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A Lei 13.245/16 e suas repercussões jurídicas e práticas nas investigações

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01/02/2016 às 08:13

Resumo:

Resumo da Lei 13.245/16


  • A Lei 13.245/16 ampliou significativamente os direitos dos advogados durante as investigações, permitindo acesso a procedimentos investigativos de qualquer natureza e em qualquer instituição responsável por investigações.

  • Introduziu medidas para proteger o direito de acesso dos advogados, estabelecendo penalidades para a inobservância desses direitos, incluindo responsabilização criminal e funcional por abuso de autoridade.

  • Permitiu a participação mais ativa dos advogados durante as investigações, garantindo o direito de acompanhar clientes em interrogatórios e depoimentos, e introduziu a possibilidade de apresentar razões e quesitos durante as investigações.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

4. Das diligências em andamento

O art. 7º, § 11 do Estatuto da OAB dispõe que “a autoridade competente poderá delimitar o acesso do advogado aos elementos de prova relacionados a diligências em andamento e ainda não documentados nos autos, quando houver risco de comprometimento da eficiência, da eficácia ou da finalidade das diligências.”

A Lei 12.527/11 - Lei Acesso à Informação - assegura o sigilo das informações que possam comprometer atividades de inteligência, bem como de investigação ou fiscalização em andamento, relacionadas com a prevenção ou repressão de infrações (art. 23, VIII).

Um fator essencial para o sucesso das investigações consiste no elemento “surpresa”. Isto é, muitas investigações obtém sucesso em razão de seu sigilo e desconhecimento por parte dos investigados.

Portanto, as diligências em andamento, cujo conhecimento por parte do investigado ou do advogado, possam comprometer a eficácia das investigações estão sob o manto do sigilo interno, devendo ser de conhecimento exclusivamente das autoridades envolvidas (Juiz, Promotor, Delegado de Polícia ou Encarregado do IPM).

Importante frisar que mesmo após a diligência estar concluída, caso dela possa derivar outras diligências, a autoridade policial possui respaldo para não juntar ao inquérito, sob pena de comprometer futuras diligências.

Assim sendo, o acesso do advogado aos autos de investigação restringem-se às diligências findas e juntada aos autos, o que não obsta que o advogado acompanhe diligências em andamento, quando essas não puderem sofrer prejuízo, como na hipótese em que a autoridade policial notifique a defesa de ofício ou em razão de pedido do advogado, para apresentar quesitos a serem feitos ao perito que analisará o computador apreendido ou fará o exame de corpo de delito, p. ex.

Importante frisar que é direito do advogado requerer diligências à autoridade policial e a nova previsão de que o defensor possui direito de “apresentar razões e quesitos” (art. 7º, XXI, “a” da Lei 8.906/95) no curso da investigação pouco altera a realidade, na medida em que o art. 14 do CPP assegura ao advogado o direito de requerer "qualquer diligência", cuja realização será decidida pela autoridade policial, o que não impede que a defesa consiga a realização da diligência mediante ordem judicial ou requisição ministerial.

Quando a lei se refere a apresentar “razões”, autoriza que o defensor apresente argumentos ou pedidos com o fulcro de convencer a autoridade policial acerca de alguma decisão já tomada ou a ser tomada, p. ex., inclusive poderá apresentar uma espécie de “defesa” visando que a autoridade policial não indicie seu cliente.

Em se tratando de apresentação de “quesitos”, o advogado poderá formular perguntas ao investigado, às testemunhas, aos peritos que elaborarão o laudo pericial, dentre outros. Frisamos ser possível, inclusive, que o advogado apresente quesitos à própria autoridade policial sobre determinados pontos da investigação.


5. Do direito do advogado de acompanhar seu cliente durante o interrogatório ou depoimento no curso das investigações

O art. 7º, XXI da Lei 13.245/16, com redação dada pela Lei 13.245/16, prevê que é direito do advogado “assistir a seus clientes investigados durante a apuração de infrações, sob pena de nulidade absoluta do respectivo interrogatório ou depoimento e, subsequentemente, de todos os elementos investigatórios e probatórios dele decorrentes ou derivados, direta ou indiretamente, podendo, inclusive, no curso da respectiva apuração: a) apresentar razões e quesitos”.

Assim, é possível afirmar que o advogado possui direito de acompanhar seu cliente durante a audição em Auto de Prisão em Flagrante, Inquérito Policial Comum ou Militar, dentre outros procedimentos.

Nota-se que a Lei referiu-se à possibilidade do advogado assistir seus clientes investigados no interrogatório (audição do investigado pela autoridade policial) ou depoimento (audição das testemunhas).

Portanto, caso a defesa pleiteie à autoridade policial que seja notificada das audições a serem realizadas no bojo do inquérito policial, em regra, deverá o advogado ser notificado com antecedência para que possa acompanhar as audições, inclusive, podendo formular perguntas que poderão ser indeferidas pela autoridade policial, de forma fundamentada, além de constar no termo de audição.

Observamos que a autoridade policial, mesmo diante do pedido do advogado para acompanhar as audições, poderá deixar de notificar o advogado, na hipótese em que determinado depoimento puder trazer informações relevantes que possam culminar em mandado de busca e apreensão, interceptação telefônica, dentre outros.

Obviamente, as testemunhas não passarão informações relevantes para a autoridade policial na presença do advogado do investigado, o que poderá frustrar as diligências.

Portanto, deve ser feita uma leitura adequada da nova previsão legal, sendo permitida a presença do advogado somente nas audições em que não há possibilidade real de frustrar futuras diligências, o que deve ser devidamente fundamentado pela autoridade policial, caso o advogado tenha requerido a participação nas audições.

Por várias vezes, pedidos de busca e apreensão e de interceptação telefônica são realizados, tendo como um dos fundamentos, os depoimento de testemunhas durante as investigações, o que deve ser preservado pela autoridade policial, sob pena de fulminar por completo a investigação.

Na prática, em muitos casos complexos e graves de investigação, o investigado e o advogado tomam ciência após as principais provas e elementos probatórios já estarem produzidos, o que poderá possibilitar a participação da defesa nas audições de testemunhas que ainda não ocorreram.

Entendemos que a nova previsão legal trata-se de um direito do advogado e não de uma garantia do investigado. Portanto, a ausência de advogado durante a audição do investigado, p. ex., caso a autoridade policial tenha assegurado o direito do investigado a contatar seu advogado e não houve manifestação de interesse em acompanhar o cliente não resulta em nulidade.

A previsão legal ocorreu no art. 7º do Estatuto da OAB, que traz os direitos do advogado, culminando sanção de nulidade absoluta caso o direito do advogado seja cerceado.

Caso fosse uma garantia do investigado seria necessária a presença de advogados em todos os procedimentos investigatórios.

De qualquer forma, assegurar a participação do advogado na fase investigatória não deixa de ser um avanço nos direitos fundamentais do investigado, consubstanciando duplamente um direito do advogado e uma garantia do investigado quando há defensor que exerça o direito de participar das audições e produção de provas.

Podemos dizer que na fase investigatória não há garantia do investigado no que tange à participação do advogado nas audições e produção de provas, salvo se houver defensor que tenha manifestado interesse nesse sentido.

A alteração na Lei cominou sanção de “nulidade absoluta”, caso haja descumprimento do direito do advogado de assistir seus clientes durante a apuração de infrações.

Ocorre que a jurisprudência do STF é pacífica de que “a demonstração de prejuízo, a teor do art. 563 do CPP, é essencial à alegação de nulidade, seja ela relativa ou absoluta, eis que “o âmbito normativo do dogma fundamental da disciplina das nulidades pas de nullité sans grief compreende as nulidades absolutas.”[7] e ainda que “para o reconhecimento de eventual nulidade, ainda que absoluta, faz-se necessária a demonstração do prejuízo”[8].

Isto é, seja a nulidade absoluta ou relativa, deve haver prova de prejuízo para que seja reconhecida a nulidade, sob pena do legislador criar uma espécie de “nulidade legislativa”, nessas hipóteses, sendo que deve ser analisado caso a caso, de acordo com a realidade dos fatos e prejuízos efetivamente ocorridos.

Na hipótese de descumprimento do direito do advogado de acompanhar seus clientes nas investigações, em se tratando de Auto de Prisão em Flagrante, esse poderá ser relaxado na Audiência de Custódia ou quando da análise do APF. Em se tratando de inquérito policial, esse não será nulo, mas a audição realizada e as provas produzidas em razão da audição poderão ser declaradas nulas, se houver prova de prejuízo. 

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6. O inquérito continua sendo inquisitivo?

Com a publicação da Lei 13.245/16, rapidamente, diversos artigos e comentários afirmaram que o inquérito deixou de ser inquisitivo, o que não prospera.

O inquérito policial continua sendo de natureza inquisitiva. Isto é, não há contraditório, nem ampla defesa durante o inquérito.

Aury Lopes[9], de forma didática, ao defender que o inquérito continua possuindo caráter inquisitório, escreveu que:

E o inquérito? como sói ocorrer na maior parte dos sistemas de investigação preliminar, continua sendo inquisitório, pois incumbe ao delegado (ou MP para os que assim pensam) presidir o procedimento, praticar atos de investigação e também decidir nos limites legais, respeitando a reserva de jurisdição.

Sim, o delegado (ou o MP nos países que adotam esse modelo) toma diversas decisões ao longo da investigação e ele mesmo realiza os atos de investigação, acumulando papéis. Nada anormal nisso em se tratando de investigação preliminar.

Portanto, o fato de ampliarmos a presença do advogado, fortalecendo a defesa e o contraditório (no seu primeiro momento segundo a concepção de Fazzalari, que é o da informação, esclareço antes de ser criticado) não retira o caráter inquisitório do inquérito! 

Como muito poderíamos falar em mitigação (mas não me parece plenamente correto), considerando que publicidade/segredo, defesa/ausência, contraditório ou não, são elementos satelitários que orbitam em torno do núcleo fundante (gestão/iniciativa da prova). Não são eles que fundam o sistema, pois são elementos secundários que - em tese - podem se unir a um núcleo ou a outro. (destaquei)


7. Qual a natureza jurídica dos atos produzidos na investigação? É possível o juiz condenar com base em elementos produzidos durante a investigação?

As diligências realizadas durante a investigação, via de regra, possuem natureza jurídica de “elementos informativos”, uma vez que esses são colhidos na fase investigatória, sem observância do contraditório e da ampla defesa, tendo por finalidade servir de substrato fático idôneo para subsidiar a tomada de decisões da autoridade policial, do promotor que é o dominus litis e do juiz, ao decretar medidas cautelares, como interceptação telefônica.

Para que determinado elemento informativo possua caráter de prova é necessário observar o contraditório e ampla defesa.

Em razão disso, imagine a hipótese em que a defesa participe de todos os atos produzidos no inquérito, ocasião em que haja efetivo contraditório, poderá o juiz condenar exclusivamente com base nessas provas produzidas?

Cremos que não, a não ser que se trate de “provas cautelares, não repetíveis e antecipadas”, consoante dicção do art. 155 do CPP.

Art. 155.  O juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova produzida em contraditório judicial, não podendo fundamentar sua decisão exclusivamente nos elementos informativos colhidos na investigação, ressalvadas as provas cautelares, não repetíveis e antecipadas. (Redação dada pela Lei nº 11.690, de 2008)

Esse entendimento que preconizamos decorre da previsão do art. 155 do CP, ao expressamente dispor que o juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova produzida em contraditório judicial.

Nota-se que o contraditório exigido pela lei deve ocorrer na fase judicial, não sendo suficiente a sua observância na fase inquisitiva.

De mais a mais, a produção probatória na presença do juiz criminal, durante a instrução processual, é essencial na formação de sua convicção, sendo inclusive previsto o princípio da identidade física do juiz no processo penal, consoante art. 399, § 2º do CPP, ao dispor que “o juiz que presidiu a instrução deverá proferir a sentença”.

Lado outro, não se pode negar que havendo participação da defesa e contraditório durante o inquérito, haverá maior segurança jurídica para que o magistrado utilize as provas produzidas na fase inquisitiva para fortalecer as demais provas produzidas na instrução processual e para que, consequentemente, profira sentença condenatória.

A título de reflexão, registro texto escrito por Afrânio Silva Jardim[10], ao fazer seus primeiros apontamentos acerca da possibilidade do inquérito vir a ser contraditório.

(...) se o inquérito vier a ser contraditório, passa a ser uma primeira fase do processo penal ( processo é todo procedimento desenvolvido em contraditório - Fazallari). Assim, a prova ali produzida poderia lastrear um juízo condenatório. O que pode parecer liberal, na verdade, de liberal não tem nada. O nosso sistema processual penal restaria totalmente descaracterizado e esta primeira fase do processo seria instaurada sem qualquer lastro probatório mínimo. O delegado de polícia iria desempenhar a dupla função, substituindo o Ministério Público e o juiz, ao presidir verdadeiras audiências instrutórias. Patente inconstitucionalidade. O sistema acusatório exige que o processo seja instaurado por ação da parte e esta acusação tem de encontrar arrimo em prova mínima colhida unilateralmente pelo Estado.

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Sobre o autor
Rodrigo Foureaux

Juiz de Direito - TJGO. Mestre em Direito. Foi Juiz de Direito do TJPA e do TJPB. Aprovado para Juiz do TJAL. É Oficial da Reserva Não Remunerada da PMMG. Bacharel em Direito e em Ciências Militares com Ênfase em Defesa Social. Especialista em Direito Público. Autor do livro "Justiça Militar: Aspectos Gerais e Controversos".

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

FOUREAUX, Rodrigo. A Lei 13.245/16 e suas repercussões jurídicas e práticas nas investigações. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 21, n. 4597, 1 fev. 2016. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/45882. Acesso em: 22 dez. 2024.

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