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A bioinvasão de ambientes aquáticos provocada pela água de lastro das embarcações e suas consequências jurídicas

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23/09/2015 às 15:33

Resumo:


  • A água de lastro desempenha um papel fundamental no controle da estabilidade das embarcações, mantendo os parâmetros estruturais adequados, como altura metacêntrica, calado e esforços estruturais.

  • Em navios, a água de lastro é utilizada para controlar o trim, a banda, o calado e a estabilidade, mantendo o centro de gravidade e o metacentro em posições que garantam o equilíbrio do navio.

  • Nas plataformas de petróleo, a água de lastro é empregada da mesma forma, porém, o impacto ambiental dos lastreamentos e deslastreamentos é menor devido à estabilidade dessas unidades estacionárias na maior parte de sua vida útil.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

5 ...... GERENCIAMENTO E CONTROLE DA ÁGUA DE LASTRO

O gerenciamento da água de lastro das embarcações aquaviárias consiste na prática de trocar ou tratar a água de modo que não ocorra a introdução de organismos exóticos e/ou patogênicos, ou que esta seja minimizada, no meio ambiente marinho (ZANELLA, 2010). O tratamento pode ser realizado a bordo ou no porto. De forma mais específica, a NORMAM 20 define o gerenciamento da água de lastro:

Compreende os processos mecânicos, físicos, químicos e biológicos, sejam individualmente ou em combinação, para remover, tornar inofensiva ou evitar a captação ou descarga de Organismos Aquáticos Nocivos e Agentes Patogênicos encontrados na Água de Lastro e Sedimentos nela contidos (BRASIL, 2014, p. viii).

Destarte, com o fim de prevenir ou reduzir ao mínimo a invasão de organismos exóticos e/ou agentes patogênicos nas AJB, a NORMAM 20, antecipando-se à vigência da BWM 2004, prescreve, no seu item 2.1, que toda embarcação nacional ou estrangeira deve possuir um Plano de Gerenciamento de Água de Lastro em sua documentação de bordo. Este plano deve, sobretudo, descrever detalhadamente as ações a serem tomadas para implementar o gerenciamento da água de lastro e indicar os pontos possíveis de coleta de amostras representativas da água de lastro do navio. Além disso, deve ser específico para cada embarcação e ser aprovado por Sociedade Classificadora com delegação de competência da AM ou pela Administração do País da Bandeira do navio (BRASIL, 2014).

Sem embargo, antes de prosseguir nas formas de gerenciamentos, faz-se necessária a abordagem do Programa da IMO que preparou a elaboração e aprovação da BWM 2004, bem como está preparando sua implementação, quando entrar em vigor.

5.1 ... PROGRAMA GLOBALLAST

Atendendo à solicitação inicial da Convenção de Montego Bay, constante nos seus art. 194 e 196, já referidos, e às demandas da UNCED-92, por meio da Rio-92, da Agenda 21 e da CDB, a IMO deu início a abordagens sistemáticas acerca dos problemas ocasionados pela água de lastro das embarcações.

Nesse âmbito, a intenção era definir regras adequadas para evitar ou reduzir a transferência de organismos aquáticos exóticos e/ou patogênicos nos locais onde as descargas de água de lastro são realizadas, bem como ensejar estudos e trabalhos científicos sobre o tema e preparar a comunidade internacional para a entrada em vigor de uma Convenção Internacional sobre Água de Lastro (LEAL NETO, 2007).

Para fomentar tais demandas, a IMO perseguiu as linhas de ação seguintes:

- formação de grupo de trabalho de água de lastro no âmbito de seu Comitê de Proteção ao Meio Ambiente Marinho (MEPC);

- adoção de Diretrizes para o controle e gerenciamento da água de lastro de embarcações para minimizar a transferência de organismos aquáticos nocivos e patogênicos;

- desenvolvimento de um novo instrumento legal de âmbito internacional (Convenção) sobre o gerenciamento de água de lastro por meio de uma Conferência Diplomática;

- e definição de uma iniciativa conjunta com o Fundo Mundial para o Meio Ambiente (GEF) e o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (UNDP) para identificar e avaliar barreiras ao efetivo trato da questão da água de lastro em algumas das regiões em desenvolvimento do mundo. (LEAL NETO, 2007, p. 16-17).

Assim, contando a IMO com o apoio dos Estados-membros e da indústria do transporte marítimo, foi possível, em 1999, a criação do Programa Global de Gestão de Água de Lastro (GloBallast), que tinha como meta preparar os países para a implementação da referida Convenção. Mas, para tanto, havia de ajudar inicialmente os países em desenvolvimento a pôr em prática as diretrizes previstas na Resolução A.868 (20).

Dessa forma, conforme informa Xavier (2008), de março do ano 2000 até março de 2003, foi implementado o Programa GloBallast nas seis principais regiões em desenvolvimento do mundo, que incluía o Brasil (Porto de Sepetiba, atualmente Porto de Itaguaí, Estado do Rio de Janeiro), China (Dalian), Índia (Bombaim), Irã (Ilha Kharg), África do Sul (Saldanha) e Ucrânia – Odessa. Devido à complexidade do tema, as negociações entre os Estados-membros da IMO alongaram-se mais do que o esperado e a Conferência Diplomática foi remarcada para 2004, de forma que a previsão de término do Programa foi estendida até dezembro de 2004, para abarcar a nova Convenção sobre Água de Lastro (BWM 2004), em elaboração.

Além dos aspectos acima e do fato de o país utilizar o modal aquaviário em 96% das exportações nacionais, conforme já aludido, o Brasil foi escolhido como um dos países-piloto do programa também pela

participação ativa da delegação brasileira no Grupo de Trabalho de Água de Lastro, no âmbito do Comitê de Proteção do Meio Ambiente Marinho da Organização Marítima Internacional (MEPC/IMO), ao longo da segunda metade da década de 90 e início desta década, e o aperfeiçoamento do Método de Diluição para troca da água de lastro pela Empresa PETROBRAS [como será verificado abaixo], por meio de modelagem numérica e testes em escala real com o Navio Lavras, credenciaram o Brasil a participar do Programa Global de Gestão de Água de Lastro – Programa GloBallast –, que conta com recursos do Fundo Mundial para o Meio Ambiente (GEF). O grau avançado de organização interna para tratar o assunto (comunidade marítima, portuária, órgãos de meio ambiente, vigilância sanitária) também foi importante no momento da escolha para participar do Programa GloBallast, juntamente com a África do Sul, China, Índia, Irã e Ucrânia. (MERCOSUL, 2004, p. 10).

Deve-se ressaltar que o MMA desempenhou a função de coordenação do Programa GloBallast na sua primeira fase, tendo a Secretaria de Qualidade Ambiental nos Assentamentos Humanos (SQA), do próprio MMA, como Ponto Focal Nacional do projeto, auxiliada pela Gerência do Projeto de Gestão Integrada dos Ambientes Costeiro e Marinho (GERCOM/SQA). Além disso, várias instituições integraram uma Força-tarefa Nacional (FTN), dentre elas: ANVISA; Agência Nacional de Transportes Aquaviários (ANTAQ); Companhia Docas do Rio e Janeiro; Diretoria de Portos e Costas (DPC); Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA); Petrobras; Universidade Federal do Rio de Janeiro; além de representantes da área do transporte marítimo e de Organizações Não-Governamentais (LEAL NETO; JABLONSKI, 2004).

Nesse âmbito, foi dada a cada país a liberdade de elaborar o seu Plano de Trabalho Nacional, que teve como componentes principais, segundo pontifica Leal Neto (2007, p. 19): “comunicação, educação e mobilização; avaliação de risco da água de lastro; levantamento da biota do porto; medidas de gestão de água de lastro; treinamento; legislação; conformidade, monitoramento e efetivação; e cooperação regional.”

É pertinente informar os principais eventos resultantes do Programa GloBallast aqui no país, justificando plenamente a escolha do Brasil como um dos países-piloto. Assim, podem ser destacadas as contribuições: elaboração, em conjunto com consultor legislativo local, do relatório final de McConnell, em 2002, que identifica as “melhores práticas e contém modelo de legislação que pode ser usado pelos países para desenvolver e implementar [...] regulamentos de gestão de água de lastro consistentes com as diretrizes [...] da IMO e a futura Convenção sobre Água de Lastro” (apud LEAL NETO; JABLONSKI, 2004, p. 18); realização pela ANVISA, em 2002, de “Estudo Exploratório para Identificação e Caracterização de Agentes Patogênicos em Água de Lastro”, por meio da coleta de amostras em nove portos brasileiros (BRASIL, 2003, p. 3); desenvolvimento por técnicos da Petrobras, e homologação pela IMO, do método de diluição brasileiro de troca da água de lastro (LAND et al., 2002), apresentado no próximo subitem; ocorrência, de 13 a 17 de abril de 2003, do “I Workshop Internacional sobre Diretrizes e Padrões para Levantamento e Monitoramento de Espécies Aquáticas Invasoras”, em Arraial do Cabo, Rio de Janeiro (LEAL NETO; JABLONSKI, 2004, p. 16, grifo nosso); execução do levantamento da biota da área sob influência do Porto de Sepetiba e publicação, em 2004, do título: “Biota da área sob influência do Porto de Sepetiba, Rio de Janeiro, Brasil: levantamento de dados pretéritos.” (VILLAC et al., 2004, p. 1); apoio do Programa para a publicação, em 2004, do livro “Água de lastro e bioinvasão”, incluindo catorze artigos científicos abordando diferentes aspectos da bioinvasão via água de lastro, escritos por vários pesquisadores (SILVA; SOUZA, 2004).

Além disso, houve várias iniciativas do Brasil, a título de cooperação regional, no âmbito do Mercosul e no de outros países vizinhos, a exemplo do Encontro Internacional realizado em Brasília de 26 a 28 de abril de 2004, para a adoção de um “Plano Regional de Ação Estratégica para Controle e Gestão da Água de Lastro de Navios e de Espécies Aquáticas Invasoras”, que contou com a participação de representantes do Brasil, Uruguai, Argentina, Paraguai, Chile e Colômbia, bem como da IMO e do UNDP (BRASIL, 2004, p. da internet).

De modo similar, convém lembrar também a iniciativa do Comando da Marinha do Brasil de elaborar a NORMAM 20, em 2005, por meio da DPC, um dos componentes da FTN, tendo em vista a autorização legislativa dada pela LESTA, em seu art. 4º, VII. Esta NORMAM, como já esclarecido, antecipa várias disposições da BWM 2004.

Em realidade, o Programa GloBallast provocou uma conjuntura internacional sem precedentes de gestão coordenada da água de lastro, de forma que, enquanto se aguarda a entrada em vigor da BWM 2004, o GEF e o UNDP aprovaram um fundo para o desenvolvimento de uma segunda fase do projeto, denominado GloBallast Partnerships (GBP). Seu processo de implementação foi iniciado em 2007, com duração inicial prevista de cinco anos, tendo como escopo o enfoque regional, direcionado a alterações e harmonizações legislativas e políticas de minimização de impactos adversos da bioinvasão em regiões ou países que não foram contemplados na primeira fase do programa (XAVIER, 2008). Atualmente, o GBP foi prorrogado por mais dois anos com previsão de término no final de 2014.

Cumpre ainda frisar que o GBP está em execução prioritariamente nas sub-regiões: do Caribe, do Mediterrâneo, do Mar Vermelho, do Golfo de Áden, do leste do Pacífico Sul, da costa oeste da África e na região especial do Pacífico Sul (IMO, 2014b, tradução nossa).

Outrossim, salienta-se que os principais resultados esperados com o GBP, o que tornará a entrada em vigor da BWM 2004 bem mais facilitada, são os que seguem:

- Aumento da aprendizagem, avaliação e gestão adaptativa.

- Estratégias de gerenciamento de água de lastro no local, incluindo medidas legais, políticas e reformas institucionais desenvolvidas, implementadas e sustentáveis em nível nacional.

- Conhecimento de ferramentas de gestão e sistemas de monitoramento marinho sendo efetivamente utilizados para: expandir a consciência pública mundial e o apoio das partes interessadas, melhorar a compreensão dos impactos da água de lastro em face da ecologia marinha e melhorar a comunicação do setor marítimo.

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- Empreendimento de parcerias público-privadas para estimular o desenvolvimento de soluções de tecnologia para tratamento da água de lastro, de baixo custo. (IMO, 2014b, p. da internet, tradução nossa).

Destarte, ficou evidenciado que o Programa GloBallast cumpriu, na sua primeira fase, e vem cumprindo, na segunda, o seu papel principal de preparação dos Estados-membros da IMO e da indústria do transporte marítimo para a entrada em vigor da Convenção Internacional sobre Controle e Gestão da Água de Lastro e Sedimentos de Navios, BWM 2004. Não obstante estes progressos, deve-se admitir que os métodos de troca da água de lastro não são totalmente eficientes para resolver o problema da bioinvasão e os métodos de tratamento ainda estão em pleno desenvolvimento, como em seguida será verificado.

5.2 ... MÉTODOS DE TROCA

A troca da água de lastro, permitida, em regra, a mais de 200 milhas da costa e em lâmina d’água mínima de 200 metros, é muito utilizada por ser ainda bem eficiente diante das circunstâncias tecnológicas atuais. Entretanto, além das desvantagens específicas de cada método, a troca em alto-mar apresenta algumas restrições decorrentes da

permanência de resíduos e sedimentos no fundo do tanque, onde organismos ainda habitam, pois diminuem a eficiência da troca em alto-mar. Os riscos que podem ser oferecidos à tripulação e estrutura do navio dependendo de certas condições de tempo e de mar e em viagens costeiras e de curta distância também são [considerados] restrições, onde a troca de água de lastro constitui um procedimento financeiramente impraticável. (ARAÚJO, 2012, p. 23).

Assim, para as embarcações que ainda não possuem aparelhamento para o tratamento da água de lastro a bordo, a legislação nacional e a internacional possibilitam a utilização de métodos para sua troca em localidades adequadas e sob condições meteorológicas favoráveis. Dentre estes, são admitidos a utilização dos métodos sequencial, de fluxo contínuo e de diluição brasileiro. O método de transbordamento é também comumente citado pela doutrina, conforme será enfocado.

O método sequencial consiste em esgotar, de forma completa, toda água de lastro do tanque e em seguida substituí-la por água oceânica. Conforme Bastos (2006, p. 38), este “procedimento é feito em águas profundas, o mais distante possível da costa e fora das águas territoriais do Estado do Porto, resultando num ‘lastro limpo’.” Isto é realizado utilizando bombas do sistema de lastro que deslastreiam de um, ou mais grupos de tanques simétricos, e despejam no mar até esvaziá-los. Em seguida, eles são lastreados por bombas, ou por gravidade caso os tanques se encontrem abaixo do nível do mar. Tal operação é executada, geralmente da sala de controle, sequencialmente em cada tanque, ou grupo de tanques diagonalmente simétricos, por meio de manobras que envolvem abertura e fechamento de válvulas e acionamento das citadas bombas. A renovação é total, mas o método é demorado e pode ser perigoso para a segurança da embarcação, porquanto, havendo inclinação ou mudança no calado, apresenta risco à sua estrutura e estabilidade.

O método de fluxo contínuo, de acordo com Carmo (2008, p. 38), “consiste na substituição do lastro sem o deslastro prévio, acrescentando um volume de água três vezes superior ao volume do tanque no decorrer da viagem e permitindo o transbordo da água pelo costado.” Nesta operação, o lastreamento é efetuado por bombas do sistema de lastro da embarcação e o deslastreamento simultâneo, e na mesma quantidade de água, é realizado pela abertura da válvula da tubulação do costado[65] ou da válvula de overboard. É um método de fácil administração que não afeta a estrutura e estabilidade do navio. Entretanto, “os tripulantes ficam em contato com a água contaminada, com riscos de doenças, e os tanques de lastro podem ser submetidos à pressão excessiva.” (SILVA et al., 2004, p. 8).

No método de transbordamento, um volume de água limpa três vezes superior ao que estiver no tanque é bombeado, por meio do sistema de lastro da embarcação, pela parte inferior do tanque até transbordar no convés, através do suspiro do mesmo tanque. Como o método anterior, não afeta a inclinação e o calado da embarcação, não interferindo na sua estrutura e estabilidade. Entretanto, além de não ser “muito eficaz em relação à eliminação das espécies transportadas”, existe o risco de contaminação da tripulação e passageiros pelo contato com a água (ZANELLA, 2010, p. 114), que, antes de ser despejada no mar, atravessa o convés. Adicionalmente, há a possibilidade de pressão excessiva do tanque, caso haja alguma obstrução no suspiro.

O método de diluição brasileiro foi criado por engenheiros da Petrobras, proposto pelo Brasil e aceito pela IMO como alternativa aos métodos anteriores. Consiste no “carregamento da água de lastro (lastreamento) através do topo do tanque e, simultaneamente, a descarga dessa água (deslastreamento) através do fundo do tanque, à mesma vazão, de tal forma que o nível de água no tanque de lastro seja controlado para ser mantido constante.” (LAND et al., 2002, p. 312-313). Há necessidade de instalação do sistema de lastreamento pelo topo dos tanques, como se observa na figura 5, mas o navio mantém seu calado e nivelamento normais durante toda a viagem, sem afetar sua estrutura, estabilidade nem tampouco atingir a tripulação com a água contaminada. Os referidos autores ressaltam que a eficiência deste método pode alcançar 96% de renovação da água do tanque durante o bombeamento de três vezes o seu volume (LAND et al., 2002).

Figura 6 – Arranjo do método de diluição brasileiro em conjunto com o sistema original de lastro do navio

Fonte: Land et al. (2002, p. 312).

Verifica-se, assim, que a principal diferença entre os três primeiros métodos apresentados e o método de diluição é que, neste, os tanques são lastreados e deslastreados utilizando-se duas bombas de lastro ao mesmo tempo, bem como há melhor eficiência em termos de renovação da água contaminada.

Dessa maneira, apesar da boa eficiência do último método apresentado, ele ainda apresenta risco de contaminação dos ambientes aquáticos. Entretanto, enquanto não houver o aparelhamento para tratamento da água de lastro dos navios mais antigos nos prazos estabelecidos pela BWM 2004, conforme denota a sua Regra B-3, a construção de novos navios com instalações que propiciem um tratamento da água de lastro eficiente, ou a combinação com outros, de forma segura e sustentável economicamente, ou, alternativamente, a construção de estações de tratamento nos portos, os métodos de trocas são os mais indicados.

5.3 ... MÉTODOS DE TRATAMENTO

Além dos métodos de troca, as formas de gerenciamento da água de lastro usadas, ou testadas em pesquisas, atualmente são os tratamentos: físicos – térmico, elétrico, magnético, acústico, de filtração, com ausência de luz, com aplicação de raios ultravioleta; químicos – desoxigenação, ozonização, eletrólise, de controle de salinidade, com aplicação de desinfetantes ou de aditivos como íons de cobre e prata; e biológicos – com aplicação de biocidas e com ausência de nutrientes.

Ressalta-se que cada sistema de tratamento de água de lastro (BWMS) deve ser aprovado pelo MEPC da IMO, ao emitir o Certificado Internacional, conforme estabelece a Seção E da BWM 2004, desde que os métodos de tratamento empregados cumpram, isolada ou conjuntamente, a já mencionada Regra D-2 desta Convenção. Em seguida, apresentam-se alguns destes métodos, sem pretender exauri-los, haja vista o estágio atual de pleno desenvolvimento tecnológico em curso.

A filtração consiste no bloqueio do acesso aos tanques de organismos maiores que o tamanho da malha dos filtros instalados nas tubulações de admissão do lastro, à montante destes tanques. O seu uso não provoca degradação ambiental, porém, o alto fluxo e o grande volume de água, nas operações de lastreamento e deslastreamento da embarcação, desafiam o uso deste método, uma vez que, “além da complexidade do equipamento a ser utilizado, é necessária a análise dos custos dos filtros, que aumentam com a quantidade de organismos removidos.” (SANTOS; LAMONICA, 2008, p. 146). Na realidade, este sistema “apresenta não mais que setenta por cento de eficiência no tratamento quando utilizado isoladamente.” (DARDEAU et al., 1995 apud PEREIRA, 2012, p. 86).

O processo de tratamento por radiação ultravioleta consiste na irradiação de luz ultravioleta na água captada pelo navio por meio de lâmpadas instaladas externamente a tubos de teflon. Esta luz provoca mudanças fotoquímicas no material genético dos microorganismos, levando-os à morte decorrente de mutações nocivas (MESBAHI, 2004 apud PEREIRA, 2012). No entanto, ainda segundo Pereira (2012), este método perde eficiência para organismos maiores, bem assim com a turbidez ocasionada pelos sólidos suspensos, pois, neste caso, há redução da irradiação da luz ultravioleta.

Com efeito, para melhorar a eficiência, busca-se combinar a radiação ultravioleta com a filtração, tendo em vista a capacidade deste de impedir a passagem de organismos maiores e de reduzir a turbidez da água.

O método térmico de tratamento consiste em aproveitar o calor gerado pelos motores que geram energia elétrica e os que propulsionam o navio, por meio do uso de trocadores de calor os quais, ao mesmo tempo em que resfria a água quente oriunda do motor, aquece a água captada externamente para lastrear os tanques.

Ainda não há certeza acerca da temperatura ideal a eliminar todos os microorganismos, porém, acredita-se que haja eliminação a partir da temperatura de quarenta graus centígrados (TSOLAKI; DIAMADOPULOS, 2010 apud PEREIRA, 2012). Apesar de ser praticamente inviável para embarcações que operam em regiões geladas e a liberação da água aquecida dos tanques de lastro no meio ambiente causar preocupação, é um método atrativo quando operadas em águas tropicais ou equatoriais, pois há melhor eficiência do aquecimento da água de lastro e nenhum produto secundário ou resíduo químico é lançado na água (PEREIRA, 2012).

O processo de tratamento por eletro-ionização tem por fim a eliminação de organismos por meio da aplicação de corrente elétrica na água de lastro. Silva e Fernandes (2004) explicam que a percentagem de esterilização da água é proporcional a intensidade da energia elétrica. De acordo com Araújo (2012), a vantagem da técnica é que ela não gera nenhum resíduo químico; entretanto, o custo é ainda alto e tem sido utilizada para tratamento de água doce, não existindo experiências para água salgada e salobra.

A ozonização é uma forma química de tratamento em que o gás ozônio é utilizado basicamente no tratamento do lastro de água doce, uma vez que, neste meio, não há geração de subprodutos tóxicos. Todavia, segundo Araújo (2012, p.26), “seu uso em água salgada e salobra causa reação com o cloro da água do mar e produz várias substâncias corrosivas, além de várias consequências adversas para a saúde de quem lida com esse sistema.” Vale ressaltar que esta técnica constitui uma poderosa forma de destruição de vírus, bactérias e esporos, bem como de redução do nível de clorofila presente na água (PEREIRA, 2012). Por outro lado, segundo este autor, apresenta desvantagens por ser bastante reativo e corrosivo, além de ser prejudicial à saúde, por ser irritante e possuir certo grau de toxicidade.

A eletrólise, como método de tratamento da água de lastro, envolve a desinfecção da água de lastro por meio da geração de radicais livres de cloro, hipoclorito de sódio (desinfetante) e hidroxila, sendo prescindível a adição ou mistura de outros produtos químicos. Assim, o hipoclorito contido na água de lastro eletrolítica é introduzido no restante da água de lastro para ser esterilizado (ARAUJO, 2012). Este autor ainda esclarece que este método não requer o armazenamento de produtos químicos a bordo do navio, o que evita problemas de segurança, mas produz a formação de íons de cloro e outros radicais iônicos que podem ser nocivos ao meio ambiente. Além disso, somente pode ser utilizado em água de lastro salgada ou salobra.

Já a desoxigenação é uma forma de tratamento que consiste na injeção de gás inerte padrão, composto por nitrogênio, gás carbônico e oxigênio nas proporções de oitenta e quatro, quatorze e dois por cento, respectivamente, por orifícios de tubulações distribuídas nos fundo dos tanques (HUSAIN et al., 2004 apud PEREIRA, 2012). Assim, há a expulsão do oxigênio da água, levando a morte dos organismos aeróbicos. Porém, não é eficiente para eliminar cistos, esporos e bactérias anaeróbicas.

Os biocidas têm sido utilizados a bordo das embarcações como método de tratamento da água de lastro. O cloro é o mais empregado por ser de fácil aplicação, baixo custo e capaz de tratar grandes volumes. Assinala Araújo (2012) que este produto pode ser adicionado à água de lastro ou ser gerado por eletrólise a partir da água do mar. A desvantagem é que, em altas concentrações e em contato com os microorganismos, o cloro gera substâncias tóxicas nocivas ao ambiente aquático, podendo causar câncer, o que coloca em risco a tripulação. Por conta destas desvantagens, acentua Pereira (2012), tem sido indicado o dióxido de cloro, pois não gera tais substâncias nocivas e pode ser usado em baixas concentrações.

No ANEXO E, é apresentada uma listagem dos sistemas de tratamento da água de lastro já aprovados e detentores do Certificado Internacional concedido pelo MEPC, em conformidade com as diretrizes da BWM 2004.

Além de comumente ser instalado a bordo das embarcações, o BWMS também pode ser aparelhado nos próprios portos. Porém, a restrição de espaço nas instalações portuárias e o tamanho da planta – de tanques, equipamentos e tubulações – necessária para tratar grandes volumes de água de lastro constituem grandes empecilhos para o empreendimento.

Diante do exposto, é necessário salientar que o sistema de gerenciamento da água de lastro, além de ser prático e econômico, deve levar em conta a saúde e segurança dos tripulantes e passageiros, a segurança da embarcação e de seus equipamentos, não devendo causar maiores impactos ao meio ambiente do que sua ausência. No entanto, ainda não foi desenvolvida uma forma de gerenciamento com eficácia plena, vez que demanda grandes investimentos em novas pesquisas tecnológicas e na adequação das embarcações.

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Sobre o autor
Marcos Ticiano Alves de Sousa

Licenciado em Matemática e Especialista em Engenharia de Sistemas pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Graduado em Direito pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Advogado.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SOUSA, Marcos Ticiano Alves Sousa. A bioinvasão de ambientes aquáticos provocada pela água de lastro das embarcações e suas consequências jurídicas. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 20, n. 4466, 23 set. 2015. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/42998. Acesso em: 23 dez. 2024.

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