ninguém consegue manter-se totalmente impermeável às influências do meio que o cercam (assim também é o jornalista, que, muito mais do que um profissional, é um ser humano com todas as características a ele inerentes). Nesse mesma linha de raciocínio, defende Luiz Ferri de Barros:

“Notícias de suicídio raramente são divulgadas pela mídia, salvo em casos excepcionais, porque existe um consenso entre os jornalistas a respeito de que tais notícias podem eventualmente induzir outras pessoas a cometerem suicídio. Esta simples norma ética, consuetudinariamente estabelecida, é demonstração suficiente de que, a despeito de proselitismo em contrário, os jornalistas concordam que a mídia tem o poder de induzir comportamentos socialmente indesejáveis, independentemente da forma com que os fatos são relatados, o que serve, adicionalmente, para demonstrar a impossibilidade de sua neutralidade, dispensando-se outras considerações” [98].

O jornalismo sensacionalista parece ter suplantado o jornalismo informativo, o qual reporta fatos despido de valorações. Aquele enaltece e fabrica o fato, dando a qualquer acontecimento uma grande carga de emoção e um tom escandaloso. Isso traz conseqüências negativas para os envolvidos, que vêem suas honras sendo atropeladas pelos veículos de informação e passam a desfrutar de uma péssima reputação diante de toda a sociedade. Reconstruir o estrago que foi feito na vida dessas pessoas é muito difícil, quando não impossível. E assim, resta a elas a perpétua pena de tentar sobrevier com as migalhas que lhes restaram de suas reputações e honras na sociedade, na esperança de algum dia reconstruir suas dignidades.

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Sobre a autora
Paula Leal Lordelo

Advogada, formada em Direito pela UFBA - Universidade Federal da Bahia. Pós graduação em Direito Processual e Material do Trabalho pelo JusPodivm.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

LORDELO, Paula Leal. Limites à liberdade de expressão e de informação da mídia face ao direito à honra de pessoas envolvidas no processo criminal. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3678, 27 jul. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/24377. Acesso em: 19 mai. 2024.

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